Flashlights & Clapperboards escrita por Paper Wings


Capítulo 2
Cap. 1: I Really Want It




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"So turn it up on the stereo

Somebody light the ignition

What the hell are you waiting for

It's time to make a decision"

I Really Want It - A Great Big World

 

Assim que pegamos nossas malas, chamamos um táxi, rumo ao nosso novo e temporário lar. Eu estava ansiosa não só por finalmente ter chegado em Atlanta, como também pela ideia de morar pela primeira vez em uma casa. Uma casa! Minha vida inteira tratou-se de três apartamentos diferentes em Londres — devido ao emprego do meu pai — e, só pela ideia de ter uma maior privacidade e poder cantar e dançar aos berros sem ter gente batendo na nossa porta, reclamando, já era lucro.

O clima da Geórgia era bem diferente da Inglaterra. Quero dizer, era úmido, porém, extremamente quente e abafado. Eu sentia os raios da manhã queimando minha pele essencialmente branca como cera e, por um instante, amaldiçoei-me por não ter colocado lentes e escolhido um óculos de Sol, compatível ao calor. Fora isso, acho que iria me acostumar rapidamente. Era tudo tão bonito, as avenidas cercadas por árvores, e tudo tão claro e iluminado. Culpe o céu nublado e opaco da capital inglesa para tantos elogios.

Coloquei os fones de ouvido e aumentei a música, dando uma indireta a minha mãe, que acabara de receber uma ligação do trabalho. Ela tentava falar baixo, mas não pôde conter alguns gritos esganiçados. Até sobre o emprego ela discutia... Pelo que entendi, teria que buscar uma papelada ainda hoje na filial e seu desejo era ficar comigo, ajudando-me com a mudança.

Ela mudara tanto em três meses, contemplei, com a cabeça nas nuvens. Seu sorriso sempre parecia meio forçado demais e agora vivia de sucos para emagrecer, como se quisesse esquecer que havia um bebê ali, em sua barriga, até... Bom, até ele não estar mais lá. Era tão injusto. Ter um irmão ou irmã seria legal, mesmo nossas idades tendo um grande espaço de diferença. Chorei tanto ao saber por meio de uma gritaria abafada no quarto de meus pais. Eu tinha o direito de saber. Só que isso não importava, ficar vivendo de possibilidades não era certo. Algo mais estava acontecendo. Minha cabeça insistia em ter esse pensamento: algo estava faltando. Eu achava isso errado, pois um aborto espontâneo deveria ser a única causa para ela estar em uma depressão no primeiro estágio: negação, porém, eu tinha a impressão dela estar escondendo alguma coisa que piorava sua situação a cada dia que se passava.

Depois de mais ou menos uma hora e meia, chegamos. Era um sobrado lindo, com sótão e um cômodo que ficava de frente para a rua, o qual dava para sair pela janela e sentar no telhado. Um sonho de consumo, para ser sincera. Na minha cabeça, eu já proclamava que aquele quarto pertenceria a mim, e lutaria por isso com garras e dentes. Imaginei Nate comigo, olhando as estrelas e zoando um ao outro com piadas infames. Ele era meu único amigo e daria de tudo para estar ali naquele momento.

Um sedan preto estava estacionado na frente e uma mulher com terninho de risca de giz, salto scarpin e um coque bem apertado estava nos esperando. Ela segurava uma pasta azulada em uma das mãos e, na outra, uma bolsa de couro empresarial. Era a mulher da imobiliária que cuidou da compra da casa, se minhas contas não estivessem erradas.

Assim que minha mãe pagou e desceu do táxi, colocando os óculos teatralmente e jogando o cabelo, algo com o qual já estava bem acostumada, ajudeia-a a tirar as malas, que colocamos na calçada, enquanto a moça aproximava-se, aguardando terminarmos de descarregar as coisas. Não era uma grande quantidade, somente três malas e bagagens de mão, pois o resto, se tudo dera certo, já havia chegado antes de nós, nos Estados Unidos, por navio. Só faltava ligar para a firma de transporte para entregar no domicílio.

