Os pais de Ken Ichijouji não o questionaram ou se opuseram quando o garoto pediu para ser transferido de sua antiga escola para a atual. De fato, ela era bem mais longe, ele tinha que pegar o metrô para chegar ao seu destino, pode-se dizer que era quase do outro lado da cidade, no entanto eles sabiam que os únicos amigos que o jovem possuía estudavam naquela instituição de ensino. 

Foi durante uma reunião comemorativa na casa dos Kamiya que Ken tomou sua decisão de pedir sua transferência. Depois que as missões como Digiescolhidos terminaram era cada vez mais difícil encontrar-se na presença de seus amigos. Aqueles assuntos animados sobre a vida escolar e a intimidade a qual todos possuíam entre si o deixara com uma leve pitada de “inveja branca”. Todos até mesmo Iori, que não estudava na mesma escola, trocavam um contato bem mais intenso. Nas reuniões Ken ficava observando os assuntos e nem se deu conta quando o desejo de fazer parte de tudo aquilo fora se tornando mais e mais intenso. 

Naquela manhã ao vestir seu novo uniforme, o portador do brasão da bondade se sentia ansioso para saber como seria sua nova vida escolar vendo seus amigos todos os dias. Ele se arrumou tão empolgado que chegou até a assustar o pequeno Digimon inseto que o observava com aquele comportamento diferenciado, Wormmon analisava atento, sem conseguir entender o motivo da aparente euforia, algo completamente divergente ao amigo. 

Ken Ichijouji não era do tipo de pessoa que se empolgava ou demonstrava animação exagerada com qualquer coisa, na verdade ele era calmo e reservado, falava minimamente e somente quando tinha algo útil a declarar, participava das fases brincalhonas do grupo de Digiescolhidos, apenas com sorriso e pouco opinava, mas se divertia a seu modo. 

(...)

Os raios de sol iluminavam a cidade, a brisa fresca trazia um cheiro doce no ar primaveril, às cerejeiras floresceram espalhando suas pétalas pelo chão e como de costume o grupo de amigos seguia seu caminho até a escola. A manhã estava tão relaxante que o silencio só fora quebrado por um longo e alto bocejo de Miyako Inoue que, cobria a própria boca com seus dedos finos parecendo tropeçar nos próprios passos de tanto sono.

— Miyako na sua casa não tem noite não? No primeiro dia letivo e você já vem com esta cara, imagino como será o resto do ano. – Daisuke Motomiya questiona indiscreto e leva um olhar fuzilante da amiga. 

— Não que eu lhe deva explicações, mas fiquei conversando pelo PC até tarde com Koushiro-kun e por isto passei muito da hora de dormir. – A garota falou naturalmente e um tanto sonolenta, mas os três amigos frearam seus passos no mesmo momento, seus olhos se arregalaram e uma troca insinuante de olhares entre eles compartilhou todo espanto. A garota então percebeu a maldade na reação brusca de seus amigos e respondeu de imediato, jogando fora toda sonolência. – Como podem pensar algo assim? Não é nada disso fiquem sabendo! 

 – Uhum! – Iori Hida, soou sarcástico. – Como podemos pensar uma coisa tão óbvia sobre duas pessoas que ficam conectados quase o dia todo, gostam doa mesmos livros, mesmos filmes, falam a mesma língua e nos deixam viajando no assunto. Enquanto formulam teorias e teorias sobre certos assuntos e ainda parecem se divertirem chegando a uma conclusão junta? 

— Miyako-san, Iori tem razão, quando você e Koushiro-san começam a conversar, esquecem-se do que está à volta e mesmo quando este somos nós! – Takeru brada em tom sincero e Miyako contorce o rosto.

— M-Mas não é nada disso, só gostamos das mesmas coisas e os assuntos vão surgindo... – A fala saiu como se a mesma analisasse bem as próprias palavras. – Além disto, o motivo pelo qual demoramos muito ontem a nos despedir foi para ajudarmos o Yamato-san com a sonorização do próximo show. Também estamos aprendendo a mixar no nível Scrilex! Mas... É só isto! 

