NyahN – Natal Galáctico escrita por NMCMsama


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Ola!

Um especial de natal!
Também estou participando de um concurso: http://maniasdeescritores.com/concurso-contos-de-natal/

Não sei ao certo se ganharei ou não, mas o mais importante é comemorar essa data com o que mais gosto! Yaoi!



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Aquela podia ser uma outra manhã como outra qualquer. Se ao menos pudesse ser definida como manhã de fato, tendo em vista que no espaço, tudo parecia ser uma eterna noite, a não ser quando passavam ao lado de uma estrela, cuja luz intensa e radiação compensavam mil manhãs. Mas aquela era sim, o início de um novo dia para a tripulação de Nautilius, contudo, para Edgan Montenegro, não era um dia qualquer. O único humano da nave cantarolava alegre, enquanto se ocupava de fazer seu café da manhã, tão perdido em seu mundo que ignorou quando uma das portas para o recinto se abriu automaticamente e uma grande figura adentrou.

— O que está fazendo? — Inqueriu Proteus, ele mal cabia nas cadeiras da mesa circular no centro do refeitório. Seu rosto era uma perfeita mescla de traços felinos e humanoides. A maior parte do seu corpo era recoberto por pelos, uma vez Edgan o havia comparado ao tigre-de-bengala, ao que parece ser uma espécie de felino já extinto na Terra. O seu rabo laranja listrado balançava para os lados, suas orelhas com pontas enegrecidas estavam levantadas e atentas aos sons que o humano fazia. Para Proteus, Edgan sempre foi um mistério, aquela pequena e aparente frágil raça tinha, aos poucos, conquistado o seu direito na União Intergaláctica, logo, muitos humanos agora começaram a ocupar cargos em diversos postos do universo. Nautilius era uma nave de mineração e transporte, supostamente necessitava de trabalhadores fortes para o trabalho pesado, mesmo que grande parte do real trabalho seja feita por robôs, mas a maquinaria em si exigia força nos músculos para ser manejada. E ali estava o senhor Montenegro, um humano esguio, cujos macacões de couro da empresa lhe eram tão folgados que o fazia parecer uma criança vestindo as roupas do pai. Sua função ali? Engenheiro de sistemas. O trabalho mais duro que Edgan já tinha feito fora carregar chips e placas-mãe de um lado para o outro. Em resumo, o humano não parecia se integrar bem a tripulação robusta e bruta de Nautilius.

— Oh? Proteus? Nem vi que estava aí! — Disse o garoto sorridente. As orelhas felinas de Proteus caíram para trás, em sinal de desconforto, sorrir para o seu povo era sinal de ameaça, se mostrava suas presas para o outro para iniciar uma briga. Contudo, tinha uma leve impressão que Edgan não tinha intenção de confrontá-lo, na verdade, o humano parecia repetir muito aquele gesto de mostrar seus dentes desprovidos de presas, principalmente quando estava alegre.

— Ops! — Montenegro cobriu a boca ainda risonha — Esqueço que não gosta quando sorrio.

— Não é como se eu não gostasse... — O homem-tigre coçou o queixo o qual apresentava um cavanhaque branco, gesto que fazia sempre que estava confuso ou embaraçado — Enfim, eu te perguntei o que estava fazendo...

— Cantando, vai me dizer que os Tigherianos não sabem o que é cantar?

Proteus emitiu um baixo rosnado.

— Lógico que sabemos o que é cantar. Só não entendo por que está cantando hoje!

Edgan sorriu novamente, na verdade não deixou de sorrir desde que iniciara aquela conversa.

— Porque hoje, no calendário terráqueo, seria 24 de dezembro! —Disse isso com um entusiasmo como se falasse a coisa mais óbvia do mundo, algo que, entretanto, resultou ainda mais confuso para Proteus.

— E esse dia seria especial?

O sorriso do humano minguou, começou a massagear o seu pescoço, seus cabelos encaracolados caíam sobre sua fronte ocultando parcialmente o seu rosto.

— Às vezes esqueço que vocês não sabem muito sobre a cultura da Terra... —Murmurou.

