Siga a Tempestade escrita por kayaa


Capítulo 1
2 de Agosto


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem, escrevi com muito carinho. c:



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O barulho da chuva era algo agradável de escutar, ainda mais quando os pensamentos de um dia cansativo aos poucos iam embora pela distração daquelas gotas que secretamente apostavam corrida pelo vidro da janela.

― Tire a roupa. ― A garota disse em um tom inocente, sem ao menos perceber o duplo sentido que a sua frase soara naquela ocasião, um erro comum vindo de alguém que não costumava dizer frases maliciosas.

Sasuke segurou a mão que já tentava desatar o nó da capa molhada pela chuva.

― Estou bem.

Em outras ocasiões ela discutiria e o forçaria a tirar a roupa molhada, não poderia deixar que aquilo secasse em contato com seu corpo, mas decidiu não insistir.

― Pelo menos fique perto da lareira.

Sasuke a obedeceu sem murmurar qualquer reclamação, afinal, precisaria mesmo de um pouco de calor para disfarçar o leve tremer que o queixo fazia.

A briga entre os dois tinha sido feia, dificilmente Sasuke perdia o controle a ponto de levantar o tom de voz ou socar o tronco de uma árvore como tinha feito mais cedo, inclusive sua frieza perante as situações mais peculiares tinham mostrado que aquilo não era bem um defeito e sim uma qualidade.

Uma disputa de quem falava mais alto e isso perdurou até que a chuva começasse a cair ao mesmo tempo em que trovões iluminavam o céu. E Sasuke sentia-se estranho por ter gritado daquela maneira.

― Sorte a nossa achar essa cabana. ― Mas foi Sakura quem começou a puxar assunto.

― É. ― Sussurou observando-a friccionar as duas mãos para manter-se ao menos aquecida.

Estava mais do que óbvio que as fracas chamas jamais os aqueceriam do vento que atravessava as falhas da porta de madeira empenada. Maldição!

Sem muitos rodeios ela levantou e caminhou até uma velha cômoda que ficava bem no canto da cabana, em um local ainda mais frio e escuro, procuraria algo que servisse de manta para cobrir os dois, entretanto só o que conseguiu achar gavetas vazias e algumas teias de aranha.

Sasuke a acompanhava com o olhar, se ia para a esquerda ou se ia para a direita seus olhos a seguiam discretamente. Era quase como se estivesse tentando não perdê-la de vista mas nesse caso ele só estava entediado em ter que encarar o assoalho de madeira.

Por fim, a jovem desistiu de procurar por alguma manta, seria inútil e teriam que se esquentar apenas com as fracas chamas que se alimentavam da lenha encontrada nos fundos da propriedade.

― Você não é fraca. ― Sasuke sussurrou encarando-a.

Primeiro Sakura pensou ser fruto de sua imaginação, mas depois de alguns minutos refletindo sobre o que acabara de escutar, decidiu rebater:

― Eu poderia tê-lo derrotado, estava tudo sobre controle e você não precisava ter interferido na MINHA luta.

A última coisa que Sakura queria era ser é a donzela em perigo da história, pois sabia que tinha potencial, força para lutar de igual para igual com inimigos considerados poderosos. Já não era fraca como aquela guennin que sabia todas as teorias e controlava o chackra com maestria.

Estava mais desenvolvida.

E de repente as lembranças de sua infância invadiram sua mente; via-se sendo protegida por Sasuke, Kakashi ou até mesmo Naruto.

Naquela época era tão medíocre com luta corpo a corpo que até mesmo o pior aluno da classe era capaz de protegê-la. Mas só se deu conta disso quando um dia Sasuke jogou em sua cara.

Ela era fraca e praticamente um estorvo para o time; exatamente, aquilo era coisa do passado.

― Não discordo. ― Disse retirando sem dificuldades a capa encharcada e a colocando um pouco mais perto da lareira, talvez ainda servisse de coberta para o dois. ― Mas de todos do grupo de apoio, você é a única que não pode se ferir. O que acha que aconteceria se a médica do grupo fosse ferida gravemente?

Sakura o fitou em silêncio.

― Gomen, mas eu não poderia ficar sem fazer nada.

A tempestade se intensificou e com isso o vento que já estava forte, estava fazendo com que gotas de chuva atravessassem as falhas da madeira. Sakura procurou sentar-se mais próxima de Sasuke, pois já não poderia ficar tão perto assim da porta de entrada.

