Experimento 09 escrita por LS Brown


Capítulo 1
Não Me Substime


Notas iniciais do capítulo

Fala aê galera! Depois de muitos e muitos pedidos (mentira, foi só minha amiga me enchendo) , resolvi meter as caras e postar minha primeira fic.
Sejam bonzinhos comigo, espero que gostem!



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Eu vagava pelas ruas escuras da cidade. Já passavam das 3 da manhã. Eu estava praticamente sozinha, exceto por alguns mendigos que dormiam pelos cantos das vielas e se abrigavam nas portas das lojas. Eles não iam me incomodar, e eu, por minha vez, também não os incomodaria. Eu vagava tranquilamente. Meus passos eram confiantes e precisos. O eco de meus coturnos soavam abafadamente ao tocar na rua aspera. Eu andava no meio da rua sem me preocupar. Não havia perigo. Na verdade não havia perigo em minha vida a tanto tempo que eu até me esquecera.

A velha bolsa que sempre carregava comigo me fazia lembrar dos velhos tempos. Ela estava surrada, nada parecida com o que já tinha sido um dia. Ela estava como minha vida na verdade. Surrada, desgastada, apagada, sem vida. O que fizeram comigo fora terrível. Tinha sido um golpe que eu não estava esperando, como um tiro nas costas. Sempre trabalhei muito bem, sempre me destaquei dos demais. E acho que esse foi meu maior erro: ser boa demais. Ser diferente. O diferente assusta, amedronta. Para eles o mais fácil seria descartar o desconhecido. Eliminá-lo de alguma forma. E ali estava eu: vagando sem rumo, como a minha vida.

Eu não tinha nada. Eu não fazia nada. Estava estagnada naquele estado a quase um ano. Eu era uma inútil. Tentei arrumar outro emprego, mas não me encaixava em nada. Por mais que tentasse. Era tudo muito entediante e fácil. Estava acostumada a adrenalina, a dificuldade. Tentei até entrar para a polícia local pensando que poderia me distrair ali, que por algum motivo ali lembraria meu antigo trabalho, porém foi um completamente decepcionante. Eu queria fazer aquilo que fazia antes, ser posta à prova, ao perigo. Ali tudo era extremamente fora desse contexto. Nosso papel era somente tirar bandidos e alguns raros traficantes das ruas e leva-los para delegacia. Era entediante. Não havia uma perseguição sequer! O máximo era uma corridinha de dois quarteirões.

Não sobrevivi aquilo. Em dois meses pedi baixa e sai. Se estivesse ao meu alcance, teria saído antes sem pensar duas vezes. Entretanto existia esse tempo limite, então fui me virando como podia. Tentei me encaixar à vida normal de todas as maneiras. Antes de tentar ser policial, tentei trabalhar consertando celulares e outros aparelhos eletrônicos numa pequena agência no centro. Foi a pior escolha e decisão da minha vida. Como eu tinha parado numa lojinha capenga e abafada do centro da cidade consertando celular? Eu não conseguia entender!

Lembrar desses pequenos fatos me fez rir sozinha. Um vento frio e gélido atravessou a rua balançando meus longos cabelos. O silêncio da rua me preenchia. Sempre fora uma pessoa de poucos amigos. Na realidade, os únicos que tinha haviam ficado para trás, junto com meu trabalho. Não que eu não quisesse fazer contato com eles. Eu simplesmente não podia. Além de ser um risco para minha vida, seria para a deles também. Eu tinha que sumir do mapa, e isso queria dizer que teria de sumir da vida deles também. No começo, confesso, que acreditava que um dia teria minha antiga vida de volta. Que eles reparariam no erro que tinham feito e que me buscariam em seus carros pretos, implorando-me por desculpas e devolvendo meu distintivo e meu velho emprego. Mas o tempo passou e essa ideia maluca e decepcionante ficou para trás junto com todo o resto.

Tinha andado tanto tempo distraída que nem reparara no lugar que estava. Estretei os olhos e olhei o local em volta. Eu estava exatamente no centro da cidade. Havia o banco, a igreja, a biblioteca, a praça. Por um instante pude ver vultos correndo pela praça. Uma coisa que tinha aprendido em meus anos de trabalho era que uma breve intuição ou qualquer outra coisa do gênero nunca deveria ser deixada de lado. Corri agachada até um pequeno beco que ficava ao lado da biblioteca . Agachei-me na sombra e me pus a observar a rua mais atentamente desta vez. A praça era muito grande e haviam muitas árvores, o que atrapalhava um pouco meu campo de visão. Estretei os olhos e forcei mais a vista. Eles estavam ali. Eu os tinha visto.

