Olhos Cor de Chuva escrita por SweetFlower


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Espero que apreciem!
Boa leitura! ♥



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Eu não a conhecia. Nem sequer sabia seu nome, onde morava, quantos anos tinha…

Só sabia de sua existência por causa do meu irmão mais novo, Liam, que referia-se a ela como “Garota dos Olhos de Chuva”.

Nunca me prendi de fato aos depoimentos extensos de Liam sobre a tal garota, sequer sabia onde ambos se conheceram. Só sabia que Liam saia todos os dias, com o máximo de propriedade que uma criança de dez anos possuía, indo ao encontro dela.

Mamãe a conhecia. Dizia que ela era uma garota doce, da minha idade, com os olhos cinzentos mais adoráveis que já havia visto. Presumi então que fora daí que Liam tirara o apelido, porque o tom de seus olhos lembrava nuvens de chuva.

Ledo engano. Só quando era tarde demais percebi como o julgamento das crianças era certeiro, só quando era tarde demais entendi sobre a chuva.

O nome dela era Sarah. Ia todas as tardes depois da aula até o parque perto de onde eu morava, para refletir, dizia. Com seus olhos cinzentos e cabelos de fogo, parecia tão leve e brilhante… Brilho esse que ofuscava a visão real dela.

Nós nunca conversamos de verdade. Eu a via as vezes, quando ia até o parque caminhar, acompanhando Liam. Sarah costumava me dar um sorriso leve e um aceno, e meu irmão corria em sua direção para brincar com ela.

Sendo assim, só fui conhecer seu sofrimento mudo depois, quando li aquela matéria curta no jornal.

Eu nunca lia jornal, mas naquela manhã me pareceu certo. Revirei-o de ponta a ponta, procurando o porque daquela sensação estranha. Até que parei na sessão dos óbitos, e vi a imagem sorridente da garota do parque.

- Ela disse que estava pronta… - Liam sussurrou, enquanto remexia seu café. - Disse que eu não podia ir junto aonde ela ia, que ainda era cedo. Ela não aguentava mais a chuva.

Então, percebi o porque do apelido. Não era por causa da cor dos olhos, mas sim porque era por eles que meu pequeno irmão conseguia ver a tempestade interior dela.

Sarah havia se matado, no banheiro de casa, em uma overdose de remédios. Descobri depois que ela estudava no mesmo Colégio que eu, e que tinha uma família aparentemente estável e amorosa. Era filha única, os pais davam a ela tudo o que podiam.

Mas por que então encerrar uma vida tão feliz? Liam disse que perguntou isso a ela, na última tarde que passaram juntos.

Ela sorriu, ele disse, e eu pude ver a chuva apertar. Ela disse que era só uma criança mimada e cruel, e que não merecia a família que tinha.

-Minha mãe não consegue me amar por eu ser como sou… Ela está tão cansada, e eu… Só acabo por piorar tudo. E papai… Bom, eu também acho que ele não consegue me amar. Então por que eu deveria obrigar a eles tudo isso?

-Mas papai e mamãe sempre nos amam! - ele tentara argumentar, com os olhos arregalados.

-É… A maioria, sim…

Liam me contou que Sarah tinha os braços sempre enfaixados. Porque anjos possuem feridas, mas eles não gostam de preocupar os outros, ele disse em seu tom professoral.

Eu só consegui imaginar tudo o que Sarah estaria escondendo sob sua aura vibrante, toda sua dor e desespero, camuflados por uma máscara de falsa felicidade. E depois imaginei a quantidade de Sarahs que existiam por aí, espalhadas pelo mundo e camuflando seus problemas.

Houve uma pequena homenagem a ela no Colégio, na segunda. Eu soube que ela era uma boa aluna, e que queria cursar Diplomacia. Tínhamos a mesma professora de Inglês, que fez um discurso emocionado sobre ela, e quanta falta ela faria.

Hoje é quinta, um mês depois do incidente. Ninguém mais se lembra de Sarah. Eu soube que a melhor amiga dela mudou de cidade, e que seus pais se separaram. Só isso.

E volto a devanear sobre quantas mais são como ela, sem nem sabermos. Quantas Sarahs mais iriam partir, sozinhas depois de tanto sussurrar por ajuda.

Quantas Sarahs mais eu iria ver com o rosto sorridente e os cabelos de fogo estampados no jornal, quantas mais seriam encontradas sozinhas em seus banheiros?

Quantas mais teriam olhos de chuva?


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