Zodíaco escrita por Ágatha


Capítulo 7
Déjà vu acontecem em horas erradíssimas


Notas iniciais do capítulo

Diana volta a narrar. (:



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Meu dia fora extremamente pesado, com tanta informação, tantos livros, tantas pessoas e tantas perguntas, que não queria ficar mais tempo na rua à noite. Começara a pensar que não estava tão ruim, ficar ali sentada na clareira esperando a fogueira ser acessa, e a maioria das pessoas já haviam me visto e cumprimentado, ou “finalmente conhecido”.

Até, é claro, um dragão pousar no recinto. O chão tremeu, assim como tudo: as pessoas, o fogo, as expressões, que por acaso foram as melhores. Alguns pareciam irritados, outros, assustados, talvez fossem tão novos quanto eu, outros permaneceram sérios, como o garoto que lançara as chamas ao alto. Fora uma das pessoas que me cumprimentou, curtamente. Apresentou-se como Vinícius e saiu. Usava um boné baixo virado para trás e moletom. Seus traços eram parecidos com os de Eric, talvez mais com os de Vitor, que também participa desse lugar. Nariz reto, com a ponta levemente inclinada para cima, algumas sardas no rosto, cabelo fino e castanho claro. Entretanto, assim como Eric, pouco importava apenas sua aparência, porque seus olhos guardavam coisas difíceis de decifrar. Alice me contara que era um dos Líderes, tendo por volta dos vinte dois anos.

Imaginei que haveria pânico, mas só houve pressa. Muitos se transformaram em animais e entraram na floresta. Portais foram criados no chão e várias pessoas, ou animais, começaram a entrar. Eric correu até mim e me puxou. Estava seguindo Alice até então. No momento que Eric segurou minha mão, Alice largou-me, transformando-se em gato do mato, sendo engolida pela escuridão da floresta.

Entramos na floresta e corremos alguns metros. Encostei-me em uma árvore assim que paramos. Alice me explicara um pouco sobre estados espirituais, e só então entendi o que Eric vivia fazendo.

Estado espiritual é algo que qualquer mago desenvolve. É a habilidade de voar, ou nadar, seu espírito por aí, conseguindo ver de outra maneira corpos, formas, tudo. Quanto mais longe formos, mais atenção nossas auras, nossos corpos reais, chamam, tornando-nos vulneráveis. Dessa forma, é possível entrar no Estado zoomórfico. Trata-se de quando seu espírito é fundido com o corpo de uma maneira acima do normal, possibilitando transformações em animais. Não trata-se do mais difícil, entretanto é o mais perigoso. Caso ocorra uma morte no estado zoomórfico, seu espírito morre também. Portanto, o principal não era aprender a transformar-se, a fundir seu espírito e corpo. Era não chamar a atenção, controlar seu poder no estado espiritual, apesar de estar muito longe.

E aparentemente Eric sabia fazer isso, a não ser que estivesse nos colocando em perigo. Ficara parado por um ou dois minutos.

– A gente tem que correr – ele disse então. – só até eu conseguir teleportar para a praia.

– A praia do sul? – considerando que estávamos entre a Casa Norte e Leste, havia a praia do Norte, mas ficava muito longe da Casa em si. A única Casa que se localizava na praia era a Sul.

– Sim, até a rampa eu consigo – ele diz, e começamos a andar. – não sei onde eles estão... E você não consegue correr.

– Claro que consigo – a princípio considero um desaforo dos grandes, mas então percebo que a floresta está muito escura. E mais densa. Eric provavelmente consegue correr aqui, eu não.

Sinto-me um estorvo do tamanho do universo.

– Vamos andando então. Acho que é melhor mesmo.

Voltamos a andar. Tento ficar alerta o máximo possível, mas parece inútil. São magos, tem uma visão muito melhor que a minha. Certa que também sou, mas vou acabar fazendo algo errado.

Volta e meia Eric para e corremos um pouco em certa direção, depois em outra. Tenho visão da rampa em um momento, e então paramos. Acho estranho não termos encontrado ninguém no caminho, pouco parecia um ataque. Entretanto ouvia gritos. Ouvia som do fogo, da água, do terror. Muito longe, mas os ouvia.

E então teleportamos em uma árvore. Eric me abraçou e entramos, mas ao contrário do que previ, não saímos em outro lugar vertical. Caímos na areia fina da praia. Ventava muito e o mar agitava-se. E ali, na praia, havia guerra.