Depois de poucos minutos eles tinham tomado conta das ruas. Escondidos, é claro, mas estavam ali. Estavam atrás dos poucos carros que jaziam estacionados nas ruas, das árvores da praça e das calçadas e em cima de alguns prédios específicos. As armas potentes e enormes dos atiradores de elite dos prédios estavam apontadas para a biblioteca. Havia alguma coisa lá dentro. E alguma coisa me dizia que aqueles caras não eram nem da C.I.A, nem do F.B.I, e nem de nenhuma organização desse tipo. Mesmo assim eram tão profissionais e bem preparados como eles. Todos estavam armados até os dentes com fuzis e metralhadoras. Lazers vermelhos começaram a passear pelo prédio branco. Seja lá o que estivesse lá dentro eram importantíssimo. Naquele momento percebi que eu tinha saído do meu trabalho, porém, ele não tinha saído de mim. Uma voz insana gritava enlouquecidamente para eu entrar. Fiquei ali os observando por alguns segundos. Decidi entrar.

Levantei-me lentamente e não completamente. Estava tão encostada na parede que quase éramos uma só. Tinha que ter alguma janela ou porta que podia ser arrombada. O beco era muito escuro o que dificultava o processo. Após alguns segundos detectei uma pequena janela no segundo andar. Tinha que ser aquela. A mais ou menos um metro dela no chão havia uma grade que dividia o beco em dois. Tomei folego por alguns segundos. Tinha que ser agora, se não desistiria daquela loucura. Suor pingava de meu corpo gelado. Levantei rapidamente e corri o mais rápido que pude em direção à grade. Tomei impulso com os pés e mãos nos pequenos buracos dela. Uma leve dor percorreu por minhas veias ao agarrar as grades. Mesmo assim coloquei força em meus braços e me impulsionei para cima. Minhas botas pararam vacilantes no cilindro médio que compunha a base da grade. Agradeci imensamente aos Céus por ter optado usar cuturno naquela noite. Votei a ter equilíbrio. Ali, parada ali, eu me senti viva novamente. Pude sentir a adrenalina percorrer por todo meu corpo. Pude sentir o sangue quente correr em minhas veias. Eu podia pular daquela grade e ir para minha casa, mas sentia que aquilo não era o certo a ser feito. Eu tinha que entrar. Eu tinha que tentar.

Virei-me na direção da janela. Nela havia um beiral grande o suficiente para me caber sentada, uns trinta centímetros, mais ou menos. O pulo deveria ser preciso para eu agarra-lo e não me espatifar no chão. Levantei-me devagar apoiando-me na parede a minha frente. O beco era estreito, o que fazia a grade ser estreita. Eu precisava de impulso. A barra da grade parecia ter uns três metros no máximo. Eu tinha espaço o suficiente. Andei calmamente até o final da grade, até encostar na parede do prédio vizinho. Tomei folego novamente. Olhei para rua e para os prédios em busca de movimentação. Eles continuavam parados, observando, e pareceram não notar minha presença ali. Eles pareciam estar esperando por ordens. Seja quem for seu líder, ele estava calculando um momento exato. Olhei para janela, agora a uns cinco metros de mim. Fechei os olhos, apertando-os bem. Vamos, coragem! Você já fez coisa pior! Com um forte suspiro, jogo minhas pernas para frente e obrigo-as a correrem e a manterem o equilíbrio sobre a barra.. Foi nais fácil do que eu pensei correr pela barra. Eu só precisei de dois passos para ficar no local exato. Quando cheguei a mais da metade da grade dei um pulo com todas as forças que consegui dar, com todo impulso que podia. Voei no ar por uns rápidos segundos até meus braços se chocarem primeiro ao beiral, agarrando-o com força. Senti o sangue fugir de minhas mãos de tanta pressão. Meu rosto e meu corpo se chocaram com força contra a parede logo em seguida. A dor se instalou por todo meu corpo. Não tinha tempo de senti-la intensamente, eu precisava subir.