— Lógico que sabemos sobre a sua cultura! — Outro ser entrou na conversa, Proteus sentiu seus pelos eriçarem, nem tinha notado a presença de Shyller, mas era compreensível, tendo em vista que aquela raça alienígena reptiliana era conhecida por ser sorrateira. O novo membro se sentou ao lado homem-tigre. Suas escamas ocupavam, principalmente, ao redor dos seus olhos de íris púrpura, o resto de sua pele era uma membrana cartilaginosa que lhe dava uma aparência meio que úmida e escorregadia. Seus cabelos avermelhados eram amarrados em firme rabo de cavalo.

— Sabem mesmo? — Edgan perguntou enquanto assoprava a sua caneca com desenhos infantis de personagens. Lembrava-se muito bem quando tentara explicar a tripulação sobre o que se tratava aqueles desenhos, muitos deles compararam os seres ali expostos com raças alienígenas (para a surpresa do humano), foi meio difícil convencê-los que não passavam de personagens de um anime/jogo chamado Pokémon. Os extraterrestres acharam cômico o fato daqueles monstrinhos serem capturados por esferas e batalharem entre si, ainda mais sendo controlados por humanos que eram evidentemente mais fracos, por que os tais pokémons não capturavam os humanos e os faziam batalhar ? Teria muito mais lógica! Edgan reprovou aquela linha de pensamento, afinal pensar nos pokémons como seres escravistas... Bem... Não lhe parecia correto.

— Lógico que sei! Deve ser esse dia que as fêmeas humanas saem na rua seminuas, vestindo umas roupas cintilantes e dançando! — A língua bifurcada de Shyller saia continuamente de sua boca enquanto falava.

— Isso é o carnaval. — O humano franziu o cenho — E isso só ocorre em fevereiro.

— As fêmeas terráqueas tem um baita de uns… — Shyller continuou a falar ignorando o comentário de Edgan, levou suas mãos para o seu peitoral e fez um sinal circular como se tivesse tocando mamas imaginárias. Proteus pôde ver como o rosto do pequeno humano se iluminava em um tom escarlate — Como vocês chamam mesmo? Peitos, não é? Eu não sou amante do leite, sabe? Mas bem que gostaria de tocar naqueles...

— Shyller! — Rosnou o Tigheriano —Tenha respeito!

— O quê? Eu falei algo de errado?

— Er... Está tudo bem, Proteus. — O humano deu um meio sorriso, ainda indicando que estava desconfortável pelo o assunto abordado.

— Opa! Esqueci que você não gosta de peitos! — Falou Shyller — E ainda mais, é virgem, não é?

Edgan quase cuspiu o conteúdo do que estava bebendo, na verdade parte do líquido saiu por seu nariz.

— N-não é como se eu não gostasse de peitos só por eu ser g-gay! —Reclamou buscando um guardanapo para limpar o rosto — E... E como sabem que eu... Digo... Isso é um assunto pessoal Shyller!

— Cheiro! — O rapaz-serpente apontou para a sua língua bifurcada — Posso sentir o aroma de sua “pureza” a quilômetros de distância. Bem que poderíamos resolver isso rapidamente se você me deix...

Proteus deu um nada leve tapa na nuca do réptil.

— Algum dia destes ainda vou arrancar essa língua... — Rosnou o tigre.

— Para fazer isso, terá que passar por minhas presas... — Falou isso enquanto abriu a boca e mostrou sua dupla de dentes finos, tal como agulhas as quais se podia ver um líquido amarelado escorrendo das pontas: o seu veneno.

— Pessoal... — Edgan tentou acalmá-los, mas era bem difícil, Tigherianos e Servthyanos eram conhecidos por sua eterna rivalidade, planetas do mesmo sistema solar, desde o princípio competem pela supremacia do próprio sistema.

A porta se abriu, um quarto membro da tripulação adentrou: esse parecia mais com um humano, a não ser por sua pele levemente azulada e as linhas brancas que pareciam serem desenhos geométricos que ocupavam grande parte de seu corpo. Seus cabelos de tom verde claro eram curtos e penteados para cima, dando um aspecto meio que arrepiado, como se tivesse levado um choque. Seus olhos eram azuis, um azul nada comparado ao dos humanos, era cintilante, como o brilho de uma pedra preciosa.

— O que está acontecendo aqui? É muito cedo para iniciarem uma briga. — Resmungou, massageando o pescoço e bocejando.

