Scream 2016 escrita por S Nostromo


Capítulo 6
Ghostface por um dia




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Uma gota de suor escorreu pela lateral do rosto, e bem, não sei onde pingou. Na imensa escuridão que a república havia se tornado eu mal conseguia enxergar um metro à frente. Mantive a faca firme e forte na mão, dessa vez tudo seria diferente, eu já sentia isso. Marco estava por perto, eu acho, sei lá, não tinha muita certeza. Ou seria Victor, embora eu não o tivesse visto desde o momento em que o deixei na garagem para pegar as lanternas. Logo depois fui atrás do ruído, então Marco apareceu e nos trancamos no quarto, estranhamente eu desmaiei e quando acordei a porta estava aberta e alguém parecia estar me vigiando naquela escuridão toda. Agora, ali, em algum corredor da república, ouvi passos de desespero, passando atrás de mim. Olhei para trás, e nada. A situação estava ficando mais difícil a cada segundo.

Entrei em um quarto, era o de Alexander. É, eu ainda me lembrava do dormitório de cada um. Já conhecia cada objeto e móvel ali presente. Algo acertou em meu ombro, cambaleei para o lado, batendo contra a mesa do computador vazia. Vi a silhueta do desgraçado. Atirou mais um objeto que fui capaz de me abaixar. Acelerei o passo e dei um chute em seu estômago, fazendo-o bater as costas no armário. Agora era a hora. Segurei a faca nas duas mãos e avancei. Seu corpo de jogou para o lado. A lâmina cravou na porta do maldito armário. Conhecendo cada canto ali, ele devia ter caído sobre a cama do falecido Alexander, e foi onde arrisquei acertá-lo, mesmo não tendo tempo de processar onde o filho da puta estava. A faca rasgou parte do colchão, e senti ele se remexendo próximo de mim. A segunda faca acertou em alguma parte de seu corpo, e eu ouvi seu grunhido de dor, e senti o sangue quente respingando em minha mão. Nenhum de nós dois via praticamente nada, era tudo na base da audição e intuição do que era mais certo a se fazer. Tentava agarrá-lo, mas apenas sentia sua pele e vestes tocando nas pontas dos dedos. Naquela briga as cegas, ouvi seu corpo desabando no chão. Pulei por cima da cama e cravei a lâmina no assoalho de madeira. Seus passos seguiram para longe de mim. O desgraçado passou pela porta e fugiu.

