Coração De Seda escrita por Maria Fernanda Beorlegui


Capítulo 58
Capitulo 58


Notas iniciais do capítulo

Meus amores e minhas amoras, o capitulo de hoje seria um especial para o dia dos pais por causa da lembrança/sonho de Henutmire com seu pai. Mesmo assim espero que contenham as lágrimas com Henutmire rainha, criança e o rei Seti.



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Ando lentamente pelo palácio e noto o quanto calmo ele está, não vejo nenhum servo ou oficial por perto, mas sinto uma paz inexplicável ao vagar sozinha. Vejo que meu ventre está seco, não carrego meu filho em meu ventre, mas não me desespero com isso. Fico de frente a porta do quarto de meu pai e então entro sem pedir permissão, vejo que há um cesto na antessala muito bem moldado, digno de um rei ou até mesmo de uma rainha. Sorrio ao deslizar meus dedos pelo ouro, mas me alegro ainda mais ao ver um manto azul claro dentro do berço.

—Isso é meu. —Falo ao pegar uma boneca de dentro do berço e sorrir ao ver o quanto ela é engraçada. Ao mesmo tempo eu me lembro de quando Anippe era uma criança, sinto lagrimas escorrem pelo meu rosto, mas uma voz familiar me faz sorrir.

—Você deve estar cansada... —Ouço meu pai falar e então eu me escondo para que ele não me veja. —Sua mãe me falou que você tem muito sono. —Meu pai fala com uma menina nos seus braços. Olho bem para a criança e sorrio ao ver o quanto bonita ela é.—Que susto você me deu, Henutmire. Pensei que você não fosse nascer, mas aí está você. Tão bela e doce como a própria Ísis.

—Pai, eu estou aqui. —Falo ao me pôr de frente para o faraó, mas ele parece não me ver. Me assusto ao ver ele chamar a menina pelo meu nome.

—Henutmire, minha filha, que a própria deusa Ísis te proteja como se fosse sua própria mãe. Que seu poder e sua sede de justiça sejam soberanas perante todo o mal, e que reine absoluta ao meu lado. —Meu pai pede ao erguer a menina para o alto. A menina, no caso eu, põe sua mãos no rosto e balança as pernas freneticamente fazendo meu pai rir. —Como é forte...

—Pai. —Chamo pelo meu pai novamente, mas ele parece não me ver. O faraó então brinca com a sua filha enquanto eu choro de felicidade. Meu coração bate tão forte que acho que irei morrer ao ver tamanho fenômeno.Isso é um sonho? Se for, não quero acorda.

—Sabe, Henutmire, quando você nasceu eu pensei que estivesse perdido. Perdido por que os deuses nunca me deram uma joia tão rara como você, minha filha. —Meu pai fala enquanto eu fico próxima, exatamente ao seu lado direito onde a criança, ou seja, eu mesma, pode me olhar. —Para onde olha? —Meu pai pede ao ver que a criança Henutmire olha fixamente para a rainha Henutmire, a mãe do libertador. Isso mas parece ser uma lembrança sendo recordada em um sonho, uma lembrança muito boa com o meu pai.—Quem é? —Meu pai pergunta risonho enquanto eu me vejo criança nos braços dele e choro comovida.

—Eu sou você, sabia? —Pergunto para a criança que começa a sorrir e então meu pai olha para os lados. —Você vai passar por muitas coisas, princesa. Mas vai se tornar rainha da nação mais poderosa da terra.—Falo tentando tocar em meu pai, mas não consigo. É então que o olhar de meu pai fixa-se no meu, mas mesmo assim ele não me vê.—Pai, eu... —Tento perdoar o meu pai enquanto olho em seus olhos, mesmo que ele não me veja, mas eu não consigo.

—Tenha bons sonhos, Henutmire. —Meu pai fala ao pôr a criança no cesto.—Quando precisar de meus braços, você sabe onde me encontrar...

Despertei com um sorriso no rosto, porém com lágrimas nos olhos ao sonhar com meu pai. Olho para o meu lado e vejo que Hur adormece tranquilamente. Ponho minhas mãos em meu ventre e sinto a presença de meu pai ser muito forte, como se ele estivesse comigo nesse momento. Algo que é impossível, mas eu sinto como se meu pai estivesse aqui.

