One-shot: Conto Sob a Lua de Sangue escrita por Something Ville Citizen


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Senhoras e senhores, essa é a primeira vez que escrevo uma one, ao mesmo tempo em que faço isso sozinha! Yaaay
A inspiração pra fazer isso aqui me veio subitamente, enquanto conversava com a Mag, a autora de Coração Partido (https://fanfiction.com.br/historia/661092/CoracaoPartido/) e lembrava do eclipse que presenciei esse ano. Ideias brotam do nada.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/665124/chapter/1

Final de setembro de 2015: jovens – e idosos, porque a idade física não interfere muito nessas horas – de todo o Brasil aguardavam ansiosamente por essa noite. E “ansiosamente” no bom sentido, como quando você fica com um frio na barriga gostoso só de pensar no que está por vir. Nesse dia 27, noticiavam sites e jornais confiáveis, um eclipse lunar total poderia ser visto praticamente de todo o país, caso não houvesse nuvens para atrapalhar, é claro. E não seria apenas um eclipse comum desses que acontecem todo ano. O fenômeno aconteceria em conjunto com a “superlua”, que ocorre quando a Lua atinge seu ponto mais próximo da Terra e parece, visualmente, 14% maior para nós, meros terráqueos, e algo assim só se repetiria em 2033.

Isso mesmo, meus caros, hoje era um prato cheio pra mim, que, em 16 anos de existência, ainda não havia presenciado um eclipse, apesar de já haverem existido possibilidades. Tá, possibilidades que ocorriam às 3 da manhã ou algo assim, por isso minha belíssima mãe nunca me deixou virar a madrugada por isso – ela fazia o tipo crente em certos assuntos, e cético quando se tratava de fenômenos espaciais, vai entender.

Até o momento eu só sabia que a coisa toda ocorreria depois das 22h, e já estava me preparando.

“- Ainda ñ to vendo nada.” – mandara meu colega no grupo da turma no Whatsapp.

“- Kirido, relaxa e goza” – outro colega respondeu, e eu ri; tem gente que nasce sem paciência. – “Certo, mas alguém já tem os horários?”

E, finalmente, alguém mandou uma imagem que informava que a penumbra começaria a aparecer a partir das 22h07m, e, depois, a tomar conta da Lua após as 23h11m. Bom saber. Agradecemos por escrito e parti direto para o quintal de casa. Lá, por acaso, existe uma cisterna branca, na qual adoro me sentar/deitar/ficar de pé quando quero observar o céu, não importa a hora. Era lá que eu ficaria essa noite.

Mandei um foda-se mental ao meu pijama, que ficaria um pouco sujo na parte de trás (gerando assim reclamações por parte da mami poderosa), e deitei-me sobre a cisterna de cimento. Agora eram exatas 22h, e eu, despretensiosamente, chequei meu smartphone novamente. Ao desbloquear a tela, percebi que havia uma mensagem de Maiara, uma de minhas amigas virtuais – mas com a qual tinha uma relação um pouco mais “abrangente” que uma simples amizade.

Maiara tinha 18 anos e morava em São Paulo, ao contrário de mim, que era nordestina. Apesar disso tudo, ela falava frequentemente em aparecer por aqui um dia, me conhecer pessoalmente. Nunca desconfiei dela, como ela pensa que eu faço, mas certo nervosismo se apossava de mim quando eu imaginava a situação. A garota viajaria de outra região só pra me encontrar, e se ela se decepcionasse ao me ver de fato? Expectativas, expectativas...

A tal mensagem me passara despercebida desde as 20h, que vergonha. Também, tamanho o rebuliço que acontecia nos 9 grupos dos quais eu participava... Abri e li:

“- Ei moça, vou viajar agora. Não morra sem mim. Espero chegar em breve. Esteja acordada quando eu aparecer, por favor... Bjos, te amo ^^”

E pensei que estaria acordada mesmo, afinal, ficaria olhando pro céu até depois da meia noite. Respondi:

“- Estarei. Vai acompanhar o eclipse?” – e aí percebi que ela tinha ficado online pela última vez alguns minutos depois de ter mandado sua última mensagem, e não esperei que ela recebesse a minha agora. Legal.

Ainda eram 22h05m, e eu apenas olhava pra cima, mirando aquela Lua cheia maravilhosa. Que falta de sorte de quem só visse nuvens ao olhar pra ela essa noite. Me perdi por alguns instantes em pensamentos aleatórios sobre a beleza do nosso satélite prateado natural e resolvi entrar em casa pra beber água.

Na sala, minha mãe, deitada no sofá, assistia à novela das 9.

- Mãaae, tá perto de começar.

- Daqui a pouco olho.

- Okay.

Daí fui ao meu quarto, ao lembrar de um binóculo que eu possuía desde os 8 anos (acho). Na época, assinei uma revista sobre biologia e afins da Abril, e ganhei o objeto como brinde. Ele jazia, no momento, numa gaveta do meu guarda-roupa, completamente abandonado. Peguei-o e levei-o pro quintal comigo, porque qualquer artefato que melhorasse essa experiência me era bem vindo agora.

