Ensaios Sobre Ser Uma Raposa escrita por Bombom


Capítulo 1
This boy is only gonna break your heart


Notas iniciais do capítulo

er... eu tenho problemas com Pequeno Príncipe q
Other than that, enjoy :3



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/650092/chapter/1

Ensaios Sobre Ser Uma Raposa

A primeira vez que ele viu Marco, Gabriel não realmente o viu, mas foi forçado a reconhecer sua presença.

Estava em um dos milhares corredores desertos de sua escola, lendo a edição gasta de Pequeno Príncipe que sua mãe lhe dera quando era pequeno pela décima quinta vez. Estava em sua parte favorita, a da raposa, quando alguém subitamente sentou ao seu lado.

Praticamente pulando do susto, Gabriel tentou se recompor, olhando de relance para o lado. O que encontrou foi um adolescente da sua idade, de cabelos negros encaracolados cortados curtos, nariz reto e olhos estranhamente verdes, destoando de sua pele cor de barro. Seus ombros eram largos e o moletom laranja da escola parecia cair em uma cascata dali para baixo, só se ajustando na cintura. Ele estava inclinado, olhando por cima de seu ombro curiosamente. O instinto de fechar o livro foi difícil de reprimir.

— Nossa Senhora, que edição velha!

Gabriel encarou o garoto, reparando em uma pinta que ele tinha na curva superior da orelha. Não sabia o que dizer, então continuou do jeito que estava, lentamente se inclinando para trás com as bochechas vermelhas de vergonha.

O estranho não parecia intimidado por isso.

— Cara, eu li esse livro quando eu tinha, sei lá, dez anos de idade! Eu amava! — Seus olhos brilhavam, e ele retirou o livro das mãos despreparadas de Gabriel, que não pôde fazer nada senão abrir e fechar a boca como um peixe. Folheando as páginas rapidamente, ele soltou uma risada gostosa. — Meu Deus! Os baobás! Meu nome é Marco, qual o seu?

Gabriel realmente pensou em responder com toda a sinceridade “Gabriel Calcanhotto”, mas de repente, ele pensou em como seria bom estar sozinho. Sua boca formulou algo diferente.

— Não me cativastes ainda. — Arrancou o livro da mão do outro e foi embora, casualmente passando a mão no rosto para esconder sua vergonha.

Pensava que nunca mais o encontraria, mas como estava errado.

A segunda vez que ele viu Marco, Gabriel estava num transe de quase sono.

Era algo comum para ele entrar nesse estado. Na verdade, ele tinha começado a entrar nesse transe desde o começo do ano, quando decidiu mudar sua aula de aprofundamento de literatura para logo depois do período de desenho geométrico. No lugar de dormir como normalmente faria, seu medo de acabar dormindo durante a aula de literatura o impedia de entrar em seu sono pacificamente.

Assim sendo, ele mal teve tempo de levar o seu cérebro a raciocinar - garoto novo, garoto desconhecido, garoto bonito - quando reparou que o professor entrava em sala. Ao pensar em literatura, seu corpo imediatamente o fez esquecer dessa estranheza, e logo seu foco estava (pela primeira vez no dia) na aula.

— E em um de seus poemas mais famosos, o vilancete Bahia, Gregório de Matos mostra seu desprazer com a situação do estado na época, que seria, deixe-me ver... — O Professor Santini fez uma pausa dramática, encarando a classe de onde estava sentado na mesa do professor. — Calcanhotto, qual era a situação?

Sem hesitação, logo respondeu: — Salvador era uma cidade sem honestidade e moral. Todos eram corruptos, e o povo honesto caía na miséria.

— Muito bom, muito bom! — Santini ajeitou o cabelo encaracolado para trás de sua orelha, e depois passou os olhos lentamente pelos alunos, até que... — A próxima pergunta vai para o aluno novo, Marco! Então, Marco, qual era um dos temas universais usados por este poeta?

Gabriel virou lentamente para ver a cara de quem estava respondendo quando teve um estalo.

Era o cara do Pequeno Príncipe.

— O carpe diem, professor. A ideia de aproveitar a vida pois ela é uma só.

-X-

— Então — ele começou, casualmente apoiando seu cotovelo na carteira de Gabriel enquanto sentava na da frente. —, já te cativei, Calcanhotto?

Gabriel soltou um suspiro, e um bem alto. Encarou o garoto à sua frente com incredulidade, enquanto nervosamente ajeitava os botões da gravata.

— Você realmente lembra disso? — murmurou baixinho, mas o suficiente para o outro ouvir. Marco sorriu, brincalhão.

— Como me esquecer da saída mais triunfal que já vi na minha vida? — ironizou. Sua gravata, vermelha e branca para representar que estava no primeiro ano, escapou de dentro do blazer e ficou pendurada entre os dois quando se inclinou para a frente. — E então?

— É Gabriel. — Mudou de posição na carteira para mais longe deste o possível. — Mas tu ainda não és diferente de cem mil outro garotos para mim, assim como eu não sou para ti diferente de cem mil outras raposas.

— De novo com as citações? Meu Deus!

Foi natural que eles virassem melhores amigos depois disso.

-X-

Tal como no livro, Gabriel soube exatamente quando era a hora de Marco voltar para sua Rosa.

As crises de ansiedade, a bebedeira constante nas festas, até que um dia ele simplesmente dormiu pela aula de literatura – quem faz isso? – e foi confirmado. Marco Antonio Guerra estava tendo um colapso de abstinência e tudo por causa daquela garotinha insensata que não sabia pensar em nada além de si mesma.

A única solução em que conseguiu pensar foi conversar com Marco, e depois da conversa, ele nunca tinha se sentido tão livre.

Mas, ao mesmo tempo, nunca tinha se sentido tão pesado. Imaginar Marco com outra pessoa, com seu sorriso safado que ele só tinha visto uma vez por causa daquela única festa em que ele também tinha ficado bêbado, e com mãos quentes passando por suas costas – novamente, a festa -, fazia seu estômago queimar e uma dor de cabeça começar a se formar entre seus olhos.

E foi com essa dor de cabeça pulsando pelo sua espinha dorsal até seus pés, num vai e vem doloroso que fazia seus joelhos enfraquecerem, que ele subitamente se enrijeceu, caminhou até Marco depois do fim de sua conversa, e puxou-o para baixo.

— Estúpido — foi a única coisa que teve tempo de murmurar antes de fechar seus olhos (ele odiava ver o seu próprio reflexo nos olhos do outro, era desconcertante) e tocar os lábios de Marco com os seus por um meio segundo.

Na outra metade, já estava afastado e passando uma mão por seu rosto, como antes. Sua voz tremeu quando mandou-o ir buscar sua Cleópatra logo, e o resto de seu corpo o fez quando Marco saiu sem dizer nada.

Sentou-se à mesa e encarou o vaso de fores que tinha no centro desta, pensando em como elas realmente precisavam de água. No fim, voltou a rosas, e pensou em Mariana, provavelmente ganhando a confissão de Marco neste exato momento.

Sem pensar, ele passou os dedos pela linha da madeira e apoiou o rosto na mão.

— Aqui vai um segredo...


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!