Segredos de um namoro fajuto - Degustação escrita por Escr Taty


Capítulo 5
Capítulo 04 - Desventuras de um romance - Parte I: Noite Feliz!




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— Pedro?!

Pulei em cima do meu colchão enquanto ouvia a abertura da música Cara Estranho, de Los Hermanos, e comecei a cantar junto enquanto me via no espelho.

— Hum... Pedro...?

—...Tem tudo sempre às suas mãos, mas leva a cruz um pouco além! Talhando feito um artesão a imagem de um rapaz de bem...

— Você realmente não se importa que eu te veja...

Joguei o ar do pulmão para fora e cantei mais alto!

—...de cueca fingindo tocar guitarra e...

Agora o solo!

— Nossa!

Mais alto o/ tuts, tuts, tuts, tuts...

— Faz parte desse jogo, dizer ao mundo todo que só conhece o seu quinhão ruim! É simples desse jeito, quando se encolhe o peito e finge não haver competição! É a solução de quem não quer perder aquilo que já tem e fecha a mão pro que há de vir.

“Obrigado público, obrigado pelos aplausos. Vocês são muito gentis e... MANUELA?!” – Triste momento para divagar sobre shows imaginários.

— O que faz aqui? – gritei descendo do colchão.

— Comprei ingresso VIP. Como deixei para pagar na entrada, custou dez centavos.

— Argh! Desde que horas está aí?

Desci do colchão e peguei meu short. Tinha acabado de tomar banho e havia me empolgado um pouco com Los Hermanos.

— Desde o começo — Ok, isso é constrangedor. — Sério que não percebeu?

— Tive a vaga sensação de que você estava me chamando, mas achei que estava na sala. O que quer?

— Hum... — Ela me olhou curiosa, depois riu feito uma louca. — Você desafina muito!

— Ei! Eu estava cantando só para mim. Nunca fez isso?

— Ah, claro! Mas não desafino igual você.

— Vai dizer o que quer?

— Sim. Temos que ir ao mercado. Se vista logo e... meu caro Pedro... — Ela começou a se afastar, mas não sem antes soltar suas risadas zombeteiras. — Muito sexy a sua guitarra. — E saiu gargalhando. Merda.

Manuela é uma mulher cruel, acredite, ela tem um desses tridentes escondidos e só falta o rabinho e os chifres. Digo isso porque ela não espalhava a zoação na frente de quem pudesse usar contra mim, ela me zoava pela metade na frente dos outros, para ser a detentora dos direitos autorais, e me zoava por inteiro quando estávamos sozinhos. Por isso, minha performance nunca seria esquecida.

— Vamos logo, Super Star — gritou ela da porta enquanto eu tropeçava nos cadarços e tombava no corredor. — O chão tem amor próprio, não precisa dos seus beijos.

— Merda!

O mercado que Manuela mencionou ficava próximo ao nosso AP, então íamos andando mesmo. Não demorou até chegarmos e enquanto Manuela escolhia o carrinho que eu ia empurrar, eu me dava o direito de ouvir música conectando os fones de ouvido no celular e pronto para ouvir tudo, menos sua voz. Fiquei quieto enquanto a via andar na frente.

Manuela é uma mulher bonita e isso nunca poderei negar. Ela tem cabelos pretos e longos, com as pontas naturalmente onduladas. Às vezes, ela cortava a franja e deixava tampar sua testa, mas, na maioria das vezes, sua franja fica comprida demais e se mistura com o restante do cabelo como mechas curtas.

Sua pele é azeitonada, nem branca e nem negra. Cor mais acentuada em quem tem genética de mexicanos. Seus olhos, cor jabuticaba, eram detentores de cílios muito escuros e longos, quase sempre sem aquele troço preto que as mulheres usam para alongá-los.

Os lábios, que viviam esticados pelo sorriso, são rosados, quase vermelhos. Nem carnudos, nem finos demais. Além de ter uma linha bem definida que parecia ser boca de boneca.

Ela é baixa, aproximadamente 1,65M de altura com quadris largos e coxas grossas. Seus peitos não são grandes, mas são médios, quase grandes. Quando de TPM, ela preferia usar blusas longas e sem sutiã, talvez por causa do inchaço.

Mesmo com tudo isso, Manuela não era linda, como o padrão de beleza dita. Ela tem o queixo mais pontudo com o rosto mais triangular. Suas sobrancelhas são mais grossas, seus olhos são grandes e ela não era exatamente magra. Tinha um pouco de pneuzinho, como qualquer mortal.

Depois que passei a morar com ela, percebi que eu era mais observador do que muitos pensam.

