O último “Don”. escrita por Alba Diniz


Capítulo 1
................... “Don” Giovanni, o patriarca.




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Ninguém desconhece as razões que levam grande parte dos membros da “família” D’Angelo a temerem e acatarem qualquer diretriz traçada pelo idoso de pele enrugada que firma o andar com auxílio de uma bengala, cujo punho é uma cabeça de leão dourada. A organização liderada pelo frágil idoso de expressão dura é uma das mais temidas e respeitadas “famílias” que atuam na Itália com ramificações nos EUA, mais especificamente em Chicago, Detroit, Boston, Las Vegas e Nova York.

Acompanhando o velho, há sempre um homem impecavelmente vestido, alto, forte; tem a cabeça lustrosamente raspada. Mesmo quando o velho apenas caminha pelos extensos jardins de sua propriedade ou pela cidade, ele está sempre ao seu lado, salvo raras exceções em que o assistente tenha que ir pessoalmente resolver alguns assuntos ou eliminar outros, quando é impossível que mais ninguém o faça.

Há muito tempo que o idoso não sai do solo italiano. Houve tempos em que permanecia mais tempo fora do país do que desejava; hoje em dia com as novas tecnologias pode se dar ao luxo de aproveitar mais os ares de sua amada Itália, sua cidade e a imensa propriedade particular, embora não dispense mão de obra de confiança nos locais em que tem interesse.

Nesse dia encontramos o velho sentado na varanda com o olhar no horizonte distante. Perdido num turbilhão de pensamentos, não percebe a presença da empregada, que traz o telefone.

— “Don” Giovanni. – A empregada o chama.

— Sim, Francesca. O que foi? – O velho responde parecendo acordar de um sonho.

— Telefone senhor. – A empregada entrega o telefone e retorna a casa.

— Sim? – A voz forte e dominante do idoso contradiz com seu porte debilitado.

A voz do homem no outro continente informa da prisão de seu filho e de mais alguns membros da "família". Relatando com detalhes precisos o ocorrido.

— Muito bem. Quero o nome de todos os agentes envolvidos. Estarei viajando amanhã. – Diz o idoso e desliga o telefone. Faz uma nova ligação. É rapidamente atendida.

— Venha imediatamente para cá e traga os homens. Amanhã iremos para Nova York. – Desliga sem mais palavras, põe o aparelho sobre a mesa e com uma expressão implacável, faz um voto silencioso de aniquilar cada um dos agentes, custe o que custar.

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Giovanni D’Angelo tinha agora noventa e seis anos, nascido em Mareno, na Sicilia era “Don” da “família” D’Angelo. Durante investigações, surgiram provas de que Giovanni entrou ilegalmente nos EUA, mas os registros são confusos e falhos. Existiam investigações inconclusivas de que na juventude ele teria se tornado um “buttom” da Mão Negra. O termo era usado para designar um executor de quadrilha. Passando a ser conhecido como um assassino frio e cruel, em menos de dez anos foi galgando posições de grande importância e poder na estrutura da “família”.

Investigadores do crime organizado, na época chamado de Mão Negra, Cosa Nostra ou Sindicato, que era como se conhecia a organização criminosa italiana nos EUA, são unânimes em afirmar que Giovanni D’Angelo foi o cérebro e o poder por trás da conversão do sistema violento num cartel semi-legítimo usado para encobrir contravenções.

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O jato particular de “Don” Giovanni corta o ar à velocidade máxima seguindo sem contratempos em direção à Nova York. Além dos dois tripulantes e os dois principais passageiros mais quatro homens de porte semelhante ao assistente, com ternos negros impecáveis e cabeças raspadas, viajam ao fundo da aeronave, calados e praticamente imóveis desde a decolagem. Após servir a bebida ao idoso o assistente volta ao seu lugar.

— O que vamos fazer em Nova York? – Pergunta o assistente.

— Quero que você elimine algumas pessoas. Tem que ser um serviço limpo e profissional, por isso estou confiando o trabalho a você e seus homens. – Responde o idoso.

Os olhos do assistente brilham com o elogio. Ele responde: - Obrigado senhor, é uma honra servi-lo.

— Mas essas não são pessoas comuns. São agentes treinados e inteligentes. Você fará contato com nosso informante no FBI, ele lhe entregará as informações necessárias. Depois disso quero que o elimine. – Diz o velho friamente sem dar mais informações.

— Mas senhor, perderemos um homem lá dentro. – Observa o assistente.

— Alguns sacrifícios são necessários. Não podemos correr riscos. – Responde “Don” Giovanni.

O assistente se limita a olhá-lo sem questionar mais nada. Ele sabe que o velho gosta de manter as informações sob seu poder até o último instante, criando um clima de mistério sobre seus planos.

A pequena janela junto à poltrona do velho mostra apenas a escuridão do céu que auxiliada pela reduzida luz da cabine convida o corpo para a sonolência. Mas não é hora para dormir, embora seu corpo não tenha mais a vitalidade necessária, a mente do idoso trabalha incansável. Usando o telefone do avião o velho digita vários números e após dois toques a ligação é atendida. Com a voz autoritária que lhe é característica ele informa ao homem do outro lado do Atlântico que se encontra a caminho e ordena que vá aguardá-lo no aeroporto. Encerra a ligação.

— Em breve vocês verão que ninguém fica impune por um ataque aos membros da “família” D’Angelo. – murmura para si mesmo, com os olhos fixos na janela.

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Localizada em Manhattan na movimentada 5ª avenida, entre as ruas 50 e 51, bem em frente ao Rockefeller Center, a catedral de Saint Patrick se ergue majestosa. Imprensada entre arranha-céus de vidro e aço, as janelas em arco e as torres perfurando o céu, destoam de toda arquitetura à sua volta. A igreja estremecia ao som do coral que jamais deixou de despertar até a mais sonolenta plateia. A cerimônia se encerra e a catedral agora deserta, tem como único ocupante um homem ajoelhado. Na mão, um envelope nervosamente manuseado. O barulho de passos contrasta com o silêncio do interior da catedral.

Sente a mão pesada sobre seu ombro. - Você está vinte minutos atrasado. – Reclama o homem ajoelhado.

Sem se justificar o recém-chegado o olha com frieza e pergunta: - Onde estão os papéis?

O homem se levanta. Sentindo-se intimidado pelo olhar do outro; entrega o envelope. Os documentos são examinados juntamente com as fotos.

— Estão todos aqui? – Pergunta o visitante.

— Estão. – Confirma o outro homem.

— Ótimo. Você foi muito cooperativo. – Exclama o visitante.

Ouve-se um estampido abafado pelo silenciador, e o informante cai derrubando o banco próximo. Logo se vê uma mancha vermelha ensopar a camisa do lado direito da barriga. O homem agacha-se, e cutucando com o cano da arma o peito do ferido diz cinicamente: - Já pensou se descobrirem um informante da Máfia no FBI?

Atônito o homem pressiona o ferimento enquanto rasteja tentando se afastar do assassino. – Mas..., eu fiz o que vocês pediram... Por que isso?

— Esse é um caso especial. A traição com seus colegas pode representar um perigo. Não podemos correr o risco de alguém descobrir e ligá-lo a nós. – E levantando-se dispara um segundo tiro, desta vez na cabeça, caminha até o centro da igreja, olha para o altar e sai calmamente pela porta central.

................... Na cena do crime.

Eram 7:50 da manhã, com as xícaras abastecidas pelo líquido marrom fumegando, a equipe de Stansfield estava acomodada à mesa terminando o café na Carnegie Deli, uma cafeteria ao lado do prédio do FBI. Ainda era novembro, no entanto, a luz do dia era cinzenta e muito fria. Sentada próxima à grande vidraça, Gabrielle observava os transeuntes que andavam apressados para o trabalho com as mãos nos bolsos dos agasalhos e as cabeças ligeiramente curvadas, tentando amenizar o vento frio que castigava os rostos descobertos.

— Esse ano parece que vamos ter uma nevasca fora de época. – Observa Claire.

— Com essas mudanças climáticas, as estações estão completamente loucas. – Eli completa.

— O pior é que esse agasalho não vai ser suficiente. Devia ter trazido meu sobretudo. – Diz Gabrielle se encolhendo.

Lucy ouvia a conversa sem se manifestar; se limitava a olhar as pessoas lá fora e a mulher de cabelos cor de raios de sol ao seu lado. O celular tocou.

— Stansfield? É o Robert. Venha imediatamente a minha sala. Temos que conversar. – Sem mais conversa o chefe se despede.

Lucy bebe o último gole de café e diz: - Ok pessoal, acabou a festa, o chefe está chamando.

Todos se levantam e seguem para o encontro. Quando já estava próxima a saída, Lucy despe o casaco e o oferece a Gabrielle. Surpresa a jovem agente com um tímido sorriso agradece, mas não era justo aceitar e deixar a chefe com frio. Lucy observa a beleza da loira e seu jeitinho de enrugar o nariz quando sorri.

— Não se preocupe comigo, meu pulôver vai ser suficiente até chegarmos ao FBI, além do mais não sou tão friorenta quanto você. – Lucy insiste.

— Mas Lucy... – Stansfield coloca o casaco delicadamente sobre os ombros da loira ao mesmo tempo que interrompe Gabrielle. – Não discuta. É uma ordem. – Diz a agente mostrando um belo sorriso. Seus olhares se cruzam numa expressão de afeto que crescia lentamente com a convivência.

— Vamos andando, o chefe não gosta de esperar. – Lucy diz desconversando.

No gabinete do 9° andar Robert examinava as pastas sobre a mesa quando Stansfield e sua equipe entram. O homem não deixou de esboçar um sorriso ao ver Gabrielle vestida com um casaco que “engolia” sua pequena silhueta.

Robert era um sujeito estranho. Era alto, cabelos castanhos arrepiados, os olhos pareciam sempre semi serrados e uma constante aparência de quem acabara de acordar. Tratava-se de um funcionário competente e tão aflito por mostrar bons resultados aos superiores que a carga de estresses por vezes quase o adoecia. Ele chefiava o departamento de agentes especiais, a elite do FBI, da qual a “Dama de Ferro” fazia parte.

— Damon foi morto. Quero que você se encarregue do caso. – Robert vai direto ao assunto se dirigindo à Lucy.

— Execução? – Claire questiona.

— Por que alguém iria matá-lo? Ele nunca foi agente de campo, nunca se envolveu em nenhuma missão. – Observa Eli em seguida.

— Isso é o que vocês vão descobrir. Ele tinha acesso às informações dos nossos arquivos, missões, agentes e etc. – Esclarece o chefe.

— Vazamento de informações? – Lucy pergunta.

— Não acredito, mas não podemos descartar a hipótese. – Robert responde.

— Não pode ter sido assalto? – Gabrielle arrisca.

— Ele foi encontrado morto com dois tiros dentro da catedral de Saint Patrick. – Robert responde e continua. – Aqui está a ficha dele. – Diz entregando a pasta a Stansfield.

Folheando rapidamente a pasta, Lucy se dirige ao pessoal da equipe: - Certo. Vamos lá pessoal! – Todos saem acompanhando a agente.

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As ruas em volta da catedral estavam agitadas como sempre, pessoas caminhando a passos rápidos, carros particulares, táxis, ônibus e caminhões circulavam no trânsito caótico de Manhattan. Em frente à igreja um carro do DPNY aguardava a chegada dos agentes. Embora a entrada principal estivesse isolada por faixas amarelas e policiais postados na calçada, não havia nenhum aglomerado de pessoas. Normalmente teriam que abrir caminho por um cordão de curiosos. Tinha sido proibida a entrada de turistas que diariamente visitavam a construção de estilo neogótico.

Lucy se apresenta aos policiais e pede um relatório da situação. O detetive informa que foram avisados pelo faxineiro. Ia começar a limpar a catedral para a missa da manhã quando encontrou o corpo.

— Quando vi a identificação, resolvi chamá-los. A cena do crime está intocada. Deixamos a diversão para vocês. – Diz o detetive com sarcasmo. – Só interrogamos o faxineiro.

— Onde ele está? – Claire pergunta.

— Lá atrás na sacristia, com o padre. Parece bastante abalado. – Informa o detetive.

Claire se dirige ao local indicado pelo detetive. Gabrielle olhava o teto incrivelmente alto, o grande órgão, o altar e o púlpito. Percorreu o comprimento da nave examinando as janelas de vitrais com imagens de santos, anjos e a provocante serpente. O chão do imenso corredor central era coberto por uma passadeira vermelha que se estendia da entrada até o final da igreja onde se encontrava o altar e logo atrás dele, pendia um enorme crucifixo com um Jesus esculpido. Na segunda fileira de bancos do lado esquerdo jazia o corpo de Damon. Lucy liga para a Dra. Maura Isles, médica legista do Laboratório de Criminalística do FBI.

— Alô, Isles? Estou com um crime nas mãos, você poderia vir até a catedral de Saint Patrick? – Numa rápida conversa sem maiores detalhes Lucy se despede da médica.

Do lado de fora Eli interrogava um morador de rua que foi detido pela polícia. Acostumado a mendigar esmolas próximo a escadaria da igreja poderia fornecer alguma pista para o caso.

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Do outro lado da rua na calçada do Rockefeller Center, um homem impecavelmente vestido perambula alguns minutos pelas lojas próximas; tomando um cappuccino a uma distância segura ele comparava as fotos e vigiava toda a movimentação na igreja. Os agentes vão iniciando a investigação sem perceber que os seus movimentos estão sendo monitorados pelo homem que agora fala ao celular.

Após o relato de tudo de modo sucinto e preciso, o homem escuta atentamente as instruções. – Sim senhor. Não se preocupe os alvos já foram visualizados... Espero pela sua ordem. – A chamada é encerrada.

................... Analisando as evidências.

Sentado no chão ele resmungava sozinho, tinha o rosto inchado, queimado de frio e espessa barba grande com fios grisalhos e amarelados misturados aos pelos ainda negros. Em intervalos ele lia uma passagem da bíblia de capa gasta e páginas encardidas, que tinha nas mãos deformadas por doença. Eli penalizado com o estado maltrapilho do morador de rua aproxima-se com um copo de café e um sanduíche.

— Gostaria de um café e comer alguma coisa? – Eli pergunta.