Meus braços tremiam por suportar o peso de meu corpo. Minhas mãos estavam molhadas de suor. Eu ia cair. Vamos! Vamos! Senti o gosto salgado do suor que caia rapidamente de minha testa. Apertei o beiral de mármore com força. Colei pressão em meus braços fazendo força para cima. Me movi lentamente até ter altura o suficiente para colocar um braço inteiro para cima. Fiquei de bruços na borda me aguentando por um pequeno tempo. Já recuperada da fadiga, coloquei força no braço direito, que aguentava todo o peso de meu corpo, e fiz impulso no resto do corpo para me sentar, como alguém saindo de uma piscina. Fiquei sentada no beiral, mesmo sendo estreito. Minha respiração estava pesada e tensa. Uma parte da missão estava concluída, agora eu só precisava abrir a janela.

Virei-me para observa-la mais de perto. A tranca estava velha e enferrujada. Peguei minha bolsa, que ficava pendurada na lateral de meu corpo. Eu sabia que ele estava em algum lugar ali. Depois de revirar os objetos presentes em minha bolsa eu o achei. O canivete prata que Hobbs tinha me dado em meu primeiro dia. 'Use-o sempre que estiver em apuros!", ele dissera. Acho que é uma ótima ideia usa-lo agora! Virei-o na parte das facas e puchei de sua cova a mais afiada entre as que ele oferecia. Ela era fina e pontiaguda. Enfiei-a na frecha, tentando achar o gancho da tranca. Quando o senti, empurrei a faca para o lado, afim de fazer força o suficiente para fazer uma frecha. Uma frecha da largura de um dedo se abrira, e, para minha surpresa, não havia nenhum tipo de cadeado, nem outra tranca reserva me esperando. Guardei o canivete de volta na bolsa e terminei de abrir a janela. Tive um pouco de dificuldade por conta de minha posição e por as rampas que conduziam as janelas para os lados estarem um pouco enferrujadas. Tentei fazer o mínimo de ruído possível. Acho que foi a primeira vez que ela tinha sido aberta em anos.

Pulei como um gato para dentro do prédio. Estava num corredor, que era ilumidado apenas com a luz da rua que saia pela janela. Havia anos que eu não vinha à biblioteca. Não me lembrava exatamente onde ficava cada coisa. A biblioteca não era grande nem nada. Ela estava na cidade desde os primórdios. Porque a biblioteca? Era estranho. Só agora, ali dentro parei para analisar. Porque a biblioteca? Tudo que estava ali era de domínio público. Qualquer um tinha acesso. Um pequeno ruído tirou-me de meus pensamentos e me deixou em estado de alerta. Havia alguém ali dentro. Andei na direção de uma passagem sem porta que me levava para fora do corredor. Entrei na parte superior da biblioteca. Ali tinha uma boa visão da biblioteca, então tratei de me situar.

A entrada principal ficava a minha esquerda. Ela havia mudado um pouco desde a última vez em que estive lá. Estava mais moderna e haviam mais livros. Muito mais. As prateleiras agora se suspendiam pelas paredes até a altura do teto. Todas elas estavam abarrotadas de livros. Ela era,praticamente, feita inteira de uma madeira pesada e escura: as mesas para leitura, que ficavam no centro, todas as estantes de livros, o balcão do recepcionista. O cheiro da madeira e de livros velhos empregava o local. O segundo andar era composto por corredores que serpenteavam as paredes laterais do prédio deixando o meio completamente livre e completamente a vista da abóboda de vidros coloridos que pendiam do tetos. Nesses corredores mais estantes enormes e pesadas preenchiam o local com mais livros velhos em empoeirados. Andei até o beiral do corredor e me encostei na grossa grade de proteção, também feita de madeira. Fiquei ali em silêncio constante afim de ouvir qualquer sinal do ruído novamente. Depois de alguns minutos em inércia, ouvi ruidos novamente e eles viam de outra ala, mais aos fundos, da biblioteca. Desci as escadas lentamente, me concentrando para não sair das sombras. Os agentes lá fora poderiam entrar a qualquer momento, e eu deveria estar preparada ou para me esconder ou para fugir.