— Capitão. — Proteus logo recolheu as garras de sua mão. Shyller fechou a boca, retraindo suas presas mortíferas. O humano soltou um suspiro de alívio.

— Então, qual é o motivo da disputa? — Perguntou o capitão da nave sentando ao lado de Edgan e lhe roubando a caneca de café — Nossa... Essa bebida terráquea é realmente perfeita!

— É a minha bebida, capitão! A máquina de café está logo ali atrás, você pode muito bem fazer a sua própria...

O alien de pele azul arqueou um de suas sobrancelhas e mirou o garoto.

— Mas você até que ficou contente com o meu gesto, pensou que isso seria como um beijo indireto, não é mesmo? Que coisa mais infantil. — Riu o capitão.

Edgan levou as mãos aos próprios ouvidos como se tampando-os poderia evitar que seus pensamentos escapassem de seu cérebro. Essa era a desvantagem de ter um Aluriano a bordo, aquela raça alienígena era famosa por seus poderes mentais atrelados ao seu intelecto avançando, logo era comum vê-los ocupando altos cargos do governo intergaláctico, o fato de Ahr ter optado por um cargo como capitão de uma mera nave era sem dúvida estranho, mas ele não se importava muito sobre o que os outros pensavam e nas expectativas associadas a natureza de sua raça.

— Ahr! — Exclamou — Pare de ler meus pensamentos! Isso é tipo... Invasão de privacidade!

Ahr, o capitão, o suposto líder da tripulação, apenas deu os ombros e continuou a beber.

— Então, me digam... Por que a manhã está tão alvoroçada?

— Por que não lê, simplesmente, os pensamentos deles? — Resmungou, Edgan.

— Não seria divertido, além do mais, eles sabem como bloquear minhas habilidades ao contrário de você, mascote. — Disse isso enquanto bagunçava os cabelos do humano.

— Meu nome é Edgan! — Rangeu os dentes.

— Enfim, será que tenho que perguntar de novo? Estou mesmo curioso.

Proteus iria explicar, mas Shyller foi mais rápido.

— Nada de mais, Ahr. Apenas começamos a discutir sobre peitos, leite e mulheres humanas.

—Hã? — O capitão franziu o cenho — Como, pelo santo buraco negro, vocês chegaram a tal assunto?

— Na verdade, capitão, falávamos de festividades humanas... Edgan estava nos dizendo que hoje era um dia especial. — Explicou Proteus lançando um olhar irritado para seu companheiro réptil.

— Festividades do planeta do mascote? Isso eu gostaria de saber! — Ahr voltou seu olhar para o humano que no momento ainda tapava as orelhas, mas logo desfez tal gesto, já que percebera a expressão de risos contidos compartilhada pelos extraterrestres.

— Hoje é 24 de dezembro... Para alguns terráqueos é uma data especial. É véspera do Natal.

— Hum... Natal... Lógico! — Ahr interrompeu, seus olhos cintilavam ainda mais — É a época do ano que os humanos comem ovos de chocolate, não? Outra iguaria humana que adoro... Chocolate!

— O-o-ovos? Vocês têm coragem de comer ovos? — Shyller parecia horrorizado com a ideia e até mesmo enojado.

— Humanos não nascem de ovos. — Disse o homem-tigre, rolando os olhos — E ainda, não são ovos de verdade! Como o capitão disse, são de chocolate!

— Mesmo assim! Isso é uma afronta aos ovíparos! Imaginem se fizessem uma placenta de chocolate, e aí? Iriam comer?

— Não queira dramatizar, Shyller. O seu povo faz uma competição de comer animais vivos sem mastigá-los, só paralisando com seu veneno e deglutindo. Depois vocês ainda cospem tudo fora para serem avaliados pelos juízes. Isso sim é que é nojento! — Agora Proteus que parecia enjoado conforme falava.

— Não se trata apenas de uma competição, é uma cerimônia sagrada! E quanto a vocês, Tigherianos, também fazem coisas bem nojentas! Como aquele concurso anual de lançamento de bolas de pelos!

O tigre-alien começou a rosnar.

— Tal concurso mostra o vigor de um guerreiro Tigherian!

— Bla-bla-bla... — Resmungou Shyller — Não importa o que diga, ainda é nojento!

