Living For the Dead escrita por Lana Paulson


Capítulo 1
Prayers


Notas iniciais do capítulo

Desde que eu li As Crônicas dos Kane, fiquei com vontade de escrever um crossover (na verdade, vários, mas só rolou esse até agora) com PJO/HDO. E toda bendita vez que o Anúbis aparecia, eu só conseguia lembrar do Nico. Logo, acabei chegando à conclusão de que esses dois tinham que se encontrar de algum modo; e já que a ~morte~ é a principal semelhança entre eles, por que não?

SOBRE SPOILERS ↓

Se você não curte, mesmo os pequenininhos, e ainda não leu ACK ou HDO, recomendo não ler (mas não tem nada de mais).
Se você não liga, gosta de crossovers e, assim como eu, queria ver esses dois na mesma fanfic, vá em frente. ♥



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Nico nunca vira tantos corpos fora do Mundo Inferior, e isso não fazia parecer menos perturbador.

A guerra havia terminado, mas as fileiras de semideuses falecidos enegreciam as cicatrizes já deixadas por outras más épocas. Nem mesmo na tentativa de seu avô, o titã Cronos, de dominar o mundo, Nico havia tido de se preocupar com tantos funerais. Em tal ocasião, os próprios sobreviventes do Acampamento Meio-Sangue haviam realizado a maioria dos rituais e homenagens aos guerreiros caídos em batalha. Ele apenas comandara as bênçãos.

Dessa vez, gregos e romanos haviam se juntado, e juntos muitos haviam perecido. Filhos da Grécia e de Roma jaziam sobre a relva chamuscada das colinas, todos cobertos por panos brancos. Alguns tinham malhas de seus respectivos chalés sobre o peito, suas mortalhas, que seriam queimadas em apenas alguns minutos. Outros haviam sido coroados com espadas quebradas ou escudos rachados, as armas que lhes haviam acompanhado na batalha.

Alguns minutos. Era todo o tempo que Nico tinha. Alguns corpos já estavam ali há tempo demais, e ninguém queria prolongar as despedidas quando haviam tantas pessoas por quem prestar luto. Era difícil aceitar tão pouco para se despedir, e por isso ainda haviam ali algumas pessoas, gregos e romanos, ajoelhados sobre amigos e parentes, dando-lhes suas últimas bênçãos, embora eles não pudessem mais ouvi-los. Nico odiaria ser indelicado num momento como aquele, mas felizmente os semideuses compreendiam sua posição como filho de Hades e se retiravam sem que ele precisasse pedir. Alguns até o agradeciam por tomar conta das coisas. Como se preparar centenas de corpos de pessoas que tinham estado respirando apenas algumas horas antes para o fogo fosse um trabalho do qual ele devesse se orgulhar.

Hazel havia preferido ajudar a preparar as piras. Nico sabia que ela era forte, mas que não conseguiria encarar aquela cena do mesmo jeito que ele. Ninguém, com exceção dele e de seu próprio pai, conseguia. E talvez uma outra pessoa que ele conhecia, cuja tarefa era exatamente a mesma que ele empenhava naquele momento, sendo também a única conexão entre os dois. Ele se perguntou se ele também estaria preparando funerais naquele momento.

Nico se ajoelhou e estendeu as mãos sobre um corpo, e começou a cantar em grego. Era um cântico muito antigo e poderoso, o primeiro que seu pai havia lhe ensinado, e serviria para encaminhar aquelas almas ao Submundo sem contratempos.

Enquanto cantava, ele sentiu outra força juntando-se à sua. Não era como a energia mórbida que os corpos exalavam – e, sim, corpos mortos continham energia, apenas uma diferente da que os vivos possuíam, e que apenas um filho do Mundo Inferior muito treinado podia captar. Era uma energia forte demais para ser de um mortal; ao mesmo tempo vibrante e ancestral, como uma árvore de muitos anos de idade que continua dando frutos frescos. A energia de um deus.

Nico encerrou o cântico e abriu os olhos.

–Olá, Anúbis – cumprimentou.