— Sra. Murray, eu presumo. — Cumprimentou formalmente. — Sou Charlotte Pine. Conversamos via e-mail e telefone nas últimas semanas em relação ao imóvel... Por favor, acompanhem-me.

Talvez fosse impressão, mas eu sentia que, a cada passo que eu dava, eu estava ficando mais e mais saltitante de tanta ansiedade. Senti uma pontada de dor no meu estômago e meus lábios secos evidenciavam também o meu nervosismo. Eu estava com medo desse grande passo, ao mesmo tempo que eu gostaria de estar rindo, despreocupada. Era uma nova escola, novas pessoas, novas responsabilidades... Uma nova vida, para ser exata.

A Sra. Pine deu duas chaves para minha mãe depois de abrir a porta principal. Imediatamente, um sorriso surgiu em meu rosto e eu tive vontade de correr para todos os cantos como uma doida varrida, mas como minha mãe iria surtar, decidi manter a compostura. Tudo bem ela se importar exageradamente com a aparência, tanto é que foi uma das heranças maternas passadas para mim. Bom, quero dizer, mais ou menos... Não era muito de meu feitio ficar andando com a cara lavada, sem um pingo de maquiagem, mas nunca fora de usar um visual pesado, o qual parecia que havia toneladas de produto em meu rosto. Uma base e uma máscara de cílios, no mínimo, eram sempre necessárias, porém, não naquele dia. Era bobo, mas eu achava que esse grande passo deveria ser feito pela real Piper Murray, e não por uma garota escondida por uma máscara.

Elas começaram a falar sobre coisas chatas, como o agendamento das prestações e outros pontos nada agradáveis para uma adolescente, então, decidi dar uma volta pelo meu novo lar. Logo ao entrarmos, abri o Skype pelo celular, sentindo saudades do meu refúgio seguro. Em Londres, era quase uma hora da tarde e Nate não tinha desculpas para não responder à chamada. Após um instante, a imagem dele apareceu. Seu cabelo estava todo bagunçado e sua cara de sono denunciava uma noite mal dormida. Deveria estar capotado até o computador apitar por minha causa.

— Ora, ora... — Arqueei a sobrancelha, colocando uma certa malícia no tom de minha voz. — Maratona de séries ou piranha desconhecida?

— Muito engraçado, Murray... — Respondeu, bocejando. — Eu quase não dormi esta noite. Tinha que me acordar tão cedo?

— Cedo, lindeza? — Esbocei um sorriso. — Bom, Bela Adormecida, temo lhe dizer que já é hora do almoço aí.

Ele fingiu irritação, bocejando novamente. A conexão falhou por um momento, porém, logo voltou e eu não perdi a oportunidade de zoá-lo mais uma vez.

— Tudo isso é amor? — Ri. — Ficou preocupado que meu avião caísse?

Algo em sua expressão mudou e, por um segundo, franzi a testa, confusa. Ele travou o maxilar e quebrou o contato visual e, instintivamente, fiquei séria, perguntando-me o que eu teria dito que fez com que ele agisse daquela maneira estranha. Meu semblante irônico começou a desmanchar lentamente para dar passagem ao meu lado "Melhor Amiga Detetive" e descobrir que porcaria estava acontecendo, mas, de repente, Nate voltou ao normal. O garoto suspirou dramático e deu um riso anasalado.

— Acho que alguém está carente, Miss Donuts... — Ele brincou, fazendo-me sorrir levemente, ainda confusa. — Como está aí, em solo americano?

Dei de ombros.

— Mamãe está cuidando das coisas com a mulher dos imóveis... — Pausei. — ... que, por sinal, não é gostosa, se é o que você estava prestes a perguntar, Nathaniel Necessitado Brown.

— Preocupada com a minha vida sexual, Murray? — Novamente, ele deixou uma pitada incomum aparecer em seu rosto. — Obrigado pela parte que me toca.

— Sabe, Nate... — Respirei fundo, séria. — ... eu sempre sonhei em vir para os Estados Unidos e seguir com uma minha carreira de atriz, lembra?

Ele revirou os olhos.

— Como eu ia esquecer, idiota? — Ficou boquiaberto. — Fui eu quem teve que passar o período dos seus nove aos doze anos escutando você falar só sobre Hollywood!