— Quê? – parei de pensar na vida e notei que ela me chamava.

— Você acha que o pacote de 8kg rendeu esse mês?

— Dá tudo na mesma. A diferença é que ele sai uns centavos mais barato.

Manuela analisou a marca do arroz, os grãos, o preço e, quando finalmente se decidiu...

— Pega dois pacotes deste.

— Eu?

— Meu caro, para que serve seus braços fortes, senão, para trabalhos braçais?

— Safada.

— Quê?

— Nada.

— Pensei.

— Hum!

Talvez eu tenha sido influenciado pela letra da música, mas eu realmente vinha pensando sobre o assunto. Resolvi aproveitar o fato de que Manuela era mais educada em público — digo, na frente de desconhecidos — e botei para fora uma dúvida que me corroía faz tempo.

— Me diz uma coisa, Manuela.

— Espiral ou ninho de passarinho? — Apontou para os macarrões. Olhei confuso, quem cozinha é ela!

— Hã... Ninho?

— Hum... Boa ideia. Cozinha mais rápido. O que quer saber?

— Você e Annabeth... Vocês não se falavam quando eu e ela namorávamos? — Antes de morarmos juntos, eu ia morrer sem saber que elas eram amigas, pois nunca as vi juntas.

Manuela jogou dois pacotes de macarrão no carrinho e me olhou séria. Pela primeira vez na minha vida — mas não a última — ela pareceu irritada por algo que não era eu e que não era o Bernardo.

— Não.

— Por quê? — Se virou e começou a olhar os molhos. — É algo ruim?

— Nós tínhamos brigado no dia em que você a pediu em namoro. Mas quando toda aquela confusão entre vocês e Bernardo começou, ela precisou do meu ombro. A amizade é assim, mesmo com raiva a gente cede um pouco.

— Você estava com raiva dela?

— Um pouco — Avançávamos pelos corredores sem nem ao menos eu ver o que ela colocava no carrinho. — A nossa briga foi realmente feia.

— E brigaram pelo quê?

— Louis estuda história. Pede para ela te contar.

— Isso te machuca ainda, não é?

— Me incomoda. Só isso. Maçã ou banana?

— Maçã. Me diz outra coisa — Esperei ela responder, mas estava atenta enchendo o saco com maçãs. — Quando pedi para alugar seu AP, você sabia que eu era o namorado dela?

— Não.

— Não?!

— Fiquei bastante tempo afastada.

— Mas você jogou na minha cara que eu a trocava fácil.

— Era o que Louis me contava.

— Então como pode acreditar que ela não me traiu? Você não estava falando com ela, não sabe o que se passou na cabeça dela e muito menos se ela tinha raiva de mim.

— Porque Anne é gentil e ingênua. Ela sempre põe os outros acima dela e ela faz besteiras para cuidar de quem gosta. Eu não gosto do método que ela usou, mas ela conseguiu, não é? Você está livre do Bernardo. Você enxergou quem ele é de verdade.

— Mas Manuela, você não viu o que eu vi.

— E o que você viu?

Me aproximei dela para falar mais baixo. Então disse com toda a convicção do mundo.

— Eu não fiquei tempo suficiente para ver detalhes, mas ela estava em cima dele... Suada e... Parecia se divertir bastante.

— Pedro...

— Não Manuela, eu conheço a Anne que namorava comigo e não era aquela. Ela... Ela parecia muito à vontade para quem era quase virgem.

— Sabe de uma coisa?

— O quê?

— Se têm dúvidas, o certo é você mesmo conversar com ela. Se o que ela disse para mim e para Louis for mentira, você vai perceber.

Confesso que saber que Louis tinha o aval para me esclarecer algumas coisas me deixou mais animado. O problema era que Louis era menos controladora do que Manuela. Louis explodia no ato enquanto Manuela acumulava — apesar de que, comigo, ela parecia com uma Louis da vida — e Louis parecia uma leoa sem motivos. Mas, ela tinha a verdade escondida e isso era muito bom.

Só voltei para a realidade quando não consegui empurrar o carrinho com a mesma facilidade de antes. Estava quase transbordando.

— Cuidado!

— Quer comprar o mercado todo? — Me virei para ela indignado.

— Ainda está faltando algumas coisas.

— Deus do céu!

— Trouxe o seu cartão?

— Epa! Já quer me extorquir?

— Deixa de ser chato, eu ainda não recebi meu pagamento. Anda, depois eu vou ao banco e pago as contas, ficamos quites.

— Hum...