― Acho que exagerei com você hoje mais cedo. Tsunade-sama sempre me dizia que aprendemos a lutar para podermos nos defender e também precisamos ser rápidos na hora de nos esquivarmos do ataque de algum adversário. ― A menina desabafou e não podia deixar de admitir que estava um pouco surpresa pela conversa com Sasuke estar durando muito mais do que três minutos. ― E tamb...

Mas antes que pudesse terminar o seu desabafo Sasuke a puxou para si, envolvendo-a no conforto de seu peito quente. Suas roupas úmidas em contato uma com a outra provocaram arrepios que pareceram visíveis ao toque de Sasuke.

Apesar de não conseguir ver o rosto dele, podia sentir o cheiro da pele e do cabelo, que mesmo molhado da chuva, exalava um perfume gostoso. E quando ela se moveu para afastar seus corpos, ele a puxou com ainda mais firmeza.

O queixo apoiado no topo da cabeça de Sakura.

― Sasuke-kun...

A escuridão escondia o brilho diferente nos olhos do ninja, escondia a preocupação que sentiu ao vê-la tentando curar-se do rasgo no ombro esquerdo. Aquilo sim tinha sido profundo.

Tudo estava tão quieto que era como se o tempo tivesse congelado. Apenas podia-se escutar o barulho da chuva e do vento batendo nas paredes da cabana.

Bem, pelo menos a escuridão escondia as bochechas coradas de Sakura, estava tão tímida com aquele toque que mal pôde reparar a mão de Sasuke subindo para acariciar seu couro cabeludo.

O toque. A respiração fraca. O cheiro de floresta.

Ela suspirou e ficou ainda mais vermelha quando suas testas se encostaram e finalmente puderam se encarar enquanto as respirações se misturavam.

― Fiquei preocupado. ― Sussurrou deixando de lado toda a sua postura reservada que só abandonava quando estavam a sós.

― Bobo.

Sakura sorriu ao lembrar-se dos questionamentos que costumava receber sobre o seu relacionamento com Sasuke porque de maneira geral, ele não costumava demonstrar ser uma pessoa afetuosa. Os dois não conversavam muito e também não saíam em encontros espalhafatosos, mas ainda assim se davam melhor do muitos casais exibicionistas na vila.

― Você está quente. ― Ele se afastou rapidamente e tocou sua testa. Com certeza a temperatura corporal de Sakura estava alta.

― Do que está falando?

― Você está com febre. ― Sasuke não pensou duas vezes antes de retirar a capa de perto da lareira e cobrir a parte exposta da jovem que não se limitava apenas nos braços, mas também boa parte das pernas estava em contato com o vento gelado lá de fora. ― Estranho não ter percebido isso.

Sakura não sabia exatamente o que dizer sobre a observação de Sasuke até porque já tinha percebido há algum tempo que o ar de sua respiração estava ligeiramente mais quente e que a sensação de frio aumentava gradativamente, entretanto se o avisasse antes sobre o bloqueio que sentia na garganta ou talvez sobre a quentura da febre saberia que ouviria ainda mais sermão.

A única fonte de luz no ambiente eram os raios que iluminavam o cômodo escuro enquanto que o barulho dos trovões caindo lá fora fazia alguns poucos bibelôs trepidarem nas prateleiras. Sakura não se importou, seus olhos mantinham a atenção voltada para o pomo de adão bem delineado de Sasuke. Ele subia e descia.

Riu consigo mesma.

― Eu sei o que está pensando e a resposta é não. ― Sussurrou enfatizando a última palavra e virando o belo rosto para encarar diretamente o olhar curioso de Sakura. ― Não vou passar dos limites com você. Não aqui. Não agora.

Essa era sempre a resposta que recebia do rapaz cada vez que ela ou qualquer pessoa insinuava um próximo passo na relação dos dois, no entanto, naquele momento era um alívio para Sakura saber que poderia respirar fundo sem medo de que algo a mais acontecesse. Não queria que a sua primeira vez fosse em uma cabana abandonada em uma data completamente aleatória.

Ela suspirou.

[...]