O deus estava sobre um dos joelhos a alguns metros de distância, com dois dedos sobre a testa coberta de um falecido, olhos bem cerrados, imerso em alguma bênção ainda mais antiga que a que Nico acabara de proferir. Vestia-se de preto, como ele, e em geral, eram idênticos: pele clara e cabelos escuros. Quem não conhecesse e visse os dois juntos, pensaria que eram uma dupla de irmãos vampiros rebeldes. O que não era muito menos absurdo que a verdade.

Assim que terminou, Anúbis se levantou, e calmamente se encaminhou para o corpo ao lado.

–Pensei que precisasse de uma ajuda – disse ele, enquanto Nico se sentava sobre os calcanhares.

–Você vai confundi-los. Vão dar de cara com um cara azul e achar que o Mundo Inferior é uma brincadeira.

–Não estou mandando-os para o Mundo dos Mortos, Nico – disse Anúbis. – Nem poderia, de qualquer forma. Eles não são descendentes do Egito. Não podem topar com Osíris numa esquina do Duat ou terem seus corações pesados contra a minha pena.

–E você é um deus do Egito. Não pode descer ao Mundo Inferior e bater um papo com Hades no Jardim de Perséfone.

–Você sabe que eu sou uns dois mil anos mais velho que o seu pai. E, de qualquer forma, quando seus ascendentes invadiram as terras egípcias, eu aprendi uma ou duas coisas. – Anúbis deu de ombros. – Posso mandar almas penadas para o seu Submundo tão bem quanto você, no melhor estilo grego.

O comentário incomodou Nico, mas ele não demonstrou. Não podia discutir com um deus, muito menos quando ele vinha da maior civilização do mundo antigo.

Em vez disso, ele se virou e continuou os rituais.

–Como soube da guerra? Achei que estivesse ocupado demais com os problemas de encarnação do seu rei e sua serpente engolindo o sol – Nico disse, algum tempo depois, fazendo soar como se eles estivessem discutindo uma lâmpada queimada ou uma cerca que precisasse ser substituída.

Anúbis balançou a cabeça, como se esse assunto já o tivesse cansado. E provavelmente tinha, depois de tantos anos.

–Minha família é tão confusa quanto a sua – afirmou ele, o que Nico não duvidava. – Mas eu procuro sempre ficar de fora dessas desavenças, então, naturalmente, tenho mais tempo para me informar de outras coisas.

–Como as desavenças dos outros deuses? – Nico meio que sorriu. – Você é uma desonra para a sua família.

Anúbis encolheu os ombros, não ressentido.

–Seria uma desonra maior se eles soubessem metade das coisas que eu faço. Que bom que eles nem se importam.

Nico juntou as sobrancelhas.

–O que quer dizer com isso? Você é quase pior que Hórus no que diz respeito a ser bonzinho.

Anúbis se inclinou e fitou Nico. Os olhos dele lembravam algo ainda mais antigo que o Mundo Inferior que ele conhecia; lembravam algo tão atrás na linha do tempo que era quase primitivo. Era com o que Nico achava que o Mundo dos Mortos dele se parecia, embora nunca tivesse estado lá.

–Você sabe que eu teria ajudado na sua guerra, se pudesse – disse o deus.

–Mas não pôde – Nico respondeu, mesmo sabendo que ele estava sendo sincero. – E, mesmo que tivesse tentado e tido sucesso em convencer um único outro egípcio que fosse a lutar uma guerra que não era do seu povo, como pode saber que isso teria culminado em algo melhor? Quem garante que não teríamos o dobro de pessoas mortas aqui, agora?

Anúbis parecia saber que as palavras de Nico não eram nada mais que a verdade e se ressentia por isso. Nico apreciava a ajuda que ele tentava oferecer, mesmo não podendo – e nem devendo – oferecer. Era um dos poucos deuses que ele acreditava que ofereceria alguma ajuda verdadeira caso as coisas ficassem feias para o seu pessoal. E ele nem era grego.

–Infelizmente – disse Anúbis, e por um instante Nico sentiu como se ele tivesse lido seus pensamentos. – Infelizmente, não pude ajudar. Não importa o que você diga ou o que minha família iria pensar. Eu teria embalsamado todos os inimigos como múmias, se pudesse ter feito.

A ideia era tão ridícula que Nico sentiu um sorriso tentando se cravar em seu rosto. Tentando.

