Tempo Ruim escrita por helenabenett, Lyra Parry


Capítulo 2
Vida Vazia


Notas iniciais do capítulo

O que fazer agora? O fim de um relacionamento de anos é sempre doloroso. E talvez o mais difícil seja saber o que fazer depois... Acompanhemos nossa amiga nessa jornada complicada.



Para Danizinha.



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Segunda-feira, 7:10, na escola

— Oi, Maga – Disse uma preocupada Mônica – Você não atendeu o domingo inteiro. Fiquei preocupada.

Olhou para Magali e ficou ligeiramente constrangida. Sua amiga estava completamente desleixada. A sorte dela é que ela era, naturalmente, linda. Não havia passado maquiagem e seu cabelo estava solto e totalmente jogado. Usava jeans confortáveis e rasgados. Uma blusa de uma banda de rock esquisita que ela sabia que Maga só ouvia quando estava na fossa. Maga era muito boa, muito boa mesmo. Por isso, quando ficava com raiva, descontava nas coisas inanimadas e em si mesma. Ouvia músicas gritantes e nervosas. E se desleixava com a aparência. Mas olhando bem para ela, Mônica notou que de um jeito diferente ela ficara bem mais bonita. Como se pela primeira vez, ela não se importasse. E estivesse do jeito que gostaria de estar.

— Estou bem, Mô. Só precisava de um tempo, você sabe. E como você está, teve um bom fim de semana?

— Nossa, a Maga tá arrasada mesmo com o namoro. Olha como ela tá vestida! – Disse uma Denise embasbacada.

— ELA TÁ HORRÍVEL, OLHA O CABELO DESSA MULHER – gritou uma histérica Carmem.

Mônica estava indo para a sala enquanto Maga foi ao banheiro. Ela fulminou as meninas com um único olhar. E foi o suficiente para não falarem mais da Magali. Pelo menos não na escola.

Quinzinho era um bom rapaz. Mas um rapaz fraco. Quando terminou com Magali, correu para Sarah. Ela, porém, era uma mulher mais resolvida. E disse que só ficaria com ele se ele provasse que não correria pra Magali na primeira oportunidade. E só tinha um jeito de provar isso, anunciando o namoro dos dois imediatamente. É claro que todos imaginariam que eles já estavam juntos antes. E essa era carta chave para Sarah: que a vergonha não permitisse que Maga voltasse pra Quim. Se ela conhecesse nossa pequena heroína não pensaria desse modo. Mas, além de não conhecê-la, Sarah era uma mulher apaixonada. E pessoas assim podem ser muitas vezes cruéis e egoístas, mesmo sem querer.

Naquele mesmo dia, no primeiro horário, Quim contou a Denise que estava namorando uma moça que estudava no colégio publico do Limoeiro e trabalhava em um mercadinho de família que ficava ao lado da padoca. Denise tinha certa consideração pela Magali, mas essa era a fofoca do SÉCULO, e apesar de ter prometido esperar o pesar da Magali passar para espalhar a noticia, bastou ver a magrela sorrir para achar que o luto tinha terminado. E contou pra todo mundo a novidade. O resultado é que, na hora do intervalo, a escola inteira já estava sabendo que o casal, contra todas as expectativas, havia se separado.

 

Intervalo, no refeitório.

— Eu vou matar o Quim e essa víbora! Vou matar os dois e depois dou um jeito nessa bocuda da Denise e... Maga?

— Mônica... Deixa isso pra lá. Eu não me importo – falou Magali olhando para o seu lanche, que, ela sabia, não comeria. Ela se importava, sim. Queria bater neles, esmurrá-los,  matá-los. Todo o restinho de tristeza que ela sentia se convertera em puro ódio. Mas ela não faria nada. E nem deixaria a Mônica fazer.

— Mô, me escuta. Nada do que você fizer vai me ajudar, entendeu? O que passou, passou. Não vale a pena falar sobre isso.

Mônica ia protestar, mas DC sentou na mesa e começou a falar sobre assuntos aleatórios. Quando eles começaram a se beijar, Maga sentiu seu estômago revirar e saiu correndo dali. Desistiu de assistir aula. Ao chegar perto de casa viu uma silhueta conhecida. O rapaz alto e forte na frente de seu portão lhe deu um rápido olhar e disse abraçando-a.

— Eu sinto muito, Magrela — para variar, o Sujinho resolvera voltar para casa mais cedo.

— Cascão, eu estou ótima. Eu juro.

— Que tal sairmos, Comilona? Eu pago.