—Pai, se o senhor soubesse que agora eu daria tudo o que tenho para ter o senhor comigo. —Falo choramingando para que Hur não ouça e faço carícias no meu ventre. —Eu sinto o senhor tão presente... —Falo ao lembrar de meu sonho. —O senhor de fato está aqui,pai? —Pergunto na ilusão de ouvir a voz de meu pai, mas no mesmo momento eu sinto meu filho se mexer. Sorrio ao sentir o meu filho se mexer em meu ventre, mesmo que eu tenha perguntado algo ao meu pai, mas parece que meu filho é o único que tem a resposta. —Eu falei com o seu avô, não com você. —Brinco e sorrio, mesmo que em meus olhos, lágrimas brotem. Não sei se choro de tristeza ou até mesmo de felicidade.

(...)

—Você está diferente. —Hur fala pensativo ao me ver sorrir. —Dormiu bem?

—Muito bem. —Respondo contente pelo sonho que tive. —Acho até que estou menos preocupada.

—Melhor assim. —Hur agradece ao beijar o meu rosto.

—Eu senti ele se mexer. —Falo em relação ao bebê, então o rosto de Hur parece se iluminar com um sorriso. —Foi a primeira vez que ele se mexeu.

—Por que não me acordou? —Hur pergunta abobalhado com a notícia. —Será que ele se  mexe agora? —Hur pergunta ao pôr sua cabeça sobre meu ventre e espera que a criança se mova.

—Eu acho que agora ele não vai se manifestar. —Brinco fazendo Hur se distanciar de mim.  —Eu vi você e Anippe.

—Você estava lá o tempo todo? —Hur pergunta enfático e assustado. —Ouviu toda a nossa conversa?

—Toda. —Minha resposta surpreende Hur. —E fico feliz por você e Anippe estarem se dando bem. É melhor assim... —Falo agradecida por saber que pai e filha não vão mais discutir.

—Agora só falta você. —Hur fala pausadamente, mas eu não entendo. —Você precisa do perdão para ficar bem consigo mesma.

—Se fala sobre o perdão que meu pai pediu, saiba que ele não o terá. Nem daqui a mil anos, meu terá o meu perdão. —Minhas palavras fazem Hur ficar um pouco constrangido, todavia eu não me envergonho. —Meu pai teve tudo, menos isso.

—Você não acha que é muito infantil o que você está fazendo? —Hur pergunta seriamente. —Você é uma mulher, não uma menina.

—Me responda, Hur. Quantas mães perderam seus filhos por culpa da maldade de meu pai? —Minha pergunta não é respondida, mas eu sigo falando. —Muitas. Inclusive eu. —Minha resposta faz Hur esmorecer. —Se não fosse por meu pai, Moisés teria ficado aqui comigo.

—Mas vocês iriam brigar como sempre, Henutmire. Todos sabiam neste palácio que você era a única que tinha a ousadia de enfrentar o faraó, somente você fazia isso.

—Não adianta. A minha mágoa é eterna, Hur. Eu nunca vou entender o por que de tanta mágoa dentro de mim, mas parece que eu nasci para odiar o meu próprio pai. —Falo aterrorizada. —É isso mesmo?

—Você não devia pensar desse jeito. Mas em todo caso você já deveria ter perdoado.

—E agora que sei que Gab é filho dele? Eu não sei bem como reagir a tudo isso. —Falo estarrecida levo minhas mãos ao meu rosto.

—Não associe Gab com Seti. —Hur aconselha.

—Não associo, mas também não posso negar que sinto nojo ao lembrar que Gab tem o meu sangue em suas veias...

—Henutmire, você e Gab são tão distintos como a lua e o sol, mas o sangue que corre em suas veias de fato faz com que você e ele sejam a mesma coisa. Mas se for para você sentir repulsa de alguém, não sinta dele, por que tanto ele quanto você foram vítimas de Tuya e Nayla. Até mesmo seu pai foi uma vítima por isso...

—Eu ainda me pergunto como meu pai não condenou minha mãe por traição. —Falo assustada ao imaginar minha mãe sendo morta. —Já ouvi falar de reis que condenaram rainhas por infâmias na frente de seus filhos.

—Talvez Seti não fosse tão cruel quanto aparentava ser. —As palavras de Hur me fazem pensar se de fato havia algum vestígio de bondade em meu pai. Talvez ninguém seja tão mal, não mal por completo. Hur tenta me convencer com o seu olhar doce, mas minha atenção é dada para o meu filho que se mexe novamente em meu ventre.

—Ele se mexeu. —Falo e ponho a mão de Hur em meu ventre. Meu marido espera ansiosamente pelo movimento de nosso filho em meu ventre, e então a criança se move novamente. —Sentiu? —Pergunto ao oprimir a mão de Hur em meu ventre, vejo Hur sorrir e então sorrio ainda mais ao sentir meu filho se mover. —Sente? —Pergunto com lágrimas nos olhos. —É o seu filho que insiste em crescer. —Falo enquanto Hur faz carícias em meu ventre. Toco no rosto do meu marido mesmo que ele esteja concentrado na criança que está em meu ventre, por isso estou tão feliz.

