Motivação. escrita por Guilherme Emilioreli


Capítulo 1
Capítulo 1




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Fim de tarde. O céu nublado e escuro impedia que os raios de sol chegassem até minha fria e pálida pele.

"A noite está a chegar... Mais uma vez.".

Entre diversas ruas abarrotadas de pessoas, um franzino rapaz de capuz não seria notado nem mesmo se quisesse, eu sabia disso. Finas gotas de chuva ensopavam aquela parte do cabelo a qual eu não conseguiria esconder. Cabisbaixo e até quem sabe tristonho, seguia mais uma vez para aquele simples apartamento, alugado há meses, para que pudesse estudar naquela única faculdade da região.

"Quanta gente... Não dá pra chegar em casa tranquilamente nem chovendo? Estão todos realmente ocupados assim?"

Era no terceiro andar. Eu sabia que não era muito, mas eu precisaria passar por aquilo. Era o mesmo, todas as tardes, enquanto eu passava por aquele sujo e fedido apartamento 201. Aquilo, era uma batida a qual ecoava pela minha mente, tão clara como papel. Sempre a mesma, acompanhada por diversos (e até perturbadores) sons... Era sério que ela gostava tanto assim daquela música? E gostava mais ainda de que seu amante "secreto" a chamasse de vadia?

"Algum dia isso termina. Mas eu não farei nada sobre isso. Não preciso disso, eu acho..."

A porta do meu apartamento estava um pouco emperrada, mas nada que um tranco ou dois não resolvesse. Estava tudo em ordem. As roupas, agora secas, no pequeno varal na varanda, sons (agora) agradáveis, saindo da antiga vitrola no canto e meu jantar, na geladeira, pronto para ser preparado. Tudo estava em ordem, como sempre estivera nesses últimos quatro (longos) meses.

"Parece que todos estamos chegando ao ponto alto dos nossos dias, não é mesmo, Annabelle?"

Ah, seu idiota, como se ela pudesse te ouvir! Seus gemidos ecoavam pelo corredor, as paredes do velho prédio nunca haviam isolado som algum. Entretanto, não atrapalhavam tanto assim... Afinal, com o tempo, nos acostumamos com algumas coisas rotineiras, nao é mesmo? Os vizinhos poderiam reclamar o dia todo, mas nada era feito. O síndico pouco se importava para nada do que acontecia, afinal, Annabelle e seu esposo deixavam-lhe seu dinheiro sempre em dia, todos os meses. E ninguém era capaz de dizer nada para o pobre esposo da luxuriosa infiel.

"Ele não pode ser tão lerdo assim. Não tem como ser."

Meu jantar estava pronto, um vinho o acompanhava. A sobremesa, ainda reservada na geladeira. Era incrível o que um pouquinho de uva podia fazer com um ordinário prato de macarrão alho e óleo. Os gritos continuavam, era quase 19h. Aquilo pararia logo, quisesse ela ou não. E todos sabiam que ela não queria. O vinho trepidava na taça de vidro. Eu ainda não me perturbava, nunca fora do meu feitio cuidar da vida dos outros. Não obstante, em meu íntimo, algo torcia para que aquilo parasse.

"..."

Fui até a geladeira. Enquanto a abria, um bolo, minha sobremesa, já em vista, um grito cortou o estranho silêncio repentino. E, então, um estampido. Um tiro. Outro som. Outra bala. E, além da música a qual ecoava pelos cômodos do meu apartamento e da risada histérica do pobre William traído, nada mais se ouviu. Até que a polícia chegasse.

"..."

Silêncio total.

"Triste motivação. Ao menos, nunca sofri tamanho infortúnio."

"Afinal, bolos não pensam."

"Afinal, bolos não se apaixonam."

"Afinal, bolos não traem."

~ Fim ~


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