— Exagerado. — Fiz um bico. — Enfim, dá para você calar a boca, lindinho, que eu estou tentando me abrir aqui? — Tentei parecer irritada em vão. — Eu sempre imaginei que faria tudo isso... — Afastei meu celular um pouco, mostrando parcialmente a casa em um giro. — ... com você aqui comigo, mas como não posso ter tudo o que eu quero, bobão, vou andar por essa casa pela primeira vez com você... — Dei um sorriso sapeca. — ... via Skype. Aí, quando você vier me visitar em algumas semanas, não vou ter que ter que me dar ao trabalho de fazer um tour pela casa... — Sorri, debochando. — Sou brilhante, não sou?

Nate ficou em silêncio. Mais uma vez, ele parecia em transe, preso em outra órbita. Era impressão ou ele estava prestes a chorar? O jovem mordia os lábios e não me encarava, algo que ele fazia quando estava engolindo o choro e tentando dar uma de machão. Nunca funcionava em cima de mim, e Nathaniel sabia muito bem disso, então, por que tentar? Será que eu falara as coisas erradas? Repassei meu discurso em minha mente: foi bem... Ah, foi bem fofinho. Talvez eu tenha exagerado no emocional, porém, eu sempre havia sido uma pessoa bem sensível. Não era minha culpa se meu melhor amigo não gostava dessa minha parte e, francamente, a esse ponto de nossa amizade, sua cabeça oca já deveria ter se mancado que eu não iria mudar. E, aliás, ele possuía vários defeitos também e eu só zoava setenta e cinco por cento deles. Ele poderia, sei lá, ser mais compreensível.

— E eu já estranhando toda a "viadagem", Murray... — Finalmente bufou, acabando com o clima pesado. — Vamos logo com isso, panaca.

Suspirei, aliviada. Ele estava de volta.

— Em que século você vive, Brown? — Gargalhei, chocada. — Você disse "panaca"?

Suas bochechas coraram um pouco e ele abriu um sorriso sincero.

Ok... — Levantou as mãos em rendição. — Me exaltei, beleza?

O primeiro recinto era uma saleta de visitas simpática e confortável. Eu já conseguia ver tudo em seu devido lugar, planejando aonde tudo ficaria. Abri uma porta dupla de correr, a seguir, feita de madeira e com um peso considerável, encontrando a sala de vídeo. Era tão ampla e já possuía um sofá escuro, combinando com um vaso decorativo na mesinha de centro, além de poltronas de couro envelhecido; a televisão era gigantesca — umas 42 polegadas — e o aparelho de Blu-ray 3-D descansava no rack ao lado do X-box... De onde meus pais haviam tirado tanto dinheiro? Não que nós vivêssemos na pobreza antes, só que aquilo era insano.

— Uau, Murray... Sua família está podendo, hein? — Voltei a tela em minha direção para vê-lo. — Acho que vou visitá-la mais cedo. Isso aí é incrível!

— Fale por você... — Murmurei. — Já estou começando a achar que minha mãe roubou um banco.

O que será que estava acontecendo? Por que estávamos em uma luxuosa casa como aquela? Eu não estava reclamando, só gostaria de entender que merda acontecia na minha própria família para variar! Eu já premeditava umas indelicadas perguntas que faria para minha mãe mais tarde.

— Estou imaginando sua mãe com um salto quinze, máscara de esqui rosa e um traje de onça pintada. —  Riu, mas parou imediatamente, contemplativo. — Isso foi bem...

— Malicioso. — Completei seu raciocínio, seca, porém, com um sorriso de lado. — Tira os olhos da minha mãe, Brown.

Passei para o próximo cômodo, era a cozinha. Grande, duas paredes eram cobertas pela decoração: a geladeira era prateada e com duas portas; armários presos no alto, tocando o teto, circundando o que havia conjugado abaixo; as janelas tinham um metro aproximadamente e eram cobertas por cortinas de linha branca e fina; e duas pias charmosas contrastavam com o granito negro, o qual também decorava uma bancada no meio do recinto, onde descansavam acima dela, um suporte que segurava panelas de um jeito bem organizado. O fogão tinha cinco bocas e o exaustor não era chamativo como eu pensava que seria. Para ser sincera, tudo parecia perfeitinho demais. A casa fora reformada por um programa de reality show ou algo parecido.

