Café escrita por Valentina


Capítulo 1
Único.




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Terça-feira,

Cinco da tarde.

Ouvi o sino da porta do Gota soar, nem precisei olhar para saber quem era, rapidamente me dirigi para a ultima mesa do pequeno estabelecimento que ficava de frente para um mural antigo onde havia fotos dos clientes mais fieis.

- Um café, por favor.

Deixei a xícara cheia e sai com o bule, de trás do balcão o observava pelo canto do olho, pelo que pode perceber o senhor misterioso sempre encarava o mural de fotos.

Quinta-feira,

Chovia,

Era 17h10min o senhor ainda não havia chegado, ele nunca havia se atrasado nesses anos que trabalho aqui.

Já era quase e seis horas quando o sino voltou a soar.

- Você é a senhorita Haruno?

- Sim, sou eu.

Era um homem alto,

- Meu pai era um cliente antigo desse lugar, ele veio a falecer no fim da tarde de ontem, e em seu testamento ele pedia para que eu entregasse essa carta para a senhorita.

Peguei a carta e dei meus pêsames, e logo o homem fora embora, porém só ousei abrir aquele envelope branco no conforto do meu sofá barato.

...

“ Sakura, somente conheço seu nome pelo crachá que acompanha o seu uniforme.

Admito que nunca trocamos palavras realmente, eu chegava, você me atendia e só. Porém, pude perceber olhares dirigidos a minha pessoa, afinal, o que um velho faria todo santo dia em um café decrepito?

Talvez você nunca tenha reunido coragem o suficiente para me questionar, e isso é ruim, mulheres tendem a serem perspicazes, e você, minha jovem não pode ser exceção à regra. Mas, lhe contarei a minha história, ou pelos a melhor parte dela.

Vim de uma família muito religiosa e rígida, filho único de militar. E a regra invisível eu segui, entrei no exército e ainda novo conquistei um bom posto, mas ainda era pouco. A ambição é o mal dos homens, já lhe falaram isso criança?

No verão de 1950 eu a conheci.

Era uma adolescente magrela que vivia com flores enfeitando os longos cabelos, tinha as bochechas coradas por ficar muito tempo no sol e usava vestidos bem maiores que seu corpo. Não, eu não gostava dela, ela falava pelos cotovelos e tinha a irritante mania de sempre sorrir para mim.

Eu sabia empunhar uma arma e já me achava um homem. Mas, eu era só um garoto de farda.

Todos os dias nos encontrávamos no Gota, no horário em que ela saia da escola e fugia dos deveres de casa. Sentávamo-nos na última mesa, perto do jukebox, ela falava como havia sido o seu dia e eu a escutava. E nos dias de quinta-feira ela sempre colocava Elvis para tocar e me forçava a acompanhar seus passos.

Cinco anos depois ela participava de um grupo que só procurava a paz, pregava o amor ao próximo, e eu partia para o Vietnã. Foram tempos difíceis, e se eu lhe dissesse que pensava nela o tempo todo e que não via a hora de me aconchegar em seus braços finos, estarei mentido. Eu estava mais preocupado em manter minha cabeça sobre o corpo.

Alguns anos mais tarde descobri que não havia nada de honroso em receber uma medalha por matar jovens vietnamitas tão assustados quanto eu.

Porém, ela estava lá para me receber. Mesmo com as minhas mãos manchadas. Um pouco mais magra, e com as flores no cabelo.

Ela estava lá.

Então com um colchão velho, uma geladeira que não funcionava e em uma casa caindo aos pedaços nós começamos uma vida juntos. Guardaríamos o fundo do exercito para a faculdade de nossos futuros filhos. Aprendemos a nos virar com pouco, ela dava aulas em uma escola para crianças e eu trabalhava o dia inteiro em uma fábrica de automóveis.

E em todas as quintas-feiras ouvíamos Elvis no Gota.

Tivemos nosso primeiro filho em um rigoroso inverno, eu achava que explodiria de felicidade ao ver aquele pequeno ser tão parecido comigo, apertando meu dedo enquanto eu o pegava e o entregava para ela.

Meu segundo filho tinha apenas seis anos quando os cabelos de sua mãe começaram a cair, o câncer veio arrebatador. Tentamos de tudo, o fundo do exercito fora todo gastado( mesmo ela não querendo) em remédios, tratamentos e consultas.

Eu não queria perde-la.

Ela usava uma coroa de flores mesmo não tenho os longos fios negros de outrora, a pele pálida e o os ossos saltados. Continuava linda, para mim ela sempre fora.

E ali, no jardim do hospital católico ela disse que me amava e que sentia muito por não estar junto a mim, assistindo nossos filhos constituírem suas próprias famílias. Foram suas últimas palavras.

Eu nunca a agradeci, mas ela sabia. Sempre soube.

E isso é tudo o que minha mente senil consegue se lembrar, com certeza houve mais momentos, coisas bem mais importantes que um café ao som de Elvis, mas com o passar do tempo esquecemo-nos dessas coisas, e as pequenas é as que ficam.

Sinto que não tenho muito tempo, não é uma sensação ruim, afinal. Mas sei que não irei para o mesmo lugar que ela. Porém minhas escolhas erradas me fizeram conhece-la nessa vida, e isso me reconforta.

Permita-me devolver a foto que acompanha esta carta, eu covardemente a roubei há muitos anos atrás do mural antigo, quando as coisas ficaram conturbadas e eu não conseguia mais olhar para o rosto dela sem entrar em desespero.

Espero que essa mísera folha de papel tenha sanado a sua curiosidade.

– Fugaku Uchiha.”

...

A foto em preto e branco de uma moça de longos cabelos lisos, preso em tranças, fazia um sinal de “paz e amor” e a sua frente estava um rapaz fardado, sério e encarava descaradamente a moça alegre, estava ao lado de um vaso de flores coloridas.

Ao outro lado havia outro porta-retratos, este com uma imagem minha e do homem alto de óculos escuros, filho de um antigo militante e atualmente meu caminho tortuoso.

Mas essa história fica para outro dia.


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Notas finais do capítulo

A fanfic deveria ter no máximo mil palavras, então eu tive que cortar muita coisa e alguma coisas ficaram até sem sentido, porém eu gostei dela, achei fofinha. Vocês não tem noção do quanto eu adoro Fugaku e Mikoto.



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