Eu te amo escrita por Ikarus


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Reza a lenda de que Lángoló Sisak não escreve apenas PruHun.



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Seus dedos corriam pelas chaves do velho piano de cauda. Era um péssimo cantor, mas se pudesse, cantaria junto com o instrumento. Era tarde da noite, mas não tarde para deixar o suave som das teclas ecoar pelo salão de sua casa, agora vazia. As notas bailavam de dentro do caixão de madeira e pela arquitetura rebuscada do interior da moradia. E, assim, Roderich Edelstein tocava para suas centenas de quadros, que enfeitavam as paredes brancas; uma ilusão para que a solidão não o abatesse do jeito que deveria.

Ah, se já perdemos a noção da hora
Se juntos já jogamos tudo fora
Me conta agora como hei de partir

Assim como havia nações que nasceram para lutar, havia também aquelas que nasceram para viver de alianças. Uma pena serem apenas acordos políticos. Entretanto, era impossível não sentir nada, nem uma penugem de sentimento em cada uma dessas uniões efêmeras. E com ela não foi diferente.

Se ao te conhecer, dei pra sonhar, fiz tantos desvarios
Rompi com o mundo, queimei meus navios
Me diz pra onde é que inda posso ir

Era como tricotar lindos suéteres nas noites de inverno. Levava um tempo até termina-los, e quando Roderich estava perto de fazê-lo, não o fazia. Era só uma questão de tempo até puxarem o fio solto e desfazer o suéter. Era prazeroso, mas apenas enquanto durava o tricotar.

Se nós, nas travessuras das noites eternas
Já confundimos tanto as nossas pernas
Diz com que pernas eu devo seguir

Foi para Elizaveta (ou Erzsébet, como preferia ser chamada) que tricotou pela última vez. Teoricamente, era para ele já estar bem acostumado a desmanchar as peças. Era uma peça difícil de ser confeccionada, com um material raro e frágil, na mesma medida em que era intrigante e cansativo de se lidar.

Se entornaste a nossa sorte pelo chão
Se na bagunça do teu coração
Meu sangue errou de veia e se perdeu

Como, se na desordem do armário embutido
Meu paletó enlaça o teu vestido
E o meu sapato inda pisa no teu

O começo foi como todos os outros: Uma mera formalidade. Assim como seu final. Era frio com ela, mas aqueles olhos verdes continuavam a tentar trazer um calor para aquela casca. Porque para ela, aquilo não era apenas uma mera formalidade. Aquilo não se tratava de apenas um teatro. Ah, se ele pudesse ver a graça nos tropeços de suas pernas nas valsas. Ah, se ele soubesse que tinha carinho naquele beijo grosseiro dela. Ah, se ele pudesse perceber que havia amor no sexo com ela, em cada murmurar, em cada sussurrar, em cada estremecer e em cada mordida. Mas não sabia.

Como, se nos amamos feito dois pagãos
Teus seios inda estão nas minhas mãos
Me explica com que cara eu vou sair

E quando ela o abraçou pela última vez naquela dança, percebeu que aquilo poderia ter sido para sempre. O suéter ficou pronto, mas nunca foi usado.

Não, acho que estás te fazendo de tonta
Te dei meus olhos pra tomares conta
Agora conta como hei de partir

E, de desgosto, jogou-se no lixo por vontade própria.


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