As garras de Proteus novamente se projetaram e se fincaram na mesa.

— Não comemos ovos de chocolate no Natal! Isso é a páscoa! — Ralhou o terráqueo, no momento certo, pois já iria se iniciar outra briga — É outra festa!

— Ah! Bem...Então o que é o Natal?

— Essa eu sei! Pois eu morei na Terra! — Quinto tripulante chegando ao refeitório. Este era a perfeita personificação de um lobisomem, seu rosto era totalmente lupino, mas seu corpo era humanoide, andava com suas patas traseiras sem nenhuma dificuldade. Era o único que não usava o macacão da empresa, ao invés disso, um short rasgado apenas — É uma festa muito interessante, os humanos se fantasiam de monstros e para falar a verdade, essas fantasias são muito parecidas com membros de algumas raças alienígenas que conhecemos, e vão de casa em casa pedindo doces! Eu mesmo participei da festa e o melhor, nem precisei me fantasiar para ganhar toneladas de doces!

Edgan levou a mão a testa, já previa uma dor de cabeça chegando.

— Opa! Doces de graça? Sabem quanto custa um doce humano? Centenas de créditos galácticos! — Choramingou Ahr — Bem que o mascote devia trazer mais comida terráquea para a nave! Chocolate, café... Pizza... Lasanha... Bolos...

— Você só pensa em comida, Ahr! — Riu Ferus, o alien-lobo.

— E tem fêmeas semi-nuas nessa festa? Fantasiadas? — Quis saber Shyller.

— Isso também não é o Natal! — Edgan praticamente gritou, se levantando da mesa e encarando todos com fúria — Quer saber, esqueçam! Não é como vocês se importassem mesmo para saberem sobre o evento!

O humano saiu, batendo os pés pesadamente no chão, deixando para trás um grupo de extraterrestres atônitos com sua atitude.

— Acho que vocês o irritaram. — Anunciou Ahr depois de um tempo.

— Nós? Você leu a mente dele e ainda roubou a caneca! — Acusou Shyller.

— Pelo menos não fiquei falando de fêmeas o tempo todo! — Disse o capitão, seus olhos emitiam uma luz baixa, nada comparado com o brilhar anterior.

— Eu não posso ser culpado... Acabei de chegar... Realmente pensei que a festa que participei era o tal Natal... — Resmungou Ferus cutucando uma gelatina roxa, sem muito apetite. Suas orelhas estavam abaixadas e seu grande rabo imóvel, mostrando que estava chateado com a situação.

Proteus suspirou.

— Edgan parecia realmente feliz hoje cedo... Ele até cantava e sorria... Acredito que estragamos tudo.

O sentimento de culpa se alastrou pela tripulação.

— Bem, ficar sentados aqui não vai resolver o problema. — O capitão se levantou e se espreguiçou.

— E o que devemos fazer? — Inqueriu Ferus — Eu não quero ver o humano triste! Digo... Ele sempre é tão prestativo. Graças a ele, nossa frota de robôs mineradores nunca esteve em melhor estado! Além disso, foi Edgan que consertou meus óculos de realidade virtual... Agora posso falar e ver a minha família em Luparin todos os dias!

— Tem razão... Ele me ajudou quando quebrei a escavadeira.

— Como é? — Ahr fitou o homem-serpente desconfiado — Que escavadeira quebrada? Não fui informado disso!

— Er... Bem, ela não está mais quebrada graças a Edgan. Por isso pensei que não precisava informar nada! — Riu nervosamente, Shyller.

— Apesar de ser essa a primeira viagem dele conosco, e nós sabemos como essas viagens interestelares podem durar bastante tempo... Ele sempre parece positivo e pronto para nos ajudar independente se era obrigação dele ou não. Mesmo sendo pequeno e fraco. — Comentou Proteus — Minha raça sempre exaltou os atributos como força e coragem... Contudo, Edgan já me provou ser um guerreiro igualmente capaz com sua inteligência e bondade. Apesar de ainda não estar muito acostumado com os seus sorrisos... Prefiro vê-lo sorrido do que com a expressão magoado de momentos atrás.

— Tem toda a razão. — Os olhos de Ahr cintilaram novamente — Devemos fazer algo para consertar o erro que vocês cometeram!

