A verdade está nas sombras escrita por Victória


Capítulo 3
O colégio da morte




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A “escola” aonde eles iam não era exatamente uma escola. O Colégio de Treinamento Especializado de Sodon era um instituto onde crianças aprendiam a usar armas afiadas e os melhores meios de assassinar em silêncio. Era um lugar onde entravam crianças e saiam soldados para servir o exército de Sodon, o país da guerra, onde o orgulho prevalece e a força nunca morre.

Para Albert, aquilo não passava de uma prisão que pregava a violência.

Infelizmente, após o incidente das sombras, todas as crianças do país foram obrigadas à treinar e estudar para servir o exército.

Estavam no meio de uma aula, Albert não queria saber qual. O professor explicava à turma como improvisar uma arma de combate com palitos e pedras em situações de emergência.

Leo não estava ali, afinal era dois anos mais velho e já estava na turma avançada faltando um ano para se formar. Já Morgana, que se sentava algumas carteiras à frente, estava do mesmo jeito de sempre: não se mexia, nem mesmo piscava perante o professor, como se ele fosse uma fera prestes a atacar.

Albert desenhava em seu caderno. Tinha adquirido aquela mania à alguns dias. Um bom modo de passar o tempo enquanto não prestava atenção na aula. Mas naquele dia, desenhava um rosto, não qualquer rosto, o rosto de sua mãe.

Não era sua mãe de verdade. Na verdade, nunca havia a visto uma única vez. Mas gostava de imaginar como ela teria sido... antes de partir.

Percebera que o professor parara sua explicação pela metade e começara a andar lentamente até sua carteira.

– Desenhando o que hoje, Albert? – Perguntou ele, irônico.

– Bem... – Dizia estático o garoto.

Ele ouvia os cochichos e os rumores que se espalhavam pela sala, sabia que era sobre ele. Novamente o garoto estranho da carteira 23 apronta. Eles não demoraram muito, o sinal havia batido.

Levantou apressado da carteira em direção à porta. O professor não podia pará-lo agora, estava na hora do treino de armas.

O treino de armas não era exatamente a hora preferida de Albert, mas era certamente mil vezes melhor do que ouvir o professor tagarelar em frente a uma turma que sabia que um dia será mandada para o campo de batalha. Todos, cada um deles, estava destinado à morte. Muitos não enxergavam, mas era verdade.

Albert, em parte, já havia se conformado com seu destino, mas sentia pena daqueles que ainda não enxergavam a terrível verdade. No grande tatame misturavam-se crianças de menos de 9 anos que brandiam espadas de madeira rindo incessantemente até crianças da idade de Albert, que tinham a liberdade para escolher as armas que usariam até o fim de suas vidas. A partir dos 14 anos, os alunos começavam a usar armas de metal cegas ao invés de madeira, pois, de acordo com os professores, tinham que aprender a aguentar a dor. Ninguém ousava reclamar, pois sabiam que quando completassem os 17 anos, seriam mandados para um tatame separado, onde lutariam com armas de verdade apostando suas vidas. Esse era o caso de Leo, que tinha uma sorte e talento que superavam todas as expectativas.

Segurava os facões de caça um em cada mão. Brandia-os para cima do garoto loiro que tremia de medo. Ele segurava uma espada de metal em uma mão vacilante e possuía escuros hematomas no rosto. Provavelmente o último que lutara com ele não deveria ter sido muito gentil.

A regra do treino era lutar até acertar um ponto vital e os alunos mais cruéis e fortes se aproveitavam daquilo para causar dor aos mais novos uma vez que não seriam separados por meras pancadas no rosto. Al já tivera sua época de calouro, mas não durara muito tempo uma vez que sempre teve talento para lutas. Com um movimento certeiro, Albert escorregou a lâmina dos facões na espada de metal, observando o menino se encolher de medo. Simplesmente arrancara majestosamente a espada das mãos do menino que ainda se encolhia.

– Vá logo de uma vez! – Gritou Albert

O garoto cambaleante procurou recolher sua espada e correr para sua próxima dupla.

– Olá, Albert – Disse uma voz por trás de seu rosto.

Com um movimento rápido, Albert defendeu-se de um golpe que vinha por trás de sua cabeça.

– Que reação mais lenta... – Disse a garota de cabelos loiros. – Se não fosse uma espada cega, você estaria bem morto agora, Al.

– E que diferença vai fazer morrer agora ou depois, Alicia? – Respondeu Al.