Ele ajeitou a mortalha de um semideus sobre seu peito. Era dourada, a cor das mortalhas do chalé 7, o chalé de Apolo. A lembrança de Octavian, descendente do deus do sol, se elevou em sua mente, e ele sentiu um gosto amargo na boca.

–Está acabado, Anúbis – disse Nico em voz baixa, porém firme, e surpreendeu a si mesmo com o quanto soava cansado e transtornado. Parou as preces por um minuto e deixou-se apenas sentir luto por todas as vidas perdidas, mesmo pelas que não mereciam. Anúbis não se pronunciou, compreendendo o momento de silêncio, e o aproveitou para fazer as próprias preces.

Depois de um tempo, Nico ergueu a cabeça e olhou para o céu.

–Vamos. Já está escurecendo. Não temos muito tempo. – Ele olhou para Anúbis. – Me ajude com os mortos, e eu vou te absolver de toda a culpa de não ter podido lutar conosco.

Anúbis assentiu, e eles deram continuidade aos rituais. Nico rezava a ambas as personalidades de seu pai, para os gregos e os romanos, e Anúbis reforçava os cânticos com bênçãos que ele mesmo havia aprendido. Vez ou outra, o deus mencionava algum ritual funerário de que Nico não tinha conhecimento, explicava suas origens e os costumes dos povos que os praticavam. Nico não se incomodava. Até preferia não ficar completamente em silêncio. Anúbis era, estranhamente, uma boa companhia.

Quando terminaram, o deus se retirou e esperou o filho de Hades comunicar a todos que os preparativos com os corpos estavam terminados. Enquanto os corpos eram transportados para o anfiteatro, Nico se esgueirou para a colina de onde Anúbis observava o movimento, e o deus lhe deu um sorriso.

–Fizemos um belo trabalho, Nico di Angelo. Uma dupla tão boa quanto gregos e romanos, não é?

Nico ergueu a sobrancelha.

–Sinto muito, mas seu nome não vai aparecer nos créditos. Ia arrumar mais problemas para mim do que para você, e, sabe, eu não tenho muitos deuses superpoderosos do meu lado.

–Poderia ser nós contra eles.

–Mumificando inimigos?

–Ou guerreando com espadas, como vocês, gregos, parecem preferir.

Nico assentiu, satisfeito.

–Vejo você na próxima tentativa de dizimação do planeta para um duelo de espadas, então. E é melhor você começar a treinar agora. Nunca sabemos quando um deus vai surtar e tentar dominar o mundo de novo.

–Feito.

Anúbis estendeu a mão e Nico a apertou. Ele esperou que o deus dissesse mais alguma coisa, mas ele simplesmente se desfez em fumaça assim que suas mãos se soltaram, deixando-o com a desconfortável sensação de estar tagarelando com o vento.

–Nico! – ele ouviu chamarem-no lá de baixo. Virou-se, e Hazel corria colina acima.

–Oi. Eu já estava indo para começar. Já levaram todos?

Hazel assentiu apenas uma vez.

–Já vamos começar. Eu só queria perguntar antes... – Hazel apertou os dedos. – Como você conseguiu? Tantas... pessoas... e ainda nem anoiteceu. Eu estava preocupada que tivesse te atrasado por não ter vindo ajudar, mas você se virou muito bem.

Nico pensou em contar a sua irmã sobre os egípcios, sobre Anúbis e sobre como ele tinha encontrado no deus alguém que entendia o que era viver para os mortos. Mas não disse nada. As feridas da guerra ainda eram muito recentes, e eles teriam muito tempo depois para conversar sobre esse e outros mil assuntos. Agora, Nico precisava assumir o comando novamente.

Ele passou um braço pelos ombros de Hazel e se virou com ela na direção do anfiteatro.

–Eu tive uma ajuda.

–Papai... Quero dizer, Plutão veio ajudar?

–Não, não ele. Você vai conhecê-lo qualquer dia desses. Acho que vai gostar dele.

–Se ele tem coragem para fazer o que fez, eu já o admiro muito. Vocês ajudaram muitas pessoas.

O filho do deus dos mortos sorriu para a irmã.

–Nós só fizemos o nosso trabalho.


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Notas finais do capítulo

Nem shippo eles. Imagina.



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