A cidade das abelhas escrita por Clarice


Capítulo 37
O retorno dos bárbaros


Notas iniciais do capítulo

Boa Leitura!



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OS BÁRBAROS RETORNAM À CUPULA

Alec estava ocupadíssimo, ser rei o absorvia demais. Tirava-lhe toda a sua vontade de viver. Sobretudo, não valia à pena. Era como ver o mundo através de um vidro. Cheio de desapontamentos e decisões difíceis. Mas ao menos havia se livrado daqueles selvagens loucos. A ideia daquele povo lhe invadindo as terras, a sagrada cúpula o deixava de cabelos em pé. Os pelos do pescoço se eriçavam loucos, um pânico corria por seu corpo inteiro. Agora estava aliviado. Eles que se sirvam daquelas mulheres. Que se fartem delas, que as roubem. Não me importo.

Recebeu a notícia de que havia um exército em suas portas no meio da madrugada. Quem diabos está atrapalhando meu sagrado sono? Quem diabos está perturbando o descanso de minha mulher? Ela tem muitos filhos a ter ainda, precisa dormir bem. Era um criado de olhos arregalados. Disse-lhe, se atropelando dentre os verbos e os pronomes, que tinha um exército de bárbaros logo a sua porta. Alec sentiu um frio lhe correr a espinha, começava a suar. Não é possível! Seu pensamento gritava, dentro de sua cabeça. ISSO NÃO ESTÁ ACONTECENDO! E o seu plano? Não os havia dado um mapa?

–... E eles gritam o seu nome. Dizem que lhes entregou uma terra amaldiçoada, e por isso vão açoitá-lo e se banquetear com a carne da sua mulher e filhos. –Alec não duvidou de que aquilo fosse verdade nem por um mínimo segundo. Estava desesperado, precisava agir depressa.

Convocou o exército, perguntou se o seu pequeno exército de feras estava pronto. O soldado-cientista chefe disse que eram tão instáveis quanto o primeiro. Alec não se importou, naquele aspecto, pensava exatamente como seu pai. Como o antigo rei. Mandou-os logo à frente, para poupar a cavalaria. Não era como se seu exército fosse muito bom. Não lutava há tempo demais. Ficar tanto tempo sem uma batalha sempre amolecia um exército. E praticamente a única experiência de guerra que tinham era contra uma nação que nem mesmo têm uma casta de soldados. E olhe para esses bárbaros, parecem que guerreiam desde que nasceram. Alec deixou sair seu exército e então trancou as portas da cidade.

Vendo de longe, por uma janela, via que o número de bárbaros era bem menor do que havia pensado. Ou eles haviam diminuído? São loucos, devem se matar mesmo sendo do mesmo bando. Isso, ao menos era uma vantagem. Se é que algo poderia ser chamado de vantagem. Ele tinha muros, tinha um exército, e ainda sim achava que sua mulher e filhos seriam jantar naquela noite. Dera diversas declarações acalmando a população, dizendo que tudo estava bem, que os bárbaros nunca entrariam. Gostaria de ser tolo como eles e acreditar nisso. Ouvira a mulher chorando durante a noite toda. Sentiu vontade de chutá-la e mandá-la parar, aquilo o estava perturbando. Mas ter uma mulher sempre grávida o fazia pensar bem a respeito. Se não a amava, amava aos seus filhos.

A vida não era mesmo justa. Ele se lembrava, dentro de seu castelo, em sua cama, deitado, mas sem conseguir fechar os olhos. Fora criado para estar naquela posição, e mesmo assim não se sentia preparado. Era o mais orgulhoso e pretensioso dos príncipes, e agora, um rei jurado de morte. E havia entrado no poder a tão pouco tempo! Depois de seu pai ter sido assassinado por aquele desvirtuado Shai, o mundo se virara de cabeça para baixo. Ele ainda não tinha certeza se tudo estava mesmo voltando ao normal. Fora convocado a ser rei, e as ruas ainda estavam cheias de rebeliões e pessoas fazendo perguntas que ele não sabia responder. Não era desse jeito que planejava viver. E esses bárbaros? De onde diabos vieram? Soube, enquanto ainda havia tempo, que estavam em suas portas, os despachara. E aquela maldita garota metida à rainha os mandou de volta. Ele queria saber como. Ele queria saber por que! Ele queria destruir tudo. Shai, aquela mulher, os bárbaros, o reino, tudo! Tudo pelos ares. Deuses, sorriria em cada instante que ouvisse o crepitar das chamas. Sorriria enquanto sentisse o cheiro de queimado. Ainda estaria sorrindo enquanto visse aquele vermelho se ondular criando uma fumaça fedorenta no ar. Estaria sorrindo com todas as forças.

Foi ao banheiro. Não aguentava mais ficar sentado naquela cama. Os nervos à flor da pele, o suor pingando do queixo. Decidiu tomar um banho. Ouviu baterem na porta, muito forte. Eram as mesmas batidas desesperadas que ouvira quando foram noticiar a guerra. E era madrugada também. Todos os seus instintos de sobrevivência lhe disseram para não se mover. Para se fingir de morto, para fugir para a colina mais distante. Como estava calor! Mesmo dentro da banheira sentia que estava suando. Saiu da água, olhou-se no espelho. O corpo jovem e esguio pingava. Os cabelos prateados longos brilhavam com a luz do banheiro. Sentia os pés quentes em contato com o chão frio. Olhava para o espelho e ria, sem saber a razão. Ria e chorava. Lágrimas saíam de seus olhos. Na gaveta abaixo da pia havia um punhal. Pegou-o e cortou o pescoço. Quando o encontraram, ainda tinha um sorriso no rosto. As maçãs do rosto altas, a testa franzida, as sobrancelhas curvadas, os olhos semi-fechados. A boca aberta. Certamente sorria.


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Notas finais do capítulo

Até mais!



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