Um Conto dos Lobos — Peeira escrita por Viktoras


Capítulo 2
Peeira


Notas iniciais do capítulo

Oi gente ^^
Desculpe a demora em postar o segundo capítulo e ele ficou bem grandinho em relação ao primeiro, mas acho que não há problema nisso :3



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Os boatos que uma criatura negra erguia-se no interior da vasta floresta engrandeceram. Diziam os camponeses assustados que uma bruxa que tinha pegado a floresta para si, mas uma velha em especial conhecedora das ervas e das peculiaridades do mundo antigo dizia que era a Peeira, uma filha dos lobos, e que as árvores sussurravam seu nome pelos quatro cantos do vento. Ninguém levou fé na senhora até na próxima estação em que outra lua iria erguer.

No pequeno vilarejo de Crains todo mundo animava-se pelo fim do inverno, quando os rios descongelavam-se e as flores abriam-se junto das novas folhas. Os caçadores mais experientes até tiniam para ir abater um veado ou um alce na floresta, ou voltar com o prêmio mais almejado de todos... A pele de um lobo, um lobo grande e alfa de uma matilha. Ah, como queriam ostentar uma cabeça daquele bicho na sala ou no salão de entrada da casa. Wesen, o mais jovem de uma família de caçadores, era um homem feito já pronto para armar-se da besta e dos grandes facões. Seguiria seu irmão mais velho na tarde plena de primavera que o sol brilhava e abateria sua primeira corsa, estava tão feliz.

Quando a tarde do dia certo para a caça chegou, selaram os cavalos  e, Wesen temeroso pela viagem, teve o seu primeiro conselho dado pelo irmão. Porém, em seu peito a vontade de caçar diminuía gradualmente.

— Ei, irmão — disse chamando mais para perto dos animais. — Você é bom com o arco recurvo, leve o seu.

Ele sorriu acanhado e sentiu um longo frio percorrer a barriga. Vestido de peles ele pensou que era mesmo o frio da estação passada, mas não, era uma verdadeira sensação ruim. A floresta dizia para que ele ficasse em casa e não aventurasse ali entre os troncos e folhas.

— O que foi, Wesen? — Seu irmão maior passou a mão pelos seus cabelos vermelhos desgrenhando-os. — Não quer abater sua almejada corsa que falou todo o inverno?

— Eu quero sim. — Piscou vagarosamente sentindo o estomago ficar gelatinoso. — Mas...

Mal houve tempo para que Wesen falasse e fora colocado no seu cavalo com o forte arco de teixo em mãos. Tinha quatorze anos, mas por causa de um problema nos pés na infância ficou debilitado, então para andar nos animais precisava de ajuda, mas para compensar seus braços e mãos eram hábeis e fortes, o arco em sua mão era uma verdadeira arma de guerra. Crains tinha o seu arqueiro.

A floresta era fria. Olmos, carvalhos secos e centenas de outras árvores cresciam a sua frente como sombras velhas mesmo com as folhas verdes nascendo. Sua primeira vez ali. Mas tinham contrastes como o frescor gelado da neve derretendo, e os colibris visitando as flores trepadeiras que cresciam entre os galhos sombrios.

No total eram dez homens naquela pequena comitiva, conversando descontraidamente sobre os alces que iram abater nos prados verdejantes de uma vasta campina mais a frente. Wesen sentia a floresta chamar pelos caçadores. Sussurros e mais sussurros das árvores, vindos de seus interiores num uníssono, os corvos o olhavam de cima dos galhos com mil olhos a vigiá-lo, para sua morte prematura. Molhou os lábios e conteve a ansiedade, era fruto de sua imaginação, a sua primeira vez na floresta negra causaria sintomas nunca antes sentidos pela sua mente e alma. Era realmente uma sensação única. O caminho até os prados foi tranquilo exceto para Wesen, após passarem por gargantas de pedras ele jurou ver uma matilha de lobos segui-los de longe, mas o batedor que ia mais a frente o desmentiu dizendo que não havia nada.  Deixaram os cavalos para trás logo depois de ter trocado a floresta pela grama e puderam vislumbrar a campina verdolenga a frente.

Naquele exato campo de uma grama finíssima e verde os animais se reuniam para se alimentar da folhagem rasteira e macia, as folhas novas eram mais saborosas e suculentas fazendo-os ganhar mais força e ter residência. Corsas, alces, cervos e veados de todos os tamanhos pastavam ali, até ursos marrons vinham rolar na grama e comer as raízes.