—Meu filho... —Hur sussurra emocionado ao beijar inúmeras vezes o meu ventre. —Como eu poderia imaginar que sua mãe engravidaria a essa altura da vida? —Hur pergunta me fazendo sorrir. Nossas atenções são dadas para Djoser que entrar em meu quarto com um semblante preocupado.

—Moisés voltou. —Meu primogênito revela e então eu me levanto da cama bruscamente. Hur me segura delicadamente deixando claro a sua preocupação, todavia eu estou ótima para tantos cuidados. —Eu o vi quando estava andando pela rua do comércio.

—Seu irmão está bem?

—Sim, mas o que me preocupa é o está acontecendo. —Djoser fala me deixando confusa. —Moisés voltou com uma quantidade absurda de hebreus e um rebanho farto.

—Rebanho? —Hur pergunta curioso. —Tem certeza?

—Absoluta. —Djoser ressalta. —Parece que Moisés tem certeza que meu tio vai libertar os escravos.

—Está chegando a hora. —Falo ao tocar em meu ventre e imaginar o que será de mim. —Acho que a praga ainda não aconteceu por que Moisés esteve todo esse tempo fora.

—Eu só não entendi por que Moisés trouxe tantas ovelhas. —Hur fala pensativo. —Isso é tão estranho.

—Cada momento é decisivo agora,pai. Falta muito pouco para o nosso povo partir do Egito e voltar para Canaã.—Djoser fala contente, porém eu me entristeço. —Anippe não se aguenta de tanta ansiedade. —Não dou atenção para o que o meu filho fala já que estou preocupada com a sua vida e a vida de Uri. Até mesmo Hur corre perigo por ser filho único, assim como Amenhotep. E ainda me falta pensar em Gab, até por que ele é o irmão mais velho!

(...)

—Ramsés. —Falo ao entrar tranquilamente na sala do trono e ver meu irmão em seu trono. —Meu irmão, faça alguma coisa para que todos os primogênitos do Egito não morram.

—Esse anjo destruidor ainda não veio, Henutmire. Uma lua se passou, seu ventre ganhou mais volume e essa praga ainda não foi enviada. —Ramsés rebate sereno. —Soube que Moisés trouxe um rebanho farto?

—Não. —Minto para o meu irmão. —Por que Moisés traria um rebanho?

—Também me fiz essa mesma pergunta, mas em todo caso mandei Ikeni confiscar as ovelhas. —Ramsés fala irônico e então eu noto o quanto meu irmão se diverte com tudo isso. —Ainda pretende partir, não é? —Ramsés pergunta sereno.

—Sim. —Respondo friamente. —Eu não vejo o porquê de permanecer no palácio.

—Mas você é a rainha da nação mais poderosa da terra, Henutmire. —Ramsés fala tranquilamente, mas eu noto a sua irritação. —Soberana do alto e baixo Egito, de sangue legítimo de Ramsés I, filha de Seti, princesa hereditária e rainha da glória. Não pode jogar todos esses títulos ao vento por causa de Hur e Moisés.

—Me perdoe, Ramsés. Mas eu fui princesa, não princesa do Egito, mas princesa de nada, se quer saber. —Enfrento o meu irmão, embora eu esteja calma. —E neste momento eu não me vejo mais governando o Egito.

—E pretende partir grávida com dois filhos adolescentes em meio a mais de seiscentos mil homens rumo a uma terra que não te pertence? —Ramsés pergunta enfático. —O Egito é muito maior que qualquer outro reino, Henutmire. É seu. Nosso!

—Mas eu devo ir para onde o meu marido for, Ramsés. —Rebato. —Fique você com o Egito. —Falo ao retirar a minha coroa lentamente para espanto de Ramsés. Olho para cada detalhe da minha coroa, mas em seguida eu a ponho no terceiro degrau do trono de Ramsés. —Eu passei um tempo pensando em não partir por que eu sabia que você ficaria sozinho, mas agora eu vejo que você terá o seu trono, e ele sempre vale mais que a família. Nosso pai deixou isso bem claro, Ramsés.

—Henutmire...

—Quando Moisés partir, eu irei com ele para Canaã e irei criar a minha família lá. Longe de você, longe dos deuses, longe até da lembrança de nosso pai. —Falo. —Meu nome será apagado da história, eu sei que você fará isso, meu irmão. Mas eu não dou a mínima importância para isso, até por que eu entrarei para a história como mãe do libertador do povo hebreu enquanto você será lembrado pelo faraó fracassado. —Minhas palavras feriram Ramsés, todavia ele não se manifesta com isso. Eu então dou meia volta e saio da sala do trono.