Um dragão vermelho passa voando por nós. Outros rugidos surgem, magias e efeitos que nunca tinha visto antes. O mais incrível nem parecia o surreal, mas a força. Uma garota arremessa um garoto na água com tanta facilidade que parecia que ele tinha no máximo cinco quilos. Duas garotas lutam na areia perto da água, até uma delas controlar uma raiz, de uma árvore muito distante dela, a ponto de arrancar a árvore e ficar no nosso caminho. A raiz se desprendeu e enrolou-se na inimiga, embaixo de seu corpo, enforcando-a.

Vejo Juan correndo próximo a nós, e outras pessoas caindo na areia. Uma pessoa é arremessada da floresta, atrás da praia, em direção ao mar, de uma altura inacreditável. E tudo isso, por pior que parecesse ser, enroscou meu cérebro. Paro subitamente, com lembranças aleatórias muito parecidas surgindo e piscando, incomodando, tirando minha atenção. Eric grita meu nome, mas não consigo reagir. Estou parada, estou no chão. Mas não estava. Alguém jogou todo seu peso sobre mim e saímos rolando pela areia, quase chegando ao mar. A areia envolve meus olhos, não enxergo, apenas sinto, me debato, enquanto a pessoa tenta me segurar. Ela me dá um soco, mas não desmaio. Sinto a dor no rosto explodir, a água salgada batendo em meu corpo.

Algo brilha, quente, tão proximo de mim que sinto meus pelos do braço queimarem, e meu agressor sai de cima de mim. Alguns braços me seguram, reconheço Eric, e braços escuros, fortes. Juan.

Eles me ajudam, mas eu caio na areia, fraca. Caio, e tudo o que peço é para sumir, para sair dali.

Então caio novamente. Não no mesmo lugar. Em um piso desconhecido. Minha mente não para um segundo de colapsar, como se uma quantidade absurda de memórias estivessem voltando, não acontecimentos apenas, mas lugares. Lugares.

Sinto uma pontada de dor na lateral da barriga. Há certo tempo já sinto essa dor, mas o soco parece ter sido mais intenso.

– Você nos teleportou? – escuto Juan dizer.

– Não! – Eric responde.

Meus olhos estão fechando, meus ouvidos estão ficando mais aguçados, a dor lateja em diversos pontos. Eles me erguem com certa facilidade e me colocam em um lugar macio.

Hayle! – ouço a voz de Eric. Não me chama como Diana, mas como Hayle. Como amiga.

– Acorda ela, Eric – Juan diz.

– Ela está morrendo. – Eric diz, suplicante.

– Não, mas foi envenenada. Se você não acordá-la, ela dormirá e aí sim vai morrer.

Vejo a expressão de Eric, assustada. Ele toca minha testa, e sinto como se ar fosse colocado em meu pulmão com muita força.

Estou acordada, estou viva. Minha mente viaja em coisas totalmente aleatórias das que quero de fato pensar. Penso na floricultura de Eric, em cactos. No meu curso. Na saída dele, onde encontrava Eric. Em café, filmes, comida, mãe. Dragões.

Tenho lembranças estranhas, desse lugar. Da floresta. Começo a conseguir controlar meus pensamentos, e sei então onde estou. Na casa Sul, no segundo andar.

Algo acontece na lateral de minha barriga que não consigo mover minha cabeça para ver. Solto um grito agonizante e começo a chorar. Eric segura minha cabeça.

Viro meu rosto e vejo uma faca ensangüentada passar por algumas mãos. Ana também está aqui, nervosa, porém ágil.

Ignorar a dor não parece possível.

– Dê algum analgésico a ela – Ana diz.

Eric levanta-se, tirando a mão de minha testa. Sinto falta de ar. Levo a mão ao rosto e dói, mas é uma dor boa, porque quanto mais a toco, menos sinto a dor da facada.

– Ela está bem? – um garoto de corte meio militar, que não conheço, pergunta. Já o vira, mas não sei seu nome. – mal se mexe.

– Sim – Ana diz, enquanto mexe com Juan em meu ferimento.

Continuo tocando em meu rosto, tentando esquecer, em vão, a dor. Algumas pontadas e sei que estou sendo costurada. Lágrimas correm, mas as contenho, porque sei que vou enlouquecer se deixar a dor tomar conta de mim. Eric volta e sei que têm analgésicos. Estico a mão e os coloco na boca, engolindo sem água mesmo, quase engasgando-me, pateticamente. Sinto algo movimentando-se onde fora esfaqueada, uma mistura de formigamento e dor.

Escuto explosões. E alguns gritos.

Juan toma o lugar de Eric e me encara. Está um pouco machucado.

– Escuta, Diana – ele diz – nós te costuramos e te curamos também, mas os pontos tem que ficar. Amanhã já podemos tirar. – ele olha para o lado e vejo seu rosto brilhar. Explosões. – Vou curar seu rosto.