— Você realmente não quer se responsabilizar, não é mesmo? — Sibilou Shyller. O capitão o ignorou continuando o seu discurso de liderança.

— Vamos pesquisar sobre esse tal Natal e tentar implantar essa festa aqui no Nautilus!

Ferus assentiu, seu rabo começou a balançar loucamente para os lados. Proteus concordou silenciosamente com a ideia.

— Mas se o Natal tiver mulheres semi-nuas? Como iremos proceder? Só existe macho nessa nave! — Inqueriu o réptil, mas sua pergunta não foi levada a sério.

Seria o primeiro Natal no Nautilus e seria inesquecível.

***

O que fazia quando estava triste? Edgan passava o seu tempo limpando as placas de memória de alguns robôs, ou mesmo fazendo uma revisão nos sistemas da nave. Era uma tarefa metódica e que de certo modo, fazia sua mente se concentrar em outra coisa que não fosse o desastroso dia que estava tendo. Mas mesmo tentando esquecer, uma hora ou outra o assunto ressurgia em sua memória...

— O que eu esperava afinal? — Perguntou a si mesmo, já que os robôs desligados não podiam lhe responder — Só por que é véspera de Natal, não significa que será como em casa...

Seu lar, o planeta Terra, tão distante... Quando subiu na nave mineradora sabia que não iria retornar para passar as festas de fim de ano ao lado de sua família. Aquela era a primeira vez que ficava tanto tempo longe de seu lar, e deve-se enfatizar esse longe, afinal, anos-luz é uma medida extremamente grande. Contudo, pensava que poderia aguentar, formaria novos amigos com aquelas novas raças. Ainda que não pudessem ser sua família substitut, mas pelo menos sanariam um pouco a solidão que dominava o seu coração, ainda mais levando-se em conta que a tripulação era composta por aqueles quatro membros somente, não era necessária uma vasta mão-de-obra orgânica, muitos dos trabalhos era desempenhado pelos robôs e pelo próprio computador central da nave. Tinha ficado chateado com o evento que ocorrera no café da manhã, mas a verdade era que não deveria ter ficado tão irritado.

Ora, aqueles seres extraterrestres não têm a obrigação de aprenderem sobre seus costumes, tão pouco aceitá-lo como um amigo. Um humano que mais parece uma criança débil ao lado daqueles aliens altos e fortes... Aquilo parecia uma grande ironia do destino, ele preso em uma nave cheia de extraterrestres bonitões. Nunca imaginara que Ets poderiam ser atraentes, pelo menos nos filmes terrestres, eram mostrados ora como monstros ora como criaturas cabeçudas com pele cinzenta de olhos esbugalhados e escuros. Pelo visto, houve uma espécie de convergência evolutiva no espaço. Muitas formas de vida evoluíram para criaturas muito semelhantes ao humano no que diz respeito a terem um par de pernas e braços, olhos, boca, narizes e essas coisas... Mas mesmo as pequenas semelhanças eram totalmente obstruídas pelas grandes diferenças. Isso só o fazia se sentir ainda mais inseguro sobre si mesmo, já era um humano baixinho e magro na Terra, agora ali em meio a gigantes “marombados”... Imagina como aqueles extraterrestres devem vê-lo?

— Eu realmente queria voltar para casa... — Uma lágrima solitária rolou por sua face suja de graxa. Sua cidade de origem era uma ilha artificial que navegava pelo atlântico, sua localização podia variar dentro dos mares do caribe, chegando na costa americana ou mesmo retornando para a costa brasileira. Sua família podia se classificar como hispânica, se bem que com a constante mistura dos povos depois do êxodo do continente superpovoado para o mar, era difícil dizer qual era a sua origem de fato, mas por falar português (além do francês e espanhol), acreditava que provavelmente seria oriundo da América do sul. O Natal lá em sua ilha era comemorado com uma grande festa, uma grande ceia, milhares de presentes... Sentiu seu coração apertar em seu peito. Ali, em uma galáxia distante, não teria nenhuma comemoração. Só seria mais um dia de trabalho. Contudo, o seu momento de depressão foi interrompido por uma música que começou a ser tocada.

Ho! Ho! Ho!