— Cara, ainda tem mais três portas... — Pigarreei. — Acho que uma delas vai para o jardim lá dos fundos. Olha, esquece. Mostro o resto depois, Nate. Quero ver o andar de cima. Sabia que temos um sótão?

— Eu sabia que a sua preguiça e curiosidade fariam um complô contra mim. — Ouvi sua risada. — Aliás, eu queria ver o lavabo.

Estanquei no lugar e virei o celular para mim novamente. Pisquei algumas vezes, em silêncio, e, enfim, fiz a pergunta que não queria calar.

— Por que raios você quer ver o lavabo, Brown?

— Ah, sei lá... — Gargalhou. — Só ache logo a porcaria do lavabo, Murray!

Praguejei e abri uma das portinhas e, sorte ou não, era justamente o que o menino desejava ver. As paredes eram pintadas com textura até a metade em um tom bem forte — quase escarlate — e a metade inferior era revestida por lajotas brancas; a luminária era bem chique sem ser exagerada... O espelho tinha um tamanho apropriado e não tirava a atenção da estilosa pia, a qual parecia uma bacia transparente e simples, mas que se encaixava muito bem ao restante tão chamativo.

— Satisfeito, E.T.? Ou quer que eu levante a tampa da privada também?

Nate deu um sorriso divertido.

— Eu cagaria à vontade nesse lavabo... — Pausou. — Você vê, outros lavabos normalmente não são receptivos e, somado ao fato de que há pessoas na sala ao lado, torna tudo mais desconfortável, sabe? E também temos que...

— Nathaniel Brown do meu coração... — Respirei fundo, massageando a têmpora e falando lentamente, como se tentasse explicar algo muito sério a uma criança de quatro anos. — ... me diz que você não está filosofando sobre lavabos e me contando sobre suas dificuldades de se aliviar na casa de estranhos.

— Chata. — Revirou os olhos.

— Aberração. — Mostrei a língua.

— Vai logo, Pips. — Bocejou. — Me mostra o seu futuro quarto logo, que eu quero dormir.

— Depois, eu quem sou a refém da preguiça e da curiosidade... — Bufei. — Se enxergue, Brown.

Sorri e saí do banheiro, em busca da escada. Meu All Star batia contra o assoalho de madeira e um degrau ou outro rangiam com meu peso, apesar da casa parecer recém-reformada. E era óbvio que Nate precisava implicar mais, ao contrário, não seria meu amigo do outro lado da linha:

— Acho que alguém precisa parar de comer rosquinhas... — Mandou a indireta em um tom melodioso. — E agora você está na terra do fast-food. Que o deus da balança goste bastante de você, Murray.

— Ah, calado, Nate! Você só esta me enchendo o saco hoje, hein? — Esbocei um sorriso contraditoriamente. — Ninguém merece não poder comer hambúrguer livremente nos Estados Unidos. Aliás, sem tocar no assunto "saúde", os padrões de beleza atuais são abusivos e...

Escutei um ronco, estranhando. Ao olhar para a tela, arquejei com a cena. O garoto fingia ter caído no sono, porém, ele não conseguia parar de sorrir como um idiota. Eu mereço... No final, talvez eu não fosse a única a bancar a filósofa aloprada, embora minha temática fosse realmente importante, ao contrário de lavabos e privadas alheias. A sorte dele era que eu o conheci quando era um bebê, senão, possivelmente ele estaria cercado por más influências e pessoas, que colocariam mais lenha na fogueira. Imaginem! Ele poderia acabar escrevendo um livro: "As vantagens e desvantagens de certos lavabos", seria horrível. Ok, isso não era verdade, exceto que a parte de ser horrível era puramente um fato. Nathaniel era aquele melhor amigo com quem nos casamos, caso ninguém tenha se oferecido para tal ato ainda, sabe? Não conseguia me ver sem sua amizade, o destinos nos uniria de algum modo. Aquelas promessas de "Se ambos não nos casarmos até os trinta e sete, promete que casa comigo?", as quais davam aquele frio na barriga só de imaginar "Será que vamos ter que cumprir essa promessa?", eram nosso lema praticamente.

