Dormi e acordei em outro mundo. O mundo do outro lado da janela. O mundo de tristeza do passado.

Eu não consigo esquecê-lo.

- O que você quer? – a voz pergunta, a voz de Deus, a voz do mundo, a voz do meu próprio coração.

- Quero que Deus realize meu desejo – digo – Meu desejo de ter aquele passado amável e feliz de volta.

Desde que você foi embora, os invernos parecem mais frios que o comum, não tenho nenhuma mão pra pegar. E parece até que estou sempre dormindo no chão da rua, ao lado de sua janela, vendo com dor seu mundo feliz. Você está feliz sem mim?

- O que você quer? – repete a voz cortante e dolorosa.

- Eu quero realizar meu desejo... E quero que ouça este egoísmo... e quero...que tenha piedade, Deus – peço fracamente numa canção frustrante e extremamente dolorosa.

- Isso é egoísmo – fala a voz tentando cortar qualquer esperança com gelo e realidade.

Do outro lado da janela, invejo a vida feliz que tem aquela garota a seu lado. Será que Deus poderia mesmo ser piedoso?

- Quero essa vida também – estendo a mão incapaz de tocar a janela do mundo feliz.

- Isso é egoísmo.

- Quero que você ouça esta voz fraca – peço com minha inútil canção que ninguém ouvirá além de Deus – E quero que você me abrace... E quero que nunca esqueça...

- Isso é egoísmo – a voz continua tentando despedaçar minha esperança no gelo.

- Quero ver seu sorriso pra mim – continuo a cantar chorando com a voz fria a me ferir – E quero estar sempre a seu lado...

- Isso é egoísmo, egoísmo demais.

- Sim – concordo enxugando as lágrimas e tomando uma decisão – Mas o que seria o mundo sem egoísmo? Se as pessoas sonhassem e desistissem sem egoísmo... não faria sentido desejar... estaríamos vazios!

O vidro do mundo feliz parece estar cada vez mais próximo. Eu poderia alcançá-lo?

- Eu quero me esforçar e conseguir seu amor por mim mesma! – suplico inutilmente num verso da canção.

- Ainda é...

- Egoísmo – completo quebrando o gelo que me manteve congelada por tanto tempo – Eu sei, mas as pessoas precisam ser egoístas pra viverem, para sonharem, para aprenderem e crescerem! Eu sei que posso acabar não tendo o que quero, mas peço pra nunca esquecer... E peço... peço que tenha piedade.

Assim que piso para o outro lado, tudo se torna quente de novo. Um olhar fofo e amável lança um “oi” em minha direção.

Sorrio.

- E quero... viver – o último pedido que faço no gelo.