Sob minha pele escrita por Bruna


Capítulo 44
Capítulo 44




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Mel.

 Algum tempo depois...

 O tempo vem passando rápido. Mais rápido do que eu imaginava. O tempo agora está mais frio, e o meu bebê vem crescendo a cada dia mais.

Todos na cidade já sabem que eu vou ter um filho. Algumas pessoas me apoiam, e outras simplesmente torcem o nariz para mim quando me veem na rua. Eu não gosto nem de pensar no que devem falar a meu respeito pelas costas. Porém, eu não deixo que essas coisas me abalem. Eu estou tão feliz. Feliz que está cada vez mais próximo o dia em que eu finalmente irei ver o rostinho do meu bebê.

Falta tão pouco.

Mateo nunca mais apareceu por aqui, e nem me dirigiu qualquer palavra. Acho que ele precisa de tempo, já que eu deixei bem claro que eu não me casaria com ele e nem com ninguém.

No dia vinte de julho. Meu aniversário. Meu avô, Ana e Julia, fizeram uma festa surpresa. O que realmente foi uma surpresa. Tinha muitas pessoas. E a parte legal é que o aniversário era meu, mas quem ganhou a maioria dos presentes foi o Max. O que me deixou muito feliz. Meu avô está se saindo um belo de um bisavô coruja. Sempre que ele sai à cidade para jogar baralho ou dominó com seus amigos ele sempre volta com uma coisa nova. Semana passada foi com um caminhão de brinquedo gigante, já ontem foi com um boneco do Batman. Eu me alegro muito em perceber que o meu bebê é muito esperado por todos.

Julia é outra compradora compulsiva. Max já tem tantas coisas que eu nem sei onde guardá-las. Eu estava em dúvida entre comprar um berço ou apenas trocar a minha cama, já que meu quarto seria também o quarto do meu bebê, bom, pelo menos até ele estar grande o suficiente para querer seu próprio quarto. O que vai demorar um pouco...

Até lá eu vou mimá-lo muito...

Optei então por comprar uma cama de casal para que ele fique bem perto de mim, para que eu possa ficar de olho nele a qualquer hora. Como mãe de primeira viagem eu não posso negar que junto com a ansiedade de poder vê-lo, também vem o medo de fazer alguma coisa errada. Afinal, bebês recém-nascidos são tão frágeis, e precisam de tantos cuidados. Eu venho me preparando muito para não precisar muito da ajuda dos outros. Parece meio bobo, mas eu quero ser a primeira a fazer tudo. A primeira a dar banho, a trocar a fralda, a colocar para dormir. Mal posso esperar por tudo isso.

Ana estava tricotando um suéter azul minúsculo para ele. O que me deixa toda boba. Mal posso esperar até ele começar a usar suas coisas.

Da última vez em que passei no médico mês passado meu avô fez questão de me acompanhar. E eu nem preciso dizer o quanto ele ficou emocionado durante a ultrassom. Max já está tão grande. E eu me surpreendo sempre a cada ultrassom nova. Adoro vê-lo brincar dentro da minha barriga. Adoro vê-lo mexendo os dedinhos, adoro vê-lo mexer os minúsculos pés. Eu até conseguir vê-lo tocando o narizinho, chorei feito uma boba. Por que aquele pequeno serzinho tão frágil que estava guardado dentro de mim era meu filho, meu menino, e ele era perfeito.

Contei ao Rafael o nome que eu havia escolhido para o meu bebê, e ele simplesmente amou, tanto que no outro dia ele veio me visitar, e trouxe um presente. Um quadro com a minha última ultrassonografia. A moldura azul era toda decorada com pequenos ursinhos, e com seu nome em letras enormes.

MAXIMILIAN.

Eu não tive palavras para agradecer. E a fotografia ficou linda na parede. Junto com as outras coisas do Max.

Eu e Julia já conseguimos organizar todo o quarto, e tudo está perfeito, apenas o esperando. Estão todos muito ansiosos.