—HENUTMIRE! —Ouço o grito de dor vindo de meu irmão, mas eu sigo firme e ando com um belo sorriso no rosto. —EU TE AMALDIÇOOU! —Paro de andar imediatamente ao ser amaldiçoada por meu próprio irmão.

—O que significa esses gritos? —Paser pergunta assustado. —A rainha e o rei brigaram novamente?

—Não importa se meu irmão me amaldiçoe ou não, Paser. Eu irei para Canaã com meus filhos e Hur. —Falo determinada e volto a andar em direção ao jardim. —Nem que meu próprio irmão me amaldiçoe centenas de vezes, eu irei para Canaã.

(...)

—A senhora tem certeza disso? —Anippe pergunta eufórica enquanto eu sorrio. —Vamos todos para Canaã?

—Vamos, Anippe. —Afirmo segura e então olho para todo o jardim real tentando memorizar cada detalhe do local. —Eu notei que estava fazendo uma tempestade num copo d'água sem necessidade alguma. —Mal termino de falar e Anippe me abraça fervorosamente.

—Eu mal posso esperar para sairmos do Egito, mãe. Imagine todos nós em Canaã, com a senhora grávida, eu tentando cuidar da casa... —Anippe fala e então eu começo rir ao imaginar minha filha cuidando de toda a casa. —Djoser vai se tornar um pastor se ovelhas assim como Moisés.

—Eu acho que seu irmão não vai aceitar isso assim tão fácil, Anippe. —Falo risonha ao imagina Djoser pastoreando. —Imagine seu pai fazendo a mesma coisa.

—Eu acho que não. Meu pai pode ter passado a infância na vila, mas pastorear ele não sabe. Conduzir ovelhas não é o mesmo que esculpir pedras preciosas como ônix, safira ou rubi. Mas será interessante ver meu pai e meu irmão pastoreando. —Anippe brinca e acaba me fazendo rir. —Tentarei manter a casa em ordem.

—Você mesma vai ter que fazer isso por que eu não tenho a mínima ideia de como seja fazer tal coisa. —Falo. —Na certa seu pai vai pedir ajuda a alguém.

—Eu vou cuidar de vocês. —Anippe fala sendo carinhosa comigo e então toca em meu ventre. —De todos vocês. Até mesmo desta criança que está aí dentro... —Anippe brinca abobalhada. —E pensar que eu estive aí dentro um dia. —Anippe fala um pouco pensativa.

—E que me fez ter muitos desejos no meio da noite. —Falo nostálgica. —Eu tinha vontade de comer tantas coisas ao mesmo tempo que Gahiji pensou em proibir a minha entrada na cozinha real.

—Leila me contou isso. —Anippe fala orgulhosa enquanto ainda olha para o meu ventre. —Eu pensei em um nome caso for uma menina.

—Qual? —Pergunto curiosa.

—Meritamon. —Anippe responde.

—E eu pensei em um caso for menino. —Falo ao percorrer minhas mãos em meu ventre. —Kamés. Este era o nome do meu irmão que morreu ainda criança.

—E se por acaso for gêmeos? Pelas crença egípcia, uma mulher que dá a luz a duas crianças é considerada uma deusa. —Anippe fala lembrando do que lhe foi ensinado neste palácio.

—E por que não, caso for uma menina, ela leve o meu nome? —Minha pergunta faz Anippe me olhar confusa.

—Quando meu pai fosse chamar pela a senhora, a minha irmã pensará que é com ela. —Anippe acaba me fazendo rir com sua imaginação.—Henutmire II? —Anippe pergunta sugestiva e então sorrio com a ideia. — Henuttawy?—Anippe pergunta sugestiva ao prenunciar com uma certa dificuldade um nome semelhante ao meu.

—Dê ênfase no final do nome, Anippe. —Falo e então minha filha tenta pronunciar o nome novamente.

— Henuttawy. —Anippe fala corretamente e então me faz rir ao se esforçar. —Ouvi Paser me contar uma história com esse nome.

—Era a filha de um sacerdote com uma sacerdotisa. Muitos não acreditam nisso, mas já que os sacerdotes insistem tanto em contar para as crianças... —Falo. —Parece que a mãe dela foi expulsa do templo ao ganhar a filha.

—Azenate. —Anippe fala pensativa, mas eu olho confusa para a minha filha. —Este era o nome da esposa de José, o hebreu que foi vendido pelos irmãos.

—Azenate era filha de um sacerdote... —Falo pensativa. —Eu não me lembro muito sobre a família de Azenate.