– Não precisa – levo a mão ao rosto. Minha voz está fraca, e dói mover o rosto – cuide dos outros.

Ele parece apreensivo. Olha ao redor um pouco, e então assente, deixando-me no sofá, despedindo-se com um beijo na testa.

Eric abaixa-se novamente ao meu lado.

– Preciso voltar pra lá. Olha, Hayle... tente manter telepatia. Nós ainda somos propícios a ter o elo, é só você respondê-lo. – ele me olha com medo.

– Me chame... De Diana. – consigo dizer. Minha voz parece algo completamente fraco e diferente do natural. Ele sorri um pouco e sai.

Tento me sentar no momento em que Eric sai. Não preciso ocupar tanto espaço. A casa está cheia e movimentada, e acredito que tem muito mais gente ferida. Tão pouco uma garota pequena, um pouco gorducha, senta-se ao meu lado. Está ferida no rosto, como se um animal a tivesse machucado. Ana a acompanha.

– Tudo bem, tudo bem – ela diz – calma, Elisa.

A menina chora. Deve ter no máximo quatorze anos. Estico minha mão e seguro a dela. Ela vira-se rapidamente para mim.

– Olhe para Diana, Elisa. Vou chamar alguém pra te ajudar, certo? Segura esse pano. – Ana deixa a menina pressionando o pano contra o rosto.

A menina olha para o chão, triste.

– Você sabe quem está nos atacando? – ela pergunta. Nego com a cabeça. – você está machucada como eu.

Levo a mão no rosto e ainda dói. Deve ter começado a ficar vermelho, logo ficará um hematoma.

– Sim – digo, com a voz fraca.

Alice aproxima-se da garota, tirando um pouco de água de uma bacia ali próxima. A água faz curvas delicadas como se estivesse no espaço, e chega ao rosto de Elisa. Ela estremece, então aperto sua mão com mais força. Logo a água transforma-se em sangue, mas quando Elisa vira para mim, apenas algumas cicatrizes permanecem em seu rosto. Um mero restício.

– Vocês deviam ir para os quartos – Alice diz, apontando para as portas no canto do grande cômodo. Mas já não estava prestando tanta atenção nelas. Um escudo enorme havia sido erguido protegendo a casa, e era possível vê-lo repelindo os ataques. Estava enfraquecendo.

Levanto-me e passo pelas pessoas, procurando a saída. A maioria saltava da sacada, mas deveria ter alguma escada, considerando que estávamos no segundo andar. Encontrei-a em um dos cantos, uma longa escada e muito fina. O primeiro andar era aberto e possuía alguns barcos. A entrada era um enorme portão de grades, o qual estava fechado, mas havia um portão menor, aberto. Tento correr até ele, algumas pessoas passando por mim, porém falho. A dor na lateral da barriga incomoda, e levo a mão aos pontos. Não é tão aguda quanto era há alguns minutos atrás, mas não deixa de doer.

A Casa Sul era estranha. Fechava de certa forma a praia, como se esta fosse uma espécie de golfo pequeno, onde a Casa Sul ocupa um dos extremos. Havia muitas pedras de ambos os lados da casa, bloqueando o caminho da Casa e o golfo em si, extenso. A única passagem terrestre encontrava-se por subir as pedras, mas o caminho era fácil. Vi um garoto em uma pedra mais alta, erguendo o escudo e o mantendo com ambas as mãos. Não sabia exatamente o que tinha em mente, mas no momento que uma chama atingiu seu escudo muito próximo dele, fazendo-o recuar e o escudo falhar, decidi que precisava ajudá-lo. Mesmo sem saber como.

Corro para a curta praia e começo a subir as pedras. O caminho era claro e fácil, então logo estava do seu lado. Tive que saltar uma pedra porque ele não estava só no caminho, e sim mais próximo do mar. Senti a dor dos pontos se aguçar, mas logo melhorara. O garoto tinha um olhar tenso e suava, cansado. Seus cabelos eram curtos e ele parecia ser mais novo que eu. Tinha lindos olhos claros, azuis.

Ergo uma mão e toco o escudo. Parecia uma mistura de formigamento com choque, então recuei. Toquei-o devagar. A área onde o tocava tomou uma fraca coloração rosada. Ele olha para mim, claramente assustado.

Algo atinge o escudo em nossa frente, e recuo, instintivamente. Ele continua segurando-o, mas a falha é inevitável. Olho-o novamente, e coloco ambas as mãos no escudo. O que acontece é inacreditável. A partir de meu toque, o escudo parece realmente fortalecer-se, suas cores ficam mais vivas, sua consistência ergue-se acima de nossas cabeças. E sinto-me forte. Forte como nunca antes.


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