O homem ergueu os olhos, lacrimosos e sem brilho. Como se não tivesse ouvido o oferecimento do alimento, ele começa a ler em voz alta um capítulo aberto aleatoriamente. Eli coloca o café e o saco com o sanduíche no chão na frente do mendigo e diz: - Senhor..., preciso de umas informações, pode me ajudar? – O mendigo para como se finalmente tivesse voltado à realidade e observa o homem agachado à sua frente que o chamara de senhor. Vagarosamente ele abre o saco, retira o alimento e começa a devorá-lo avidamente como se fosse sua primeira refeição em dias; em curtos intervalos bebia o café deixando por vezes escorrer pela barba. Eli espera pacientemente que o homem termine a refeição. O mendigo se dispõe a responder todas as perguntas do agente que anota cada declaração feita e a descrição do homem visto saindo da Igreja tarde da noite. Agradecendo a colaboração Eli retorna para o interior da catedral, deixando a nota de um dólar na lata do mendigo.

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Quando Eli se junta as suas companheiras, encontra a equipe chefiada pela Dra. Isles começando os trabalhos de perícia do local. Colhendo cuidadosamente todas as evidências possíveis através de fotos, exames minuciosos com sofisticados aparelhos e produtos químicos específicos para esse tipo de investigação.

A equipe de Stansfield acompanha atentamente os trabalhos. Ao final o corpo é recolhido e enviado ao Laboratório de Criminalística para autópsia.

— Então, a que horas foi? – Lucy pergunta se aproximando.

— Num exame superficial eu diria entre nove e meia-noite. Mas só vou poder ter certeza com a autópsia. – Responde a médica.

A equipe de peritos já encerrara os trabalhos e se encaminhava para a saída, enquanto a médica conversava com Stansfield.

Lucy analisava as evidências iniciais. - Você observou que não tem sinais de luta ou de fuga? O assassino entrou calmamente, ficou de frente para a vítima e atirou... O que você encontrou?

— Parece que os tiros foram dados de perto. Tem uma mancha de sangue onde ele rastejou. Impressões de sapatos e digitais antigas e recentes, mas não tenha muita esperança minha amiga. Quem fez isso não deixou muitas evidências, é um profissional. – Responde Isles.

— Se os tiros foram de perto e ele não reagiu significa que Damon conhecia o assassino... Quando posso ter as respostas? – Lucy pergunta ansiosa.

— Amanhã lhe entrego o relatório da autópsia e o resultado da investigação. – A médica responde.

A conversa se prolonga por mais um tempo. A certa distância Gabrielle observava o charme e a elegância da médica legista e a atenção que Lucy dispensava a ela.

Lucy e Maura Isles se conheciam desde a época da academia. Stansfield era uma agente durona, inteligente, corajosa, perspicaz e competente e Isles uma inteligente, competente e vaidosa médica legista. Mesmo sendo diferentes, essas duas mulheres se tornaram grandes amigas e combinaram seus conhecimentos formando um forte relacionamento profissional que ajudou a desvendar vários crimes.

— Vamos Gabrielle! – A voz de Claire assusta a loira que desconcertada segue a companheira de equipe em direção à saída. Já na porta, Gabrielle por sobre o ombro dá uma rápida olhada na direção das duas mulheres.

................... O primeiro alvo.

Com o passar dos anos Claire e Lucy além de parceiras de trabalho se tornaram grandes amigas, ambas compartilhavam até os assuntos mais íntimos sem qualquer preconceito ou pudor. Lucy ouvia os desabafos da amiga sobre sua relação conturbada com David; acompanhou tudo até o desfecho da separação. Por sua vez Lucy confidenciava suas relações pouco duradouras, mas intimamente mantinha a esperança de um dia encontrar alguém a quem pudesse dedicar tempo, carinho e amor. Nessa hora a “Dama de Ferro” deixava transparecer seu desconhecido lado sensível.

Numa breve pausa para um café as duas agentes conversam reservadamente: - Lucy, o que você tem? – Claire pergunta preocupada.

— Nada. – A agente responde secamente.

— Ora, eu te conheço o suficiente para saber que você está preocupada e de mau humor. – Claire insiste.

Após alguns segundos em silêncio Lucy desabafa: - Sabe..., acho que me precipitei quando aceitei Gabrielle para a equipe. Ela ainda é muito inexperiente. Me parece insegura. Ela não é como nós.

— Mas nós também já fomos inexperientes, como ela. – Claire observa. – Ela é inteligente, esperta, me parece competente e responsável. O resto vem com o tempo... Eu acredito na loirinha. – Após alguns segundos de silêncio Claire volta a falar. – Você pretende fazer alguma coisa?

A fisionomia de Lucy está tensa, por fim ela responde: - Estou pensando em falar com Robert para transferi-la para o serviço interno, é mais seguro.

— Eu entendo que esteja querendo protegê-la, mas você vai magoá-la. Ela adora esse trabalho, além disso, ela gosta da nossa companhia..., principalmente da sua. – Claire responde com um sorriso malicioso.

O olhar surpreso de Stansfield diverte a parceira: - Você está fantasiando coisas sua louca. – Lucy responde desconversando.

— Será que estou mesmo? – Claire responde sorrindo.

Bebendo o último gole de café Lucy desconversa. - Vamos voltar ao trabalho.

— Lucy por que você está fugindo do assunto? Eu te conheço. Você está se interessando pela loirinha, não está? – Claire pergunta.

O silêncio vem como resposta. Após alguns segundos Stansfield sorri e diz: - Não tem como esconder nada de você não é?

— Desde que nos conhecemos nunca tinha visto você tão interessada por alguém. Quero dizer, interessada mesmo, não só uma aventura. Gabrielle abalou a Dama de Ferro..., quem diria hein? – Claire responde sorrindo.

— Também não exagere. Não é bem assim. – Lucy responde embaraçada.

Claire passa o braço carinhosamente sobre o ombro da amiga e diz: - Não seja boba... Olhe, pelo que pude observar ela também está balançada por você.

Os olhos azuis de Stansfield brilham nesse momento. – Não..., ela não me parece ter esse tipo de interesse. Só me vê como amiga e chefe, nada além disso... É bom que continue assim.

— Lucy, o jeito que ela te olha... Dá para perceber que existe uma química entre vocês. Ela se transforma, fica mais radiante, mais alegre..., sei lá. E você também muda, perde esse ar sisudo, tenso... Acho que você está se apaixonando minha amiga. – Claire diz com um sorriso malicioso.

— Pare com isso. Vamos embora, temos muito trabalho. – Lucy desconversa. As observações de Claire a deixam perturbada.

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David Craigan é o que se pode chamar de workaholic. Por conta disso as mulheres nunca aguentaram seu ritmo de trabalho, sua vida sentimental era um desastre. A única mulher que significou algo importante na sua vida foi Claire. Tiveram um relacionamento complicado; os constantes desencontros, ele pela compulsão com o trabalho e ela pelos afastamentos e “sumiços” por conta das missões secretas acabaram por desgastar a relação dos dois, mas Craigan ainda mantinha esperança de um dia voltarem a se entender.

Claire entra na sala com homens e mulheres andando de um lado para o outro, computadores, gritos, ordens, acenos de mão, ligações telefônicas. Ela se debruça sobre o ombro de Craigan, observando o monitor do computador. Com a proximidade, o perfume da mulher foi instantaneamente absorvido por ele, parecia ficar mais intenso nos longos cabelos castanhos que caiam sobre seu rosto. - Então? Conseguiu alguma coisa? – Ela pergunta.

Se esforçando para manter a concentração ele responde: - Ainda não, mas está quase. Ele usou vários computadores. O que consegui está na impressora.

Claire se dirige para a impressora e pega os papéis. Fica surpresa com o que vê. Nesse instante Craigan avisa que acabara de enviar o restante da pesquisa. Claire recolhe os papéis que vão saindo; seu espanto é ainda maior quando pega a última folha impressa. Ela junta as folhas e se aproximando do homem agradece e lhe dá um rápido beijo no rosto. Craigan ensaia dizer algo, mas ela já disparou porta a fora. Ele dá um profundo suspiro resignado e volta atenção para o monitor.

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Claire entra apressada na sala onde sua equipe se reunia para analisar as informações conseguidas até o momento; entrega os papéis para Stansfield. Ela os folheia sob o olhar curioso dos demais. Sua expressão se fecha. Gabrielle não se conteve e pergunta: - Lucy..., o que houve?

O silêncio paira na sala. Após vários segundos Lucy diz: - Eu mandei que Claire pesquisasse quais os dados que Damon havia acessado nas últimas semanas... Ele fez um levantamento completo de todos nós e do julgamento do processo do caso Sanderson..., muita coincidência não acha?

Todos se entreolham. – Você acha que Damon era um informante? – Eli arrisca.

— Só sei que temos que redobrar a atenção e os cuidados. – Lucy responde.

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A picape estaciona a poucos metros do prédio do FBI; do seu interior um homem de elegante terno negro e cabeça raspada examina a portaria. A vigília se inicia; o homem já recebeu a ordem do assistente para concluir a missão. Sem tirar os olhos da portaria do edifício ele fala com o outro “buttom” pelo celular: - O alvo está saindo. Devo segui-lo?

— Sim. – Responde o outro.

— E você? – Pergunta o primeiro homem.

— Vou “visitar” o apartamento dele. Não o perca de vista. Me avise qualquer mudança. – O homem diz saindo do Audi preto e se dirigindo a entrada do edifício onde Eli mora.

A picape preta parte seguindo o alvo que pegou um táxi.

O segundo “buttom” aproveita a saída de uma moradora e entra no prédio. Em minutos ele já está na escada de serviço, a caminho do 3° andar. Cerca de cinco minutos depois o homem consegue entrar no apartamento. Trabalho profissional, executado com muito cuidado. A decoração é moderna, mas nada luxuoso. Os tons escuros predominam. Examina cada cômodo atentamente, faz uma procura minuciosa, mas com o cuidado de manter tudo no devido lugar. Na gaveta da mesinha junto à cama encontra uma pistola automática particular; ele descarrega o pente e volta a guardá-la. Destrava a janela do quarto que dá para escada de incêndio externa. Trinta minutos e um telefonema depois, ele é informado pelo companheiro que o alvo está num bar com três mulheres. O “buttom” olha pela janela, o movimento da 6ª Avenida é incessante. Sai do apartamento satisfeito, estava tudo pronto.

................... Os atentados.

— Isles? É Stansfield... Está ocupada?... Humrhum. Sei. A que horas você sai?... Vamos tomar um drink? Preciso conversar... Ok, então te encontro as oito no Flint Bar. Até mais.

Lucy chega primeiro e consegue uma mesa atrás de dois casais barulhentos, que visivelmente eram turistas. Poucos minutos depois Claire e Isles chegam. Stansfield vê as amigas e acena. Alguns minutos depois Eli se junta às três. A conversa gira em torno do andamento das investigações que caminham lentamente, mas até o momento as evidências apontam para...

— Damon um infiltrado? – Isles diz estarrecida.

Um agente duplo é sempre algo muito prejudicial, especialmente quando não é detectado a tempo. Lucy sabe que se a Máfia estiver envolvida toda equipe estará em sério perigo. As evidências vão sendo enumeradas e analisadas detalhadamente. A conversa vai se desenrolando pela noite. Aos poucos as peças vão se encaixando, embora não de forma conclusiva, mas um caminho já podia ser traçado e tudo apontava para os D’Angelo.

Pelo adiantado da hora a reunião informal é encerrada. Stansfield se oferece em deixá-los nas respectivas residências. Após deixar a médica. Lucy segue para o endereço de Eli. Há tempos ela sabe do envolvimento de Claire e Eli. Jantavam juntos algumas noites depois do trabalho, bebiam um drink, iam para cama e estavam bem assim. A única coisa que Lucy sempre deixou claro é que esperava que eles não deixassem os assuntos pessoais prejudicarem a equipe, nem interferir no trabalho.

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Na picape preta os dois homens observam o casal que salta do carro. – Isso é ótimo, vamos poder pegar dois agentes de uma vez. Foi melhor do que esperava. – Diz um dos “buttom”. – Vamos nos separar.

Eli e Claire se despedem de Lucy. Estão ansiosos para chegar ao apartamento. O prédio antigo tinha uns poucos degraus até a porta de entrada. Eli sobe as escadas já afrouxando a gravata. Entram no apartamento; ele tira o coldre com a arma e o coloca sobre a mesinha da TV; caminha para o pequeno móvel com garrafas e copos e prepara uma dose de Whisky para ambos. Precisam tomar um banho e relaxar da tensão dos últimos dias. A noite promete ser bem agradável.

Nas áreas comuns do prédio o movimento é constante, dessa forma pessoas estranhas são indiferentes aos moradores. Sentado nas escadas, concentrado no jogo do seu Tablet, o menino nem percebe o homem que passa por ele em direção ao 3° andar.

Simultaneamente a janela do quarto é aberta vagarosamente. Como uma sombra o outro “buttom” entra já de arma em punho. A única luz acesa é a do abajur na sala. Silencioso, ele se encaminha para a sala. Se esgueirando junto à parede ele vê o casal. O homem aponta a arma; um tiro certeiro na cabeça e a missão estará cumprida.

Ao mesmo tempo dois estampidos secos parte a fechadura. Um chute faz a porta se escancarar com força. O homem invade o apartamento ao mesmo tempo em que Eli, num reflexo de sobrevivência arremessa a garrafa no homem, que por sua vez se esquiva com movimentos rápidos de quem sempre espera o inesperado. Eli aproveita e se joga atrás do sofá escapando dos disparos. Ele olha para a arma que agora está mais próxima. Uma sensação de raiva e frustração toma conta do agente.

Simultaneamente Claire percebendo a sombra do outro homem se joga do sofá para o chão já sacando a arma. A bala transpassa o encosto do móvel onde a pouco estava a cabeça da agente. Em segundos a sala se transforma num campo de batalha, tiros sendo disparados de ambos os lados, até que numa fatalidade Claire é acertada na barriga do lado esquerdo. Ela se curva e tomba pressionando o ferimento, o sangue escorre entre seus dedos pingando no tapete.

— CLAIRE! – Eli grita desesperado.

Na urgência de desviar a aproximação do homem ele atira o abajur sobre o invasor, ao mesmo tempo em que se atira na direção da sua arma. Disparos são feitos. Eli tomba com um tiro próximo a virilha. O “buttom” se aproxima para o tiro fatal. Pressionando o ferimento, num gesto de desespero repentinamente ele estende o braço para a arma já ao alcance da mão. O assassino atira. A bala perfura o peito de Eli que se encolhe e tomba de vez no chão.