Calculando todas as contas que tínhamos (telefone + internet, água e luz), ficava, aproximadamente, R$200,00 para cada. Internet custa caro!

A moça do caixa foi passando as compras sem dó, quando ela chegou na METADE, a conta estava em R$285,77. Arregalei os olhos, mesmo que Manuela pagasse as contas do mês seguinte, ela não pagaria a metade das compras. Vagabunda!

— Manuela! — trinquei os dentes quando passou de R$400,00 e Manuela me apareceu com um segundo carrinho, só que menor, porém, igualmente cheio.

— Quê? Aproveitei para pegar o que estava faltando.

A moça do caixa sorriu e continuou o seu trabalho. Aff... Eu sabia que teria que parcelar em 3x caso quisesse comprar os presentes de Natal dos meus sobrinhos.

— Porque precisa ser tão extravagante? — Olhei os dois potes de sorvete de um quilo cada.

— Deixa de ser chato. Eu também vou pagar por isso.

— Quando Marte provar que é habitada?

— Argh...

— Não se preocupe — disse a moça do caixa. — Meu marido é igualzinho. Precisa ver quando vamos ao shopping!

— Quê? Não, obrigado! Ela que procure um escravo.

A moça riu e Manuela me mostrou a língua. E como se fosse pouco, ainda tive que pagar para o entregador levar em casa... Que mundo capitalista!

— Você quer me falir antes que eu enriqueça?

— Depende, vai me sustentar quando for rico?

— Não!

— Então sim, eu quero te falir.

— O cara que casar com você terá que ser bilionário.

— Hum... talvez um banqueiro seja suficiente.

— Interesseira.

— Calúnia!

Com dezembro chegando ao fim, começou o corre-corre. Todo mundo que havia passado nem pisava mais os pés na faculdade, mas os que haviam perdido... Lá estava eu, pobre miserável, fazendo minha prova final. A professora tinha sido cruel e mencionou assuntos até do semestre passado. Felizmente, eu tinha tido a brilhante ideia de estudar e somado com o silêncio da sala quase vazia, estava fácil para mim.

Quando saí da sala, vi um grupo de meninas vindo em minha direção. Dalí eu só conhecia a Josiane, uma das amigas inseparáveis de Anne, Louis e Manuela.

— Oi Pedroca, Feliz Natal! — Josiane gritou e todas me abraçaram, cada uma trazia algumas sacolas. — A gente quer te pedir um favor.

— Favor?

— Isso — sorriu e me estendeu duas sacolas de papel. — Pode entregar para a Tita? Nós não vamos poder esperar por ela, nosso ônibus sai em uma hora.

— Ah... Tá! Só esse? — E aí me encheram de sacolas com caixas e outros bagulhos. Senhor... — Hã... Ok! Entrego tudo para ela.

— Ótimo, obrigada — disse Josiane quase saindo, mas me olhou curiosa. — Algum problema?

— Hum... Só um.

— Qual?

— Quem é Tita mesmo?! — Que é? Essas coisas a gente tem que perguntar!

— A sua esposa?! — disse com cara de óbvio.

— Ah! A Manu... Porque Tita?

— Manuzita é muito extenso. Tita é mais bonitinho.

— Hum... — continuei confuso, mas esse é um daqueles momentos em que você finge que entende, só para não estender a conversa.

— Já deu um apelido carinhoso para ela? — perguntou uma loirinha alta com os cabelos bem curtinhos.

— Ah, já! — Hehehe.

— Qual?

— Diaba! — sorri orgulhoso. — Ai! — E levei um tapa daqueles nas costas.

— Faça a Tita sofrer e eu juro que viro assassina — disse Josiane furiosa. — Você será a primeira vítima.

— Ok, Diabinha não é um bom apelido.

— Isso mesmo, assim vai continuar vivo.

— E enquanto ao presente? — perguntou a loira.

— Presente? — O que se dá de presente para uma esposa em dia de Natal? — Bem...

— Não comprou ainda, não é? — Josiane fez cara de tédio.

— A Tita não gosta de flores brancas, ela acha sem graça. — disse a loira.

— E nem amarelas... — disse uma baixinha com os cabelos castanhos. — Lembra velório.

— Nada de chocolate também, acaba num tapa e ela gosta de algo que possa guardar. — disse Josiane.

— Urso de pelúcia é de praxe, mas com ela não funciona. — disse a baixinha.

— E nem CD’s. Ela gosta de comprar ela mesma.

— Hã... Meninas, meninas, farei bem melhor do que isso — Resolvi por um ponto naquilo tudo. Um homem precisa saber se impor. — Darei o dinheiro a ela e ela mesma compra e...