Andei lentamente e concentrada encostada nas estantes. Tentei pisar o mais levemente possível se não meus coturnos me denunciaram. Andei em direção a grande passagem que levava para outra enorme sala. Ela tinha vários e vários corredores de estantes. Achar qualquer coisa ali, até mesmo um simples livro, demoraria muito tempo. Coloquei novamente meus ouvidos em prontidão. Dava pequenos passos na direção em que supostamente eu achava que o som tinha vindo. Eu estava perdida naquele labirinto de livros. Vamos, faça algum barulho! Eu sinceramente não achei que minhas preces poderiam ser atendidas. Um estalar agudo como o de um metal pesado caindo no chão preencheu a sala. Eu estava indo pelo caminho certo. Dobrei o próximo corredor lembrando de onde o som ficara mais alto. Estava lá atrás. Acelerei o passo em busca de encontrar logo o que estava procurando, seja lá o que for. Os livros passavam como vultos a medida que eu acelerava mais. Eu queria estar ali, mesmo sendo complemente louco de minha parte.

De repente, o autor dos sons aparecera na minha frente. Ele estava concentrado e não notara minha presença. Ele era grande e forte. Seus braços eram enormes, super malhados e se exaltavam a medida que ele fazia mais força. Ele puxava algo da parede. Haviam alguns livros espalhados pelo chão. Ao seu lado um escudo jogado de cabeça para baixo, acho que dali havia partido o som que o entregara. Ele estava concentrado demais. Ele bufava a medida que fazia mais força para puxar o pesado tijolo preso a parede. Só agora tinha percebido que havia pedaços dos azulejos jogados pelo chão que antes estavam preso as paredes. Eu tinha que alerta-lo que estavam vindo pega-lo. Só ali parada, o observando que minha fixa tinha caído. Porque eu estava ali? Porque queria alerta-lo? Eu não tinha tempo para responder aquela pergunta, mas eu confiava naquele homem mais do que nos agentes lá fora. Algo me impulsionou a ajuda-lo. Era um risco que eu estava disposta a correr.

-Hey! - gritei do lugar que estava. Com o susto, ele puxou o tijolo com uma força brutal e rapidamente o mirou em minha direção pronto para jogando-o com uma força monstruosa em minha direção. Por sorte, meus reflexos funcionavam como antes e estava alerta o suficiente para me desviar do enorme pedaço de tijolo.

-Quem é você? - a voz dele era precisa e poderosa. Ele estava preparado para um combate.

-Calma, só estou tentando ajudar você! - digo me aproximando, mantendo as mãos onde ele pudesse ver.

-O que faz aqui? - ele olhava freneticamente para mim. Ele estava nas sombras, não pudia ver seu rosto. Ele usava uma calça jeans azul, e estava com um casaco preto. O capuz em sua cabeça.

-Olha, eu estava andando na rua quando um bando de agentes sercaram o prédio! São vários e vão entrar aqui a qualquer minuto!

-Então saia daqui enquanto há tempo! É perigoso, não devia ter entrado! - ele parecia um policial falando com uma garotinha pobre e indefesa. Percebeu que não ia ser nenhum tipo de ameaça, ele se vira voltando a fazer o que estava fazendo. Fiquei com raiva.

-Olha eles são muitos...

-Eu dou conta do recado sozinho! - ele me interrompe ainda olhando para o pequeno buraco onde antes jaziam os tijolos. Ele pôs as mãos no vazio da parede oca em busca de alguma coisa. Instantes depois ele retira um pequeno baú de madeira do tamanho de um livro de dentro da parede. De onde quer que sejam aqueles agentes eles estavam atraz daquilo também - ainda está aqui? - ele diz após se virar em minha direção.

-Não vou sair daqui! Tem que me explicar...

-Hey, hey, hey, eu não tenho que te explicar nada! Some daqui! - ele diz contrariado, se aproximando e tirando o capuz. A luz fraca da janela iluminou seu pálido rosto. Sua face carregava uma expressão dura. Seu maxilar estava contraído. Seus olhos eram de uma azul intenso. Seus cabelos louros jaziam num pequeno topete bem estilo anos 60. Ele me olhava friamente.

-Não vou embora! - protestei - você não é páreo sozinho contra aqueles caras! Não tem chance! -Digo com convicção. Ele ri com desdém. Seu rosto fica ainda mais lindo.

