A verdade está nas sombras escrita por Victória


Capítulo 2
A garota do olho vermelho




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A luz do sol invadia o quarto por entre as persianas. A luz batera em seu rosto, fazendo-o cobrir sua cabeça com o cobertor. Fechou os olhos novamente procurando o sono que se perdera.

Tivera um sonho estranho naquela noite... Tinha visto uma masmorra, uma garota e... vermelho... Muito vermelho...

– Hora do café! – Disse uma voz por trás da porta de madeira, o garoto retrucou gemendo. – Não vai querer que eu acrescente um pouco de pimenta em seu café matinal novamente, não é? Isso o acordará rapidinho.

Muito desgostoso, o garoto pôs os pés no assoalho frio, o que fez seu corpo tremer até os dentes. Como odiava o inverno... Tratou de trocar as roupas, escovar os dentes e bagunçar o cabelo negro que teimava a cair sozinho de tão liso.

Desceu as escadas, tropeçando, como sempre, no último degrau.

– Bateu seu recorde hoje, maninho! – Disse o garoto loiro que sentava-se à mesa – Que homem leva 30 minutos se arrumando?

– Aqueles que não são porcos! – Disse a mulher de avental que limpava a mesa pela décima vez naquela manhã.

– Dane-se o meu recorde, Leo! – Disse o garoto de cabelos negros. – Quero saber quando é que você vai consertar aquele degrau! Já está solto à anos!

– Tudo em seu tempo, maninho! – Respondeu o garoto.

– Não sou seu irmão.

Sentou-se a mesa do lado de Morgana, a garota que vivia calada desde o dia em que chegara àquele lugar. O lugar, como dizia Leo, para onde são mandados os casos irreversíveis, as crianças que ninguém quer... Não era exatamente um orfanato, além do que, só havia os três ali desde... o Dia das Sombras.

Não falavam sobre ele, nenhum deles queria. Cada um deles havia perdido coisas importantes naquele dia e não era necessário conversar sobre ele para saber disso, bastava olhar nos olhos deles.

Puxou a cadeira para sentar-se do lado da garota que estava absorta em um livro. Ela não comia. Bebericava uma xícara de café cada vez que terminava um parágrafo.

Fora a última que chegara ali, dois dias depois de Albert, à dois anos atrás, e, até hoje, só lembrava de ouvi-la falar frases simples como: “Com licença”, “Obrigada” ou “Por favor”, simplesmente nunca a vira conversando com ninguém. Tinha cabelos cor chocolate que se prendiam em um rabo-de-cavalo atrás da cabeça, tão lisos, mas tão lisos que era um mistério como eles se mantinham firmes ali. Uma franja cobria um de seus olhos. Albert fora o único que já vira o que ela escondia entre a franja cor-chocolate, lembrava-se como se fosse ontem:

Estavam saindo em um piquenique no parque da cidade e, Morgana, como sempre, preferira ficar na sombra de uma árvore afastada dos outros, lendo sempre o mesmo livro.

Na época, faziam apenas duas semanas que ela havia chegado àquele lugar. Albert não era diferente, somente dois dias a mais que ela. A garota evitava contato com qualquer um na casa, mesmo que com o olhar, já Albert já havia tomado intimidade com todos, Senhora Lyrol, Leo, o gato barrigudo Fellow...

Albert não estava sentindo-se confortável aturando as brincadeiras de mal gosto de Leo, e decidiu sentar-se junto a garota. Tentou puxar conversa, fazer graça, mas nada adiantava, os olhos da garota permaneciam fixados no livro que à todo lugar carregava. De repente, um verto forte atingiu onde estavam, o que fez voar a franja chocolate da garota, que revelou... um olho vermelho... com uma pupila de um pentagrama. Assustada, a garota pôs-se a cobrir o olho novamente tirando as mãos do livro.

Recomposta do susto, com Albert ainda estático olhando para ela, voltou sua atenção ao livro. Havia perdido a página em que estava. Com a face estampada de dor, a única que ele já havia visto até hoje, ela se levantou e correu em direção à outra árvore.

Naquele momento, Albert havia sentido um misto de terror e culpa. Será que ela havia chorado por ter perdido a linha da história que tanto amava? O que era aquele olho vermelho estranho? Será alguma doença que ela tinha vergonha? Não sabia responder, como também, não queria mais dirigir suas palavras à garota a não ser que ela falasse com ele. E lá estava ela, lendo o mesmo livro de dois anos atrás.

Mesmo com o susto que havia levado naquele dia, para Albert, ainda era bem melhor sentar-se ao lado da garota com o olho vermelho do que ao lado de Leo, onde sofria uma ameaça constante.

Senhora Lyrol serviu-lhe o café que prometera. Albert, antes de tomá-lo, cheirou a bebida escura procurando evitar qualquer acidente com pimentas, como já ocorrera uma vez.

– Não se preocupe! – Disse Senhora Lyrol – Eu não colocaria pimenta no café do meu menininho, pelo menos não no dia de hoje!

No dia de... É verdade! Era seu aniversário! Como poderia ter esquecido?

– E o que eu devo dar de aniversário para o meu irmãozinho este ano? – Perguntou Leo pensativo – Você sabe, minhas ideias se esgotaram...

Leo era do tipo brincalhão. Possuía cabelos loiros rebeldes que chegavam aos ombros e olhos azuis bem claros. Era o mais velho dos três, apesar de possuir a mentalidade de uma criança de acordo com Albert.

Dois anos atrás, em seu aniversário de 14 anos, ele lhe dera uma meia, somente uma, a qual Albert guardara no fundo da gaveta com ódio. No ano seguinte ele lhe dera uma meia igual e lhe disse: Veja, agora poderá formar um par!

Apesar de possuir um temperamento irritante e uma queda por brincadeiras de mal gosto, Leo era extremamente mulherengo, não havia uma garota na vila que ele já não houvesse cantado, não... na verdade havia sim... E ela estava sentada bem ao lado de Albert.

– Por que não me dá uma luva? E quem sabe no ano que vem você me dá o par? – Disse Albert.

_ Não... Acho que este ano lhe darei um relógio, assim talvez você não se atrase mais para o café. – Respondeu Leo sorrindo.

Albert apertou os punhos com raiva. Estava furioso com o comentário de Leo, mas era infelizmente verdade. Al possuía um certo talento em se atrasar para tudo.

– Leo, pare de zombar com Al pelo menos hoje! – Disse Senhora Lyrol dando um peteleco na testa do garoto loiro.

– O que eu posso fazer se é verdade, Senhora Lyrol?

Albert terminou seu café da manhã correndo ao perceber que Morgana e Leo já haviam deixado a mesa e ido a escola sem ele. Pegou sua bolsa e saiu correndo porta à fora.

– Al! Terminando a aula, venha direto para casa! Tenho uma surpresa para você! – Gritou Sra. Lyrol.

– Pode deixar! – Respondeu o garoto sorridente.

Ele não sabia, mas a surpresa que ele encontraria seria bem diferente da que ele imaginava.


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