A chuva ainda parecia estar com força total, não importava quantos trovões caíssem ou quantos clarões aparecessem, aquela tempestade provavelmente estava inundando a parte mais baixa do terreno. Por sorte, eles estavam abrigados no alto de uma colina. Era até possível enxergar a maneira como as árvores mais finas se curvavam diante da ventania.

― Você está com frio. ― Ela esticou a mão para tocar-lhe o rosto, a ponta de seus dedos encostando-se à pele fria dele. ― Vou colocar aquele banco de madeira na lareira.

― Estou bem.

― Tem certeza? Acho melhor você ficar com a sua capa. ― Insistiu desatando o laço que a prendia no pescoço.

― Estou bem, sério. ― Sasuke não tirava os olhos dela, queria ter certeza de que nada lhe aconteceria. Sua falta de sono era prova disso.

Um clarão iluminou a cabana e com ele, o sorriso tímido da menina. Outro clarão se fez presente e em resposta ao sorriso, veio o perfeito vislumbre dos lábios de Sasuke movendo-se em um curto sorriso, daqueles quase imperceptíveis.

Talvez Sakura ainda não tivesse percebido o que Sasuke capturara há alguns meses: As tempestades pareciam fazer de tudo para que os dois ficassem sozinhos; e se esse mero acontecimento da natureza tivesse consciência, saberia que aquela era quarta vez em que ficavam presos em uma cabana qualquer esperando uma chuva torrencial passar.

Quais as chances de ser uma mera coincidência?

Ele novamente se pegou com a pele arrepiada de frio, as extremidades de seu corpo estavam geladíssimas e praticamente dormentes. Claro que poderia pedir de volta o único meio, além da lareira, que tinha para se esquentar, mas isso faria com que uma outra pessoa sentisse frio. Faria com que ela sentisse frio.

Conforme a noite avançava, era possível ouvir o som da chuva diminuindo e o barulho dos insetos aumentando, provavelmente estariam procurando por abrigo. Sasuke sempre ouvira de sua mãe que ao final de tempestades, os animais costumavam se mudar e procurar por locais com maiores altitudes.

Sua mãe...

O simples cheiro de terra molhada o fazia lembrar-se da infância antes do pesadelo, de quando voltava sujo de lama para casa e encontrava a sua mãe preparando o jantar. Inevitavelmente ousou respirar fundo para conseguir capturar, talvez, um resquício daquela época.

Pode-se dizer que tempestades lhe traziam algumas boas lembranças e aquele dia não seria diferente.

Sasuke ajeitou-se em uma posição mais cômoda, trazendo o corpo semi adormecido de Sakura para perto de si. Ali ele capturava calor e doava o seu próprio até que pudessem entrar em um equilíbrio térmico, seria melhor se pudessem se manter próximos um do outro e assim aquecidos.

Lá fora a chuva novamente começava a tomar forma, não tinham mais os relâmpagos, mas em contrapartida, o vento parecia ainda mais arrebatador. Por sorte aquela cabana estava sendo forte o suficiente para aguentar a tempestade.

Sakura frequentemente abria os olhos e depois os fechava em uma luta incessante contra o sono, levantava as mãos tateando o rosto de Sasuke para logo se entregar ao cansaço.

O perfume natural de Sasuke era o que a fazia despertar.

― Sasuke-kun... Que horas são? ― Sussurrou tão baixo que pensou nem ter aberto a boca para pronunciar as palavras.

― Falta muito para amanhecer. ― Disse puxando-a para mais perto de si, ainda podia senti-la tremer de frio.

― Por que... Está me... Abraçando?

― Não é um abraço, estou te mantendo aquecida. Não posso chegar em Konoha e dizer que te deixei morrer de frio. ― Ele respondeu, parecendo um pouco vago.

Sakura bocejou ruidosamente.

― É por isso que ninguém acredita em mim quando digo que você não é tão malvado quanto parece. ― Sakura disse sorrindo, procurando encontrar os olhos dele.

Normalmente aquele era o máximo de palavras que trocavam durante uma conversa e então um silêncio se formava, não que fosse algo ruim quando acontecia mas transmitia uma sensação que fazia o rosto queimar. Poderia ser receio do que estava por vir?

A verdade é que Sakura preenchia com calor a existência de Sasuke, não precisavam de frases decoradas ou de conversas longas para que se bastassem. Entre eles não havia choque térmico.