— Olhe, irmão, sua corsa bem ali. Atire nela antes que a perca para algum urso — disse seu irmão maior batendo em seu ombro.

Wesen não tinha o sangue de caçador e apesar de em retirar uma de suas belas flechas da aljava, puxar a corda para trás e mirar com perfeição no pequeno animalzinho, não existia coragem em seu peito para soltar a seta afiada... Mirou e tentou errar, o medo de ser reprovado por seu irmão era maior. Soltou a flecha e a haste zuniu acertando o bicho lá na frente.

— Vá, Wesen! Corra, pegue-a você mesmo — disse seu irmão colocando o facão entre seus dedos. — Já expliquei como esgota o sangue dela, pelo pescoço. Quando a matar me grite e nós o ajudamos a carregar.

Entretanto o uivo agudo de um lobo fez os cabelos de suas costas arrepiarem e depois muitos outros ressoaram em meio a grama. Uma sombra escura tampou sua visão ao ser jogado para trás com violência... Recobrando a consciência num instante viu o peito de seu irmão aberto com seu coração ainda a pulsar e sobre ele um grande lobo negro rasgando-lhe a carne violentamente com ira nos olhos e pêlo eriçado. Não pensou naquele momento, só tentou correr para a floresta e tentar se esconder indo em direção aos cavalos, mas eles não estavam mais lá. Os pés tortos da deficiência não o deixavam ser mais veloz, todavia a vontade de chorar e as arfadas de medo o impulsionavam a correr, o arco na mão, a aljava e o facão na cintura eram seus meios de defesa.

Depois de encontrar um grande toco oco de árvore na floresta, escondeu-se lá dentro e desabou a chorar de medo. O que fora aquilo?  Não haviam mais sinais dos caçadores na floresta e seu irmão fora morto por um lobo. Ataques assim nunca foram registrados. Já estava para escurecer e dormir na floresta não era uma opção. Logo após das pernas pararem de tremer decidiu chamar por alguém, mas o medo congelara-lhe os lábios. Pôs a cabeça para fora e olhou ao redor, o fedor de carne e sangue quente impregnava a floresta, o silencio gritava mais que todos os sons.  Os corvos de lá de cima das árvores cutucavam uns aos outros mostrando um único sobrevivente da chacina motivada por vingança. Metade do corpo de Wesen já estava para fora quando a cabeça de um cavalo caiu do alto em sua frente, esguichando sangue em sua face, um relincho aturdido explodiu em seus ouvidos e outro cavalo passou galopando lá na frente com a cela desmanchada pelo lombo arranhado. O garoto logo se recolheu para o tronco puxando o arco de volta. Lá fora escutou as folhas sendo amassadas e dois pés sujos surgiram, um ponto de esperança cresceu em seu peito, mas depois reparou que havia sangue neles e os insetos rastejantes do chão mexiam sob a pele desprotegida. Em seguida patas lupinas surgiram também, embebidas em mais sangue que qualquer outro corpo quente.

Uma mão forte quebrou a madeira e dedos envolveram sua perna, Wesen foi puxado para fora sendo levantado de cabeça para baixo, vendo tudo girar. A mulher a sua frente o analisou com seus olhos amarelos e lambeu os lábios, ao seu lado um crescido lobo negro cheirava-o.  Estava nas garras vis da morte em pessoa.

— Você não tem sangue de caçador — disse com os lábios movendo-se lentamente. — Não há malícia nessa mente.

Continuou a analisar o jovem içando-o com apenas uma mão do chão.

 — Deixe-o ir, mas não o mate, alguém precisa dizer aos homens que eu reivindico a floresta em meu nome.

Gemendo e com medo de morrer Wesen foi solto caindo desajeitado no chão. Ela agachou diante dele que tentou recuar e o mesmo lobo que rasgara o peito do seu irmão rosnou rente a sua face fazendo-o parar.

— Diga aos caçadores de Crains que os quero para que eu possa acalmar os corações de meus lobos, diga que eu os espero para que cacem mais animais e eles mesmos sirvam de alimento para mim... Que eu quero o sangue deles!

— O-O que é você? — A garganta de Wesen travou com um soluço de medo.

— Uma Peeira, uma guardiã da vida e da vingança. — Sorriu, deixando mostrar os dentes sujos de sangue.

 


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Notas finais do capítulo

Essa Peeira vingativa... Não vai dar nada que presta, só esperem pra ver, só esperem.
Até o próximo gente



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