Enquanto isso o outro homem se aproxima e pisa sem piedade no pulso de Claire; ela solta a arma, ergue os olhos e vê o sorriso sarcástico do assassino, acompanhado de um silenciador apontado direto entre seus olhos. Não teve muito tempo para encará-lo. Um disparo foi a última coisa que ela ouviu antes de sua visão escurecer.

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Na rua a agitação habitual de trânsito e pessoas não é suficiente para desviar a atenção da agente da picape preta de vidros escuros estacionada próximo ao prédio de Eli. O carro lhe parece suspeito. Há qualquer coisa nele que a incomoda. O que será?

— Já vi esse carro. – Diz a si mesma. – Sem dúvida que sim. – Lucy puxa pela memória e recorda-se de tê-lo visto estacionado em frente a catedral dias atrás. Ela estaciona na primeira vaga que encontra; liga para central, informa a placa do veículo e aguarda a resposta. Dois minutos depois ela é informada que o veículo pertence a César D’Angelo. Ela sai do carro e corre na direção do prédio de Eli. Sobe pulando os degraus até o 3° andar; ouve os tiros. Invade o apartamento de porta escancarada a tempo de ver o homem com a arma apontada para a cabeça de Claire. Sem pestanejar ela dá um único e certeiro tiro na nuca do assassino. O “buttom” desaba pesadamente junto de Claire.

O segundo “buttom” atira na direção de Stansfield. Num reflexo de um piscar de olho a agente responde ao fogo. As balas cruzam a sala com disparos contínuos. O homem tenta abaixar-se por trás de um móvel, mas tem o ombro atingido. Mais alguns disparos e por fim o silêncio se faz. O assassino jaz com o peito, o ombro e a cabeça atingidos.

Lucy corre até Claire, mas a encontra desmaiada. Eli respira com dificuldade, uma golfada de sangue espumoso sai de sua boca. Imediatamente ela dá os telefonemas necessários e aguarda a chegada do socorro.

Um dos telefonemas é atendido com voz sonolenta. – Sim?

— Isles? É Lucy. Pegaram Claire e Eli. Preciso de você! – A aflição da voz de Stansfield é sentida pela médica, que sem mais perguntas se encaminha para o endereço de Eli.

Lucy desliga o celular. É então que percebe a blusa molhada de sangue no local do ferimento de raspão na lateral das costelas.

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De longe o 3° “buttom” assistia a cena das ambulâncias recolhendo os corpos. Os quatro sacos pretos foram colocados nos veículos. Isles acompanhou o transporte onde estavam Claire e Eli.

— Senhor ocorreu um problema... Tivemos duas baixas. Mas os alvos foram eliminados. - A comunicação se deu de maneira fria e profissional. A perda dos companheiros não significava nada. Ele como todos os outros sabiam que danos colaterais são normais e que acontecesse o que acontecesse os agentes teriam que ser eliminados.

O assistente não esboçou qualquer sentimento com a notícia. Apenas se limitou a dizer: - Pelo visto vocês subestimaram os agentes, mas isso não voltará a acontecer. Entendido?... Mas foi um bom trabalho. Vou informar “Don” Giovanni. – O assistente diz ao “buttom”.

— Quem é o próximo? – O homem pergunta.

— Se encarreguem da loira. – E o assistente desliga da forma brusca habitual.

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Quem trabalha em determinados setores do FBI está de tal maneira comprometido com o dever que praticamente perde o vínculo com o mundo exterior. Tudo em nome do bom desempenho das missões. Os últimos dias foram tensos e exaustivos. Com os pais e a irmã morando em Los Angeles, Gabrielle se sente sozinha longe do aconchego da família. Apesar de já ter criado vínculos com muitas pessoas, a grande maioria eram companhias de trabalho. Ao ingressar no FBI quando permaneceu incomunicável por seis meses em treinamento, sentiu sua vida sentimental se abalar. Poucos meses depois com o casamento já com data marcada, a relação não resistiu a mais três meses sem voltar para casa após o atentado da Maratona de Boston. Limitando-se a um telefonema semanal onde tentava convencer o noivo que voltaria no mês seguinte. É evidente que quando o regresso aconteceu, o noivo já tinha dado por encerrada a relação e partido para trabalhar na filial londrina da empresa.

— Droga, ninguém atende! – Gabrielle reclama. - Interrompe a chamada e faz outras tentativas. Todas às vezes ouviu apenas a voz metálica informando que o número procurado não está disponível naquele momento. Por fim ao ouvir o sinal deixa um recado para os pais. Aborrecida ela joga o celular sobre o sofá e acomoda-se na poltrona folheando uma revista. Assusta-se com o som do celular e pula da cadeira.

— Até que enfim! – Diz aliviada acreditando ser o pai. – Pai?

Nenhuma resposta, mas o som do outro lado da linha denuncia o ruído de rua, carros passando e vozes desconhecidas. Ela insiste na pergunta, mas a curiosa coincidência do som de uma sirene que irrompe no fone do aparelho ao mesmo tempo em que passa sob sua janela quatro andares abaixo a deixa em alerta. – Muita coincidência?

Apaga todas as luzes, mergulhando o apartamento na escuridão. Se posiciona junto à janela protegida pela parede. Na rua o tráfego agitado de veículos e pessoas, não denuncia nada suspeito.

Você está ficando paranoica. — Diz a si mesma, acalmando momentaneamente a tensão. No entanto alguma coisa chama sua atenção para o homem de cabeça raspada que fuma tranquilamente encostado na picape preta estacionada na calçada em frente e olha fixamente para sua janela. O homem atravessa a rua e desaparece de sua linha de visão. Algum tempo depois a campainha toca uma, duas, três vezes. Com o susto seu coração dispara. Ela pega a pistola na mesa próxima à porta e engatilha a arma. Após alguns instantes quem quer que esteja do lado de fora agora mexe na maçaneta. Ela se abriga atrás do sofá próximo à janela. O ranger das dobradiças avisa que a porta foi aberta; passos estalam no assoalho. Com os ouvidos atentos ela detecta que o intruso examina a sala e depois se dirige ao quarto. Ele abre armários, examina cada cômodo. O caminhar era nitidamente ouvido no assoalho, de repente o silêncio.

A agente aguarda vários minutos tentando identificar algum som, por fim levanta a cabeça cuidadosamente. A sala está vazia. – Onde você está? – Ela pensa.

Na escuridão ela não vê o vulto protegido pela parede do pequeno hall. As luzes dos letreiros luminosos que entravam pela janela criavam sombras na sala. Ela se tornara um alvo fácil. Um estampido seco e a bala raspa sua orelha. Instintivamente Gabrielle coloca a mão sobre o ferimento. O sangue escorre entre seus dedos; o tempo do gemido de dor é suficiente para que o homem esteja a sua frente com a arma apontada para ela. Os milésimos de segundos não serão suficientes para uma reação da agente.

Dois disparos. É tudo que ela ouve e logo em seguida o barulho do homem caindo pesadamente no chão com os olhos arregalados na direção dela numa expressão de surpresa.

Nem Gabrielle compreendeu de imediato. Só instantes depois reparou dois pequenos buracos no vidro da janela. Ela coloca a mão nas costas do homem e sente a umidade entre os dedos, na saída às balas fizeram grandes buracos. Cautelosamente examina o prédio de cinco andares em frente. Apenas um atirador de elite conseguiria acertar um alvo com tamanha precisão daquela distância e com pouca luz. Alguém fizera o papel de anjo da guarda. Mas quem?

A prioridade agora era comunicar o ocorrido às autoridades e providenciar seu atendimento médico. Seu primeiro pensamento é ligar para Stansfield e comunicar o fato.

................... Longe do perigo?

— Lucy..., Lucy você não pode fazer isso comigo! – Gabrielle esbraveja enquanto segue a agente que caminha a passos largos pelos corredores do FBI, sem nenhuma palavra.

— Lucy... LUCY! – Gabrielle berra segurando firmemente o braço da agente querendo parar sua caminhada. Numa reação imediata Stansfield para fuzilando a loira com o olhar.

Gabrielle caindo em si desculpa-se. – Por favor, não me tire da equipe.

Lucy a olha seriamente. Não demonstra nenhuma sensibilidade com o pedido de Gabrielle, se limita a responder friamente: – Você não vai sair da equipe, vai apenas ficar no serviço interno à nossa disposição.

— Não é isso que eu quero. – Gabrielle responde taxativa.

— Escute mocinha aqui não se tem “querer”, cumprimos ordens entendeu? Estamos lidando com gente barra pesada, sem o menor escrúpulo nem sentimento. Eles não vão pensar duas vezes em estourar sua cabeça. Você viu o que aconteceu com Eli e Claire..., e por pouco com você também. – Lucy responde rispidamente.

— Eu dei sorte. – Gabrielle responde.

— Não trabalhamos confiando em “sorte”. Você vai ficar no serviço interno e não se fala mais nisso. Entendeu? Não posso ficar me preocupando com uma agente inexperiente. – Lucy responde visivelmente irritada, os olhos azuis chispavam.

Gabrielle parou de falar. Faltou a voz, enquanto brilhavam lágrimas em seus olhos. Num fio de voz ela pede: - Por favor, eu quero ficar com você..., é, quer dizer com vocês. – A loira corrige no último instante.

Encarando os olhos verdes esmeralda, por alguns segundos um sentimento de ternura se apodera da Dama de Ferro, aquela doce criatura e ao mesmo tempo tão decidida estava abalando sua decisão. Encerrando a conversa ela diz: - Vou falar com Robert hoje mesmo.

As palavras de Stansfield atingiram Gabrielle como um soco. Ela sai apressada pelo corredor de cabeça baixa tentando esconder as lágrimas que insistiam em brotar.

Lucy continua o caminho para sua sala, entra e se joga na cadeira, amargurada com o que acabara de dizer, mas era para o bem de Gabrielle. Ver os olhos lacrimejantes da loira rompeu sua couraça. Ela sabia que Gabrielle jamais a perdoaria, mas certos sacrifícios são necessários. Era mais importante mantê-la viva.

...........................................

A voz firme do assistente atende o celular. - Sim? Correu tudo bem?

O “buttom” respira fundo e diz: - Senhor, as coisas não correram bem. O alvo escapou e tivemos outra baixa... Sim eu sei, a baixa é o de menos.

O assistente ouvia lívido. A sua equipe tinha sofrido três baixas. Ele desliga o telefone visivelmente irritado. Sem dúvida nenhuma “Don” Giovanni não irá gostar nada da notícia. Ele sabia que apesar de estar trabalhando com “Don” Giovanni há muitos anos, isso não será motivo para que o velho carrasco não corte sua cabeça.

A casa era grande e confortável construída no centro de uma grande área, mas sem ostentação. Cercada por um muro reforçado de três metros encimado por uma cerca elétrica. Os grandes portões automáticos se abrem dando passagem ao carro que se move em baixa velocidade até a entrada da casa. O veículo para junto aos quatro degraus que dão acesso a entrada da residência. Ele desce do carro, sobe os degraus e para, olhando a porta de entrada, ajeita o terno e entra.

Com a intimidade que demonstra ter com o hóspede da casa, o assistente logo é encaminhado para o local onde o velho se reunia com alguns membros da “família” D’Angelo. O idoso o cumprimenta com um aceno de cabeça.

“Don” Giovanni..., - Não foi necessária mais nenhuma palavra, a voz do homem estranhamente hesitante já denunciava que as coisas não saíram como planejadas.

— Presumo que as coisas tomaram outro rumo desde nossa última conversa. – Afirma o velho.

— Sim senhor..., - O assistente sente o olhar de desprezo do velho.

— Lembra-se que o alertei que não eram pessoas comuns? – Diz o velho.

Ele sente o peso do olhar de todos da sala. Evitando encarar “Don” Giovanni, o assistente diz: - Senhor é uma situação completamente imprevista. Mas lhe garanto que não haverá mais erros. Agora só restam duas agentes. A agente Stansfield e uma tal de Gabrielle.

— Você não compreendeu. Pelo que sabemos Stansfield não é de fugir da luta. A sua falha vai fazê-la redobrar a vigilância. Dentro de três dias tenho que voltar. Tenho assuntos pendentes em Roma. Quero isso resolvido antes de partir. Trate disso pessoalmente e o mais depressa possível. Agora se mexa! – Diz o velho.

Com o rosto vermelho e o olhar faiscando de raiva ele se dirige a saída. Respira fundo tentando se acalmar. Cabeça quente propicia a erros, e isso é uma coisa que não pode mais acontecer. A estratégia tinha que ser redefinida. Estava na hora de mudarem o tipo de isca para pegar o peixe grande. – Vou pegar as duas de uma vez só. – Resmunga para si.

Novamente o serviço de invasão de propriedade é executado com muito cuidado. As ordens do assistente são explícitas, não pode haver mais erros.

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O dia se passou monótono para a jovem agente. Fazendo o caminho para casa de táxi, Gabrielle está com o olhar perdido nos letreiros luminosos e vitrines que instigam o consumo dos mais diversos produtos. Já mora em Nova York a mais de dois anos, mas continua se sentindo uma forasteira. Quando entrou para o FBI imaginava-se como uma agente envolvida em missões secretas, com adrenalina correndo nas veias a cada dia, e agora estava trabalhando entre quatro paredes e “plantada” na frente de um computador.

O táxi para no endereço indicado. Ela entra no prédio e estranha a ausência do porteiro. Pega o elevador para o 4° andar. Entra no apartamento acende a luz e vai se desfazendo dos seus objetos. Então repara que o quarto está iluminado; provavelmente esquecera a luz acesa. Caminha até o quarto e se depara com o porteiro imóvel no chão sobre uma poça de sangue; confortavelmente sentado numa cadeira está o assistente; o “buttom” se aproxima por trás encostando o silencioso na nuca da loira.

— Boa noite Gabrielle. – Diz o assistente com voz firme.

— Quem... quem são vocês? – Gabrielle pergunta tentando não deixar transparecer o medo que se instalou.

A resposta não chegou a ser ouvida, Gabrielle leva uma pancada na nuca que a derruba e deixa sem sentidos.

................... Preparando a armadilha.

— Deixe o carro a uns cem metros do prédio, não podemos nos denunciar. – Ordena o assistente ao “buttom”.