— Mas o que... — Atônito, começou a caminhar em direção a ponte de comando, afinal, era ali que se faziam aqueles tipos de transmissões. O que estava ocorrendo? Será que estava tendo alucinações? Sabia que não devia ter comido aquela comida desidratada espacial. Conforme se aproximava do local, mais alta a música ficava.

Ao adentrar na ponte de comando, notou, primeiramente, a estranha escultura que jazia no meio da ampla sala oval. Era um amontoado de peças sobressalentes de robôs que foram arranjadas de uma forma que parecia uma... Árvore? Um pinheiro de natal mecânico? Além disso, havia cabos de fibra-ótica que cintilavam ao redor do monumento.

— Piscas-piscas? — Balbuciou ainda surpreso. Quem teria feito algo assim? Se aquilo era uma alucinação talvez fosse melhor voltar para o seu quarto e descansar. O fato de ser véspera de Natal, a discussão com a tripulação e a solidão deviam estar afetando seus sentidos.

— E aí? Gostou? — A voz animada de Ahr o fez sobressaltar, o capitão da nave vestia um macacão vermelho... O estranho era ver a barriga falsa que fora criada, provavelmente, com cobertas e resto de roupas enfiados dentro do macacão e que davam um aspecto deveras cômico ao alien — Ho! Ho! Ho!

— Er... Capitão? O que você está fazendo?

— Não reconhece o papai noel, mascote? Bem... Falta a barba e o gorro, mas o que importa é a intenção, não é mesmo?

Edgan levou a mão a boca, contendo uma risada.

— Ei! Pode não estar rindo fisicamente, mas sua mente está dando muitas gargalhadas! — Resmungou o rapaz azulado.

— Já disse para parar de ler a minha mente. — Falou o humano — Por que você está fantasiado de papai noel?

— Ora, para comemorar o Natal. — Quem respondeu foi Shyller — Ahr era o melhor candidato para nosso “papai noel” galáctico!

— Tsc... Eu me sinto meio ridículo. — Reclamou o capitão acariciando a sua barriga falsa.

— Mas... Como vocês sabem sobre o papai noel? Eu não me recordo de ter falado algo sobre isso no café da manhã...

— Nós pesquisamos! — Disse Ferus com seu rabo balançando para os lados, rapidamente — Aliás... Desculpe por ter confundido a festa... Digo, Halloween não tem nenhuma relação com o Natal. Agora eu sei...

— Está tudo bem. Eu não devia ter ficado tão chateado com o que ocorreu hoje mais cedo.

— Besteira! — Interpôs Ahr — Você tem total direito de querer comemorar a sua festa! Temos liberdade de cultura, afinal de contas! Ainda mais, depois de pesquisar sobre o Natal, vi que se trata de algo muito interessante...

— Sério? — Edgan arqueou as sobrancelhas, surpreso pelo interesse deles no assunto.

— Foi a entrega de presentes que está atrelada ao marketing e ao consumismo. O Natal é uma época de se praticar a caridade... Tentar ajudar o próximo. Reavaliar nossas ações. Uma data que se busca a paz e a união. Mesmo que seja só um dia no ano terráqueo... Já vale algo. Em meu planeta, por exemplo, não temos um dia assim. — Completou, Proteus, que também vestia um macacão vermelho. Aliás, todos eles compartilhavam a mesma vestimenta (menos Ferus, que usava um short vermelho).

— Nem no meu! — Reclamou o serpente. Ferus assentiu, partilhando a afirmação.

— A essência do Natal é bonita. E acho que seria interessante implantar essa comemoração no nosso calendário.

— S-sério? Digo... Vocês não precisam! — O humano estava maravilhado, não imaginaria nunca que aqueles seres iriam levar a sério a data, tampouco comemorá-la.

— Mascote... — Ahr sorriu, seus olhos cintilaram fortemente — Esta é a sua primeira viagem para além das fronteiras conhecidas da humanidade. Eu entendo que deve se sentir solitário e meio desajustado perto de nós, mas mesmo assim está desempenhando com excelência o seu papel na nave. Não pense que o menosprezamos ou algo do tipo...

— E-está lendo a minha mente de novo?

— Não preciso ler sua mente para concluir o com que tanto se preocupa. — O capitão deu um leve cafuné nos cabelos do menor — Você faz parte da tripulação... E mais ainda, é nosso companheiro e amigo.