-É perigoso demais pra você! Saia pelo mesmo lugar que entrou e vá pra casa! Só está me atrapalhando aqui! - ele disse girando os calcanhares, andando até o final do corredor onde tinha uma pequena mesa quadrada de madeira. Não, eu não dei meia volta e fui embora. Eu o segui. Ele se sentou na cadeira e analisou o pequeno baú. Ele era rustico e estava mofado. Havia um pequeno cadeado feito de ouro puro - suponho isso, pois o cadeado brilhava em meio ao mofo e fungos que se espalhavam pelas paredes do baú - o trancando fortemente. Ignorando o cadeado, o homem põe-se a puxar a tampa do baú. Ele era incrivelmente e absurdamente forte, afinal ele puxara um tijolo acimentado da parede sem fazer muito esforço. Porém, por mais que tentasse a caixa não se abria. Acho que ela tinha sido feita a prova de rombos. Ele tinha que ter a chave.

-Você não vai conseguir abri-la!

-O que está fazendo ainda aqui? Saia!

-Os agentes! Eles vão chegar a... - então fui interrompida por um estrondo que vinha da porta principal da biblioteca.

-Droga! - ele grita enquanto pega o pequeno baú e corre na minha direção - precisa sair daqui! - ele grita pegando em meu braço e me conduzindo de volta a onde estávamos. Nós corremos desesperadamente até o escudo. Ele o pega com a maior facilidade do mundo, mesmo o escudo aparentar pesar horrores - precisa sair daqui! Acha que consegue sozinha? - ele falou como um soldado em campo de batalha. Treinado para dizer aquilo.

-Vou ajudar você, já disse! - digo. Não sabia o que me levava a querer ajuda-lo. Eu simplesmente sabia que eu tinha que fazer aquilo. Mesmo arriscando minha própria vida. Uma carreira de homens preencheu a ala principal. Podia ouvir seus passos percorrerem a sala e seguindo em nossa direção. Uma pequena listra de fumaça começou a preencher a sala onde nos encontrávamos. O homem do escudo olhou para frente e olhou para mim como se eu fosse um peso, um encosto que ele deveria carregar. Ele me puxou novamente pelo braço e saímos a passos largos em direção a outra sala.

Essa era ainda maior do que a principal, com ainda mais estantes de livros e mais mesas. Pareceia ser uma ala nova. Ela fedia a coisa nova. Sua estrutura era idêntica a da ala principal. Seguimos até a escadaria indo para o segundo andar. Paramos de frente para grande passagem que haviam passado a poucos minutos. Ela era ainda maior que a primeira e estávamos a mais de trinta metros de distância dela. Aquela era a última ala da biblioteca.

-Eu irei distraí-los - ele avisa soltando meu braço, voltando para frente - e você se esconde em algum lugar! Quando isso terminar você sai do prédio! - ele se vira novamente para mim e olha dentro de meus olhos, seus olhos azuis tempestuosos - tem que me prometer que não contará nada do que viu aqui a ninguém! - ele suplica.

-Não irei me esconder em canto nenhum! - digo olhando para a porta. Os passos estavam mais perto. Eles marchavam rapidamente em nossa direção. Era agora. Ignoro-o e saco uma arma que jaziam presa na parte de trás de minha calça. Era uma calibre 32. Eu sempre andava com ela. Por algum motivo idiota. Acho que era o mesmo que me fazia acreditar que eles voltariam para me pegar. Eu me sentia protegida e em casa com ela. Bem, ela me seria útil naquele dia.

Eu não tinha mais permissão para portar uma arma, entretanto ninguém além de mim sabia da existência dela, até aquele momento. O homem me olha boquiaberto. Ele não esperava aquilo de mim. Na verdade ele esperava que eu saísse correndo para me esconder debaixo de uma mesa, morta de pavor. Miro na porta e fico a espera dos agentes. Rezo para não ter tirado os carregadores reservas da bolsa.

-Só espero que você seja o mocinho! - digo sem tirar os olhos da porta. Eles iam entrar a qualquer momento. E não seria para conversar. O homem colca o escudo de prontidão. Ah! Um escudo! Não tinha algo mais útil? Pergunto mentalmente. Ficamos sem respirar, esperando-os.