—Se sabe muito pouco. Mas o mínimo que eu sei é que ela desistiu de ser uma sacerdotisa de Seth por causa de José. —Anippe me conta e eu acabo ficando incrédula com essa história. —Foi vista com maus olhos por isso.

—Os pais dela devem ter se envergonhado por isso. Principalmente o pai que era um sacerdote. —Falo pensativa e acabo rindo. —Isso foi a mais de quatrocentos anos atrás.

—Quem sabe daqui a mais de quatrocentos anos alguém esteja contando a nossa história. —Anippe brinca enquanto eu sorrio, mas o meu sorriso se desfez ao sentir uma leve cólica.

—Eu não estou gostando nada disso. —Falo temendo pela minha saúde e pela saúde do meu filho. —Me sirva um pouco de água, Anippe. —Peço para minha filha que atende de imediato.

—Soberana. —Oritia faz uma reverência á mim e então eu sorrio forçado. —Como se sente?

—Muito bem. Embora a gravidez me deixe exausta em alguns momentos. —Respondo um pouco incomodada com a presença de Oritia. —Onde está Yaffa?

—Muito bem acompanhada por Djoser. —Oritia responde sorridente embora eu não goste nenhum pouco disso. —Adoro a amizade entre eles...

—Beba um pouco. —Anippe interfere na conversa ao me entregar uma taça com água. —Eu pretendia passear com eles, mas pelo o que vejo Djoser se adiantou.

—Devemos nos acostumar com isso já que o rei pretende casar seu irmão com minha filha. —Oritia fala risonha e Anippe sorri falsamente, embora eu esteja incomodada com isso, não me mostro incomodada. —Anippe é idêntica a você quando adolescente, Henutmire. —Oritia fala ao olhar fixamente para minha filha. —Já tem algum pretendente? —Oritia pergunta risonha e então minha filha me olha assustada e envergonhada. —Na sua idade, Henutmire convivia com alguns cortejos... —Sinto uma ponta de ironia vinda de Oritia, mas parece que a mulher me odeia por saber que o seu marido sente algo por mim. Mas mesmo assim ela finge não saber, e eu faço o mesmo jogo. —Mas nenhum foi páreo para o que Seti reservava para você.

—Disebek. —Falo enojada ao lembrar que meu pai escolheu justo ele para ser meu marido. —Mas graças ao destino que Hur surgiu em minha vida.

—Com tantos homens em sua volta, homens poderosos no caso, você escolheu o mais simples de todos. Isso me faz pensar que o amor é para poucos. —Oritia fala um pouco magoada. —É raro ver um homem e uma mulher se amarem tanto da forma como você e Hur se amam.

—Pertencíamos a mundo diferentes, mas a partir do momento que eu vi Hur com outros olhos, me senti diferente. —Falo nostálgica. —Demorou um pouco para Hur me conquistar por completo, mas quando ele conseguiu, de imediato planejei o nosso casamento.

—E Ramsés se opôs, mas em seguida concedeu. —Oritia fala risonha. —Com tantos altos e baixos você dois permaneceram juntos. Mas as vezes eu me pergunto o que teria acontecido se Seti não tivesse morrido.

—Como assim? —Pergunto confusa.

—Talvez Seti tivesse dado um jeito em separar você e Hur. Quem sabe até Ramsés não tivesse se casado com Nefertari. —Oritia fala como se de certa forma desejasse o meu mal. —Mas graças aos deuses isso não aconteceu.

—Soberana. —Paser interrompe a nossa conversa, mas eu fico aliviada por tê-lo conosco. —Vim saber como está. —Paser fala ao se aproximar de mim enquanto Oritia se afasta.

—As vezes eu sinto algumas cólicas, mas rapidamente elas passam. —Revelo e então Paser põe sua mão em meu ventre. —Algo de errado, Paser? —Pergunto seriamente, mas Paser começa a rir.

—O mesmo de sempre. A senhora deve repousar e não deve se aborrecer. —Paser fala ainda com sua mão em meu ventre. —E pensar que Nefertari esperava um filho também.

—Já se passou duas luas desde a morte dela. —Anippe fala nostálgica e evita as lágrimas. —Eu sinto  muito.

—Eu sinto mais. —Paser fala entristecido. —Mas não é hora nem momento para isso, princesa. Agora precisamos cuidar muito bem da sua mãe.

—Estou fazendo isso, mas como todos nós sabermos ela é muito teimosa. —Anippe brinca, mas me deixa um pouco constrangida.