— Ha ha... — Sorri, cínica. — Já pensou em seguir com a carreira de comediante?

No andar de cima, direcionei-me ao quarto que dava para a rua e ele era absolutamente lindo. Pensei nas minhas coisas, que minha mãe já deveria ter pedido para o caminhão trazer, sendo colocadas cada uma em seu devido lugar e, sem perder tempo, passei pela janela, sentindo meus pés tocando o telhado. Do lado de fora, fazia bastante sol, e notei que iria precisar de uma toalha de praia para conseguir sentar naquela telha fervente, porém, fora isso, estava perfeito. Era uma vista maravilhosa: a rua não muito movimentada; a casa da frente, a qual parecia ter a mesma estruturação que a minha; o espaço arborizado no final da rua: uma pracinha circular. Era lindo.

— Terra chamando Pips...
         Despertei com a voz meio abafada, franzindo as sobrancelhas, e só aí que notei que havia deixado o celular com a câmera para baixo, ao encontro do telhado. Nate não estava vendo nada, coitado... Quero dizer, coitado nada. Ele estava muito abusado, isso, sim; merecia meia hora com uma imagem escura.

— Você precisa me visitar o quanto antes, Brown. — Murmurei sem fitá-lo, pois estava ocupada com a paisagem. — Aqui é tão perfeito que não teria dúvidas que nossa amizade só se fortaleceria... Fale com seus pais para deixarem você vir, ok? Acho que preciso de você aqui, comigo, bobão. Além do mais, se não fosse você, nada disso seria possível. Sem aquele e-mail, eu não estaria na Geórgia... Atlanta irá perecer diante da nossa indestrutível amizade londrina, você vai ver!

Enfim, encarei a tela do celular, incerta se ele tinha capotado de novo pela minha atuação tosca de político tentando comprar votos.

— E-eu... — Ele começou a dizer algo, mas pareceu desistir. — Veremos, Murray. Em menos de duas semanas começam as aulas, mas vou falar com eles.

— Beleza. Ah, depois vou conectar de novo, então, faça o favor de não desaparecer, viu? — Fiz uma careta. — Eu vou decorar meu quarto mais tarde, quando as coisas chegarem, e quero que você me ajude.

Nate assentiu com um semblante que me deixou, no mínimo, confusa. 

— Vou me certificar de que sua preguiça não vença sua vontade de decorar seu novo refúgio. — Prestou continência. — Entendido.

— Ah, e, Brown... — Sorri. — Adorei a rosquinha, seu idiota. Sua sorte é que o Andrew nem vai lembrar da nossa cagada. Aquilo foi há uns cinco meses, né? E, se ele lembrar, Nate... — Fiz a minha melhor cara de assassina. — ... vou morrer de vergonha, virar um fantasma e voltar para puxar seu pé à noite, capisce? — Retornei à expressão fofa. — Tchau.

Algo em seu olhar brilhou, só não entendi bem o porquê e, como ele pareceu não ter mais o que falar, desconectei. Ele estava tão desnorteado e lerdo hoje que era melhor nem comentar ou sim, comentaria, só que mais tarde. Afinal, eu era sua melhor amiga e junto com esse título vinham certos privilégios, como o de incomodar o outro até conseguir uma resposta decente. Incomodar e ameaçar. É, eu estava ansiosa para sufocá-lo com perguntas.

Meu telefone apitou, assim que o bloqueei. Era um e-mail, e quase caí do telhado quando reconheci ser da produção de "The Walking Dead", via correspondência da AMC. Sério, eu queria muito simplesmente falar com Nate novamente e surtar, mas retomei a compostura, suspirei e abri a mensagem, a qual deveria ter sido enviada à minha mãe também. Perguntavam se eu fizera uma boa viagem e se não seria muito incômodo se eu visitasse o set de filmagens ainda naquele dia, após o horário do almoço. Eles pediram desculpas por qualquer transtorno, explicando que era importante eu conhecer o restante do elenco e aproveitar para buscar o script, pois as filmagens seriam iniciadas em duas semanas e meia e não daria tempo para eu me socializar pela primeira vez com eles de um jeito que eu ficasse confortável para atuar.