A menina lentamente despertou e saiu de perto de Sasuke, em direção a janela empoeirada. Com os punhos, limpou a parte que mais dificultava a visão do lado de fora e observou algumas poças de chuva nas falhas da clareira.

― Não acho que a chuva vá cessar antes do amanhecer. ― A cortina balançou com o vento que invadiu o cômodo.

Ele não respondeu, apenas concordou com leve chacoalhar de cabeça e reabasteceu a lareira com um banco velho de madeira.

O fogo subiu. O cômodo tornou-se mais quente, um pouco mais iluminado também. O rosto de Sasuke parecia mudar de forma a medida que as chamas da lareira se movimentavam com o soprar do vento: Ora parecia ter o rosto mais fino, ora parecia estar maior.

― Você deveria dormir, precisa estar bem descansado para quando seguirmos viagem. Além disso, precisamos encontrar os outros. ― A firmeza em sua voz ressaltou o ar de liderança que conquistara ao longo dos anos, nem de longe parecia aquela garotinha retraída que escondia a própria identidade ao usar franja.

― Não estou cansado. ― Os olhos se abriram vagarosamente para encarar a expressão séria de Sakura. ― Sente-se aqui, a chuva não vai parar só porque está andando de um lado para o outro.

―Sasuke-kun, não consigo ter a sua paciência. Poderíamos já estar seguindo caminho com os outros. ― Sakura respirou fundo, entediada.

O rosto dela se moveu para mais perto e então pôde vislumbrar, graças às pequenas chamas da lareira, seu próprio reflexo na íris negra do rapaz, naquela imensidão escurecida em que fazia questão de se perder.

Seus olhos.

Seus lábios em transe.

― A sua já ultrapassou a minha.

Não era necessário ser nenhum amigo íntimo do casal para saber que aquela frase solta tinha um significado muito profundo para a shinobi. Não eram as palavras em si que a impactaram, mas sim a situação a que elas se referiam.

― Aquele dia... ― Ele apertou o maxilar. ― Você quase me fez ficar...

As cortinas balançaram com mais uma rajada de vento.

― ... Faltou muito pouco para eu não dar meia volta e ficar na vila com vocês. ― Sasuke tocou o rosto dela, deslizando a ponta dos dedos até a base do queixo.

Naquele momento vários flashes da noite em que ele a deixara passaram por sua cabeça e junto deles o sentimento sufocante que lhe afligiu por anos seguidos, na esperança de trazê-lo de volta.

Sakura lembrou-se da dor de quando achou que tudo aquilo que havia lutado estava morto, que não teria mais forças para lidar com um Sasuke corrompido. Lembrou-se do vazio que sentiu quando decidiu que ela mesma teria que pôr um fim na sombra do que Sasuke tinha sido um dia.

Lembrou-se da raiva que a preencheu por não ter conseguido matá-lo.

― É passado. ― Ela sorriu, seus braços deixando-se cair sobre os ombros de Sasuke. ― Você está aqui agora. Comigo. Sozinho no meio do nada.

― Alguns passados não são apenas passado. ― Seus dedos hesitantes tocando as bochechas, contornando a silhueta da maçã do rosto.

Ela bocejou, ainda com sono. Pretendia ignorar o fato dele estar tentando desenterrar assuntos mortos mas se estava tentando lhe dizer algo, era porque de alguma forma queria desafogar o coração daquelas amarguras que poderiam estar querendo escapar.

Então, Sakura ajoelhou-se diante dele e segurou o seu rosto com as duas mãos, uma em cada lado. Meio receosa, não conseguiu tirar os olhos dos dele:

― Por que “quase”?

Sasuke permaneceu parado e quieto. Talvez estivesse procurando palavras para que nada soasse cruel demais aos ouvidos da kunoichi, não queria que ela ouvisse mais do que o necessário, porém isso abiu margem para que o questionamento continuasse:

― Quero que me conte, Sasuke-kun... O que teria acontecido se você nunca tivesse partido?

― Com certeza não estaríamos aqui nessa cabana. ― Fitava as órbitas esverdeadas, mas logo desviou o olhar para a janela. ― Não seríamos quem somos hoje e provavelmente eu não teria me dado conta do que sinto.


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Notas finais do capítulo

O segundo e último capítulo já foi programado para ser postado às 15:00



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