—Talvez esse mal seja de família. —Paser brinca me fazendo rir. Sinto meu coração bater forte e em meus pensamentos me vem o rosto de Hur. Sinto uma necessidade enorme em ver Hur neste exato momento...

(...)

Entro sorrateiramente na sala onde Hur confecciona suas joias com Uri, mas eu vejo apenas o meu marido. Sorrio ao ver que Hur está muito concentrado ao lapidar o mesmo diamante que há em minha coroa. Ponho minha mão esquerda em meu ventre e imagino se, talvez, a criança que carrego no ventre herde o dom de Hur. Tento não chamar muito a atenção de meu marido e por isso me esquivo ao ver Hur virar-se para a direita e pegar um pequeno baú, aproveito a distração de meu marido e fico por detrás dele mesmo, em seguida ponho minhas mãos em seus olhos, tapando a sua visão.

—Você sabe que eu sempre acerto. —Hur fala risonho, mas eu não retiro minhas mãos de seu rosto. —A rainha não deveria estar em seus aposentos?

—Não. —Respondo ao retirar minhas mãos da vista de Hur e ver seus olhos negros repousarem em mim, mas em seguida irem até o meu ventre e em seus lábios um sorriso se esboçar. —Senti uma necessidade enorme em te ver.

—Você vai me ver todos os dias. Por que está assim agora? —Hur pergunta risonho. Permaneço observando-o sem falar uma palavra sequer, mas pareço querer guardar a lembrança de seu rosto. —Alguma coisa te atormenta?

—Claro que não, Hur. Nada me atormenta, tudo está em seu devido lugar. —Minto, mas rapidamente tento esquecer o meu medo. —Eu decidi que vamos para Canaã, Hur. Eu não vou mais ficar aqui...

—E Ramsés? —Hur pergunta ainda assustado. —Ele já sabe disso, Henutmire?

—Me amaldiçoou. —Falo para o seu espanto. Meu marido segura o meu rosto com suas duas mãos como se quisesse me salvar do meu irmão. —Ele não pode me prender como fez, mas me amaldiçoou, o que foi muito pior.

—Nenhum mal vai te acontecer, Henutmire. —Hur promete preocupado comigo. —Você já passou por coisas piores do que isso.

—Eu sei, saiba que eu não estou preocupada com isso. —Falo tentando acalmar Hur, mas eu mesma estou nervosa. —Eu tenho fé. E eu só conheço essa fé por ter você e Moisés.

—Eu nem tanto, mas Moisés... —Hur fala orgulhoso e põe suas mãos em meu ventre delicadamente. —E pensar que essa criança vai crescer em Canaã.

—Por que eu sinto que algo grandioso está destinado para essa criança? —Pergunto para mim mesma ao ver Hur concentrado ao ponto de não me ouvir. Sinto isso pelo meu filho, mas também sinto que isso vai me custar muito caro. Mas a decisão de seguir em frente com essa gravidez é minha.

—Você deveria estar repousando. —Hur fala.

—Eu repousei demais no jardim, sendo muito bem cuidada por Anippe e tamb... —Paro de falar imediatamente ao ser carregada nos braços de Hur. Grito assustada e faço Hur rir de mim. —Você me assustou! —Falo com um pouco de raiva e faço Hur rir ainda mais. —Não faça isso!

—Já que você não vai por bem, vai por mal. —Hur fala ao me carregar em seus braços.

—Eu não preciso disso. —Falo risonha ao ser carregada nos braços de meu marido. —Assim vai parecer que sou uma inválida.

—Não é isso que eu penso, mas estou aproveitando a ocasião para cuidar de você. —Hur fala risonho por me ter em seus braços como sempre teve.

—Você sempre fez isso. —Falo.

—Mãe? —Djoser me chama assustado ao me ver nos braços de Hur. —Se sentiu mal?

—Estou ótima, até agora. —Respondo aliviando o meu primogênito. —Seu pai quem está exagerando.

—Como sempre. —Djoser ressalta risonho. —Eu estava procurando Anippe.

—Você estava com Yaffa? —Pergunto curiosa e faço Djoser olhar assustado para Hur. —Me ouça, Djoser. Tenha muito cuidado com Yaffa.

—Mas se meu tio já até falou que vamos nos casar. —Djoser fala contente com um brilho em seus olhos. Me admiro ao ver esse brilho no olhar de Djoser, o mesmo brilho que tive quando recebi da boca de minha mãe que me casaria com Disebek.

—Eu acho que você é muito novo para pensar nisso, Djoser. —Hur intercede. —No momento você é um príncipe, um adolescente...

—Mas eu não vejo nada de errado. Mas vejo que minha mãe se irrita um pouco quando sabe que estou com Yaffa. —Djoser me enfrenta de tal maneira que penso em sair dos braços de Hur para segurar meu filho pelos braços.

