A madrugada estava quente naquele dia em Beach City. O mar estava calmo e o horizonte sutilmente clareava. Os cidadãos dormiam em paz, tranquilos por saberem que as Crystal Gems sempre os protegeriam de qualquer que fosse o perigo.

Greg dormia profundamente em sua van, Steven se encontrava enrolado em suas cobertas, Connie, Lion, Lars, Sadie, todos estavam perdidos em sonhos. Era mais uma noite comum em Beach City, exceto por uma coisa. Uma pequena diferença que por se tratar de quem, parecia a coisa mais estranha que acontecera na cidade praiana até hoje.

–Garnet, o que você acha que ela está fazendo?

Pérola sussurrava para a amiga enquanto se ocultava na penumbra da sala na pequena casa atrás da montanha.

–Eu não sei.

–É muito estranho isso. Desde quando ela faz esse tipo de coisa...

A gem vermelha tampou a boca da outra rapidamente com a mão, assim que alguém cortou o silencio da sala escura.

Já era a sexta vez que Ametista percorria a extensão da pequena casa para levar diversos sacos de lixo para fora. A porta da frente bateu e a pequena novamente sumiu.

–Apesar de achar isso muito estranho, fico feliz com essa atitude. Já estava mais do que na hora dela arrumar toda aquela bagunça. Todo aquele entulho estava um completo...

Pérola se calou assim que a porta abriu e a gem roxa entrou, caminhando em direção ao seu quarto mais uma vez.

–Hmmm...

A gem vermelha resmungava curiosa, mas achou que aquele assunto não era da conta delas. Se Ametista tinha amadurecido, esse era um ponto ótimo para a equipe e isso era somente o que importava. Enquanto a formação das gems estivesse perfeita na hora da batalha, Ametista podia ser e fazer o que quisesse.

–É melhor sairmos daqui, Pérola. Não seria legal se ela nos visse espiando.

–Tem razão.

–Estarei no meu quarto e se precisar de alguma coisa, é só me chamar.

–Tudo bem Garnet.

A porta do quarto da maior se abriu e fechou rapidamente. Pérola foi atrás e entrou em seu próprio quarto.

A gem pálida se encontrava em um cômodo enorme. Tudo ali parecia ser azul. O chão, o céu estrelado e a água que caía das fontes para um grande lago.

Pérola saltou até a menor delas e sentou-se delicadamente sobre lâmina d’água. Quando sua pedra brilhou, um pequeno baú rosa surgiu de dentro da fonte. Era o seu tesouro mais precioso. Além do baú, algumas coisas de seu interior também tinham pertencido a Rose Quartz. A gem sorriu e abriu a tranca em formato de estrela, revelando o seu conteúdo cuidadosamente organizado.

“Ah Rose, o que você diria dessa situação? Acho que a nossa pequena finalmente cresceu.”

Sentiu uma onda de felicidade crescer dentro de si e uma enorme saudade bater em seu peito. Pegou o diário de capa rosada e o abriu na primeira página.

“Querida Pérola,

Deixo com você este diário para que guarde suas mais preciosas memórias.

Da sua gem preferida,

Rose Quartz”

Um grande sorriso brotou nos lábios de Pérola lembrando-se do dia em que ganhou o presente. Rose tinha entrado em seu quarto com o pequeno embrulho nas mãos, dizendo-lhe que seria algo muito útil e se caso não fosse, pelo menos seria divertido relembrar das coisas boas do passado. E ela tinha toda a razão.

A gem pálida abriu o pequeno livro e percorreu página por página, recordando do que tinha acontecido a milhares de anos atrás. Admirou algumas fotos antigas de quando a rosada ainda estava com elas. Todas sorriam alegremente nas mais diversas situações que Greg retratara há anos atrás. Nunca havia percebido antes, mas em quase todas as fotos, uma pequena Ametista estava em seu colo, ou no seu ombro, ou na sua cabeça. De algum modo, elas sempre estavam juntas.

Pérola passou horas recordando do tempo em que ela e a gem roxa eram inseparáveis. De tudo que a ensinou, de quando a pequenina não se conteve de alegria quando invocou sua arma pela primeira vez e de todas aquelas horas que passavam treinando para aprimorar a técnica de ambas. Lembrou-se de quando Rose partiu e deixou Steven em suas mãos, e de como elas se afastaram gradualmente com a chegada do garotinho.