Alicia, a única pessoa que falava com Al naquela classe... ou talvez a única pessoa com quem ele se sentia confortável ao conversar, afinal, de uma forma ou outra, ambos eram os excluídos da classe só que por motivos diferentes: ele por ser ruim demais e ela por ser boa demais. Nenhum dos dois se enquadravam aos padrões e nunca se enquadrariam.

– E as notas? Como elas vão? - Perguntou Al sem parar a luta

– Você sabe... Sempre acima da média! Um 10 em defesa pessoal, 9,5 em história, um 10 em estratégia... E as suas?

– Você sabe... Sempre abaixo da média...

– Al, eu sei que você não quer se tornar um soldado, mas as suas habilidades com armas são incríveis! O governo não seria idiota de deixar alguém como você de lado, estudando ou não.

– Você sabe que eu só venho aqui porque é obrigatório! Eu não vou deixar eles me fazerem soldado, nem que eu tenha que começar a fazer corpo mole nos treinos! - Al estava mentindo. Não havia escapatória para ninguém.

– Quer falar mais baixo, seu idiota?! Imagina se o professor ouvir!

– Dane-se se o professor ouvir! Só estará escutando o que eu canso de falar!

– Humf... Você não tem jeito Al... – Disse Alicia investindo novamente a espada de esgrima – Mas saiba que um dia me tornarei um soldado do governo, não poderei lhe apoiar pra sempre.

Alicia acertou com a ponta da espada cega onde estaria o coração de Al com um sorriso satisfeito. Albert recolheu um dos facões que caíra e pôs-se a mover-se para a próxima dupla.

Morgana estava parada olhando diretamente para os olhos de Albert. Empunhava uma espécie de soco inglês com lâminas esperando o melhor momento de atacar. Albert tentou tomar a iniciativa, e, em uma fração de segundo, um hematoma surgiu em seu pescoço. Morgana havia atacado.

Largou as facas e levou suas mãos ao hematoma no pescoço, realmente estava doendo. Morgana havia virado de costas para ele, não olhava mais em seus olhos. Com raiva, recolheu as armas no chão e investiu sobre a garota que defendeu rapidamente, mesmo não enxergando o movimento de Albert. Dessa vez ele que olhava nos olhos dela, eles não demonstravam nada, nem superioridade, nem raiva, muito menos medo. Como aquela garota conseguia se manter tão fechada?

– Albert! Eu vi que você levou um belo golpe no pescoço, você já estaria morto! – Gritou o professor – Creio que sua vez já terminou há bastante tempo. Que tal se dirigir à sua próxima dupla?

Albert resmungou e afastou suas lâminas da arma de Morgana, que se afastou vagarosamente.

Perdera a conta de quantas vezes os professores já ofereceram à Morgana a chance de ingressar na turma dos avançados, onde se usavam espadas de verdade. Mesmo este sendo o sonho de toda criança daquela academia, ela negava, sempre negava e Albert não entendia. Poderia estar com medo? Certamente não... Ela nunca parecia ter medo...

As crianças daquele tatame veneravam os garotos da turma avançada como heróis, não porque eles cortavam uns aos outros com espadas, e sim, porque aquela turma era um universo desconhecido para todos aqueles que estavam ali. Ninguém sabia como eles lutavam, ninguém sabia que treinos faziam, ninguém sabia de nada. Mas Albert sabia. Leo já havia contado à Albert alguns “segredos” da turma dos veteranos, e o que mais lhe interessou foi que todas as armas, sem exceção, eram feitas de cobre.

O sinal batera. Todos os alunos tomavam rumo em direção às suas respectivas salas de aula, mas Albert não. Se camuflando na comoção de alunos andando de um lado para o outro, Albert seguiu em direção à janela dos fundos do tatame onde levava direto ao muro que protegia a escola. Atravessou a janela certificando-se de que ninguém o havia visto e começou a escalar o muro habilmente. Chegando no topo, pulou na grama macia executando um rolamento para não se machucar. Começou a correr.

Normalmente, nenhum aluno teria coragem de atravessar a floresta que jazia nos fundos do gramado, mas Albert tinha mais do que coragem, ele conhecia aquela área como a palma de sua mão. Corria desviando de galhos e pulando pedras até chegar à um extenso campo de flores que jazia em uma grande clareira. Aquele era seu lugar preferido pois ninguém seria capaz de incomodá-lo lá. Respirou o cheiro doce das flores para dentro de seu pulmões. Mas algo o preocupou.

Ele não estava sozinho.


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