—Não irrite sua mãe, Djoser. —Hur pede ao ver que Djoser está me enfrentando.

—Sempre foi assim. —Djoser fala enfurecido conosco. —Sempre obedecendo aos dois, sempre sendo o bom filho que aceita tudo para não contrariar. —Djoser fala e então eu faço Hur me colocar no chão. Meu primogênito me olha assustado ao me ver em sua frente com os pés no chão, porém não fala mais nada.

—O que é isso agora? —Hur toma partido e se coloca em minha frente. —Que revolta é essa?

—Revolta nenhuma, pai. Mas eu acho estranho a forma como a minha mãe fala de Yaffa, mas ela só faz isso quando a moça não está presente. —Djoser é debochado ao ponto de me desejar bater em seu rosto, mas eu não faço isso. —Ela fez algum mal e eu não sei?

—Se sua mãe diz que você deve tomar cuidado...

—Engraçado é justamente ela pedir para que eu tenha cuidado com Yaffa sendo que minha mãe é o pivor de tudo o que acontece neste palácio. —Djoser rebate enfático enquanto eu o observo distante, o corpo de Hur está entre nós dois agora. Agora que Hur e Anippe fizeram as pazes, eu e Djoser estamos nos desentendo.

—Você não pode ir para Canaã se pretende se casar com essa moça. —Hur relembra.

—Yaffa está disposta a partir conosco. —Djoser rebate mais uma vez me tirando do sério.

—CHEGA! —Grito ao ser tomada pela minha fúria e a insistência de meu filho. —Pare de argumentar!

—Mas eu quase nunca faço isso. Quase nunca desobedeço! —Djoser fala a contra gosto. Me recuso a acreditar que o adolescente que está em minha frente é a criança que um dia carreguei nos braços. —Qual é o problema com Yaffa?

—Nenhum! Eu apenas não quero você e ela juntos. —Acabo contrariando o meu primogênito. —Djoser... —Chamo por meu filho ao ver ele mesmo ir embora. —Djoser! —Chamo por ele novamente, mas Hur segura a minha mão e me impede de ir atrás de nosso filho.

—Deixe ele ir, Henutmire. Djoser é apenas um garoto. —Hur tenta me acalmar.

—Exatamente por isso. —Falo preocupada. —Você viu como ele ficou comigo? —Pergunto ao lembrar do olhar de Djoser para mim. —E se ele me odiar por isso?

—Eu vou conversar com ele. —Hur fala tentando me acalmar e segura em minhas mãos com carinho. Sinto seus lábios deslizarem nos meus e então eu tento esquecer a minha discussão com Djoser. —Venha, vou com você até o nosso quarto.

—Não precisa se preocupar comigo, Hur. Vá conversar com nosso filho. —Peço angustiada e então Hur me atende. Vejo meu marido sumir e então ando lentamente, acompanhada apenas pelo filho que carrego no ventre.

—De longe já dá para saber que você não anda sozinha. —Ouço Amun falar e então ponho uma de minhas mãos no ventre e outro em meu peito por conta do susto que acabo de levar.

—Eu soube que você e Oritia estão se desentendendo. —Falo fingindo preocupação.

—Mas não Imagina o motivo... —Amun fala ao se aproximar de mim sorrateiramente. —Ou imagina?

—Imagino que você esteja insatisfeito. —Falo com a voz embargada. —Espero que se entenda com Oritia.

—Henutmire. —Ouço Gab chamar por mim e então me acalmo ao ouvir a voz do meu meio irmão. —Se sente bem?

—Ótima. —Minto ao ter Amun e Gab em minha frente. —Pode me acompanhar em um passeio?

—Creio que a soberana não deve se esforçar tanto. —Amun fala forçadamente ao ter Gab presente. —Não faria bem a criança.

—Se tornar uma prisioneira é o que a rainha não pode se tornar, sacerdote. —Gab fala ao sorrir falsamente para Amun. —Majestade? —Ele chama por mim ao oferecer o seu braço.

—Com licença. —Falo ao me apoiar em Gab e me despedir de Amun. Quando vejo que nos afastamos o suficiente do sacerdote, olho um pouco envergonhada para Gab.

—Posso? —Gab pergunta ao pairar sua mão sobre o meu ventre. Eu sorrio permitindo o seu toque, e então vejo o rosto de Gab ganhar um belo sorriso. —Já se mexeu?

—Duas vezes. —Respondo orgulhosa.

—Henutmire, eu pensei. —Gab muda de assunto me deixando confusa. —Eu acho que vou para Canaã.