Eu fiz sete meses de gravidez no dia vinte e nove de setembro. No outro dia foi o aniversário de John, ele estava completando vinte e seis anos, e lembrar disso me deixou um pouco deprimida. Me sinto mal por esconder. Sei que é uma coisa terrível, mas de certo modo é necessário. Será melhor para nós dois. Assim nenhum de nós irá magoar o outro de novo, e assim meu filho não terá que viver no meio de toda confusão que existe entre nós dois.

Conversando com Julia eu decidi que já que Max seria registrado apenas no meu nome ele deveria ter alguma coisa de John também. Então eu decidi que colocaria o segundo nome de John nele. Julia amou a combinação. E eu também.

MAXIMILIAN RICHARD GUILLÉN.

Talvez um dia as coisas mudem, mas a cada dia que passa eu percebo que fica mais tarde, e minha decisão de manter segredo também se mantem.

Estamos no dia vinte e sete de novembro e eu estou enorme. Já que minha barriga não havia crescido muito no principio da gravidez eu achei que seria assim até o fim.

Como eu estava enganada.

Ela está tão grande que dificulta, e muito, o meu sono durante à noite. Eu não encontro uma posição certa para dormir, meus pés estão inchados, assim como as ânsias também voltaram. Às vezes olhando para minha barriga durante o banho eu tenho medo de que ela exploda. Mas todos parecem ver apenas a beleza de tudo isso. Ana já fez um álbum enorme de fotografias minhas exibindo o barrigão. As fotos são lindas e eu vou guardar para sempre com muito carinho.

Talvez eu não tenha essa experiência outra vez. Talvez Max seja meu único filho, por que eu sinceramente não sei se algum dia eu poderia amar outro homem a ponto de ter um filho com ele.

Meu coração ainda tem um dono.

Nessas horas da madrugada que meus pensamentos voam soltos. Nessas horas da madrugada em que eu não consigo pregar os olhos por conta do desconforto da barriga enorme, além de Max estar fazendo uma pequena festa, creio eu, que de despedida já que está bem perto o dia do nascimento, e eu estou em uma mistura de empolgação, felicidade e muito, muito medo.

Ana tem dormido junto comigo desde semana passada. Nós tivemos um pequeno susto. Eu realmente pensei que havia chegado a hora, mas segundo Rafael foi apenas um falso alarme, o que significava que não estava longe. Desde a hora do jantar eu venho sentindo um pequeno desconforto, mas eu não quis alarmar ninguém, porque poderia ser um alarme falso outra vez.  Mas agora eu estou começando a repensar essa minha decisão, porque eu realmente estou entrando em pânico. E alguma coisa dentro de mim está me avisando que é agora!

— Ana. – Eu digo baixinho enquanto chacoalho seu braço. Ela está com o rosto amassado contra o travesseiro, a boca aberta. Ela está em um sono profundo.

Que inveja!

Eu nem lembro mais o que é ter uma noite tranquila de sono, em que você pode simplesmente deitar na cama e apenas dormir. Max parece ter algum tipo de aviso quando eu estou prestes a deitar para descansar. Entramos num impasse. Eu quero dormir, e ele quer brincar com tudo o que existe dentro de mim.

Ele parece estar fazendo isso bem agora!

Ergo-me com dificuldade até estar sentada na beirada da cama. Coloco minhas mãos sobre minha barriga e sinto uma leve pressão. Meu coração acelera quase que de imediato.

Levanto-me e vou em direção ao banheiro para jogar um pouco de água no rosto e tentar acalmar os nervos. Olho-me no espelho e posso ver meus olhos quase se fechando de tanto cansaço.

Tudo o que eu queria era dormir!

Porém Max parece ter outros planos.

Sinto algo molhado descer por minhas pernas e imediatamente o pânico toma conta de mim.

Está acontecendo!

—Ana! – Eu grito assustada com minhas mãos segurando minha barriga.

Não sei o que devo fazer!

— Ana! – Grito outra vez sentindo uma pequena dor, suportável, atravessar meu ventre.

Fecho meus olhos e tento me lembrar de tudo o que o Rafael me disse:

— Quando chegar a hora não entre em pânico. Tente respirar fundo e manter a calma e tudo irá ficar bem.

