Saudade escrita por Theeco


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Hieee!
Quando se fala em aniversário, logo pensamos em festa, bolo, bexigas... Quis fugir um pouco do óbvio aqui e pra isso não me importei em arriscar, fugindo da minha zona de conforto também.
Boa leitura a tod♡s!
(Fic não betada, já peço desculpas por qualquer erro)



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Seria o tempo a cura para tudo?

Embora duvidasse muito, Renato perguntava-se constantemente se havia alguma mínima chance disso ser verdade.

Seus pais faziam parte da grande parcela de pessoas que acredita nisso. Inclusive, viviam dizendo que sua atração por homens era apenas uma fase e logo passaria; acreditavam fielmente que o tempo iria curá-lo e que depois ele voltaria a ser o filho perfeito que era motivo de tanto orgulho para eles.

Mesmo achando um absurdo, Renato não os julgava, afinal, isso tem a ver com a fé de cada um. Muitas pessoas têm a necessidade de acreditar que algo pode fazer as coisas melhorarem em algum momento; elas precisam depoisitar sua fé em algo e usá-lo como apoio para suportar determinadas situações sem perder o controle.

Renato queria ser assim, já que isso parecia funcionar bem com as pessoas em geral, mas ele simplesmente não conseguia. Principalmente depois de sua enorme perda.

Apesar de ser constantemente chamado de pessimista pelos seus familiares, ele era consciente de que nunca fora e, mesmo depois de tudo, ainda não tornara-se um; só foi obrigado a enxergar a vida de maneira mais realista, sem idealizá-la — coisa que passou a fazer bastante ao ter seu coração roubado por Augusto.

Desde quando o conhecera, Renato carregava consigo a certeza de que ele era uma pessoa muito especial.

Augusto era um dos veterinários de uma das maiores clínicas veterinárias da cidade. Essa clínica realizava ações solidárias a cada dois meses: os funcionários resgatavam cães e gatos abandonados das ruas, levavam os animais para a clínica — onde eram tratados — e, em seguida, encaminhados para a adoção. E foi graças a uma dessas ações que Renato e Augusto se conheceram.

Renato não era um dos funcionários da clínica, no entanto, sabia do trabalho voluntário que faziam. Então, quando encontrou um gato ferido e aparentemente desnutrido em frente sua casa, não pensou duas vezes antes de levá-lo à clínica. Augusto foi o veterinário responsável pelos cuidados daquele gato, e depois de uma breve conversa com Renato, não escondera o interesse em ser responsável por ele também. Em suas próprias palavras: "Esse gato chamado Renato também precisa de cuidados especiais?"

Embora Renato tivesse achado muito atrevimento da parte de Augusto cantá-lo assim, tão diretamente, Augusto era bonito e pelo pouco que vira, parecia ter um bom coração. Por que não se permitir?

Dali em diante, aproximaram-se cada vez mais. Como Renato adotara o gato em recuperação, levava-o constantemente ao veterinário — muito mais vezes do que o necessário. Logo, os habituais encontros que já nem eram tão profissionais assim, deixaram de ocorrer no interior da clínica, virando visitas a domicílio e, mais tarde, encontros assumidamente românticos. Não precisavam mais inventar desculpas para se encontrar, não precisavam usar o bichano — que fora o que com que se conhecessem — como desculpa para se verem. O gato, carinhosamente nomeado de Guto, já não era mais o centro daquela bonita relação que se desenvolvia de forma rápida, porém honesta. Guto tornara-se um coadjuvante naquela história de amor.

A medida em que tornavam-se mais íntimos, o amor que um nutria pelo outro crescia de forma avassaladora. Então, sem querer perder mais tempo, Augusto pediu Renato em namoro. E é claro que o moreno aceitou.

Quase dois anos depois, descobriram sobre a doença que Augusto tinha. Foi um baque, é claro, mas Renato não queria que Augusto — assim como as outras pessoas que recebem o mesmo diagnóstico — se deixasse abater e vivesse apreensivo e desanimado.

Renato tinha certeza de que Augusto era quem ele queria como seu parceiro por toda a vida e não se importava se ele tinha uma doença séria... para ele, o amor é cumplicidade; é estar junto independente de saúde, status social ou qualquer outra coisa cuja importância e atenção deveria ser menor do que a recebida pela sociedade. Então, certo de sua decisão e de seus motivos para tal, Renato pediu Augusto em casamento. Só algo muito desejado poderia minimizar o que Augusto viria a sentir, e a realização de um sonho certamente seria capaz de tal feito. Eles já eram praticamente casados pois viviam juntos, mas a oficialização daquele relacionamento sólido elevaria o grau de satisfação pessoal que Augusto sentia.

O casamento teria de ser feito às pressas pois não queriam e nem poderiam perder tempo. Então, conforme organizavam a cerimônia, programavam-se também para futuras viagens e passeios, e até mesmo a realização de coisas simples que Augusto prezava, como algumas ações solidárias — principalmente em defesa dos animais.

Embora soubessem que Augusto tinha uma doença séria, não esperavam que o pior pudesse acontecer repentinamente. Por mais que as pessoas possam não ter esperança ou tentarem preparar a mente para o pior, ninguém nunca está tão preparado quanto se pensa.

Tudo acontecera de maneira extremamente rápida. Casaram-se numa pequena e simbólica cerimônia, onde os convidados eram apenas seus poucos amigos — já que nenhuma das famílias era a favor daquele relacionamento —, e horas depois, não estavam mais festejando. Estavam no hospital.