Trinta segundos depois, corpos pretos portando fuzis de todos os tipos e tamanhos começam a invadir a sala. Não dou a eles tempo de nos localizar, começo a atirar nos primeiros que entram. Minha mira ainda era precisa. Corpos e mais corpos que iam adentrando à sala caíam no chão automaticamente logo ao entrarem em meu campo de visão. Alguns poucos tinham tempo de atirar, mas não conseguiam nos acertar, pois não sabiam de onde os tiros estavam partindo. Depois de não sei quantos tiros minhas balas acabam e tenho que procurar na bolsa o carregador. Esperamos por tiros, mas nada nos atingia. Eles haviam sumido. Olho aflita para o homem ciente de que mais homens estariam naquela sala em menos de alguns segundos. Ele me retribui o olhar levantando o escudo para nos dar cobertura. Queria soca-lo forte no rosto! O que uma droga de um escudo podia fazer?!

Não demorou muito até eles entrarem, agora em maior quantidade, na sala novamente. Eu remexia a bolsa rapidamente. Onde estavam aquelas drogas de carregadores?! O som de tiros preencheu meus ouvidos. Fechei os olhos crente de que iria padecer ali mesmo. O homem com uma rapidez impressionante se pôs na minha frente com o escudo nos protegendo. As balas batiam na carcaça do escudo e tilintavam caindo sem força no chão. Praguejei baixo. O que diabos era aquilo? Aquilo parava balas! Balas de fuzil! Ele segurava firmemente o escudo o forçando para frente. Não parava de ouvir tiros e passos, e tiros e passos. Eles eram muitos. Muitos. Não podíamos fazer nada.

O homem forçou-me a andar para trás. Os tiros nem sempre nos atingiam. Saímos do campo de visão deles. As balas agora atingiam os livros das prateleiras. Folhas e mais folhas, livros e mais livros voavam pelos ares. O bom era que aquilo nos protegia deixando-nos fora do campo de visão deles. Nos abaixamos com o escudo a nossa frente. Estávamos próximos. Muito próximos. Podia sentir o calor irradiando de seu corpo. Sua respiração pesada e rápida. Seu alito doce chegando a meu rosto a cada inspirada. Sua respiração seguia um ritmo constante e rápido. Ele não estava cansado. Ele estava nervoso, aflito. Eu estava a poucos centímetros de sua boca. Estava tão perto de seu rosto que podia ver o suor descer de sua testa pelas laterais. Ele era lindo. Mesmo naquele estado patético.

Fiquei perdida olhando para ele. Por um instante senti o tempo parar ao meu redor. Por algum motivo eu confiava naquele homem. Eu poderia me jogar de um penhasco se ele jurasse que me seguraria.

Eu só podia ter perdido o juízo. Quem em sã consciência confiaria num desconhecido? E não, não era por sua beleza! Eu não era tão fútil a esse ponto! Era somente algo dentro de mim que gritava e dizia isso. E eu estava determinada a seguir aquela voz.

Depois daquele pequeno surto voltei a procurar o carregador reserva. Não que eu achasse que ele resolveria nossos problemas e que os deteria, mas nós tínhamos que tentar. Minha bolsa tinha tudo que eu precisava. E não se tratava de maquiagens e espelhos, ou coisas desse tipo. Eu a usava em meu antigo trabalho, então ela estava repleta de coisas que eu precisava usar lá. Além das coisas é claro que eu roubara de lá.

O canivete era um dos mais diversos apetrechos que tinham ali: haviam facas, cordas, carregadores para minha pistola, um cabo contendo diversos tipos de entrada para todos os tipos de aparelhos existentes no mundo, um aparelho antigo de gps, um canivete de chaves de fenda, uma arma de choques e uns outros brinquedinhos que davam choques que poderiam derrubar um cavalo, algumas bombinhas de gases tóxicos, sprays de pimenta e outros, um netbook que eu tinha roubado da central antes de sair, e uma granada de alta precisão, a G360. Isso! Tratei de procura-la por entre os objetos.

-Isso são horas de se maquiar?! - ele pergunta ironicamente. Sua expressão está compenetrada. Ele deveria estar bolando um plano. Ignorei-o e continuei a procurar a granada.