Tento fazer o que ele me mandou, mas mesmo assim eu preciso de alguém aqui. Eu vou dar a luz. E não pode ser nesse banheiro.

Respiro fundo.

— Ana! – Grito a plenos pulmões.

Ouço algo se esbarrando e caindo no meio da escuridão.

— Mel? – Chama Ana com a voz meio atrapalhada do sono ainda. – Onde está você? – Posso sentir o alarde em seu tom de voz.

— Aqui no banheiro. – Digo tentando não chorar. Tentando não deixar o medo e o pavor me dominarem.

Essa foi uma das coisas mais difíceis que eu já tive que fazer em toda minha vida!

Ana aparece no banheiro com o cabelo todo desgrenhado e os olhos inchados. Ela me olha dos pés a cabeça, mas não parece não notar nada de errado.

Nem mesmo a poça de água aos meus pés.

— Acho que minha bolsa estourou. – Digo o mais calma possível.

Seus olhos de repente se arregalam e ela corre até mim me segurando pelos ombros e pela primeira vez percebendo a bagunça aos meus pés.

— Você acha que sua bolsa estourou? – Pergunta em tom de zombaria.

— Na verdade, eu tenho certeza. – Digo rindo.

Ela me ajuda a chegar até o quarto e me senta na cama. Agora ela está revirando o quarto às cegas a procura do que, eu não sei.

— Ana, acenda a luz. - Digo com paciência. Ela parece estar mais nervosa que eu.

— Claro. – Diz dando um tapa na testa. – Eu deveria ter pensado nisso. É uma hora da manhã, que hora esse rapazinho resolveu vir ao mundo.

Bom, pelo o que Rafael me explicou as coisas não são bem assim. O parto pode acontecer rápido ou pode demorar um pouco. Espero que o meu seja bem rápido.

Agora essa louca procura de Ana por alguma coisa no quarto já está me deixando agoniada.

— Ana, o quê você está procurando? – Pergunto respirando fundo, tendo que aguentar outra espécie de choque na barriga.

— Estou procurando uma roupa para você! Você não pode ir para o hospital de camisola!

Rio de sua atrapalhação.

Depois que Ana se troca ela me ajuda a fazer o mesmo. Acho melhor colocar um vestido já que provavelmente eu irei trocar de roupa quando eu chegar ao hospital. Ana me orienta a colocar um casaco por cima já que o vento está muito gelado do lado de fora. Ela já passou no quarto do meu avô e em tempo recorde devo acrescentar ele já estava pronto para sair. Segundo ele, ele não iria perder o nascimento do bisneto dele por nada. Julia também já está de pé, e está na cara que o nervosismo está quase a consumindo por completo. A todo o momento ela pergunta se estou sentindo dor, e eu sempre digo que estou sentindo desconforto. Ainda não me parece dor.

Fico com medo do momento em que eu vou começar a sentir...

— Julia, você pode pegar a bolsa do Max, por favor? – Digo enquanto me sento no banco traseiro do carro. – Está dentro do guarda-roupa.

— Claro! – Diz afobada. – Eu vou buscar! Dois minutinhos e eu estarei de volta. – Dizendo isso ela sai em disparada pelas escadas.

Rio de sua animação.

— Está tudo bem? – Pergunta meu avô enquanto coloca o cinto de segurança na poltrona da frente. – Está com dor?

— Não. – Digo sincera. – Estou bem.

— Então, finalmente vamos conhecê-lo, não é? – Diz com um sorriso no rosto.

— É. Finalmente. – Digo alegre.

Julia volta com a bolsa verde cheia de ursinhos, e senta ao meu lado no banco de trás. Ana está no volante e finalmente estamos indo para o hospital.

Fecho os olhos em uma prece silenciosa para que tudo dê certo. E para que meu filho chegue ao mundo com muita saúde.

— Eu já liguei para o Rafael. – Diz Julia entrelaçando seus dedos aos meus. – Eu disse que sua bolsa estourou. Ele estava em casa, mas disse que já estava a caminho do hospital!