— Se é mesmo só isto então por que você ficou toda coradinha? – Daisuke provoca e Miyako range os dentes. – Olha só “Koushiro-chan como você é inteligente”! – O ruivo provoca fazendo uma voz afeminada e gesticulando, causando risos aos outros colegas. A princípio ele se diverte com as próprias besteiras, mas quando volta seu olhar para a amiga, se depara com uma aura negra e olhos faiscantes. O pobre nem ao menos tem tempo de dizer nada em defesa antes de sentir o peso da mochila de MIyako acertando-lhe a cabeça com toda força.

— Arg... Daisuke eu te mato seu pirralho! 

Depois deste episódio os dois se entretêm em uma briga que dura até a entrada do colégio. Takeru e Iori não podem evitar a diversão que as constantes brigas dos dois proporcionam a eles. Sempre a mesma história Daisuke provoca Miyako e esta responde as provocações de forma mais infantil possível. Infelizmente há dois anos que Iori tem que continuar a fazer uma parte de seu percurso escolar sozinho, o tempo se passou e agora o mais novo se encontra no ensino fundamental enquanto os mais velhos já cursam o ensino médio, sendo que Miyako está um ano à frente. 

(...)

Hikari Kamiya realmente tinha o dom de atrair as pessoas, sua a luz natural parecia atrair atenções como doce atrai abelhas, mas a Digiescolhida da luz também tinha suas trevas, às vezes ela queria ser menos notada, queria um pouco de paz e privacidade, queria se fechar em um campo de invisibilidade e tentar viver a vida de forma mais normal o possível. Agora a garota enfrentava as crises da adolescência bem como sua melhor amiga MIyako, mudanças de humor e em seu o seu corpo, tudo parecia estressá-la ao passo que a mesma tentava se manter o mais calma o possível. Mas as coisas estavam mudando, seu irmão morava sozinho, os primeiros Digiescolhidos todos já se encontravam mais ausentes absortos em suas vidas, mas o pior de tudo ainda estava por vir, Hikari ainda não sabia, mas ao final de seu deste primeiro dia letivo seu amigo Daisuke Motomiya estava decidido a se declarar para ela. 

A Digiescolhida da luz sempre teve certa afeição por seu amigo de infância Takeru Takaishi, com o passar do tempo este fato se tornou tão evidente, exceto para “ele” e para Daisuke. 

Não era o momento de se perder neste tipo de pensamentos, Hikari ajeita seu uniforme pela última vez passa um pouco de perfume, beija Tailmon embora saiba que esta normalmente a segue assim como os demais Digimons fazem o mesmo com seus parceiros. 

Ao chegar a seu colégio Hikari é abordada por suas colegas de classe, cada uma querendo se gabar mais que a outra de onde passaram as férias, as meninas são boas pessoas, mas às vezes seus assuntos são maçantes e a Digiescolhida da luz só tinha mesmo olhos para a entrada a espera de certo garoto loiro de olhos azuis, mas em vez disto ela teve a impressão de ter visto outro amigo de olhos azuis, mas o tumulto de garotas animadas não a deixou ter certeza se realmente era o Digiescolhido da bondade. 

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Takeru Takaishi chega a seu colégio com seus dois amigos, Daisuke Motomiya e Miyako Inoue, uma vez que Iori segue a diante para sua escola. O portador do brasão da esperança já está com dor de barriga de tanto gargalhar com as confusões dos amigos. Assim que cruzam o portão de entrada Hikari vem correndo em direção a eles sem perceber deixando as colegas de classe no vaco. Sua vontade era de correr de encontro a ela e abraçá-la bem forte girando-a como em um filme, mas a vida não é tão simples assim e tudo que ele pode fazer é apenas contemplá-la correndo com cabelos ao vento, enquanto o mesmo não contém um sorriso bobo em seu rosto. 

— Miyako-chan. . . Takeru-kun. . . Daisuke-kun! 

Hikari e Miyako se abraçam saudosamente e logo os três estão conversando pouco tempo antes que o primeiro sinal toque. Existem momentos em que Takeru gostaria de estar no lugar de Miyako para ter tanta proximidade com Hikari, eles já foram bem próximos um dia, mas agora com a descoberta de seus sentimentos por ela, o portador do brasão da esperança tem ficado mais afastado com medo que as coisas mudem. 

(...)

— Olhem aquele não é o garoto gênio que desapareceu da mídia de uma hora para outra? 

— Dizem que do nada as notas dele despencaram e ele passou a ser um aluno comum! 

— Então ele vai estudar no nosso colégio agora...