O homem entra no prédio e procura por Lucy Stansfield. Identifica-se como parente. O porteiro informa que ela não está. Ele pede que seja entregue a ela um pequeno envelope. Agradece e sai do local.

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Com a cabeça fervilhando ela entra no hall do prédio e se depara com várias correspondências no seu escaninho. Misturado a elas um pequeno envelope. Ela observa que não tem remetente, apenas o seu nome impresso.

— Quem entregou isso? – Stansfield pergunta ao porteiro da noite.

— Não sei lhe dizer senhora. Não foi entregue no meu turno. – O homem responde.

— Tudo bem, Não tem problema. Obrigada. – Diz a mulher com um leve sorriso.

Ela se dirige ao elevador. Abre o envelope, tira um pendrive e um bilhete. - “Divirta-se.” - Sua fisionomia muda visivelmente. Seus músculos se contraem, seu maxilar se cerra quase dolorosamente. Imediatamente ela corre para o apartamento abre a porta, liga o notebook e insere o pendrive.

Após alguns instantes um voz sem imagem a saúda: - Boa noite agente Stansfield. Ainda não tivemos oportunidade de nos conhecer pessoalmente, mas isso não vai demorar a acontecer. – Diz o homem com sarcasmo. Uma gargalhada enche o ouvido da mulher, irritando-a. Após dois segundos aparece a imagem de uma porta sendo aberta. Sem imaginar tal cena, Stansfield vê horrorizada, um homem de terno preto, em pé ao lado de Gabrielle algemada numa parede com os braços para cima, obrigando-a a ficar de pé. O sangue escorre por um corte no lábio da loira.

— AH, MEU DEUS NÃO!!! – O grito explode na garganta de Stansfield. O pânico toma conta do raciocínio da agente. Um nó na garganta a sufoca, seus olhos lacrimejam, o desespero, a dor da impotência, da incapacidade de proteger Gabrielle rasga seu peito. Tenta inutilmente controlar as lágrimas que brotam nos seus olhos, se sente sufocando, então ela ouve novamente a voz do homem.

— Você certamente conhece o “caixão frio”, não é? - Diz o homem.

Lucy entra em desespero. O “caixão frio” era um recurso que a Máfia usava para se desfazer de pessoas “indesejáveis”. As pessoas eram enterradas vivas e seus corpos nunca eram encontrados.

Agora mais do que nunca tinha que se manter lúcida. Lutando contra o pânico ela respirava fundo tentando acalmar-se. Num esforço sobre humano exigia de si toda concentração; tinha que existir um meio de identificar o lugar. Era óbvio demais que era uma armadilha. Eles sabiam que ela iria fazer o impossível para encontrar Gabrielle.

Sempre existe uma falha. - Ela pensou. Retira o pendrive e volta para o FBI.

Ela entra esbaforida na sala e encontra Craigan debruçado sobre o micro digitando, analisando e redirecionando dados. Ele se assusta com a mão pesada sobre seu ombro.

— David preciso de sua ajuda. – Lucy mostra o pendrive – Preciso que você analise e decodifique essas imagens. Analise tudo que puder. Veja se consegue alguma referência, alguma coisa que ajude a descobrir onde é esse lugar. É urgente.

— Agora não é possível, tenho que entregar esse relatório em vinte minutos. Vai ter que esperar. – O homem responde.

Lucy gira a cadeira deixando Craigan de frente para ela, com os olhos faiscando de raiva, agarra-o pela gola da camisa e aproximando seu rosto do dele diz: - Escute, essas pessoas são as mesmas que atiraram em Claire. Se você realmente se importa com ela e quer justiça, então me ajude a encontrá-los.

A lembrança de Claire desaba como uma montanha sobre o homem. - Eu não sou especialista nisso. Vou te mandar a alguém que pode te ajudar mais que eu. – Ele faz uma ligação interna: - Alô..., Karl? É o David. Preciso de um favor. – Após uma breve explicação, o encontro é acertado e antes que Lucy se afastasse, ele a segura pelo braço e murmura: - Pegue-os.

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Karl é um especialista em som e imagem. Nos poucos minutos que o homem está trabalhando o vídeo, Lucy vê numa velocidade vertiginosa as imagens serem selecionadas e ampliadas a procura de algum indício que possa ajudar no reconhecimento do local. Os minutos vão se passando, mas nada é encontrado para desespero de Stansfield.

— Não é possível. Tem que haver alguma coisa. – Ela desabafa nervosa.

— Sinto muito, mas fiz tudo que foi possível. Esses caras são espertos, não deixaram nada à vista. – Karl responde com certa frustração.

Lucy desaba numa cadeira, com o rosto escondido entre as mãos deixa escapar um soluço. Karl a olha sensibilizado, indeciso se falava alguma coisa ou não. De repente como último recurso lembra-se de analisar a parte sonora da gravação. O vídeo é novamente assistido, mas dessa vez o trabalho tem a finalidade de separar a imagem do som. As distorções sonoras aparecem em gráficos na tela. Vários ruídos se sobrepõem, mas Karl consegue captar e diferenciar a maioria. Nenhum som que possa servir como referência; ruídos abafados de motor, murmúrio de vozes. A gravação é repetida mais três vezes, até que por fim Karl detecta um som quase inaudível que passara despercebido anteriormente. – Espere..., tem algo aqui.

Lucy salta da cadeira quase a derrubando: - O que foi?

Karl repete o trecho da gravação. – Ouça..., o que lhe parece?

— Não sei..., está estranho. Tem como aumentar? – Lucy pergunta já com esperança.

— Não dá, já está no máximo possível, mais que isso vai distorcer completamente o som. – Karl responde.

— Repita. – Lucy pede.

Karl obedece e dessa vez Lucy com o sentido totalmente voltado para a gravação detecta sons de grasnados. – A mente da agente trabalha analisando, deduzindo a informação. - Aves..., são aves!... Gaivotas, o rio..., é isso! – Com a adrenalina já correndo nas veias, imediatamente ela liga para Craigan.

— David eu preciso que me diga se existe algum armazém, depósito, galpão, prédio abandonado, qualquer coisa do tipo nas margens do rio. Depressa, não temos tempo! – Lucy diz com a voz aflita. Em seguida ela se dirige para Karl: - Obrigada, muito obrigada, te devo essa! – Sai disparada para sala de Craigan.

...........................................

— Ok, já estou jogando os dados..., tenho que me conectar com os arquivos da Prefeitura. – Diz Craigan.

Os minutos se passam como se fossem séculos. – Não dá para ir mais rápido? – Lucy pergunta ansiosa, debruçada sobre o ombro do homem.

Craigan se limita a um rápido olhar sem responder. Os dados solicitados aparecem na tela, em ambas as margens são um total de cento e oitenta e dois imóveis que se enquadram na pesquisa solicitada pela agente.

— MERDA! – Lucy exclama esmurrando a mesa do computador. Caminha inquieta pela sala. O cérebro super ativo da agente analisa a situação. Não dispõe de tempo para ser desperdiçado em tentativas, são muitos lugares para serem investigados. As evidências do caso Damon se cruzam com os fatos dos atentados a equipe. O raciocínio lógico conduz a uma hipótese.

— David preciso saber quem são os proprietários desses imóveis. – Diz a agente repentinamente.

— Quê? Mas o que isso... – a frase é interrompida com o olhar de Stansfield que se crava no homem.

— Ok, ok. – Ele acessa novamente os arquivos da Prefeitura e aparece a lista dos proprietários.

— Veja se existe algum em nome dos D’Angelo. – Orienta a agente.

A relação rola velozmente pela tela. Ao final, aparece a mensagem que não foi encontrado nada no parâmetro solicitado. Ela pragueja.

Craigan empurra a cadeira para trás e levanta-se para um rápido alongamento. Lucy ocupa o seu lugar e com o mouse rola novamente a lista no monitor. Já haviam se passado noventa e um registros quando ela subitamente para. Sai disparada pela porta, acompanhada pelo olhar espantado de Craigan. Ele se aproxima e lê o registro de um depósito no East Side, em Manhattan, em nome da Beneth Co.

................... Um motivo além da razão.

— Você enlouqueceu? Isso é fora de cogitação! – Robert exclama exaltado.

— Robert, é a única chance de resgatá-la! – Lucy responde.

— Não, nem pense nisso. Não vou autorizar essa loucura! Você está esquecendo os riscos que vai correr? Não está vendo que é uma armadilha? – O homem questiona.

— Eu aceito os riscos. – Lucy insiste.

Robert a olha incrédulo. Lucy não parecia ser mais aquela agente sempre fria e racional. O que a estaria levando a uma atitude tão radical de por a própria vida em risco? – O homem se questionava.

Após alguns segundos de silêncio ele diz: - O que você está pedindo é perigoso demais. Você parece que perdeu o bom senso. Parece que essa missão se tornou uma coisa pessoal. - Sem esperar resposta ele continua. – Minha situação é delicada demais. Minha cabeça vai rolar se seu plano não der certo, além de ter 99% de chance de você morrer.

— Chefe se você quiser eu assino um documento assumindo toda a responsabilidade sobre a operação e os riscos, por favor, não posso deixar Gabrielle morrer. Tenho que tentar salvá-la! – Lucy responde olhando o homem fixamente.

— Stansfield eu não posso autorizar uma operação dessa só baseada em suposições. Não existem provas concretas que os D’Angelo estão envolvidos. Estaremos cavando nossas próprias covas, você sabe disso. É melhor esquecer e tentar outro jeito. – Pondera o homem.

Lucy vai ficando cada vez mais irritada com a intransigência do homem. Os minutos estão passando, escorrendo entre seus dedos. A sensação de impotência é desesperadora. Por fim ela decide uma última cartada. – Robert, entendo perfeitamente sua posição. Já que você não quer autorizar a operação, pelo menos a ignore. Peço em nome da nossa amizade de muitos anos.

— Quê? O que você quer dizer com isso? – Questiona o homem surpreso.

— O que estou dizendo é que com ou sem sua autorização vou tentar salvar Gabrielle. – Responde a agente.

— Você está me desafiando? – Robert pergunta perplexo.

— Só quero que você entenda que não é só por Gabrielle. Essa situação com os D’Angelo será eterna. Eles se julgam acima da lei e da justiça. Se pudermos dar mais um golpe, dessa vez acertando no “Don” da família. Vamos desestruturá-los pelo menos por um bom tempo. Esses mafiosos miseráveis vão ver que não podem fazer o que bem entendem por aqui e continuarem ilesos. – Lucy diz.

Robert a encara e fica em silêncio analisando as palavras de Stansfield. Por fim diz: - Você está consciente de que é isso mesmo o que quer fazer?

— Estou sim. – Lucy responde.

— Está bem, vou designar dois agentes para te dar apoio, me dê uns minutos. - Robert analisa a relação de agentes no computador, depois faz as ligações necessárias e determina que os agentes se apresentem imediatamente na sua sala. Em seguida liga para o departamento de tecnologia e encaminha Stansfield. Ela agradece e se dirige para a porta. O homem no último instante diz: - Lucy..., - Ela se vira atendendo ao chamado. - fique viva! - A agente esboça um sorriso e sai.

...........................................

— Isles..., nós somos amigas a muito tempo não é? – Pergunta a agente.

— Somos por quê? – Responde a médica.

— Posso te pedir um grande favor? – Diz a agente.

— Que pergunta mais ridícula. É claro que sim! – Isles responde com rispidez.

Lucy mostra a Isles uma cápsula do tamanho da unha do dedo mínimo, contendo um nano chip e explica a sua intenção. A médica se espanta com o pedido da amiga.

— Você deve está brincando. Sabe o que está me pedindo? – Isles responde espantada.

— Eu sei que meu pedido é absurdo, mas, por favor, me ajude, eles já pegaram Eli e Claire, e Gabrielle está nas mãos daqueles filhos da pu... – Lucy se contém no último instante.

— Lucy esse tipo de coisa ainda não foi autorizada. Está em fase experimental, nunca foi feito em humanos. Você enlouqueceu? – Rebate a médica.

— Eu aceito o risco. – Lucy responde e com voz quase suplicante: - Por favor, me ajude a salvar Gabrielle.

Após alguns instantes de silêncio, Isles diz: - Sei que devemos deixar os amigos terem segredos, você não tem porque me contar tudo o que faz, eu respeito isso, mas você há de convir que isso é no mínimo... – Lucy a interrompe. – Isles... Ela é importante para mim.

Isles observa Stansfield por alguns instantes em silêncio. O olhar angustiado da amiga sensibiliza a médica. Passados alguns minutos o procedimento do implante é iniciado. Uma picada rápida e profunda; um pequeno corte e pouco depois o procedimento está terminado.

— Pronto, aí está! É incrível o que a tecnologia faz hoje em dia. Alguns anos atrás isso seria pura ficção científica. – Diz a médica colocando um pequeno curativo no corte.

— Obrigada... Está tudo bem? – Lucy pergunta.

— Não se preocupe foi apenas um corte do tamanho do chip, esta implantado na derme, quando a anestesia passar você vai sentir um incômodo pela sensibilidade do local, mas é suportável. – A médica responde enquanto retira as luvas.

— Te devo essa, amiga. – Lucy diz emocionada enquanto veste a blusa.

Isles a olha por alguns segundos e diz: - Lucy..., não comente com ninguém sobre isso ou minha cabeça vai rolar.

— Fique tranquila, vai ser nosso segredo. – Stansfield responde. – Agora preciso de mais um favor. Você é a única pessoa em quem posso confiar para fazer isso.

— O que você quer? – Isles responde olhando seriamente para a agente.

Lucy passa o número de um telefone e explica o que deve ser feito. A médica ouve espantada o plano de Stansfield. Isles repete as instruções para que não houvesse qualquer dúvida e conclui: - É só isso?

— Só. – Lucy responde.

— Está bem, pode contar comigo. – A médica responde apertando as mãos da agente entre as suas.

— Obrigada Isles... – Um súbito alívio é demonstrado num tênue sorriso de Stansfield.

Os agentes se apresentam a Dama de Ferro conforme determinado por Robert. Lucy não dispõe de tempo para avaliar seus novos parceiros. Sua vida e o sucesso do plano dependerão da precisão e competência deles.

................... Mordendo a isca.

Já é noite. Tudo calmo nas imediações do depósito. A adrenalina jogada no sangue deixa os sentidos em alerta total, os músculos contraídos prontos a responderem num piscar de olhos. Lucy para o carro duas ruas após o depósito. Engatilha a arma e se esgueira até o portão do depósito se comprimindo contra a parede.