Franzo minhas sobrancelhas.

— Ele não estava de plantão hoje? – Pergunto.

Julia dá de ombros.

— Pelo jeito não, mas ele disse que já estava correndo para o hospital! E que estaria esperando você!

Ele não precisava fazer isso. Qualquer outro médico poderia me atender. Deveria ser sua noite de folga. Me sinto meio mal por isso.

O hospital fica a certa distância do restaurante, e com as estradas escuras ainda por cima, eu não poderia deixar de sentir medo.

Tudo vai ficar bem!

— Lembre-se de ficar calma, e de respirar fundo assim como o doutor disse. – Diz Julia carinhosamente ao meu lado.

Os minutos se passam, e acho que só agora eu estou sentindo dor realmente. Dores cansativas que vem de tempos em tempos, e me deixam muito cansada a ponto de quase cochilar. Até ser despertada por outra.

— Chegamos Mel! – Anuncia Julia para o meu alivio.

Ana estaciona o carro e rapidamente a porta ao meu lado já é aberta. Sinto os braços do doutor Rafael em minha barriga. Ele se inclina e tira o meu cinto de segurança.

— Então, como está essa mamãe? – Pergunta animado.

Por que estão todos tão animados?

Eu estou a ponto de ter um treco!

— Por enquanto ainda estou bem. – Murmuro enquanto ele me ajuda a sair do carro.

— Consegue andar? – Pergunta solicito. – Eu posso te carregar no colo. – Oferece me encarando com seus olhos azuis, com uma ternura que me faz sorrir.

— Não. Eu consigo andar não se preocupe. – Digo lhe dando meu melhor sorriso.

[...]

Eu estou a tanto tempo deitada nessa cama, sem nem ao menos ter noção de tempo. Eu não sei se passaram minutos, horas, ou dias. Eu apenas sinto essa dor infernal capaz de me enlouquecer.

Meu avô está ao meu lado segurando minha mão, enquanto eu me contorço sentindo outra contração. Bem mais forte que as anteriores. Uma dor que parece querer me queimar viva. Eu não tenho mais fôlego. Eu pensei que iria ser rápido, mas não é bem assim.

Deveriam ser proibidos esses filmes em que a mocinha dá a luz lindamente.

Eu estou a ponto de enlouquecer!

No começo eu estava tentando controlar minhas lágrimas, mas agora, eu não sei se choro por causa da dor, ou se choro pelo cansaço, ou se choro por não conseguir parar de pensar em John desde o momento em que coloquei meus pés nesse hospital.

Seria tudo tão diferente se ele estivesse ao meu lado. Se ele pudesse ouvir o nosso filho chorar pela primeira vez. Eu realmente queria que ele estivesse aqui. Mas eu não posso voltar atrás. Eu já tomei minha decisão, e eu sabia quais seriam as consequências.

— Ana, isso não vai acabar nunca? – Pergunto choramingando com o rosto enfiado no travesseiro.

— Meu amor, essas coisas demoram mesmo. – Diz enxugando minhas lágrimas.

— Mas eu não aguento mais! – Digo exausta com uma vontade imensa de fechar os olhos e dormir. Entretanto para dormir é necessário relaxar, e a dor não me deixa relaxar.

— Aguenta mais um pouco Mel. – Diz Julia ao meu lado. – Já está quase no fim.

Eu só queria que ele nascesse logo. Essa dor não passa, e nem me dá descanso. É tão exaustivo e frustrante, porque eu sei que não há nada que eu possa fazer para acabar com tudo isso a não ser esperar.

E esta espera está me matando...

— Vim ver como você está. – Diz Rafael baixinho segurando minha mão.

— Eu não estou bem. – Digo sem conseguir conter o choro. E eu me odeio por isso. – Isso é muito mais difícil do que eu imaginei. Por que tem que demorar tanto?

— Ele precisa estar pronto Mel. – Diz Rafael carinhosamente. – Você é uma mulher corajosa! Eu sei que é difícil, mas tudo vai valer a pena no final!