Depois de alguns instantes tateando a bolsa eu a achei. Eu a tinha roubado das coisas de Hobbs, era para ser testada ou algo do tipo. Eu não fazia cerimônia quando ia pegar as coisas dos lugares. Se eu achava que me seria útil, eu pegava. Ela era bem maior que as granadas convencionais. Lembro de ter ouvido o técnico prometer a Hobbs que seu poder de destruição era tamanho que ela poderia abater um tanque. Os agentes tinham parado de atirar, eles deveriam estar recarregando as armas. Tirei a granada da bolsa e mostrei-a para o homem. Ele me olha incrédulo. Não precisei falar nada, ele havia entendido meu plano. Em seu rosto pairou um ar de alívio misturado com incerteza. Ele olhou em meus olhos, respirou fundo e pegou minha mão.

Levantamos cambaleantes. O escudo em seu braço esquerdo pronto para nos proteger das balas. Logo que nos pusemos de pé os tiros voltaram. Ele começou a correr puxando-me logo atrás dele. Até aquele momento eu só tinha pensado na granada e que ela acabaria com os agentes, mas e nós? Eu não tinha pensado nisso. Por nenhum momento pensei numa rota de fuga nem nada do tipo. O homem pareceu não se importar muito com isso, ou ele tinha alguma espécie de plano ou estava pronto para morrer.

O corredor era grande. Corríamos o mais rápido que podíamos. Para o homem, estava a função de nos proteger. Para mim, de acionar e jogar a granada.

Quando chegamos a mais ou menos metade do corredor percebi que alguns guardas estavam subindo as escadas para atirar no mesmo andar. Era agora ou nunca. Levei a granada que tinha o tamanho de uma maçã à boca. Tentei por uns instantes procurar o pino. A movimentação dificultava minhas ações. Eu tinha que andar rápido antes que os agentes subissem toda a escada e antes que o corredor acabasse.

Quando finalmente achei o pino, coloquei-o entre os dentes e o puxei com força. Ela estava assionada. Mirei em qualquer espaço e a arremecei, jogando-a por cima do homem com escudo. Cuspi o pino com foça no chão. Um gostinho azedo de metal preencheu minha boca. Agora que eu tinha me livrado da granada, o homem pões-se a correr mais rápido. Fiquei aflita. O corredor estava acabando. Quanto mais perto do fim chegávamos mais rápido ele corria. Ele puxava meu braço com força, fazendo as juntas de meu ombro começarem a doer. Quando finalmente prestei atenção a minha frente vi o plano que o homem bolara.

Havia uma janela. Na verdade, havia uma espécie de vitral colorido no fundo do corredor. Aquela ala era repleta deles. Eles eram grandes de tamanho indo até o teto e tinham mais ou menos dois metros de largura. Corríamos desenfreadamente na direção dele.

Pelo que conhecia de vitrais eu supunha que eram feitos de vidro grosso, reforçado. Nós acabariamos batendo no vidro. Talvez ele quebraria, mas a dor e os estragos físicos que nos deixaria, iam ser grandes. Sem contar que estávamos no segundo andar. Aquele plano inteiro era suicídio! Mas ele não parava. Acelerava ainda mais. Tentei me desvencilhar de sua mão, mas era inútil. Ele me prendia forte.

Estávamos a poucos metros de chegar no vitral quando os guardas alcançaram o segundo andar. Uma onda de tiros nos atingiu por trás. Cadê a droga da granada?! Pelos meus cálculos ela já deveria ter estourado levando tudo pelos ares.

Quando menos espero, o homem pula o mais alto que consegue e faço o mesmo logo atrás dele. Ele posiciona o escuto a sua frente, mirando-o no vidro. Esperei ser jogada para trás, mas foi exatamente o contrário. O escudo quebra o vidro com uma facilidade tremenda. O ruido de vidro quebrado soa em meus ouvidos. Pedaços coloridos de vidro voaram por todos os lugares. Alguns deles passaram com as pontas afiadas em meu rosto, mas eu não sentia dor, estava em estado de êxtase. Quando estávamos em queda livre o homem posiciona habilidosamente o escudo abaixo de seus pés e me pega no colo. Esperei atingir o chão com tudo até eu ouvir o barulho da G360.

Com o impulso da explosão nossos corpos foram jogados para frente com uma força esmagadora. O barulho foi ensurdecedor. Os outros vitrais e vidros da biblioteca explodiram, aumentando ainda mais o barulho. Pude sentir o ar quente da explosão por toda minha pele. Tudo estava pelos ares. Papéis queimados voavam para fora do prédio.