Lucy é observada de outro carro pelos dois agentes. – Não estou gostando disso. Está muito calmo, muito fácil. – Brunhilda murmura.

— Eu também não, mas temos que seguir as ordens. Temos que aguardar o sinal. – Frankie responde.

No monitor do painel do carro um pequeno ponto vermelho se move indicando sua localização. Cada movimento é acompanhado atentamente pelo casal.

Lucy abre vagarosamente o portão e corre na direção dos grandes caixotes empilhados. No meio do amplo galpão está a picape preta; mais a frente tonéis empilhados próximos à parede formam uma escada que dá acesso às janelas altas do galpão.

Observando o circuito interno o “buttom” avisa ao assistente: - Senhor, ela chegou. Está sozinha.

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A aguçada audição da agente percebe o leve barulho de porta se abrindo. Pelo fundo do galpão surge um vulto que se aproxima cautelosamente se esgueirando junto aos tonéis. Propositalmente Stansfield se deixa surpreender por trás pelo “buttom”. Com o cano da arma encostada na cabeça ela ouve a ordem: - Largue a arma!

Ela deixa a arma cair e levanta vagarosamente as mãos. O homem dá uma pancada na nuca de Lucy; ela cai, mas não perde os sentidos. Instintivamente massageia o local atingido. O assistente se aproxima e a levanta pela gola do casaco. O “buttom” a revista. Encontra mais uma arma; entrega as duas armas ao assistente.

— Olá Stansfield..., você demorou. – Diz o assistente com um sorriso sarcástico e continua. – Que bom que você nos poupou trabalho vindo até aqui. – Lucy o encara. Os olhos azuis refletem um brilho frio.

O assistente dá um soco no rosto da agente cortando seu lábio. O sangue imediatamente escorre pelo ferimento. Lucy não reage. Ele ordena ao “buttom”: - Pode levar. Vou avisar “Don” Giovanni.

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O telefone toca. O mordomo atende e se encaminha com o telefone sem fio para o idoso que está comodamente sentado na sala de estar, entretido com as notícias na TV.

Os segundos seguintes se passam com o velho escutando e falando o estritamente necessário. Nota-se que o assunto o desagrada. Quando desliga seu semblante está totalmente modificado. Em seguida manda chamar dois homens que fazem a sua segurança; digita alguns números no telefone; a ligação é atendida no segundo toque. Não é necessária identificação. A voz autoritária de “Don” Giovanni é inconfundível.

— Estou indo para aí agora. Não façam nada até eu chegar. – O velho ordena ao homem que atendeu o celular. Em seguida desliga.

Os dois gigantescos seguranças estavam parados na entrada da sala de estar aguardando as ordens. O idoso se levantando com dificuldade apoiado na bengala, ordena: - Tragam o carro. Vamos encerrar um certo assunto.

Tão logo chega a porta o idoso empalidece e se apoia no segurança a sua esquerda.

— Espere. – Ordena o velho ofegante. – Deixe-me recuperar o fôlego. – Quem o ouvisse acreditaria que é asmático.

Ainda leva alguns minutos para que sua respiração se normalize, mas assim que consegue, o velho solta o braço do segurança e assume uma pose senhorial onde a bengala parecia ser apenas um adereço e não um suporte.

...........................................

O local é escuro de paredes cinzentas e sujas, móveis empilhados descuidadamente; duas cadeiras, uma em frente à outra e uma lâmpada que pende do teto.

O homem levanta-se e passeia pela sala. – Agora somos só nós dois. – Diz o assistente. O olhar perverso e penetrante em nada altera a frieza de Stansfield.

— Você não sabe o mal estar que me causou perante meu chefe. Confesso que estava curioso para te conhecer. Você realmente é, ou melhor, foi uma excelente adversária. – Diz o assistente.

— Obrigada pelo elogio. – Lucy responde com um sorriso sarcástico, provocando o homem. – Quem é você?

O homem a encara e responde: – Nomes não importam.

— Ah é claro, você não passa de um capacho dos D’Angelo. – Lucy responde.

A resposta é um soco que atira a mulher ao chão. – Levante-se. – O assistente ordena. – LEVANTE-SE! – grita, quando vê que ela não obedece.

Stansfield se levanta sem pressa, sem dizer nenhuma palavra nem demonstrar sensação de dor; levanta a cadeira e torna a se sentar. Sem tirar os olhos do homem ela cospe o sangue que escorre da boca.

— É uma pena que tenha que matá-la, você é uma mulher muito linda..., atraente... Mas ordens são ordens. Vocês mexeram com quem não devia. – Diz o assistente. – Aliás, a loirinha também é linda, ou melhor, era linda.

Ao ouvir a frase Lucy sentiu um aperto no coração. O homem prossegue com a pressão psicológica. – Você já imaginou o que ela deve ter sofrido? Consegue imaginar aquela carinha tão linda amassada por um animal como eu. Consegue, hã?

De fato Lucy conseguia imaginar a cena. O assistente ou qualquer “buttom”, não tem misericórdia de ninguém, seja homem ou mulher. Se a morte ou a “lição” for decretada pelo “Don”, os socos que ela levara eram tapinhas em comparação ao que eles podem fazer.

— Onde ela está? – Lucy pergunta.

A resposta fica suspensa no ar, pois nesse instante o “buttom” abre a porta, se dirige ao assistente e lhe murmura qualquer coisa junto ao ouvido.

O semblante do assistente se transforma. – Tem certeza? – O assistente questiona. Seja lá o que for não lhe agrada.

— Tenho senhor. Ele acabou de ligar. – O “buttom” responde.

Agora se dirigindo a Lucy ele diz: - Você tem sorte, o chefão quer assistir a execução pessoalmente. Seu final só foi adiado por mais alguns minutos.

— Sinal que o chefão não está mais confiando no seu trabalho, quer se certificar que o serviço dessa vez vai ser mesmo feito, já que os outros dois foram um fracasso. – Lucy responde olhando-o firmemente. O semblante do homem muda no mesmo instante. Agora era Stansfield quem aplicava a pressão psicológica.

— Não pense que consegue me enganar com esse blefe. – O homem responde.

— Blefe? Eu não teria tanta certeza disso. – Lucy insiste.

O homem a observa por instantes. Nota-se que Lucy está sendo avaliada. O assistente ignora a provocação, mas Lucy insiste. – Se tudo estivesse finalizado como você pensa, por que ele viria? Ele já fez isso antes? – Lucy arrisca.

O assistente fica pensativo, as rugas tensas na testa indicam que o peixe estava mordendo a isca.

— Cale-se. – Ele ordena. Mas Lucy continua a instigar cada vez mais a dúvida.

— Esta mentindo. Seus dois agentes estão mortos. Tenho informações disso. – Rebate o assistente.

— Vocês foram enganados. Os dois estão vivos. – Lucy afirma encarando-o firmemente.

O assistente fica furioso. A lembrança do olhar de desprezo de “Don” Giovanni no último encontro que tiveram, ainda queimava na sua mente. Ele pega a arma com o silenciador, destrava e encosta na testa de Stansfield.

— Não abuse sua vagabunda, posso acabar com você agora mesmo! – Diz o assistente irritado.

— Não pode não, e você sabe disso. – A agente responde com tom desafiador.

— O que você quer dizer com isso? – Pergunta o homem com o rosto vermelho de raiva.

— Que tem um desgraçado acima de você a quem você não tem e nunca vai ter coragem de desobedecer. Vai ser sempre o cãozinho obediente. – Stansfield responde.

— CALE-SE! - O homem não se contém mais, novamente esmurra o rosto da agente fazendo o sangue escorrer pelo nariz. Agarrando-a pela gola do casaco a sacode violentamente jogando-a contra parede. Enraivecido, esmurra a agente na barriga violentamente. Lucy cai, mas a agressão continua. O homem descontrolado chuta seu abdômen. A agente se encolhe com a dor emitindo um urro abafado.

De repente o assistente é afastado pelas mãos fortes do “buttom”. - Pare com isso, vai matá-la!

— Vou acabar com essa vagabunda miserável, que se danem as ordens! – Responde o assistente possesso.

— PARE COM ISSO. CONTROLE-SE! – Grita o “buttom” agarrado ao assistente, tentando com muito esforço segurá-lo.

Ofegante o assistente acaba por se acalmar. Respira fundo várias vezes reassumindo o controle de si. – Ok..., pode deixar estou bem..., estou bem. - Sob o olhar do assistente Stansfield tenta se levantar com muito custo, mas não consegue.

— Leve essa cadela para junto da outra, vou receber “Don” Giovanni. – Ordena o assistente.

A ordem é cumprida sem demora. O assistente sai sem olhar para trás. O “buttom” levanta a agente que mal se mantém de pé e a leva para outra sala por onde consegue ver através da porta aberta uma luz mais forte. O homem a empurra pelo corredor sem piedade do seu estado. Os poucos metros de corredor que separam as duas portas parecem quilômetros. Lucy sente dor no local dos pulmões, talvez umas costelas quebradas. Mas a costela terá que esperar. – Preciso aguentar mais um pouco. Tenho que descobrir onde ela está.— Pensa enquanto caminha cambaleando.

Seus pensamentos se desviam para Gabrielle conforme se aproxima da porta. - Será que fizeram o mesmo com ela? Ela é mais frágil, não foi feita para suportar esse tipo de tratamento. - Seus pensamentos são bruscamente interrompidos por um empurrão mais violento que a joga contra parede. Ela consegue conter o grito de dor, mas não evita que uma golfada de sangue escorra de sua boca.

Pare com isso! Já chega de pensar nela. Isso é apenas trabalho... Concentre-se... concentre-se no que tem que fazer! - Enquanto pensa entram na sala e Stansfield se depara com a mesma cena do vídeo. Olha para Gabrielle procurando escoriações ou inchaços. Vê apenas a mancha de sangue seco escorrido do lábio cortado. Não parece ter sofrido nenhum outro maltrato.

Gabrielle grita chocada com o estado de Stansfield: - LUCY! AH MEU DEUS...

A loira se debate com toda força que é capaz, mas sabe que seu esforço é inútil, não conseguirá se libertar, as algemas ferem seus pulsos. As lágrimas rolam pela face de Gabrielle, que xinga os homens descontroladamente. Impaciente o assistente a esbofeteia violentamente jogando a cabeça da loira para trás. A dor é imediata. O ferimento reabre e o sangue escorre pelo lábio atingido. Os olhos de Gabrielle lacrimejam.

— MISERÁVEL! - Stansfield grita e tenta ir em direção à Gabrielle, mas o “buttom” lhe dá um violento empurrão derrubando-a. Dessa vez ela não consegue evitar o urro de dor. Permanece caída, sem forças.

Gabrielle grita desesperada; o “buttom” se aproxima e segura a loira pelos cabelos puxando sua cabeça para trás e levanta o punho, está prestes e desferir o soco. Gabrielle fecha os olhos e aguarda a pancada.

— PARE! - Ouve-se a voz autoritária, atraindo a atenção de todos. O “buttom” vira-se para trás e vê “Don” Giovanni sustentado pela costumeira bengala ladeado pelo assistente e dois homem.

— Senhor... – O “buttom” gagueja baixando o punho.

— CHEGA!..., eu mandei que não fizessem nada até eu chegar! - O tom de voz do velho revela que não permitirá discussões. Se dirigindo ao assistente e ao “buttom” completa: - Venham. Temos umas coisas para conversar.

O assistente e o “buttom” se entreolham confusos. Mas não se atrevem a questionar a ordem de “Don” Giovanni.

................... A operação de resgate.

Frankie olha pelo retrovisor e vê quatro picapes se aproximando de faróis baixos. Um dos veículos passa pelo carro onde estão os agentes e estaciona uma rua depois do depósito. O outro para uma rua antes, o terceiro para logo atrás deles e o quarto entra na rua lateral em direção aos fundos do depósito. Passados alguns instantes o silêncio nos minúsculos fones do casal de agentes é interrompido. Após a identificação, ainda dentro da picape, o agente que comandará a operação pergunta: - Como está a situação?

Frankie faz um breve relato, incluindo a chegada de um veículo aproximadamente cinco minutos atrás. - Ela está lá dentro já faz trinta e oito minutos. – Brunhilda conclui.

— O que vocês estão fazendo aqui? Pelo que sei a operação não foi autorizada. – Frankie questiona.

— O chefe mudou de ideia. Viemos dar cobertura. – O agente responde e sem mais explicações ele determina: - Atenção todas as equipes, tomem posição. Vamos entrar ao meu comando.

Imediatamente todos os agentes descem dos carros e cercam o prédio. Se esgueirando junto as paredes, invadem o galpão, examinado minuciosamente o lugar. De repente são ouvidos disparos.

— Ah meu Deus, não! Não pode ser! – Exclama Brunhilda, correndo para o lugar dos disparos.

O agente que comandava a operação ordena para os outros companheiros: - SEPAREM-SE! VASCULHEM TUDO, TEMOS QUE ENCONTRÁ-LAS!

Frankie corre em seguida dando cobertura a parceira. Entram na sala e se deparam com a cena de um ajuste de contas. O velho cumprira o que tinha prometido sobre encerrar o assunto. Na sala jaziam dois corpos com a expressão de surpresa ainda estampados nos rostos. Tudo estava terminado. Os dois seguranças e o velho já se encaminhavam para a saída quando ouvem a ordem:

— PARADOS! FBI! – Frankie grita quando invade o recinto.

O efeito surpresa da operação do FBI acabou no momento que os dois agentes invadiram o aposento. Instantaneamente os dois seguranças tentam proteger o velho com o próprio corpo ao mesmo tempo em que atiram contra os agentes.

Em atos contínuos, no máximo dois minutos foi o tempo decorrido para o que aconteceu a seguir.

Com agilidade Brunhilda se joga no chão ao mesmo tempo em que atira atingindo o ombro de um dos seguranças; em seguida dois tiros de Frankie atinge o peito do homem que desaba no chão com um baque. Num piscar de olhos as balas zunem em todas as direções, estilhaçando os vidros das janelas, ricocheteando nas paredes. Uma bala atinge o braço esquerdo de Frankie.

A incapacidade física do velho de se locomover com velocidade atrapalha a fuga e antes que eles possam chegar a porta, o outro segurança é atingido nas costas por dois tiros e cai pesadamente.