— Não!

— Nem pensar!

— Ficou louco?

Canhãe...

— Que tal um jantar romântico? É o primeiro Natal de vocês juntos, não é? — perguntou a baixinha.

— É, mas...

— Pois então! Vai ser tão lindo... — disse a loira toda sonhadora.

— Ok, vocês não tinham um ônibus para pegar?

— Mais que droga! Vamos meninas.

E finalmente saíram correndo me dando tchau. Viram? É assim que se impõe respeito!

Para você que está mais perdido do que cego em tiroteio, eu havia posto em prática o meu plano infalível. A briga com Bernardo havia repercutido mais do que Bruno me contou e, de uma forma mirabolante, junto com ela, a confirmação de que eu e Manuela estávamos casados.

Assim como Bruno havia dito, eles pareciam ter se esquecido que Anne e Bernardo haviam me traído e passaram a querer saber como raios eu havia conseguido conquistar Manuela. Ao que parecia, ela tinha fama de lésbica, mas nunca foi vista aos amassos com outra mulher. Passou a ter fama de encalhada, mas ela dispensava 90% dos caras que tentavam alguma coisa com ela. Embora eu não conseguisse entender como acontecia, bastava Manuela conversar por 1h com um cara de “coração vazio” para ele se apaixonar terrivelmente por ela. Eu achava essa parte um absurdo, até porque, eu morava com ela e só queria distância, mas vi como alguns caras me olhavam indignados. Sendo assim, ela criou fama de ser o tipo de mulher que não fica com qualquer um. Claro que essa fama era entre os seus, ela não era popular na faculdade.

Voltando ao assunto, meu plano era simples: Ao invés de negar até a morte que estávamos juntos, passei a dar evasivas. Ou seja, quando alguém me perguntava se havíamos mesmo nos casado, eu apenas soltava uma frase que poderia dizer tanto sim quanto não. Se a pergunta era feita na frente de outra pessoa que não estivesse falando sobre o assunto, eu apenas ria e começava a conversar com essa outra pessoa. Quando a pessoa criava a própria confirmação — assim como Josiane e as outras duas — eu mantinha uma conversa em que eu não afirmava nada, mas também não fugia. Desta forma, caso Manuela descobrisse do meu plano, eu poderia dizer: Mas eu não disse nada!

E como todo plano infalível, o meu possui uma brecha. Manuela não sabia de nada. Se ela ficasse sabendo eu poderia ser expulso do AP e acusado de... Bem... Acho que ela poderia conseguir uma ordem de afastamento ou sei lá... O fato é que eu não tinha outro lugar para ficar, então, ela não poderia saber de nada.

Agora você faz a pergunta óbvia que até o gênio do Tiago fez: Porque você não pede ajuda para ela?

E junto vem a resposta óbvia: PORQUE É LOUCURA!

Manuela nunca me ajudaria com isso pelo simples fato de ser mentira. Ela odeia mentiras, não suporta falsidade e nunca, nem de longe, aceitaria mentir nesta magnitude. Isso duplicava o meu trabalho, pois eu tinha que dar a entender que éramos um casal quando ela estivesse no mesmo ambiente que eu sem ela desconfiar da mentira e sem os outros desconfiarem da verdade. Puxa, como essa vida é uma merda!

No começo foi fácil, mas quando a história chegou aos ouvidos de pessoas próximas — como professores — o bicho pegou. Por natureza, Manuela fechava a cara e saia batendo o pé. Depois eu tinha que inventar uma desculpa. Meus antigos colegas de República fizeram o favor — mesmo sem saberem — de acostumá-la a ouvir coisas como “cadê seu marido” e isso evitou alguns problemas, pois ela logo ligava essa frase à mim.

— Pra quê tudo isso? — perguntou Tiago me seguindo.

— Mandaram entregar para a tirana.

— Ti... Tirana?!

— Codinome: Diaba.

— Hã?

— Manuela.

— Ah! — Ele riu negando com a cabeça. — Ela sabe desses apelidos?

— Talvez...

— E onde ela está agora?

— Aquela peste? Provavelmente dormindo. Ela passou em tudo.

— Quanto amor...

— Quê?

— Nada! Vai fazer como no Natal?

— Como assim?

— É o primeiro Natal de vocês juntos, não vai ficar estranho quando perguntarem onde passaram e cada um ter uma versão?

— Puta merda!

— Eu disse, peça ajuda pa...

— E ser enforcado? Não, obrigado.

— E o que pretende fazer?

— Vou pensar ainda.


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