— S-sério? V-vocês... Me consideram um amigo?

— Lógico que sim! Acha que falo de peitos deste jeito com qualquer um? —Agora era a vez de Shyller falar. Bem que Edgan pensava, de fato, que o rapaz réptil falava destas coisas abertamente com todos — Alguém da minha espécie não deveria sentir atração por organismos de sangue quente, sabe? Se falo destas coisas com vocês é por que confio!

— Eu te considero meu amigo também, Edgan! Te considero como um membro honorário de minha alcateia! — Falou Ferus, se o seu rabo podia balançar ainda mais rápido? A resposta era sim. O humano deixou que um sorriso se formasse nos seus lábios. O pesar anterior que estava sentindo, aos poucos, estava sendo esquecido...

— Que bom...

— O que foi? — Mirou Proteus que massageava o pescoço, como pensando no que deveria dizer.

— Seu sorriso... Ele voltou. — Murmurou.

— Ops... Esqueci que você n... — O tigre segurou o pulso do humano, o impedindo de ocultar o sorriso com a mão, como já tinha feito em outras ocasiões.

— Eu gosto do seu sorriso. — Disse Proteus decidido. Isso só resultou na produção de um maior sorriso por parte do humano.

— Certo! Certo! Nada de flertes enquanto não trocamos os presentes e começamos a ceia! — Anunciou Ahr batendo as palmas fazendo com que as luzes do resto da ponte de comando se acendessem.

— C-ceia? Com comida de verdade?

— Mascote, eu não posso fazer milagre. — Riu o capitão apontando para as gelatinas e pastas de comida desidratada dispostas na mesa — Mas amanhã pousaremos em um planeta próximo e te prometo um verdadeiro banquete!

— Eu... Não sei o que dizer... — Balbuciou o humano, sentindo seus olhos umedecerem — Já tinha me resignado que não comemoraria o Natal...

— Não chore... — Proteus acariciou a bochecha do humano, limpando um pouco de graxa que ainda permanecia ali — Não é uma data para tristeza e sim alegria.

— Não estou triste... Estou muito feliz. — Sorriu novamente e notou que o tigre estava tentando imitá-lo, forçando uma careta que devia sua tentativa de sorrir.

— Proteus... — Tocou a bochecha peluda do alien, acariciando de leve. Pode ouvir um estranho som...

“Meu deus... Ele está ronronando?”.

— Oh! Que lindo! — Ahr interrompeu o momento — Espera... Existe uma tradição natalina de... Shyller!

— Aqui! — Edgan levantou o olhar para o metal moldado, parecia uma espécie de planta.

— Isso é um visgo?!

— Tentei fazer o mais parecido possível... — Informou Ferus.

— Está parecido! — Cortou Ahr — Então, mascote! Sabe o que tem que fazer quando está embaixo de algo assim?

— Er... — O humano fitou Proteus e depois a sua tripulação. Ele teria que beijar o alien-tigre-super-sexy? O mesmo extraterrestre a qual tinha uma paixonite desde que adentrara na nave? Proteus não iria aceitar! Afinal, ele era um guerreiro! Sem falar que...

Edgan sentiu duas mãos fortes segurando o seu rosto. Não teve muito tempo para processar a ação, até que lábios quentes colidiram com seus próprios lábios. Proteus o beijara.

Aquele foi o melhor beijo de sua vida...

Literalmente estava vendo estrelas.

— Feliz Natal... — Sussurrou o tigre após o longo beijo. Edgan não respondeu. Seu cérebro tinha derretido, não estava muito diferente da pasta desidratada servida na ceia natalina improvisada.

Podia estar distante de casa... Da Terra... Mas ainda podia comemorar o Natal com aqueles novos amigos intergalácticos.

— Feliz Natal... — Respondeu dando o mais imenso sorriso possível.

Aquele seria o primeiro de muitos Natais espaciais na nave Nautilus.


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Notas finais do capítulo

Primeiramente devo agradecer a beta NamelessChick, graças a ela essa história foi lapidada!
Muito obrigada!

Agora, tenho outro agradecimento a fazer!
A todos os meus leitores/amigos que me acompanharam ao longo deste ano!
Essa história é oferecida a todos vocês como um presente!
MUITO OBRIGADA!
E um feliz natal!