Enquanto voltava a vagar cautelosamente pelos corredores obscuros, eu tive um tempo para refletir na situação toda, no rumo que minha vida estava tomando, no rumo que minha vida tomaria depois de tudo aquilo. O tempo da nossa mente e do mundo onde vivemos é bem diferente. Em segundos podemos pensar em milhares de coisas, então não sei se tive muito ou pouco tempo para esse momento de reflexão, depende do ponto de vista. Mas o que aconteceria depois? Perguntei a mim mesmo. Talvez eu fosse ter uma vida com a mídia me perseguindo por um tempo, programas de televisão querendo uma entrevista com perguntas que ninguém ainda havia feito. Pessoas que me amariam por ter sobrevivido, e talvez até mesmo cidadãos me odiando. Definitivamente eu não queria isso para a minha vida, essa conturbação toda, como os personagens sobreviventes em filmes de terror. Embora eu admita que seria interessante. Vez ou outra, eu tenho alguns estranhos surtos sobre o que estou fazendo com minha vida, seguindo o mesmo fluxo que todos seguem. Colegial, a vida de adolescente com sentimentos a flor da pele. Zombando de outros ou sendo humilhado. Amigos, sonhos banais e o desejo de chegar aos dezoito para poder entrar em certas festas ou coisas assim. César me disse uma vez que quando era adolescente ansiava pelos dezoito anos. Disse que ia fugir do mundo, viver longe e esquecer tudo que passou. Ia descobrir a felicidade de uma vez por todas. Ah, e tinha aquele ódio ridículo dos pais, as brincadeiras maliciosas com os amigos de sala. As crianças que acham ser adultos. Então vem o inicio da fase adulta, você ingressa na universidade ou começa a trabalhar definitivamente em algo que lhe parece mais produtivo, que vá trazer algum futuro digno. Amigos novos, mais festas, namoros, mandar na própria vida. Agora, adultos com resquícios de uma criança. Tudo tão igual e repetitivo para todos, e no final é sempre a mesma coisa: um corpo idoso e gasto, debilitado, cansado, mas provavelmente feliz. Então vem a inevitável morte. As vezes gosto desses eventos anormais em minha vida. É como acontece com Kate em Atividade Paranomal. Por causa de sua avó, sua vida mudou os trilhos drasticamente, embora seu destino não tenha sido agradável. Ou como aquele casal em O Segredo da Cabana. Um simples fim de semana com os amigos se torna um inferno, e eles vivenciam toda uma organização manipuladora, e eles, os pequenos e insignificantes insetos que conseguem mostrar que não são tão insignificantes assim. Como eu disse para Emily no hospital: foi horrível ser atacado naquele dia da festa, mas ao mesmo tempo, bem lá no fundo, pude me sentir talvez mais feliz simplesmente por ter fugido da vida repetitiva que todos seguíamos. Agora, estando na escuridão possivelmente correndo perigo, o nervoso tomava conta de cada fibra do meu corpo. Caso eu sobrevivesse, poderia sorrir. Não pela sobrevivência, mas pela sorte de viver tal experiência, algo que levaria para a vida toda. Algo diferente, mesmo ruim, algo que nos ensina e nos faz realmente evoluir, em vez dessa porcaria de ciclo de vida, praticamente igual para todos.

Um vulto passou correndo no corredor que cruzava com o meu. Parei no ato. Dei meia-volta e comecei a seguir por outro lado. Ia fazer o contorno e encontrar de frente com ele. Era a minha chance. Corri. Fiz a curva do corredor já ouvindo seus passos chocando-se no assoalho. Então batemos um de frente com o outro, mas diferente do filho da puta, eu já tinha tudo planejado. Vi o contorno de seu corpo, ali, em minha frente. Rapidamente tomei impulso e acertei a faca em seu peito. Ele puxou o ar, e um som rouco veio junto. Afastou-se de mim. Não tinha mais para onde correr. Vi seus braços mexendo de forma curiosa. Parti para cima. Na escuridão, demorei a entender que ele havia agarrado um quadro na parede e atirado em minha direção. Parte acertou em meu braço que tentei me defender, e outra parte pegou em minha testa. Um fio de sangue escorreu no mesmo instante, mas não parei a perseguição. Passei por cima da dor latejante e cravei a faca em seu peito mais uma vez. A voz engasgou, e eu o esfaqueei seguidamente, até seu corpo cair no chão, podendo ouvir o sangue esguichando de cada ferimento.

A surpresa, aquela estranha sensação, o arrepio diferenciado subindo pela espinha e seu cérebro liberando substâncias que só são sentidas naquele momento tenso. A mesma surpresa, aquela de tempos atrás, de quando César, o assassino, entrou pela porta do meu quarto no segundo andar. O choque de algo inesperado estava presente naquele corredor aleatório e abafado por causa do sangue ainda quente escorrendo pelas paredes. Victor surgiu. Sua lanterna invadiu o local com a luz e a surpresa estava nítida em nossos rostos. Minha mão e a faca, banhadas em sangue, tingidas de vermelho vivo. Algumas gotas respingadas na roupa e no rosto. Não sei o que assustou mais Victor, se foi o meu estado ou o sujeito morto violentamente no chão com suas vísceras e entranhas expostas. E eu também não sei o que me assustou mais, se foi a presença repentina de Victor, ou se foi ter visto que o corpo morto diante dos meus pés era na verdade Marco.


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