— PARE OU ATIRO! – Brunhilda grita, com a arma apontada para o idoso.

O velho estremece e para, permanecendo de costas para ela, subitamente o sangue some de suas faces, a palidez lhe dá um ar cadavérico que faz sobressaírem às rugas carregadas da idade, começou a arfar como um asmático. Ele se curva apoiado na parede e começa a tossir, a bengala cai de sua mão; ele quase cai, não fosse a rapidez de Frankie que o ampara e o deita no chão.

— Estou com a boca seca. Meu peito dói! – Diz o velho roucamente tentando a todo custo respirar.

— Chame uma ambulância! Ele está morrendo! – Frankie grita para a mulher.

Brunhilda se aproxima e olha friamente para o velho. – Mafioso desgraçado. - Ela pensa.

Não fosse por seu colega, talvez ela virasse as costas e deixaria o velho à própria sorte. Pelo rádio ela pede o socorro e avisa dos outros quatro corpos que se encontram na sala. Nesse momento três agentes invadem a sala de armas em punho. O agente que comandava a operação se agacha e num exame rápido vê que o velho está imóvel, de olhos arregalados.

— Está morto. – Diz o agente olhando Frankie que se aproxima segurando o braço ferido. - As ambulâncias já chegaram, vá cuidar disso.

— Foi só um arranhão. Vou sobreviver. – Frankie responde ensaiando um sorriso se encaminhando para o socorro.

Brunhilda acompanha a cena calada, sua expressão é soturna. O agente se aproxima e pergunta: - Alguma coisa errada?

Ela responde num tom de lamento: - Falhamos.

— Eu não teria tanta certeza. – Responde o homem olhando a bela loira.

No olhar de Brunhilda aparece um rápido brilho de surpresa. – Quer dizer que ela está viva?

— Está sim. Já foi levada para o hospital. Está bastante machucada, mas vai sobreviver. Não é à toa que a chamam de “Dama de Ferro”. – Faz uma ligeira pausa. – Vamos, o caso aqui está encerrado. - Conclui o agente.

Os corpos são colocados nos sacos pretos e transportados para autópsia, somente para atender uma exigência burocrática necessária para os enterros.

— Senhor..., e o velho também vai junto? – Pergunta um dos socorristas.

— Levem para o necrotério. Vamos avisar a família. – Responde o agente, saindo da sala junto com Brunhilda.

................... E no hospital...

Isles chega junto com as ambulâncias e se identifica: - Levantem com cuidado ela está em choque. Pode estar com hemorragia interna. As costelas devem ter perfurado o pulmão. – Orienta a médica.

Gabrielle fica desesperada quando vê Stansfield inconsciente na maca. Ela sabia que apesar dos hematomas, o mais grave eram os ferimentos internos. Por mais que Gabrielle insistisse, Isles não autoriza a loira a seguir na ambulância que transportaria Lucy. Os paramédicos prestavam socorro, mas Lucy não reagia. A pressão sanguínea caíra perigosamente.

O pânico da impotência desesperava a loira. Com lágrimas escorrendo no rosto Gabrielle desesperada agarra e beija a mão de Lucy. Isles assiste a cena e se comove. Gabrielle se dirige a médica e suplica: - Salve-a!

— Não sou cirurgiã, mas vou acompanhar tudo e farei o que for possível. – A médica responde.

As portas da ambulância são fechadas e o veículo dispara em direção ao hospital. Durante o percurso Isles faz contatos com amigos providenciando o atendimento assim que chegasse ao local.

.................................................

Lucy sai da cirurgia de emergência. Após o período de observação no dia seguinte vai para o quarto onde é esperada ansiosamente por Gabrielle. Sempre depois do trabalho a loira ia para o hospital e não saía mais de perto da cama de Lucy; acompanhava atentamente o trabalho dos enfermeiros e médicos.

Com a imagem de Stansfield abatida e indefesa na cama, Gabrielle se deixa vencer pelo sentimento que gritava nas suas entranhas. A loira se aproxima da cama e delicadamente segura a mão de Lucy entre as suas, acaricia os cabelos e o rosto dela e sussurra: - Eu sei que pode me ouvir. Não é a sua hora, eu sinto no meu coração. Lucy..., longe de você eu sinto um vazio que nunca senti antes e isso me assusta. Eu preciso de você.

Gabrielle estava tão absorta com Lucy que não percebe que a Dra. Isles silenciosamente entreabrira a porta do quarto e assistia a cena, se comovendo com a declaração da loira. Decidindo que não devia interromper aquele momento a médica volta a fechar a porta vagarosamente. A dedicação e o carinho de Gabrielle seriam importantes na recuperação de Stansfield.

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Lucy acorda mais uma vez. Os três dias se passaram lentamente. Ainda sob efeito dos sedativos, os poucos momentos em que passava acordada eram como um borrão de consciência. Agora ela se sentia melhor. O raio de sol que entra pela janela indicava que ainda era manhã.

Stansfield vira a cabeça e depara com o lindo sorriso de Gabrielle e a saudação: - Bom dia!

Lucy tenta se levantar, mas o tórax dói, o corpo dói, é então que ela percebe a presença de mais duas mulheres no quarto. A tonteira a faz se deitar novamente.

Dois grandes sorrisos saúdam a Dama de Ferro. – Você nos deu um grande susto! – Exclama Claire.

— Olá amiga, como você está? – Lucy pergunta.

— Comparando com seu estado, estou ótima. – Todas sorriem. – Dei sorte a bala saiu por trás. – Claire levanta a blusa mostrando o curativo. - Você chegou bem na hora. Salvou minha vida. – Claire responde emocionada.

Cansada pelo esforço, Lucy olha Gabrielle e pede que conte o que aconteceu. A loira segura sua mão e começa a contar sobre a operação de resgate que afinal foi autorizada por Robert; conta da participação de Brunhilda, Frankie e vários agentes; da participação de Isles junto com a equipe de resgate; que ela passou por uma cirurgia, por isso estava fraca e cansada; que o estado de Eli ainda inspirava cuidados, mas estava reagindo bem. Que o “buttom” tinha sobrevivido a execução e confessado ser o autor de várias mortes e sobre “Don” Giovanni ser o mandante das execuções e que ele morrera durante a missão.

Lucy percebe que Brunhilda olhava Gabrielle como se a estivesse admirando. Stansfield se sente incomodada com a situação. Ela reconhecia naquele olhar algo mais além de uma simples amizade.

— E você Brunhilda já tinha participado de alguma missão desse tipo antes? – Lucy pergunta tentando desviar a atenção da agente.

Todos os olhares se voltam para a loira. Ao sentir que estava sendo o centro das atenções Brunhilda se desconcerta e o rosto enrubesce. Ela faz um breve histórico de sua experiência no FBI, e olhando Stansfield, acrescenta que ficou maravilhada em conhecer a famosa “Dama de Ferro” e que ficou eufórica quando foi designada para trabalhar na operação.

O olhar de Brunhilda brilhava de contentamento enquanto falava. Lucy Stansfield era uma lenda dentro do FBI, conhecê-la pessoalmente e ainda trabalhar com ela era o sonho de muitos agentes, e agora ela tinha realizado esse sonho alimentado por muitos anos.

Nesse instante Isles entra no quarto e se depara com as três visitantes, após os cumprimentos ela diz: - Meninas façam o favor de não cansar minha amiga. – A médica diz em tom de gracejo e se aproximando da cama se inclina ligeiramente sobre Lucy.

— Como está se sentindo? – Isles pergunta acariciando os cabelos e rosto de Lucy.

Lucy sorri e responde: - Agora estou bem melhor. Obrigada por tudo Isles. - Gabrielle observa a cena e sente o rosto em brasa.

— Ora amiga, eu apenas cumpri com minha obrigação. – A médica responde.

— Bem já que a doutora chegou e você está em boas mãos, eu vou embora. – Gabrielle interrompe.

Os olhares se voltam para a pequena loira. Lucy hesita, mas controla seu desejo de pedir que Gabrielle fique. É incrível o fascínio que aquela loirinha exercia sobre ela. Era uma atração inexplicável. Claire assistia a cena, observando a reação de Gabrielle.

— Eu também vou embora. Se você quiser eu te deixo em casa. – Brunhilda diz se dirigindo à Gabrielle.

— Você mora no oposto do meu caminho. – Observa Gabrielle.

— Não tem problema. Hoje estou de folga, não tenho nenhum compromisso. Podemos ir ao Art Deli. Lá tem um cheesecake divino. O que você acha? – Brunhilda convida.

Dessa vez é Lucy que interrompe: - Gabrielle acho que ainda não é seguro você ficar sozinha. Você pode dormir no meu apartamento. É mais perto.

— Se você quiser pode dormir na minha casa. Eu também sou sozinha. Podemos fazer companhia uma à outra. - Diz Brunhilda.

Os olhos de Stansfield faíscam. Claire assiste a tudo calada, esforçando-se para não rir.

Gabrielle olha para Lucy e Isles por segundos e decide aceitar o convite de Brunhilda de fazer um pequeno lanche, quanto ao resto decidirá depois. O olhar de Brunhilda brilha de contentamento. As duas se despedem das demais saindo em seguida numa animada conversa.

Assim que a porta é fechada Lucy tenta se levantar. Mas a dor forte e a sensação de fraqueza a seguram na cama.

— Êi, o que pensa que está fazendo? – Isles reclama segurando Lucy pelos ombros.

Pálida e ofegante pelo esforço Lucy solta um gemido e se acomoda no leito. - Sabe de uma coisa?... Eu não gosto dessa Brunhilda. – Após uma breve pausa ela continua: - Isles quanto tempo vou ficar aqui?

— O tempo que for preciso. E nem pense em bancar a Mulher Maravilha, entendeu? – A médica responde.

Após alguns instantes de silêncio Isles continua. – Lucy..., quando você foi trazida para o quarto, ouviu o que Gabrielle falou?

Lucy hesita e explica que num sutil instante de consciência, teve a impressão que Gabrielle segurava sua mão e sussurrava palavras, mas eram confusas, as palavras vinham nítidas para em seguida se perderem no vácuo. Ouvira algumas palavras sim, mas atribuía tudo a alucinações causadas pelo seu estado de choque.

— Amiga..., acredite, ela realmente se importa com você. – Isles responde.

................... Comemorando a partida.

Quatro meses se passaram. O trabalho no departamento continuava agitado e incessante. Os raros momentos de descontração só ocorriam quando circulava um e-mail pelo departamento, anunciando que alguém fazia aniversário, celebrava uma data importante, ou com mais frequência, alguém partia.

As pequenas cerimônias, algumas vezes acompanhadas de bolo, um discurso do chefe e uma resposta do homenageado, sempre quebravam a rotina tensa dos agentes.

“Despedida de Gabrielle amanhã, às 16:30 minutos no departamento”. O conteúdo do e-mail chocou Stansfield. Ela lia e relia o documento. Não era possível que isso fosse acontecer. Gabrielle tinha pedido transferência do departamento. Iria para o escritório de San Francisco. Desde que voltara a ativa Stansfield e Gabrielle mantinham uma relação amigável, mas profissional. Quando seus olhares se cruzavam, normalmente a loira desviava sua atenção para outro ponto. Lucy se entristecia com a ausência de Gabrielle nos “happy hours” da equipe.

A notícia inesperada deixou Lucy atordoada. Mesmo que Gabrielle trabalhasse no serviço interno, a ideia de perder contato definitivo com a loira era dolorosamente sufocante. Durante todo esse tempo ela evitara demonstrar o sentimento que queimava em seu peito. Gabrielle era aquela pessoa com quem ela sempre sonhara; aquela pessoa a quem ela dedicaria seu tempo, carinho e amor. E agora a perderia.

Perdida nesse tipo de conflito ela se assusta quando Claire pousa a mão sobre a sua na mesa do bar.

— Lucy, sei que tem alguma coisa te incomodando. Você quer conversar? – Claire diz percebendo a angústia da amiga.

O olhar entristecido comove Claire. Lucy dá um profundo suspiro e responde. - Não se preocupe. Isso vai passar, é só questão de tempo.

— O problema é Gabrielle não é? – Claire pergunta sabendo ser desnecessária a confirmação.

Lucy não responde, apenas ensaia um sorriso sem ânimo.

— Lucy por que você não deixa esse orgulho idiota de lado e vai falar com ela? – Claire pergunta.

— Não é isso Claire. Ela já traçou os rumos da vida dela. Eu só iria atrapalhar. – Stansfield responde.

— Bobagem! Essa sua teimosia não vai levar a nada, ou melhor, só vai levar a um sofrimento inútil para as duas. Ela gosta de você. Só você não vê isso! – Claire afirma.

Lucy a olha em silêncio por alguns instantes e desabafa: - Não sei amiga. Ela mudou muito. Evita me olhar sempre que estamos a sós. É como se minha presença a incomodasse. Não vejo mais aquele sorriso alegre espontâneo de antes. Ela me trata cordialmente, mas distante.

— Mas é claro, como você queria que ela reagisse? Para toda ação existe uma reação. Desde que voltou ao trabalho você não deu a menor chance dela se aproximar. Sempre a tratando com frieza. Ela está confusa. O que ela está sentindo é uma novidade para ela. Imagine uma mocinha de uma família tradicional, de repente se vê atraída, ou melhor, apaixonada por outra mulher...

Lucy interrompe Claire: - Apaixonada? Lá vem você com suas fantasias!

— Fantasias? Você é uma idiota mesmo hein? – Claire se irrita. – Por que você se nega o direito de ser feliz? É masoquismo?

Lucy fica surpresa com a reação da amiga. Após uma pausa ela diz: - Você acha mesmo que ela gosta de mim?

— Acho não, tenho certeza! – Claire afirma.

No mesmo instante o olhar de Stansfield brilha. Claire digita um número no celular. – Isles? É Claire..., tudo bem sim. Escute, você poderia fazer o favor de repetir para a cabeça dura da Lucy o que me contou?

Claire passa o celular para Stansfield. Conforme a narração vai se desenrolando o semblante de Lucy vai modificando, o brilho no olhar, o sorriso aberto, a expressão de alegria, lembrava uma adolescente apaixonada. Claire sorria com a felicidade da amiga. Por fim o celular é desligado. Lucy não cabe em si de alegria. Seu coração está disparado. Ela se levanta repentinamente da mesa, surpreendendo Claire.

— Êi aonde você vai? – Claire pergunta.