As pessoas muitas vezes não sabem como podem magoar alguém com simples palavras, nenhum daqueles adolescentes sabia como era doloroso para Ichijouji lidar com o peso do título de ex-gênio, mas naquele dia em especial estas especulações e burburinhos a seu respeito não estavam afetando o rapaz, na verdade ele não entendia porque seu estomago estava estranho, como se tivesse dado um nó. Seus olhos serenos buscavam em todo canto a presença de seus amigos. 

Quase sem esperanças de encontrá-los o portador do brasão da bondade decidiu se dirigir a secretaria quando foi abordado por um grupo de garotas eufóricas perguntando sobre sua identidade como um bando de gralhas todas falando ao mesmo tempo, quando o som de uma gargalhada familiar lhe chamou a atenção o fazendo procurar por cima das cabeças curiosas das garotas, que não demoraram muito a perceber que estavam sendo totalmente ignoradas e começarem a olhar na mesma direção em que o rapaz olhava com olhar tão atento.

Ken não pensou duas vezes quando teve um leve vislumbre dos cabelos lilases de Miyako que, agora se encontram abaixo da cintura. Ele se esquivou para fora do grupo de curiosas e deu dois passos à frente, pode vê-la com nitidez, ela parecia prestes a entrar em sua classe, quando traindo seus próprios padrões comportamentais a chamou. – Miyako-san! – O grito saiu com um tom de alegria e duvida como se estivessem em batalha ou algo do tipo. A garota freou o passou imediatamente completamente incrédula, ela só podia estar imaginando coisa. 

Uma rajada de vento entrou pela vidraça fazendo seu som ecoar com o silencio que se instalou no corredor, fazendo os cabelos e a longa saia de Miyako esvoaçarem em sincronia. Ken pode contemplá-la virando-se para olhá-lo como se fosse em câmera lenta. 

Naquele momento ele pode compreender o significado do olhar cúmplice que seus pais trocaram após perguntarem se era nesta escola que Miyako-san estudava, entendeu a cara de boba que sua mãe fazia todas as vezes que ele estava com a amiga ao telefone, entendeu as piadinhas que seus amigos jogavam em relação a eles desde sempre. Foi por causa dela, era para poder vê-la todos os dias, mas foi tão inconsciente! Como pode o que ele sentia ser tão obvio para todo e o próprio só se dar conta disto neste momento. 

De repente as pessoas pareceram sumir de perto deles, Miyako deu alguns passos tímidos e receosos, com um sorriso rasgando o rosto. – Ken-kun? ! 

— Miyako-san... – Murmurou o garoto.

— Você está mesmo aqui? – Ela abraçou forte sua mochila, suas bochechas ardiam, mas por quê? Era apenas o Ken... Na sua entediante escola, todos os dias... Seu coração não podia estar mais acelerado. 

— É... Estou sim! – Ele respondeu timidamente admirando o rubor do rosto da amiga. Certamente ela não imaginava como ficava linda com aquele uniforme verde em perfeito contraste com o tom de seus longos cabelos. 

— Ken-kun... 

— Miyako-san...

Mas de repente a voz grossa do professor da portadora do brasão do amor, os trouxe de volta a Terra: – Inoue-san deixe para paquerar os calouros no final da aula! Francamente! Anda volte para sala! 

Foi como se um enorme piano tivesse caído na cabeça de ambos ou como se alguém tivesse jogado um balde de água fria. Minúscula e corada Miyako nem teve forças para se despedir, abaixou a cabeça e entrou em sua classe, notando as colegas cochichando entre si e abafando risinhos, não demorou a vergonha explodir em raiva e a garota gritar: – Porque não cuidam das suas vidas? ! – O berro saiu alto fazendo os cabelos das garotas voarem para cima enquanto elas ficavam em modo chibi, morrendo de medo correndo desesperadas iguais formigas. 

— Inoue-san! – Grita o professor. – Vá para diretoria agora assinar uma advertência. Quem a senhorita pensa que é para gritar na minha aula? 

A herdeira do brasão do Amor e da Sinceridade se viu injustiçada, em seu primeiro dia de aula tendo que assinar advertência, logo ela que sempre teve um histórico impecável. Só podia ser piada, mas espera... A garota se lembra da causa inicial de tudo isto e um sorriso rasga seu rosto, ela ainda tinha dois longos anos pela frente para ver seu “amigo” mais querido todos os dias... No fim o dia não estava tão ruim assim.