Chegava a ser irônico Renato ter de passar por aquilo. Sempre preferira os filmes e livros com desfechos tristes, pois a tragédia era algo, de certa forma, misterioso: deixava tudo mais belo, mais intenso, mais memorável. E ali estava ele, vivendo sua própria história de amor com um fim trágico. Diferente do que sentia aos finais de livros e filmes, constatou que não tinha nada de belo. Era duro, era cruel. Era a vida, estapeando-lhe a cara, mostrando de forma bruta que a ficção e a realidade vivem numa linha tênue.

O clima daquela noite parecia ser a representação de seu estado de espírito em forma de paisagem: céu sem estrelas e mais escuro do que o habitual, e um dilúvio caindo violentamente contra a área cidade. Sentia-se assim, vazio, preenchido e rodeado por uma imensa escuridão, enfrentando sentimentos e pensamentos ruins que o violentavam por dentro.

Lágrimas escorriam de seus olhos fechados, tão intensas quanto a chuva; desciam pelo seu rosto como se queimassem cada pedaço de pele tocada como se fossem gotas de ácido.

Seus punhos estavam cerrados com tanta força que chegava a ferir sua própria pele. Os batimentos cardíacos em ritmo descompassado faziam seu peito arfar sem parar. Cada pulsada de seu coração era como se um soco acertasse em cheio o seu peito. Socos fortes e precisos, fazendo com que faltasse-lhe o ar a cada golpe sentido.

Sentia seus ossos enfraquecerem, tinha a impressão de que a qualquer momento eles se partiriam. O peso de seu corpo parecia ter triplicado, era difícil manter-se em pé diante daquilo. Não demorou muito para suas pernas cederem ao cansaço físico, pelo esforço e correria em levar Augusto pro hospital, e psicológico, por ter de lidar com isso. Ele caiu de joelhos, fazendo com que um baque impactante chamasse a atenção das pessoas próximas dali.

Alguns pacientes e funcionários que estavam no corredor aproximaram-se para tentar ajudá-lo, mas não podiam acalmá-lo porque ele não estava nervoso, só estava incrédulo; em choque.

Como os médicos tinham que tentar reanimar seu namorado a qualquer custo e o quanto antes, Renato não poderia ficar junto. Então ele ficou esperando do lado de fora, no corredor, recusando qualquer tipo de ajuda alheia. Se ter ajuda significava afastar-se dali, não aceitaria: se aquele corredor era o lugar mais próximo de Augusto que poderia ficar, era ali que ficaria. Até o fim.

E o fim chegou, forçando-o a enfrentar momentos de angústia imensurável. Sozinho. Mais uma vez.

~💔~

Engraçado como o tempo pode ser relativo. Um ano é tempo de sobra para se fazer algumas coisas, no entanto, parece tão pouco tempo para outras.

Um ano depois da morte de Augusto, ele ainda fazia muita falta na vida de Renato. Especialmente naquele dia, que seria comemorado seu aniversário de casamento.

Fazia um ano que Augusto partira, mas ainda parecia algo muito recente. Renato ainda lembrava da textura de sua pele, dos tons de sua voz, das pequenas variações em seu semblante conforme seu humor, do gosto e da intensidade dos beijos que trocavam, das palavras reconfortantes que dizia nos momentos certos. Tudo ainda era muito vivo na mente e no coração de Renato, e apesar de lindas lembranças, também eram muito dolorosas. Era horrível pensar que nunca mais poderia presenciar nada daquilo.

Gostaria que o tempo pudesse curá-lo das feridas da alma; livrá-lo da mágoa, dos questionamentos, do saudosismo. Seria libertador.

Renato esforçava-se para tentar acreditar que o caminho mais fácil nem sempre é melhor que o da dor; acreditar que, de algum jeito, a dor era necessária. Lembrava-se de uma frase que lera em algum lugar, que era algo como: "Mais vale viver com a perda de um grande amor, do que morrer sem nunca ter amado."

Superar a tristeza é necessário. De nada adianta privar-se de viver entregue por medo do futuro, ou viver na esperança de que o tempo leve de si a dor e as memórias dolorosas.

O tempo não cura as dores. Nunca curou, na verdade. Conforme ele passa, automaticamente acreditamos estar curados e seguros pois nos conformamos e passamos a acreditar que o passado é passado. Mas, de certa forma, o passado é presente.

O passado é presente porque tudo o que passamos influencia o nosso jeito de ser, de pensar e de ver as coisas. O que passou realmente passou, mas não se apaga nunca. A qualquer momento o passado pode ressurgir, trazendo de volta as infelicidades perturbadoras.

Então, o tempo não é uma cura, é um curativo. Ele esconde o ferimento para que ninguém saiba o quão profundo é, mas basta uma cutucada para ver que, pode passar o tempo que for, um dedo na ferida sempre irá machucar. Porque assim como o amor, a saudade é o tempo que não se desfaz.


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Notas finais do capítulo

Preferi não dizer o que Augusto tinha pra não usar uma doença e falar "abobrinha", já que não tive tempo de pesquisar sobre alguma.
Bom, essa foi a primeira fic original que eu escrevi. Além disso, eu não sou da turminha do drama/angst e é a primeira vez que escrevo algo assim, inteiramente narrado, sem a estrutura falas+ações e tal. Então, por favor, deixem suas opiniões e críticas, vai ser mega importante ter uma noção de onde acertei e onde errei. (mas peguem leve porque sou um pobre e sensível garotinho, ok? HAHAH)
Brincadeiras à parte, espero que tenham gostado! ❤