Mas as estrelas são tão brilhantes... escrita por AsgardianSoul


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Olá, se está aqui é porque se interessou pela leitura.
Desde já agradeço.
Boa leitura!



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Ele vive sob minha pele, fluindo no meu ar, distorcendo meu caótico tempo. Dou-me conta de que respiro quando tuas lembranças se vão da minha mente. Meus sentidos não respondem, ou eles fazem, e não sou mais capaz de reagir. Fico perdida entre seus sinais. Preciso ir embora. Deixa-me deixar-te! Mas as estrelas são tão brilhantes...

O silêncio é minha testemunha, assim como a caneta e o papel. Eu tentei. Ir embora é difícil quando se quer ficar. O primeiro passo fica preso entre o alívio e a saudade, um precipício grande demais para se cruzar. Sinto uma vontade incessante de passar os dias ensolarados à sombra de teus gestos. Queria que o vento sussurrasse uma mentira aconchegante em meus ouvidos, uma fantasia qualquer aonde eu chegasse a tempo de aconchegar sua alma entre minhas mãos. Ainda lembro-me do seu olhar, tão insanamente palpável. Neles, em vão, procurei vida. A decisão tinha sido tomada. Meu discurso se tornou utopia, assim como nós.

Guardo tuas palavras como se fosse amuleto. Pintei-as em um quadro imaginário, como se não fizessem sentido, assim como você costumava fazer com suas pinturas melancólicas. Nunca entendi sua paixão pelo céu noturno. Em cada obra ele gravava uma estrela. Um diálogo meio convexo depois de duas cervejas me fez entender que há coisas que não são para compreender.

— Por que sempre estrelas?

— Por que elas nunca desistem de brilhar, por mais escuro que esteja.

Enquanto encaixava estrelas em suas pinturas, algo crescia dentro de ti. Nuvens escuras ofuscaram tuas estrelas, apagando seus passos para que eu não mais pudesse os seguir. Jurei estar ao seu lado, embora nunca tenha te contado. Jurei nunca rir do seu cabelo, não implicar com suas bolachas integrais, não sucumbir ao meu humor bipolar, embora tenha feito um par de vezes e quis fazer outro par de vezes. Como um pensamento bobo invade uma mente leviana, me pego rindo do seu cabelo e adorando suas bolachas. Compro, porém não tenho coragem de comer, pois tem seu gosto: gosto de morte. Compro e as despejo em um pote para deixar sobre a mesa. A visão das migalhas se depositando devagar no fundo do recipiente indica a passagem do tempo melhor do que qualquer relógio. Peço aos céus, às suas estrelas, para que elas se desintegrem bem lentamente. Quero sentir a eternidade reduzir-me a um fio de existência.

Agora chove. Nesta noite ele não diria que as estrelas são tão brilhantes. Tatuaria esta frase ingrata em meu peito se não a tivesse gravada na alma. Sinceramente, prefiro o céu assim. Não quero olhar para elas e lembrar que foi sua última frase. Uma dedicatória merecida para uma coisa que sempre fez parte da sua vida, ao contrário de mim. Talvez porque elas te entendiam melhor do que eu. Talvez por elas sempre estarem lá, ouvindo-te em silêncio eterno, o espectador leal, assistindo a sua queda.

Ninguém testemunhou as lágrimas que derramei quando soube da sua ruína. Era uma manhã ensolarada, que se apagou, como sua vida. O suicídio do resto do dia. Encontrei a prova de sua última sentença pendurada no local mais alto da sua parede, os traços tão firmes como jamais foram: “Mas as estrelas são tão brilhantes...” Um borrão negro e pontinhos brancos cintilavam acima. Dois meses depois tive coragem para guardar suas pinturas. Tirei-as da parede com o sentimento de violação que um beija-flor deve sentir ao fazer despencar uma pétala de flor. Só então, ao estuda-la melhor, pude notar no verso o complemento de sua frase favorita: “Porém, nenhuma como Jane White”.


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Notas finais do capítulo

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