— Você tem razão. Vou falar com ela. Me deseje sorte amiga. – Lucy responde com um grande sorriso e sai do bar em disparada.

...........................................

A campainha toca insistentemente. – Já vai, já vai! Mas que diabos é isso? – Gabrielle caminha irritada para a porta. Desconfiada olha pelo visor e se surpreende ao ver Lucy. Abre a porta surpresa.

— Lucy? O que houve? Está tudo bem? – A loira pergunta surpresa e confusa.

— Posso entrar? – Lucy pergunta.

— Ah..., claro, me desculpe. Só não repare a bagunça, estou arrumando minha mudança. – Gabrielle responde com um sorriso sem graça.

Lucy vê algumas caixas já arrumadas no canto da sala e outras sendo organizadas. Por segundos se arrepende de ter vindo. Sob o olhar fixo de Gabrielle se sente desconcertada. Mas não estava mais disposta a esconder seus sentimentos.

— Você está mesmo disposta a ir embora não é? - Lucy sua idiota, que pergunta ridícula. É claro que ela está! - Lucy pensa.

— É..., acho que San Francisco vai ser melhor para mim. – Gabrielle responde sem empolgação.

— Sua despedida vai ser amanhã..., vai embora de imediato? – Lucy gagueja enquanto pensa. - Vamos lá, coragem. Pare com esse rodeio.

— Não. Pedi dois dias de licença para poder fazer a mudança. Ainda devo ficar um dia ou dois por aqui. - Gabrielle responde.

Lucy engole em seco. - O que está acontecendo comigo? Estou tremendo, me sentindo sem chão. - Bem..., é que... – Lucy respira fundo. – Amanhã eu não poderei ir na sua despedida..., então resolvi me despedir hoje. Te desejar felicidades. – Meu Deus..., eu não consigo falar!.

Gabrielle sente um nó na garganta, sente os olhos marejarem. Tenta a todo custo disfarçar. Reprime o seu real desejo de confessar seus sentimentos, pois não vê possibilidade de ser correspondida. Sorri sem jeito e com a voz embargada agradece por tudo que Lucy lhe ensinou e pela amizade.

Lucy sente como se seu coração fosse explodir de dor. Não existe mais volta. Gabrielle está decidida. Lucy não conseguia pronunciar nem mais uma palavra. Foi quando seus olhares se encontraram. Ela não conseguiu mais se controlar, seus olhos encheram-se de lágrimas. Só nesse momento compreendeu de fato como sentia falta daquela mulher. Com uma passada larga abraçou Gabrielle. Grudou-se nela ali mesmo. A visão demasiado turva para ver o rosto da loira, embora ao abraçá-la com força sentisse seu tremor e sentia que ela também tremia. Nenhuma das duas conseguiu dizer nada. Lucy a apertava com toda força, mas não era o bastante. Queria que não houvesse espaço nenhum entre elas.

Gabrielle se aconchegava nos braços de Lucy com o mesmo sentimento. Por fim, Lucy a afastou para vê-la melhor. Seus olhares se encontraram transmitindo um sentimento novo, puro e verdadeiro. Gabrielle a custo controla as lágrimas que escorrem pelas faces. Tenta falar, mas não consegue as palavras estão todas presas na garganta.

As palavras se tornaram desnecessárias. Lucy encostou a cabeça dela em seu peito, as duas abraçadas, coladas uma na outra alheias a tudo a sua volta. Com muito custo Stansfield falou entre lágrimas.

— Gabrielle..., por favor..., não vá. Eu não posso mais viver sem você... Eu te amo! – Lucy se declara.

As palavras de Lucy eram tudo que Gabrielle desejava ouvir e agora elas estavam nos braços uma da outra. A loira tremia de paixão e felicidade. Com a voz embargada a loira responde: - Pensei..., que você nunca me diria isso... Eu também te amo. Te amo mais que tudo nesse mundo.

O coração de Stansfield batia acelerado parecia prestes a sair do peito. Ela levanta o queixo de Gabrielle delicadamente e seus lábios se juntam a princípio num beijo carinhoso que se torna intenso, profundo e excitante.

Com esforço Gabrielle se separa de Stansfield e diz: - Tenho que ir imediatamente ao FBI.

— Quê? Mas agora? Não pode esperar? – Lucy responde ofegante com o desejo borbulhando nas veias.

— Acredite, preciso ir agora. Tenho que providenciar uma coisa. – Gabrielle responde.

Lucy dá um profundo suspiro e diz: - Espero que seja realmente importante.

................... O funeral.

O corpo de Giovanni D’Angelo foi velado na propriedade de seu filho, César “Papa” D’Angelo. Posteriormente foi enviado de volta à Itália, para ser enterrado no mausoléu da família. O velório foi digno de um “Don”. Dezenas de carros congestionavam as ruas e a propriedade. Os familiares recebiam os pêsames dos “Capos”, inclusive de outras “famílias”. Que embora fossem adversárias, nessa hora se mostravam solidários com a dor dos parentes.

Junto ao caixão a neta predileta sofria calada a perda do avô querido. Não se viam lágrimas escorrerem pelo seu rosto, mas o sentimento da perda dilacerava seu coração.

O sentimento amoroso do avô era correspondido na mesma intensidade pela menina, agora uma mulher feita. Enquanto isso do lado de fora, do velório, os membros do clã já discutiam sobre o cargo agora desocupado. Uma vez ou outra uma voz mais exaltada chamava atenção da mulher. Por fim com um profundo suspiro, num gesto de despedida ela beija a testa do avô e se dirige ao grupo que discutia os rumos da “família” D’Angelo. Constantemente acompanhada por quatro homens de terno negro e cabeças raspadas a mulher loira era simpatizada por muitos do clã. As características semelhantes ao avô, sua inteligência, raciocínio rápido e sua força de liderança faziam dela uma boa opção para liderar a “família”, caso não fosse uma mulher.

Pela hierarquia caberia a César “Papa” D’Angelo assumir o cargo de “Don”. Mas fora condenado a vinte e oito anos de prisão. O seguinte seria Patrick D’Angelo, mas “Little Pat”, como era conhecido, não gozava da simpatia da maioria dos membros do clã. Era considerado um sujeito instável e sem escrúpulos.

Ela se aproxima, mas é ignorada pelos homens que discutem acaloradamente. Ela observa cada um deles, sem dizer uma palavra. - Corja de abutres desgraçados. - Pensa.

Após alguns minutos ela se manifesta: – Senhores..., senhores! Sei que o assunto que estão discutindo é de vital importância para toda organização, mas aqui não é o local adequado. Vocês estão chamando atenção de todos. Se não se importam, poderiam discutir no nosso jardim de inverno. É bem espaçoso e mais reservado. Mandarei servir bebidas. O que acham?

Os homens se entreolham e concordam, satisfeitos com a sugestão. Enquanto se encaminham para o local. Ela sussurra algo para um dos homens que a segue. Ele retorna e vai cumprir o que lhe foi ordenado.

Os homens se acomodam e as conversas reiniciam; não havia um consenso entre os presentes. Estavam tão exaltados que não percebem que aos poucos vários homens vão entrando e formando um grande círculo em volta deles. Ela volta a se manifestar.

— Senhores. Estou vendo que vocês não conseguem chegar a um acordo. Então eu quero lhes apresentar um novo nome.

Os homens se entreolham surpresos. Após alguns murmúrios, um homem aparentando próximo aos sessenta anos pergunta: - E quem seria esse nome?

— O meu. – Ela responde com um sorriso irônico.

Passados dois segundos da surpresa os homens caem na gargalhada. Ela também sorri, mas é um sorriso cínico e malévolo.

— Você só pode estar brincando. Não seja ridícula mulher. - Um “Capo” gordo, de cara avermelhada esbraveja e completa. – Que asneira!

— Sabe..., você devia ser mais educado, com uma mulher. – Ela responde encarando-o séria.

— Ora faça o favor de sair daqui e nos deixar em paz! Vá cuidar dos convidados. Temos assuntos... – A frase é interrompida quando uma pistola com silenciador é apontada para a cabeça do “Capo”. Todos se assustam, ensaiam reagir, mas o inconfundível som de armas sendo engatilhadas acaba com qualquer intenção. Então percebem os homens com as armas apontadas para eles. Estão cercados.

— Mas o que significa isso? – Questiona um homem aparentando faixa de cinquenta e cinco anos, de bigode e brilhosa cabeleira arrumada com muito fixador.

— Significa duas coisas: Uma - “Capos” podem ser substituídos; duas: - que os senhores não precisarão mais se preocupar com esse assunto. Já que meu pai está preso, eu vou assumir o comando da “família” D’Angelo. – A mulher responde.

— Isso é ridículo! – Esbraveja o homem de cara avermelhada e em tom de gracejo continua. – Uma mulher comandando uma organização como a “família”?! Só se for para administrar a cozinha dos nossos restaurantes.

Ele e mais alguns sorriem debochadamente. As risadas são interrompidas pelo berro do homem de cara avermelhada. O sangue respinga nos homens sentados ao lado dele. A imagem do joelho estraçalhado por um tiro apavora os demais.

— Alguém vai dizer mais alguma piadinha? – Ela pergunta segurando a arma.

Todos a olham em silêncio, o medo estampado nos rostos é resposta suficiente. Ela continua: - Onde estávamos mesmo?... Ah sim! Como eu disse, vou assumir o controle da organização!

— SUA VAGABUNDA! ISSO NÃO VAI FICAR ASSIM, SUA PU... – A frase é interrompida por um estampido e a cabeça do homem gordo tomba para trás transpassada por um tiro.

Todos se apavoram, mas ninguém diz nem uma palavra. Olhando para o cadáver ela diz sorrindo maldosamente: - Não é assim que se fala com uma dama.

E se dirigindo para os demais diz com voz firme de comando encarando cada um deles: - Amanhã eu os espero aqui às 8:00 da manhã. – Após ligeira pausa ela continua. - Alguém tem mais alguma coisa a dizer?

— Não senhora. Estaremos aqui. – Responde o homem de cabelos com fixador.

Antes de sair ela devolve a arma ao “buttom” e ordena. Mande limpar essa sujeira e se livrem do corpo.

...........................................

São 16:30. Gabrielle é ovacionada pelos colegas do departamento. Ela está encabulada, não imaginava tamanha recepção. Uns soltam gracejos, outros a parabenizam. Por várias vezes tenta falar, insistindo que tinha um comunicado a fazer, mas a euforia dos colegas a interrompia. Por fim chega a vez de Robert fazer o pequeno discurso, exaltando as qualidades da agente e dos serviços prestados para a instituição. Gabrielle tenta interromper, mas não consegue. Claire assiste a tudo calada de braços cruzados. Por fim terminado o discurso Robert entrega a Gabrielle o documento que autoriza sua transferência.

Ela agradece o carinho que teve de todos e pede desculpas por decepcioná-los, mas ela não irá mais para San Francisco. Tinha solicitado o cancelamento de sua transferência.

A notícia calou a todos instantaneamente. Robert ficou boquiaberto. – Quê? Mas..., quando foi isso? Não estou sabendo de nada.

— O e-mail foi enviado para você ontem, pelo Diretor, depois do expediente. – Stansfield informa.

Gabrielle se desculpa novamente. Claire olha para Stansfield que assistia a tudo encostada na mesa próxima à porta. Um sorriso malicioso e uma piscadela de Lucy foi resposta suficiente. Claire dá uma risada e começa a bater palmas, quebrando o silêncio da sala, seguida por Lucy, Eli, Brunhilda e Frankie; de repente todos na sala aplaudiam a loirinha.

Claire se aproxima de Stansfield. Brunhilda abraça Gabrielle demoradamente, acaricia seu rosto e diz: - Que ótimo que você vai ficar. Precisamos comemorar isso.

O olhar de Lucy se fixa na cena e antes que Claire falasse qualquer coisa Lucy murmura: - Sabe..., eu não gosto dessa Brunhilda.

Claire dá uma sonora gargalhada.

................... As confissões.

A equipe de Stansfield foi reestruturada. Apesar de não simpatizar com Brunhilda, Lucy não deixava de reconhecer a competência da agente já demonstrada em outras missões. Frankie também se mostrara um agente valioso. Claire continuava a parceira amiga, leal e inseparável de sempre. Devido suas limitações físicas, Eli foi transferido para o serviço interno. A bala que o atingira na virilha estraçalhara seu fêmur, agora ele usava uma prótese metálica, a outra bala se estilhaçara no pulmão. Foram horas de delicada cirurgia, mas foi inevitável a perda de um dos pulmões.

A Dra. Maura Isles embora não fizesse parte da equipe, se tornara um membro efetivo dos habituais happy hours do grupo. As conversas rolavam descontraídas. Gabrielle voltara para o trabalho de campo. Sentia-se realizada no trabalho e na vida pessoal. Trabalhava no que queria e encontrara a pessoa que preenchia sua vida lhe dando carinho, atenção e amor. Não se sentia mais uma forasteira na cidade.

— Lucy tem coisas que me deixaram intrigada no caso de “Don” Giovanni. – Gabrielle relembrava. – Como você sabia que o velho ia aparecer lá no depósito?

Após um gole de cerveja, Lucy explica: - Foi tudo uma sequência de coisas. Primeiro: em todas as operações da Máfia sempre existe um homem que fica de fora observando, é por isso que dizem que a Máfia tem olhos e ouvidos por toda parte. Quando Claire e Eli sofreram o atentado, eu sabia que estávamos sendo observadas, por isso combinei com Isles que colocasse os dois dentro do saco preto. Quem quer que nos observasse comunicaria que eles estavam mortos e os dois ficariam fora da mira deles.

Segundo: A Máfia não tolera erros nem mentiras. Pedi a Isles que ligasse para o “Don” se passando por uma informante e comunicasse que os dois agentes estavam vivos. Quando o chefão soubesse que tinha sido enganado pelos seus homens, ficaria furioso.

— Interceptamos o telefonema de “Don” Giovanni, aí foi só esperar ele chegar e pegar todos juntos. Só não esperávamos que o velho fosse ter um infarto fulminante. – Frankie completa.

— Tem mais uma coisa... – A frase de Gabrielle é interrompida.

— Aahh Gabrielle, esquece isso, vamos nos divertir. Isso é o que importa agora. – Lucy responde com um belo sorriso, que deixa a loira encantada.