Ela sorriu. Como era bom estar naquele abraço amigo. Ela amava seus amigos, todos eles. Mas a Mô era esquentada demais, e por mais que ela fosse sua melhor amiga, Maga não podia demonstrar nenhum tipo de fraqueza perto dela, pois ela simplesmente enlouquecia e queria tomar frente em tudo na sua vida. O Cebolinha (ela ainda o chamava assim em pensamentos) era um sem noção que não sabia lidar nem com os próprios sentimentos, imagina com os dos outros. Ele era perfeito no momento em que a situação fosse menos fresca e ela quisesse ouvir piadas ácidas a respeito das coisas. Mas não agora. Ela queria alguém pra abraçar, que não fizesse perguntas, que não ficasse irritado. Que apenas a deixasse esquecer seus problemas por alguns minutos. E o Cascão certamente era o mais perfeito pra isso. Ela chorou naquele ombro amigo por alguns minutinhos. E ele não falou nada, não fez perguntas, não fez piadinhas. Quando ela terminou ficou ligeiramente constrangida. Saiu do abraço e limpando as lágrimas disse:

—Desculpa, Cas. É tudo muito novo ainda pra mim.

— Tudo bem, Maga. Sabe, eu te pago o lanche outro dia. Vou indo. — Dando um beijo na testa da amiga, ele deu meia volta e foi pra casa. Cas sentia uma raiva incontrolável do ex-namorado de Maga. Queria chutar aquele traseiro gordo até não poder mais. Mas não diria nada disso a menina. Não queria assustá-la. E conhecia Magali como ninguém. Ela não queria que alguém pensasse que ela não sabia lidar com os próprios problemas. Ela era orgulhosa, no fundo, e ele respeitava isso.

Magali pegou o Mingau e acariciou longamente seu pelo branco. Disse mais para si do que para o gato: “Você nunca gostou do Quim. No fundo você sempre tem razão, não é Mingauzinho? Bem, senhor soberano, o que eu faço agora?” Boa pergunta... e agora? Bem, ela não queria namorar, certamente. Mas ela passava pelo menos duas horas do seu dia na padoca. E por mais que não ficasse muito tempo com Quinzinho, ainda sim estava lá. Ela precisava de um hobby. Mas o quê?

 

Oito semanas depois:

— Você reparou como a Maga anda evasiva ultimamente? – dizia Mônica para o namorado. – Mal sai com a gente, e olha que eu evito o Joaquim ao máximo. Para que ela não fique constrangida. Porém, ela não parou de sair só comigo, é com todo o mundo. Fica três horas todo dia fazendo sei lá o quê que nem a mãe dela sabe. E está com o rosto mais magro e as roupas cada vez mais largas. Será que ela tá com anorexia ou algo assim, DC?

DC estava jogando no celular e mal ouviu o que a namorada disse. Falou apenas um “AHAM”, mas a Monica estava tão focada em seu problema que não notou o desinteresse do namorado. Quando viu Maga passando pela janela de sua casa, correu para cima dela como um leão em cima de sua presa.

— MAGALI! Ok, eu estava tentando ser compreensiva. Mas pra mim já é demais, você some por dias, fica toda misteriosa e... Por que você está rindo?

— Mô, por favor, eu só estou ficando mais tempo na academia. Não reparou que emagreci? – E naquele momento caíram luvas de boxe da mochila de Magali.

— Você está fazendo aulas de boxe? QUE COISA MAIS MASCULINA É ESSA? TÁ LOUCA?

— Não notou como estou bem? Larga de ser mente fechada, Mônica. Eu queria mesmo era fazer umas aulas de tiro, mas isso pouco ajudaria meu físico. Eu me sinto bem, minhas notas melhoraram, meu físico melhorou... Eu só quero dar um tempo da turma. Só quero um tempinho pra mim. É pedir demais?

A Monica entendia muito bem. Ela olhou para amiga e notou que não precisava se preocupar tanto assim, afinal, aquela comilona sabia se cuidar muito bem. Lembrou-se de que ela vinha de uma linhagem de mulheres poderosas. Não podia deixar se levar pelas aparências... Magali era sensível e bondosa. Mas não era fraca. Era uma mulher forte e de muito caráter.

— Bem... você podia colocar a cara do Quinzinho nesses sacos que vocês socam!

— E você pensa que eu já não fiz isso, amiga?

As duas riram.

— Que tal se a gente saísse? - sugeriu Mônica. – Só nós quatro. Só a turma clássica!

— Tem certeza, Mô? As coisas entre você e o Cebola a muito tempo não estão lá muito boas...

— Tenho, Maga. Não se preocupe... Não é só você que sabe se controlar.

Meia hora depois, lá estava Mônica gritando com Cebola ao telefone. "VOCÊ VAI SIM, CEBOLINHA, NEM QUE EU PRECISE TE ARRASTAR PELOS CABELOS!". DC resolvera ir embora para dar algum espaço para as amigas. E Mô ficou responsável de ligar pros meninos e marcar o lugar e os horários.

