A floresta dos cantos 2 escrita por black cat


Capítulo 1
a pequena fada


Notas iniciais do capítulo

bem, essa é um tipo de "bonus" de uma fic que eu já postei, portanto, é indicado que você leia a primeira antes dessa.



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Logo abaixo das ruinas encontravam-se as catacumbas. Centenas de túneis que se ramificavam um a um desenhando o subsolo do castelo.

As paredes altas de pedra grossa tornavam o ambiente ainda mais sombrio. Foi feito assim propositadamente para assegurar a agonia dos prisioneiros de guerra enquanto seus torturadores dormiam.

Cada pedaço daquele lugar foi feito evidentemente para tornar os castigos ainda piores.
De trás das celas rústicas de barras de aço, viam-se os esqueletos repousando. Jamais sairão daqui. Das caveiras, era possível ouvir os leves lamurios dos mortos. Mas apenas aqueles que prestassem atenção poderiam sentir a leve brisa das almas que passavam por lá sempre procurando a liberdade que jamais irão encontrar. A morte não é libertadora.

Os ratos divertiam se com as baratas pelo teto e buracos nas paredes. Seu barulho quase camuflava os gemidos dos falecidos.

No entanto, há um lugar aonde sua ousadia não chegava. Uma cela em especial que aos poucos se iluminou com a luz do lampião. As correntes haviam parado de sacudir e o único som que quebrava o silêncio eram as gotas que caiam de minuto a minuto em sua bandeja de água.

Como uma boneca, ela repousava quase morta aos pés da parede de pedra úmida. Se não fosse sua respiração baixa e suave, quase acreditaria que tivesse me deixado.

Suas mãos ainda estavam presas às correntes que se estendiam ao teto bem como há deixei dois dias atrás. As pernas juntas em posição fetal como se tentasse ao máximo preservar o calor que ainda lhe restava. Tremia de leve hora ou outra, provavelmente atormentada com um pesadelo novamente.

Forcei a porta alta e gradeada para dentro que abriu aos rangidos. Se ela estiver acordada não me deixará saber.

Entrei pisando nos longos cabelos loiros pelo chão. Foram cortados em meio a uma excitante melodia de gritos desesperados e banhados nas lágrimas da alma por quem tenho tanto apreço. Não existe de fato uma razão que explique porque a deixei viver. Na verdade, se me perguntarem não poderei dar uma resposta. Algo nos olhos dela fez minha lamina parar como se, por um momento, estivesse arrependida do quase ato.

Olhei mais uma vez a dama adormecida antes de acariciar sua cabeça. É um pouco incômodo admitir, mas não posso negar que é quase um martírio me sentir dessa forma.

Em outros tempos não seria assim. Provavelmente não a deixaria viver por tantos dias. Já faz quase três semanas que matei sua família e a escondi aqui. Agora tenho que descer até este lugar para trazer-lhe comida, mas não consigo evitar.

Já tentei matá-la, mas algo em seus olhos sempre consegue me fazer parar. Isso é uma tortura.

Olhei mais uma vez minha pequena fada dormir, ou fingir que dormia pelo menos, antes de puxar seus cabelos, agora curto, para cima.

Já fazia algum tempo que ela não gritava mais. Apenas me olhava com os olhos suplicantes como um pedido mudo pela morte:

-Tão bela…

Sussurrei em seu ouvido, mas, como esperado, não houve reação. Sequer piscou.

Toquei seu rosto novamente com calma descendo a mão da testa para a bochecha. Ela é perfeita.

No entanto, logo não será mais. Os lindos olhos que a mantiveram viva durante todo esse tempo já não demonstram mais a amabilidade de antes. Na verdade, quanto mais se passam os dias, mas ela se torna uma casca oca. Seus olhos já estão prestes a perder a luz.

A coloquei novamente deitada no chão de pedra e me virei. Mas antes de ir olhei mais uma vez para a pequena fada. Ela levantou minimamente a cabeça sem mudar o olhar:

-Em breve minha pequena. Logo que o brilho de seus olhos se apagar eu lhe darei a dadiva que tanto deseja.

Ela então deitou a cabeça novamente e se pôs a dormir. Seu corpo machucado repousava enquanto a cabeça deixava-se viajar por entre as muitas paredes daquele labirinto subterrâneo.

Já eu preferi apenas fechar a porta e esperar mais uma ou duas noites, afinal, assim como meu pai, eu levaria adiante o ceifeiro dos perdidos. Uma lenda que se imortalizaria com a vinda do próximo herdeiro.

Afinal, minha fada enjaulada sequer desconfia do destino da criança que repousa em seu ventre nesse exato momento. E, assim como minha mãe na cela ao lado, ela repousaria nas intermináveis catacumbas para sempre


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Notas finais do capítulo

Obrigada por ler, por favor, comente.