Pelo adiantado da hora aos poucos o grupo vai se dispersando. Por fim Lucy deixa Gabrielle na porta do prédio. – Você não quer ficar por aqui hoje? – A loira pergunta com um sorriso provocante.

— Claro que quero. – Lucy responde sorrindo.

As duas saltam do carro e entram no prédio. Saem do elevador e caminham de mãos dadas até a porta do apartamento. Quando entram, mal a porta é trancada Gabrielle se aconchega no peito de Lucy num carinhoso abraço. Lucy por sua vez a aperta com força sentindo o perfume daqueles cabelos dourados, a pele macia e calor do corpo de sua amada.

— Gabrielle..., eu acho que não tem mais sentido você continuar morando aqui... Não quero mais ficar longe de você. Quer vir morar comigo? – Lucy pergunta.

— QUÊ? - Gabrielle se afasta numa atitude de surpresa. Seus olhos brilham e um grande sorriso se abre no rosto da loira. Uma felicidade indescritível acelera o coração da jovem mulher.

— Aaahh Lucy eu quero sim! Quero viver ao seu lado enquanto você me quiser! – Gabrielle responde radiante.

Lucy sente seu coração prestes a explodir de felicidade e responde emocionada: - Eu te quero e vou te querer para sempre na minha vida..., meu amor. – A declaração é selada com um beijo profundo e apaixonado.

— Vamos providenciar a sua mudança o mais rápido possível. – Lucy exclama eufórica. – Seu apartamento é muito devassado. Você fica muito vulnerável. Qualquer pessoa do telhado do prédio em frente vê aqui dentro.

A observação de Lucy chama atenção de Gabrielle. - Como você sabe disso?

Lucy fica embaraçada, sem saber o que responder de imediato. Por fim dá uma resposta não muito convincente para a loira. Gabrielle a observa séria.

— Sabe que até hoje eu não sei quem acertou aquele sujeito?! – A loira diz olhando fixamente para Lucy.

Stansfield fica em silêncio evitando olhar para Gabrielle. – Lucy..., foi você não foi? – A pergunta de Gabrielle é quase uma afirmação.

— Ah Gabrielle, que importância tem isso, já passou tanto tempo! – Lucy desconversa evitando olhar para a loira.

— Como você sabia que eu ia ser atacada? – Gabrielle insiste.

Lucy está desconcertada, fica olhando pela janela durante alguns minutos em silêncio. Depois encara a Gabrielle e por fim responde:

— Está bem..., fui eu sim. Queria te proteger. Com Claire e Eli fora do caminho, você seria a próxima. Eles me deixariam por último para que eu visse toda minha equipe ser exterminada. – Após uma breve pausa ela continua: - Resolvi passar por aqui para ver se estava tudo bem, foi quando vi o homem parado do outro lado da rua olhando para sua janela. Como a descrição era semelhante aos que atacaram Eli e Claire... Bem, o resto você já sabe.

— Por isso você chegou tão rápido quando te liguei avisando. – Gabrielle conclui.

A loira se atira contra Stansfield, abraçando-a com força surpreendendo a mulher. Aconchegando-se Gabrielle diz: - Obrigada, você salvou minha vida três vezes.

— Três? – Lucy pergunta intrigada.

— Uma foi aqui, a outra no depósito e a outra foi o vazio que você preencheu na minha vida. – Gabrielle diz emocionada.

Lucy não consegue evitar a emoção, seus olhos marejam de felicidade. – E você preencheu a minha também.

Lucy levanta o rosto da loira e inicialmente dá um delicado beijo em seus lábios. Em seguida outro com mais paixão; os lábios de Gabrielle se entreabrem recebendo a língua de sua amada, num profundo e apaixonado beijo, deixando-a quase sem fôlego.

Num rompante Stansfield pega a pequena loira no colo e se dirige para o quarto. Gabrielle surpresa dá um gritinho de susto. – Lucy..., espere.

Stansfield para junto à cama, coloca Gabrielle no chão e exclama. – O que foi? Não vai me dizer que tem que ir no FBI?

A loira sorri, corre e fecha a janela, desce a persiana e diz: - Eu tenho o resto da noite e amanhã é minha folga.

— Hum que coincidência, é a minha também... Pelo visto essa persiana vai ficar fechada um bom tempo. – Lucy responde sorrindo.

................... Mudança de comando.

Na imensa propriedade, o jardim estava mais vigiado que de costume. Os homens espalhados por todo perímetro da propriedade garantiam a segurança das pessoas reunidas na mansão. Na cabeceira da imensa mesa de madeira entalhada a poltrona de encosto alto acolchoado, realçando seu porte imponente, aguardava seu novo ocupante.

No grande salão havia seis janelas, mas as pesadas cortinas não deixavam entrar nem um raio de luz. Iluminado apenas pelas luminárias de parede, o ambiente assumia um ar soturno. Em cada lado da enorme mesa havia quatro cadeiras de encostos altos e sentados nelas seis homens e uma mulher. Uma cadeira permaneceria vazia até que um novo “Capo” assumisse.

— Bom dia senhores. – A mulher loira saúda os presentes com um sorriso cínico. - Perfeito. Estão todos aqui, ou melhor, quase todos... Ótimo. Gosto de pontualidade. – Após pausa de segundos ela continua. - Cumprindo a tradição aqui estamos eu e “Little Pat” para que os senhores avaliem e escolham a partir de hoje quem vai liderar a “família”.

— Isso é ridículo. Nunca nenhuma mulher assumiu esse cargo. Se ela assumir como vamos impor respeito às outras “famílias”? Vamos virar motivo de piada. – Esbraveja “Little Pat”.

Os homens se entreolham. Alguns se remexeram desconfortáveis nas cadeiras. Entre murmúrios e sussurros, alguns discretos acenos de cabeça indicavam que a maioria concordava com “Little Pat”.

O homem cinquentão de cabelos engomados é o primeiro a falar: - Senhora..., nossa organização tem que ser comandada por um pulso firme. Lidamos com o mais variado tipo de gente e negócios; drogas, prostituição, agiotagem, contrabando..., em fim negócios violentos e lucrativos do submundo, vendo por esse ângulo “Little Pat” tem razão. Uma mulher não seria aceita nem respeitada.

Se sentindo encorajado outro homem se pronuncia: - Durante todos esses anos seu avô trabalhou duro para impor os D’Angelo como uma das mais poderosas e organizadas “famílias” nacionais. Hoje em dia temos influência com banqueiros, políticos, juízes. A realidade é que vivemos numa sociedade de homens. Não há espaço para mulheres nesse meio. - Todos concordaram.

A mulher ouvia tudo calada. Embora não dissesse nada, seu olhar faiscava de ódio, o semblante era uma máscara malévola. Por fim ela diz:

— Seus argumentos são ridículos. Os senhores já ouviram falar de Teresa Mendoza? Conhecida como a Rainha do Tráfico na Espanha? Pois bem, ela comanda um cartel com um faturamento de 45 milhões de dólares por ano. Ela lida com pessoas muito mais perigosas que vocês todos juntos. – A loira faz uma ligeira pausa enquanto observa os homens e continua. - No fundo os senhores sabem que eu seria melhor escolha do que “Little Pat”, mas já que o preconceito aqui fala mais alto que a razão, vou sair da reunião. – Ela levanta e se encaminha para a porta. Antes de sair ela se volta e diz: - Estejam prontos para arcar com as consequências de sua escolha. – Sai fechando a porta.

Algumas horas se passam. Por fim os homens vão saindo da mansão e após as despedidas se dirigem para seus carros acompanhados dos respectivos seguranças e seguem para suas jurisdições de controle.

...........................................

Dois meses se passam. Na madrugada de 26 de junho. Um encontro é marcado no Gardini, um restaurante italiano, no Brooklyn, conhecido local de refeições e encontros da “família” D’Angelo.

Convocados por “Little Pat” todos os “Capos” comparecem e aguardam a chegada do “Don”. Alguns reclamam de terem sido convocados em plena madrugada e o interessado ainda não ter chegado. Aproximadamente dez minutos depois do horário marcado, “Little Pat” entra mal humorado no restaurante e se acomoda na cabeceira da mesa. Todos o olham ansiosos e curiosos. Os olhares se fixam no “Don” esperando que ele se manifestasse, mas o silêncio e o olhar interrogativo de “Little Pat” também os deixam confusos.

Por fim alguém se manifesta: - Então “Little Pat”, o que tem de tão importante para nos chamar aqui essa hora?

O “Don” se surpreende com a pergunta. – Como assim?... Recebi recados de alguns de vocês pedindo uma reunião de emergência e aqui estou. Eu que quero saber o que é tão urgente que não pode esperar até amanhã?!

Os homens se entreolham espantados e confusos. Todos negaram terem convocado a reunião. Então perceberam que estavam sós. Os dois vigias tinham ido embora. O homem de cabelos engomados percebe o cheiro de gás. Era uma armadilha. Quando ameaçaram se levantar a bomba explode. O fogo toma conta de todo local instantaneamente. As chamas ferozes não deixam escapar nada nem ninguém ao seu redor. Os estilhaços de vidros, madeiras, ferros e plásticos voam a dezenas de metros, atingindo os estabelecimentos vizinhos e os carros estacionados próximos. Tudo que era envidraçado próximo ao restaurante se transformou num mar de estilhaços. Alarmes dos veículos e lojas disparam. Imensos rolos de labaredas e fumaça saiam por todo imóvel, já irreconhecível. Era o inferno à céu aberto. Os sons de sirenes e viaturas dos bombeiros, polícia e ambulâncias já eram ouvidos a certa distância avisando de sua aproximação. Uma segunda explosão acaba por destruir totalmente o estabelecimento, dessa vez fazendo voar pedaços de concreto e tijolos em todas as direções.

De longe num luxuoso Mercedes preto, a mulher loira acompanhada por quatro homens assistia a tudo calmamente.

— Não é um espetáculo? – Ela comenta com ar sério. – É..., pelo visto teremos que convocar nova reunião. – Em seguida dá um sorriso cínico, ela sinaliza para o motorista. O carro parte normalmente.

...........................................

Lucy e Gabrielle assistiam ao noticiário da madrugada. A loira aconchegada nos braços de sua amada com a cabeça pousada em seu peito, aproveitando o merecido descanso e tranquilidade após momentos de tórridas entregas de corpos, quando ouvem a noticia do incêndio. Com o prédio ainda em chamas, como imagem de fundo, a repórter informa sobre a explosão de um restaurante no Brooklyn que deixou seis vítimas fatais e prejuízos imensos.

— “...uma explosão a poucas horas atrás nas instalações do restaurante Gardini...” - A imagem muda para a os bombeiros com jatos de água, tentando apagar as chamas no interior do prédio e mostrando um policial empurrando o câmera para se distanciar do local.

“-... foram confirmadas as mortes do senhores...” - A tela passou a mostrar fotos dos homens mortos.

As mulheres quase simultaneamente sentam na cama. Todos os mortos eram conhecidos “Capos” da Máfia de Nova York.

As redes de televisão cobriam a notícia com alvoroço, cada qual querendo apresentar informações mais recentes e precisas que as outras. A imagem mostrava o tenente do DPNY informando que as investigações foram iniciadas.

A repórter reaparece com mais informações. “- ... sem confirmação oficial, acredita-se que a explosão foi devido vazamento de gás...”

Passado o primeiro momento da surpresa da notícia, com a fisionomia tensa Lucy tenta por as ideias em ordem.

— Não foi nada de vazamento de gás... Isso é grave. Com todos os “Capos” mortos significa que os D’Angelo já têm novos comandantes. Foi mais rápido do que eu esperava.

Gabrielle se exaspera. – Ah não Lucy, por favor, não!

Lucy responde: - Meu instinto me diz que isso não foi um acidente. Esse tipo de explosão incendiária é bem característica da Máfia.

— Não acredito que você vai estragar nossa noite. Será que você não se desliga um minuto sequer? – Questiona a loira irritada.

— Eu não disse que ia fazer nada..., só estou curiosa. – Lucy responde.

— Sei..., eu conheço você, duvido que não esteja tentada a ir lá. - Diz Gabrielle, que já mostrando certa irritação desliga a televisão.

— Você tem razão. - Lucy dá um profundo suspiro e volta a se deitar, puxando a loira para junto de si, novamente aconchegando-a em seu colo. O perfume dos cabelos de Gabrielle, o contato da pele macia e quente invadem os sentidos de Lucy, causando um arrepio que se transforma num desejo crescente de beijar os lábios quentes e macios da loira. Suas mãos começam a acariciar o corpo de Gabrielle que responde as carícias com a mesma intensidade, entregando seus lábios com o mesmo ardor com que era beijada. As carícias se tornam mais ardentes, os beijos mais apaixonados, suas línguas se encontram e examinam as bocas profundamente. As peles arrepiadas, os suspiros e gemidos são a certeza que mais uma vez o momento de entrega de seus corpos e almas se dão de maneira completa e apaixonada.

A “família” D’Angelo, não é mais um assunto importante..., por enquanto.

................... O nome da rosa.

Era a primeira reunião após a fatalidade do Gardini. Os novos “Capos” estavam todos presentes ao encontro na mansão. Dessa vez havia a unanimidade para eleger o novo “Don”. A mulher senta-se na poltrona da cabeceira da mesa. Agradece o apoio e faz um juramento solene que fará dos D’Angelo, a “família” mais poderosa de Nova York e prometendo que expandirá o controle dos negócios na Itália e principalmente os que existem nos Estados Unidos. Após um pequeno discurso de agradecimento, ela levanta a taça num brinde, sendo acompanhada pelos demais.

Após o primeiro gole, um “Capo”, aparentando uns quarenta e cinco anos, ruivo e de olhos verdes, num tom descontraído de gracejo se dirige a mulher.

— Senhora, é de praxe todos nós sermos identificados por um apelido. Por exemplo, o John é “Duke”, o Pascale é “Hook”, o Nicola é o “Nik Petty”...

A mulher parou por um instante olhando-o séria. – E vocês estão pensando em quê? Me chamar de “Mama”?... Não, nem pensar. Precisamos deixar esses velhos costumes. Quero que me chamem pelo nome que meu avô escolheu para mim e que será conhecido por todas as “famílias”. Me chamem de CALLISTO!

Todos se reúnem. O tilintar das taças soam nítidas e novo brinde é feito em homenagem a Callisto, a nova chefe da “família” D’Angelo.

FIM


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Notas finais do capítulo

Agradecimento: Flavia C. Silva