Deitei sobre o cimento frio novamente e observei a penumbra negra avançar, dando a impressão de que a Lua não era mais cheia, e sim, minguante.

* * * * *

Já passavam das 23h. Eu já havia convencido minha mãe a dar uma olhada no eclipse duas vezes, e, na segunda vez, finalmente, ela ficou impressionada. A Lua se exibia no céu como se tivesse sido banhada de sangue, e o resultado era encantador. Ela começara alaranjada, e, os poucos, ficara avermelhada, escurecendo cada vez mais. Eu olhava pelo binóculo, hipnotizada, enquanto minha mãe avisava que estava indo dormir. A brisa que me envolvia era fria, e o céu continuava aberto. Quer cenário mais perfeito?

Meu celular vibra alguns minutos depois, o pego, desbloqueio a tela e vejo uma mensagem de Maiara – até que enfim ela estava de volta! -, em seguida, abrindo-a.

“- Chegaaay! Vou acompanhar sim, jovem. Sei que vc odeia ligações, mas aí vou eu” – e, de fato, ela ligava agora. Perguntei-me mentalmente o porquê da atitude de emergência e atendi.

- Alô? – cumprimentei, hesitante.

- Alô! Lembra de quando eu falei que descobriria seu endereço sozinha, porque você não queria me dar?

Gelei. O que raios ela ia fazer agora? Engoli a seco e continuei.

- Lembro, mas duvido que tenha encontrado – respondi, sorrindo, mas não tão confiante como gostaria.

- Haha, não encontrei não, mas sei que estou no seu bairro. – caralho, caralho, não podia ser verdade. Alguém me mata.

- Como vou saber que realmente está no meu bairro?

- Teu amigo, que conheço do grupo, me contou qual era.

Agora a coisa ficou séria.

- Onde exatamente você está?

- Hmmm... no meio de uma avenida. Tem uma igreja aqui perto.

- E uma farmácia também?

- Sim, tem uma farmácia logo ao lado, junto de um mercadinho.

Puta merda, tudo o que eu não esperava tinha acontecido agora. Ela realmente tinha vindo parar bem perto da minha rua.

- Acho que a iluminação pública dessa cidade é uma merda, está tudo tão escuro... Não vai vir me guiar? – ela falou do outro lado da linha, manhosa.

Aí eu pensei – se uma vez já rodei um hotel inteiro de pijamas, por que não ir até lá, quando a rua deveria estar deserta? Meu pijama nem era tão ruim assim. Não era por covardia que eu iria decepcioná-la hoje.

- Vou sim, sua piranha. Fique em frente à farmácia e não saia daí. – desliguei.

Saí de casa com a perícia e a agilidade dignas de James Bond durante uma fuga secreta e fui parar na avenida, graças à porta auxiliar que dá do meu quintal para a rua. Realmente, estava escuro pra caralho, com exceção de alguns postes falhos e da própria Lua, que, mesmo cor de sangue, era útil.

Em meio às sombras, notei que algumas pessoas sentavam nos bancos da praça que temos no meio da avenida para olhar o eclipse também. Alguns casais, até. Que meigo. E havia uma silhueta parada em frente à farmácia. Meu coração parou quando notei sua estatura – um pouco menor que a minha - e seu cabelo longo e escuro, posto de lado sobre um dos ombros. Era ela.

Aproximei-me sorrateiramente, mesmo sabendo que ela me descobriria antes de eu chegar a 4 metros de distância. Maiara virou-se para a avenida. Eu liguei o botão do foda-se novamente e saí correndo ao seu encontro.

- SUA PUTAAAA!!! – gritei, rindo loucamente, abraçando aquela criaturinha linda enquanto a girava no ar.

- Você é tão romântica!! – ela gritou em resposta, também gargalhando como há muito não fazia. – Ai, para, tô ficando tonta, socorro.

Parei e a coloquei no chão, apesar de que, naquele momento, eu poderia ter caído na calçada com ela. Rolaríamos e riríamos até não termos mais estômago.

- Eu sei, o romantismo é, definitivamente, a minha maior virtude. Todos os pegadores de novinhas que conheço me invejam por isso.

- Falta isso neles, creio eu – ela entrou na minha onda de sarcasmo, e eu podia ver seu sorriso se formando à meia luz. – Me mostre mais do seu romantismo infalível.

- ... bem, por que não?

Coloquei uma das minhas mãos em volta de sua cintura, a outra, em sua nuca, nos curvando como num passo clássico de tango. Em seguida, veio um beijo, profundo como o vermelho da Lua de Sangue que pairava sobre nós. Logo após, o paraíso.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Esse não é o tipo de conto que escrevo com a intenção de receber vários favoritos e comentários, mas, se quiser deixar sua opinião aqui, fique à vontade. Eu certamente apreciarei o gesto. Espero que tenha gostado!