—Conosco? —Minha pergunta faz Gab se surpreender. —Eu imagino o motivo de seu espanto. Mas eu de fato vou para Canaã com a minha família.

—Não vai ficar no Egito... —Gab fala e então me olha contente por isso. —Mas, você vai suportar andar pelo deserto com uma criança no ventre?

—Não me amedronte, Gab. Sei o risco que corro, mas eu estarei ao lado de Hur. E somente isso é o que importa. —Falo.

—Você está certa. —Gab fala a contra gosto. —Mas acha que Ramsés vai deixar você ir assim tão fácil?

—Ramsés não é meu pai, Gab. Ele é meu irmão, o irmão mais novo que não pode decidir na vida da irmã mais velha. —Falo determinada. —Está perto de Moisés partir, e eu vou entrar em Canaã ao lado de meu marido e de meus filhos, custe o que custar.

—Espero que esse custo não seja muito alto, Henutmire. Até por que você está,milagrosamente, com uma criança no ventre. Dane-se lá o que nos está reservado no caminho, no deserto, onde há ladrões, comerciantes de escravos... —Gab fala um pouco pensativo. —Assassinos e outros tipos de pessoas!

—Deus vai nos guiar, Gab. Eu não sei como, mas eu acredito nele. —Falo com a esperança de que tudo vá dar certo. —Você tem certeza de que vai conosco?

—Eu não tenho o que fazer aqui,Henutmire. —Gab fala um pouco ressentido. —Quem sabe Canaã seja o meu lugar. —Gab mal terminou de falar e eu senti uma necessidade imensa em abraça-lo. —Por que me olha assim?

—Eu estive pensado. —Falo ao lembrar do que Hur me falou sobre Gab ser tão inocente quanto eu, mas ao lembrar de tudo o que ele fez, minha raiva retorna.

—Sobre sermos irmãos? —Gab pergunta na esperança de que vá considerá-lo meu irmão. —Henutmire...

—Gab, sobre isso eu estou tentando entender. —Falo, vejo um certo brilho no olhar de Gab, mas nem por isso demonstro alguma felicidade. —Mas eu não posso esquecer do que você fez comigo quando chegou no palácio. —Falo frustrada. —Sei que deve me odiar, também deve odiar Ramsés, pelo fato de você ser o herdeiro legítimo...

—Eu não quero o trono. —Gab me surpreende. —Ele é seu e de Ramsés, não quis, nem vou querer o trono que foi do homem que me renegou.

—Eu sinto muito por tudo o que aconteceu com você, mas não posso te perdoar tão facilmente. —Deixo claro que entre mim e Gab, nenhuma relação entre irmãos pode haver.

—Eu sempre quis ter irmão, mas nunca pensei ser irmão do rei e da rainha do Egito. Parece que estou sendo testado... —Gab argumenta pensativo. —Isso que você disse...

—Eu sei que temos o mesmo sangue, Gab. Mas eu não consigo ser sua irmã como deveria ser. —Falo severa, sem temer a reação de Gab. —Para mim, após a morte de Kamés, a criança que nasceu antes do rei, meu único irmão sempre foiRamsés. Sempre fui a mais vais velha, a que deveria proteger Ramsés...

—Mas você nunca pensou em ter um irmão mais velho para te proteger? —Gab pergunta sugestivo e risonho.

—Sim. —Respondo secamente. —Mas não você. —Minhas palavras foram muito duras para Gab.—Nunca pensei que fosse participar de um possível incesto. Por que assim seria caso sua vontade fosse atendida.

—Mas no Egito já houve relatos de irmãs e irmãos que foram marido e mulher. —Gab brinca, todavia volta a sua seriedade ao me ver incrédula. —Mas você tem razão.

—Isso foi muito anos do Egito não precisar de aliados. —Falo. —Mas voltando ao assunto, não consigo ser nada sua, nem sequer me vejo te chamando de irmão.

—Eu entendo perfeitamente. —Gab fala um pouco magoado. —Não é para menos.

—Fico agradecida ao ver que entende. —Falo e sorrio falsamente para Gab. —E Radina? Ainda está presa?

—É melhor assim. Radina pode criar uma rebelião contra o reino. —Gab ressalta conformado com o paradeiro de Radina. —Henutmire, onde está a sua coroa? —Gab pergunta ao me observar melhor.

—Eu a deixei na sala do trono. —Falo ao imaginar Ramsés com a minha coroa em mãos, pensando no que vai fazer agora que o Egito não tem mais sua rainha novamente. —De toda forma ela não é mais minha...


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Notas finais do capítulo

GENTE! VAMOS PARA CANAÃ!



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