Sentiu seu coração apertar. Ela se afastara da amiga por motivos idiotas. Ametista teve que crescer sozinha enquanto as outras cuidavam do garoto. Ela cresceu na rua com amigos mais velhos e aprendeu aquilo que lhe parecia legal. Seus modos, sua mania de comer e acumular lixo e principalmente seu temperamento tão instável. A gem roxa se irritava facilmente com qualquer tipo de ordem lhe imposta, afinal, sempre viveu com as próprias regras. Em vista disso, a gem pálida começou a se sentir incomodada com a rebeldia e imaturidade da outra. Mas agora, depois de tanto tempo, algumas coisas faziam sentido. Ela fora deixada de lado e superou suas mágoas da maneira que pôde. Esse era o jeito dela, não poderia implicar com isso, não era justo com a menor.

Pérola tinha os olhos arregalados e a mão na boca.

“O que foi que eu fiz?”

Uma onda fria percorreu seu corpo.

“É por isso que nós brigamos o tempo todo? Isso é o que impulsiona nossos desentendimentos?”

Pequenas lágrimas percorreram as maçãs de seu rosto.

“Quão ferida eu a deixei?”

Pérola secou o rosto com a palma das mãos, guardou seus pertences e se levantou. Sentia a necessidade de ver a amiga e precisava arrumar uma maneira de reparar seu erro.

“Espero que não seja tarde demais.”

De volta ao templo, Pérola vasculhou o local a procura da pequena.

Steven estava sentado a frente da tv assistindo um cartoon estranho sobre frutas chorando, ou algo do tipo.

–Bom dia, Pérola!

–Bom dia, Steven. Hm...por acaso você viu a Ametista?

–Ela saiu já az um bom tempo. Disse que iria se encontrar com uma velha amiga.

–Uma velha amiga?

–Sim. Deve ser a mãe do Cebola.

–Vidália...

–Pérola, você...

Steven não teve tempo de terminar sua frase. Pérola já havia saído da casa com passos apressados.

“Você está se encontrando com essa garota de novo?”

A gem pálida sustentava uma expressão irritada e confusa no rosto. Irritada por não acreditar que a menor voltara a sair com aquela garota desajustada, e confusa por não compreender o porquê de estar tão irritada com algo que antes não fazia diferença.

Parou de frente à casa de Vidália e pode ouvir risadas vindas de dentro. Cuidadosamente, espiou pela janela. As duas amigas estavam sentadas lado a lado, rindo, cada uma com uma cerveja na mão e outras tantas latinhas vazias espalhadas ao redor.

Elas pareciam estar se divertindo muito, o que incomodou Pérola.

Ametista podia se divertir, claro que podia. Da maneira e com quem quisesse. Isso não era problema nenhum. Nunca fora.

Mas...porque seria agora?

A gem pálida queria ouvir mais sobre o que elas tanto conversavam e riam. Queria saber sobre o tipo de assunto que elas compartilhavam e queria entender o motivo de ficar irritada sempre que a loira encostava na menor.

Pérola se recompôs, cerrou os punhos e voltou para o templo.

“Isso é unicamente culpa minha! Eu que fui descuidada o suficiente para gerar esse tipo de coisa. Devo manter a calma e deixar isso para lá.”

Respirou fundo e resolveu passar no Big Rosquinha para fazer uma surpresa a todos. Comprou uma dúzia de rosquinhas e voltou para a casa.

–Pérola!!!

Steven vinha correndo para abraçá-la.

–Oi Steven! Olha o que eu trouxe para vocês.

O garoto arregalou os olhos quando viu o pacote pardo do Big Rosquinhas!

–Obrigada Pérola! Você é a melhor!

O pequeno separou as rosquinhas e levou as suas para frente da tv.

A gem vermelha estava sentada no sofá com um jornal nas mãos.

–Está tudo bem com você?

–Ah...está sim...só preciso descansar um pouco.

Garnet acompanhava Pérola com o olhar. Voltou a fitar seu jornal e falou em voz baixa.

–Apenas tenha paciência, Pérola.

A mais nova voltou sua atenção para a outra que, já retomava sua leitura.

Caminhou para a porta do templo e entrou e seu quarto.

“Talvez ela tenha razão. Não vou conseguir arrumar as coisas da noite para o dia.”

A porta se fechou e ali permaneceu até o dia seguinte.