Só mais um dia escrita por Caroline Bueno


Capítulo 7
Versos




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Eu ter um irmão não era tão horrível, na realidade era ótimo. Alguém iria ficar para poder me substituir, alguém faria com quem minha morte caísse no esquecimento com 1 ou 2 anos. Eu não o conheceria, nem ele saberia muito de mim, talvez minha mãe contasse como eu era para ele, mas ninguém jamais falaria dele para mim. Sua existência seria algo no qual eu não faria parte.
A conversa tinha sido difícil. Na hora eu não expressei surpresa e nem nada, apenas sorri e disse “que ótimo” enquanto ela me falava que estava tudo bem com a gestação. Eu não sabia se sentia raiva de não poder conhecê-lo ou se era grata, pois era uma pessoa a menos que sentiria minha falta, uma a menos para sofrer. Talvez morrer não fosse tanto uma má ideia, já que eu não precisaria sofrer com remédios na veia e nem lidar com a palidez. Eu seria mais uma nas estatísticas de pessoas que morreram de câncer. Mais uma pobre menina que teve a vida interrompida por um doença cruel. Que estúpido.
Eram umas 4h20 da manhã, o sol nascia graciosamente, deixando a luz laranja-amarelado enfeitarem meu macacão branco. Fiquei observando o céu e pensando que lá não seria um lugar tão ruim de se estar depois de morrer. Talvez eu pudesse observar todos lá embaixo depois que o sol nascesse. Peguei meu notebook e comecei a escrever uma rima qualquer:

No parapeito da janela
Ela observa o Sol nascer
Pensamentos passam pela cabeça dela
Ela tem medo do desconhecido, não quer morrer.

“A vida dela é frágil e a alma eterna
Seu sorriso é simples e encantador
Mas quando pensa na morte ele se sela
Pois tem medo de estar longe do amor.

O final feliz é tudo que lhe resta
Já que a vida lhe foi sem cor
Ela apenas espera
Que no fim possa aliviar a sua dor.”

As palavras do poema contavam o que eu sentia. Chorei silenciosamente no meu quarto. O dia já havia chegado, então resolvi descer e tomar café-da-manhã. Como era muito cedo ainda, só tinha eu acordada. Fui até a geladeira, peguei geleia de uva e o saco de pão em cima da bancada. Sentei à mesa, cortei o pão e passei um pouco de geleia, depois enchi um copo com leite puro e bebi. Estava tudo muito bom, mas era o tipo de coisa que eu só poderia comer de vez em quando. Comi um quadradinho do chocolate que eu ainda tinha da Cadbury e voltei para meu quarto. Quando subia a escada, meu pai esbarrou comigo.
-Bom dia filha. Podemos conversar um pouco agora? - ele falou sorrindo.
- Claro pai, tudo bem. - falei.
Descemos as escadas juntos, ele parecia querer falar sobre algo muito importante. Sentamos no sofá cinza-claro, e ele começou a falar.
- Filha, eu sei que você não reagiu bem a notícia de que sua mãe está grávida. Eu sei que você tem medo que seu irmão ou irmã substitua você, mas isso nunca vai acontecer. Você e sua mãe são as coisas mais preciosas que eu tenho. Você sempre será a minha princesinha ruiva que corria pela casa, sorrindo. Não importa o que aconteça, você sempre estará aqui - ele colocou minha mão no lado esquerdo do seu peito - no meu coração.
- Eu te amo pai - eu o abracei e chorei.
Eu nunca havia me sentido tão bem por ter conversado com meu pai. Por saber o quanto era importante, apesar de que eu não estaria mais viva depois de algum tempo.


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