Isso tudo aconteceu — o atraso —, pois eles tiveram um problema de coerência em relação ao meu personagem e à história. Aí, a maioria das coisas mudaram sobre quem eu teria de interpretar e fiquei, então, com apenas um nome e nada mais: Jodie Lancaster. Esse era o meu papel: trazer vida, propósito e sentimentos a ela. Não era preciso me conhecer para saber que eu passaria a noite em claro, devorando as palavras que descreviam a menina.

Meu coração queria sair pela boca e me senti empalidecer. Era real e eu estava indo ao set para conhecer os diretores e o elenco. Aproveitaria para pedir carona para minha mãe, já que ela teria que pegar a papelada de seu emprego na filial e, já premeditando seu discurso sobre aparência e alta costura, decidi colocar um pouco de maquiagem, a não ser que eu quisesse me atrasar depois. Ignorei minha linda decisão de embarcar na aventura sem uma máscara em minha face escondendo quem eu sou, pois seria impossível ela deixar eu conhecer famosos sem estar devidamente apresentável.

Desci as escadas, surpresa pela mulher da imobiliária ainda estar ali, fazendo mamãe assinar infinitos papéis, e levei minhas malas para meu quarto. Troquei a roupa usada na viagem, colocando uma mais colorida, porque eu já era mais pálida que papel e usar combinações de preto e cinza só contribuíam para me deixar com a aparência mais próxima a um fantasma que o normal. Eu precisava parecer comum, e não uma inglesa deslocada. Por isso, optei por uma cor mais quente: laranja.

Minha maquiagem baseava-se no batom e no delineado gatinho, porém, meus longos cílios estavam bem marcados com máscara e, com o louvado corretivo, pude esconder as olheiras e disfarçar o inchado dos meus olhos. Encarei-me no espelhinho de bolso, ficando satisfeita. Achava que aquilo já era até um exagero, mas conseguia imaginar muito bem a minha mãe com um amplo sorriso, apreciando o resultado quando eu descesse.

Respondi ao e-mail dizendo que estaria lá, sem nem ao menos consultar a opinião da minha mãe. Ela concordaria de qualquer jeito mesmo, pois, devido às discussões entre ela e meu pai, ela tentava ao máximo não me afastar, deixando eu fazer as coisas que eu quisesse e tentando compreender o meu lado sempre que possível. Era bem conveniente, mesmo eu querendo, na realidade, que ela fosse sincera comigo sobre as brigas e sobre o aborto, do que me mimar sem ouvir direto as coisas que eu falava... As coisas iam melhorar. Mantive esse pensamento na cabeça, enquanto ia para a sala, esperando que, a esse ponto, a Sra. Pine já tivesse ido embora.
        


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Notas finais do capítulo

E aí, walkers do dia-a-dia? Gente, e a Pips que não se toca? Nate está tão... Ai, coitado. O que vocês acham? Ele está apaixonado ou é só um sentimento de "minha melhor amiga foi para outro continente e me deixou aqui, sozinho"? E a Pips só no "meu melhor amigo", "amizade indestrutível"... Hm... E, nossa, agora ela se soltou, hein? Afinal, com os amigos somos todos aloprados. Hahahahaha
Esse capítulo foi mais descontraído e um pouco mais descritivo, mas não será sempre assim. Entendo que pode ficar cansativo e até mesmo chato para alguns...
>>> Link do look 2 da Piper: http://www.polyvore.com/flashlights_clapperboards/set?id=188838205
Comentem ~me deixa extremamente feliz XD~ e até o próximo capítulo!!!
> Ah, eu ainda estou procurando um Nathaniel Brown certo, ok? Quando eu achar, eu coloco aqui como ele é. E não quero que se sintam pressionados a vê-lo da maneira que sugiro aqui, assim como em relação a Piper.
Xxxxxx



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