"Será que é uma boa ideia?", pensou Maga. Havia outro motivo pelo qual ela não desejava sair com os meninos. Mesmo se esforçando para não pensar muito nisso, havia muito tempo que ela se sentia inclinada para o Cascão. Ele era tão bom com ela, sempre fora. E, apesar de negar, ela sentia a falta de alguém em sua vida. Praticamente nunca ficara sozinha. E namorar o Cascão lhe parecia cada vez mais interessante e belo. Ela já não lia mais romances, não via comédias românticas e não ouvia músicas melosas, porque tudo isso a lembrava o sujinho. Ela queria expulsar qualquer tipo de possibilidade de romance de sua vida. Até suas roupas eram largadas e nada sexys. E quando se sentia sozinha, colocava um rock pesado, para se sentir melhor.

Começara pegando leve na academia. Uma horinha. Depois se interessara pelo boxe e pelo jiu-jitsu. Quando notou, passava mais de duas horas lutando. Fosse em um estilo, ou em outro. Seu corpo mudara. Sua mente, que antes ficava focada na dor emocional, se fechara e só absorvia o que era físico. Os filmes que ela via estavam cada vez mais práticos e realistas. Seus livros eram sobre assassinatos, máfia, economia, matemática, física. Tudo que não tivesse a ver com casais e suas tristes realidades. Comprara o equipamento básico de boxe, e toda vez que ficava estressada descontava naquele saco de areia. Só havia passado seis semanas e ela já era uma das  melhores pugilistas da academia. Ela estudava metade do dia, a outra metade estava na academia, e no finzinho da noite lia seus novos livros e ficava com Mingau. Apenas nos fins de semana e na escola via Mônica. Talvez por isso a dentucinha estivesse tão brava com ela, afinal. Mas às vezes ainda sentia a Magali doce e carente dentro de si. Nesses dias não havia leitura, não havia descanso. Ela ficava horas socando aquele maldito saco de areia e se culpando por ser uma idiota. Foi num dia desses que o Cascão a encontrou. Duas semanas após o término, ele fora em sua casa, mas a Gulosinha pediu para a mãe dizer que ela estava indisposta. O que era verdade, pois ela estava emocionalmente assim. Mas o Cas não era exatamente o tipo que se contentava facilmente. Subiu na árvore que ficava ao lado do quarto de Maga e ficou um tempo a observando, sem que ela o pudesse ver. Ela socava com força e dava chutes sucessivos no saco de areia. Ouvia uma música pesada do Matanza. E cantava: “Mesmo que eu pudesse controlar a minha raiva, mesmo que eu quisesse conviver com a minha dor, nada sairia do lugar que já estava não seria nada diferente do que sou... Eu só quero que você entenda bem, eu não gosto de ninguém”. Se fosse a Mônica que tivesse pegado Magali naquela situação, ela teria ficado brava e preocupada. Cascão riu. Cada um lida com sua dor como pode, e era o que ela estava fazendo.

Mas ele ainda estava com raiva do Quinzinho, e teria sua chance de descontar o que ele fez com sua amiga. Teria sim... Por mais que ela estivesse bem, apesar de diferente. Aquilo era imperdoável. Não só a traição, como a humilhação. Isso era demais para Cascão. Dois dias depois lá estava Quim jogando com os meninos. Ele era o goleiro do time oposto, e Cas sorriu pra si mesmo. Era hoje que ele ia chutar aquele traseiro gordo. Arranjou uma desavença qualquer com Joaquim e foi empurrando ele por toda a quadra. Ele era bem difícil de brigar. Por que não passava de um bunda mole. Mas Cascão estava bem motivado. Ele era uns 20 cm mais alto que o padeiro e incomparavelmente mais atlético. Olhou para Quinzinho e disse:

— Você não passa de um traidor imbecil. Não basta trair a namorada, nossa amiga, aliás. Ainda tem que ficar de trairagem no futebol também. Me encara se for homem.

Os meninos entraram no meio. Cascão ficou feliz, pois quando olhou aqueles grandes olhos inseguros e assustados sua vontade de bater no garoto passou totalmente. Talvez no fundo as coisas tivessem acontecido da melhor forma. A Magali era uma mulher incrível, forte, corajosa, sem deixar de ser tranquila e bondosa. Ela merecia coisa melhor. E foi nesse momento que Cascão pensou: “Meu Deus... ela LOGO vai arranjar alguém melhor”. E seu coração doeu.


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Notas finais do capítulo

22/02/2016
Capítulo revisado. Continuem avisando se encontrarem erros de sintaxe, ortografia e outros.
PS: vamos parar de postar de madrugada, porque sempre estamos com sono nesse horário, por isso os textos saem assim, sem cuidado com a formatação. Vamos retribuir o carinho que nos dão com um trabalho de qualidade.



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