O homem e eu fomos arremessados para a rua. Voamos cerca de dez metros de distância da biblioteca. O impacto com o chão fez minhas entranhas se emaranharem e pularem dentro de meu corpo. Estávamos protegidos de nos ralar no chão pelo escudo. Deslizamos em cima do escudo como se estivéssemos sobre um skate. Fagulhas saíam do chão quando o escudo o tocava. Além disso uma pequena rachadura rasgava a rua a medida que nos arrastávamos sobre ela. Eu literalmente me odiei por ter odiado aquele madilto escudo. Percorrermos cerca de mais um metro em cima do escudo até ele finalmente perder força e parar.

Eu estava tonta. Tudo girava a meu redor. Não sentia meus braços nem pernas. A anestesia que a adrenalina causara em meu corpo havia passado. A dor pairou sob mim por completo. O homem se levantou cuidadosamente comigo em seus braços. Me pôs no chão sem fazer força. Meu corpo inteiro sentiu a dor do simples toque de meus pés no chão. Eu não tinha controle sobre meu corpo. Ia desabar no chão.

Então o homem desconhecido me segura com suas mãos fortes. Não entendia o que estava acontecendo comigo. Meus ouvidos zuniam por causa do barulho da explosão. Minha visão estava turva.

-Temos que sair daqui! - ele grita alto em meu ouvido, fazendo o zumbido aumentar ainda mais. Acho que seus ouvidos também haviam sido comprometidos. Mantendo-me ainda apoiada em seus braços, apenas concordo com a cabeça.

Ele tenta me fazer andar em vão. Eu ainda não tinha o controle de minhas pernas. Ele percebe pelos passos vacilantes que eu não ia conseguir andar,então me pega no colo com uma facilidade enorme. Como se eu fosse uma cadeira leve, e como se a tarefa de me levantar fosse a coisa mais fácil do universo.

Me senti uma idiota por não conseguir fazer coisas simples, como andar. Mas eu não conseguia. Por mais que tentasse. Por mais que obrigasse meu corpo a andar ou ficar de pé ele não me obedecia, pelo menos não da maneira correta. Eu me sentia protegida em seus braços, então não protestei para descer. E ele tinha razão, tínhamos que sair dali. Poderiam chegar mais agentes ou a polícia, ou até mesmo a C.I.A. e eu não queria estar ali para explicar toda aquela bagunça quando eles chegassem.

Seu escudo jazia no chão onde paramos. Com um pisada ele faz o escudo pular do chão. Automaticamente, ele é sugado para um dispositivo em seu pulso direito, como imãs. Ele o prende em suas costas deixando seus braços livres para me carregar. Com o escudo recuperado não há nada que nos prenda ali. Ele começa a correr. Pensei que finalmente meu peso o atrapalharia, ou o cansaria, mas nada parecia o incomodar. Ele corria velozmente pelas ruas dobrando em várias esquinas. Não parecia estar indo para um lugar específico. Ele só queria nos tirar dali o quanto antes.

Ao longe pude ouvir as sirenes. Graças aos Céus saímos dali a tempo. Graças aos Céus ele era rápido o suficiente.

Eu sinceramente não sabia onde estava, ou para onde aquele estranho estava me levando. Podia parecer loucura, mas eu confiava nele. Mesmo depois disso tudo. Eu sabia que ele era o mocinho. Que ele tinha um bom motivo para estar ali. Eu sabia que eu não tinha sido levada a entrar naquele prédio a toa. Sabia que ele me protegeria caso fosse necessário. Sabia que ele me levaria para um lugar seguro, seja lá onde fosse esse lugar. Eu não tinha nada a perder entrando nessa maluquice, certo? Tudo iria se sair bem no final, certo? Na verdade naquele momento eu não estava pensando em nada disso. E creio que ele também não. O sol já estava nascendo no horizonte, batendo em nossos rostos machucados. Não tinha percebido que o tempo tinha passado tão rápido.

Meus olhos se fechavam a cada passo que ele dava. Estar em seu colo me fez perceber o quão cansada e o quão machucada eu estava. A luz do sol fez o calor percorrer em nossos corpos gelados. Estávamos sozinhos na rua. Eu não sabia com quem estava nem para onde estávamos indo, só sabia que me sentia viva e segura para continuar em frente.

(...)


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Notas finais do capítulo

Deixa aí seu comentário! bjs de luz ♥
Ah, talvez eu demore para postar, sinto muito.