Eu sei que estão todos nervosos, mesmo que estejam tentando parecer o mais calmo possível, mas eu não consigo disfarçar. Eu estou uma pilha de nervos.

Sei que no fim eu vou ter meu filho nos meus braços. Vou poder ver seu rostinho, seu corpinho, seu sorriso. Mas por que esse fim tem que demorar tanto?

— Não estou me sentindo assim agora!- Digo cerrando os dentes ao sentir outra contração.

— Me deixa ver como estamos indo.

— Eu vou tomar um café. – Diz meu avô depositando um beijo em minha testa. – Eu já volto. - Sei que ele quer me dar privacidade nesse momento. E até eu prefiro assim.

Eu queria tanto ir dar uma volta agora...

Sair um pouco do meu corpo. Deixar de sentir essa dor por alguns segundos.

Eu gostaria de ir para um lugar bem longe. Nova Iorque talvez. Para os braços de um certo alguém.

Assim que Ana e meu avô saem do quarto eu caio em um choro inconsolável ao me deparar sem John nesse quarto. Em um momento tão importante. Sem ele para segurar minhas mãos. Sem ele para me dizer que vai ficar tudo bem, para dizer que me ama.

Uma angustia invade o meu peito.

Meu deus! Ele nem sabe que eu estou aqui agora!

Prestes a dar a luz!

— Mel, - diz Julia tentando me consolar. Mas ninguém pode fazer isso. Só eu sei o quanto dói abrir mão. O quanto dói esse orgulho idiota. O quanto dói esconder que a pessoa mais importante de nossas vidas está prestes a chegar ao mundo. – você precisa ser forte.

Eu tenho sido forte desde o momento que ele foi embora. Desde o momento que descobri que estava grávida. Eu tento sempre ser forte por todos, mas nesse momento eu não consigo ser forte por mim mesma.

— Estamos quase lá Mel. – Diz Rafael enxugando minhas lágrimas com ternura. – Está bem perto agora. Se continuar indo rápido assim, em menos de uma hora seu filho já terá nascido! – Diz confiante.

Rápido?

Isso não está sendo nem um pouco rápido para mim!

— Tente relaxar. Feche os olhos. Pense em coisas que te fazem bem. – Diz Rafael tentando me acalmar.

— Tipo lembranças? – Pergunto fungando.

— Sim. – Diz sorrindo. – Lembranças é uma boa.  Eu volto daqui a pouco para te ver! – Diz acariciando meu cabelo.

Fecho os olhos e automaticamente ele toma meus pensamentos.

 

— Tem alguma coisa diferente em você. Eu não consigo me afastar. – Diz com a voz afetada. Como se existisse algo no ar. Sua voz soava como música para os meus ouvidos. Me encantando aos poucos. Me envolvendo. – E seja lá o que for isso, eu sei que você sente o mesmo. E isso só deixa as coisas mais difíceis para mim.

Ele me beijou naquela noite. Foi o nosso primeiro beijo. E foi o melhor beijo da história. Eu ainda consigo sentir seus lábios nos meus. Seus lábios em meu pescoço. Seus lábios em todos os lugares.

Por que nos distanciamos tanto?

Por que brigamos tanto na última vez que conversamos?

Por que ele me deixa com tanta raiva a ponto de querer odiá-lo?

Sinto mãos em meu rosto. Um soluço involuntário de dor sai de mim. E eu não sei dizer se essa dor é física, ou se é em meu coração, castigado demais.

— Você está pensando nele, não está? – Pergunta Julia com doçura.

Suspiro alto.

— É tudo tão complicado, tão triste – digo chorosa com as mãos acariciando minha barriga – eu não consigo parar de pensar no quanto eu estaria mil vezes mais feliz se ele estivesse aqui. Comigo. Apesar de estar com muita raiva dele eu ainda o amo muito Julia! E eu não consigo parar de pensar nele. E eu não consigo parar de me remoer, em saber que toda às vezes em que eu olhar para o meu filho, eu vou estar olhando para uma parte dele. E eu sei que vai doer demais. Por que já está doendo pra caramba agora!

— Eu não sei se eu seria tão forte quanto você. – Diz Julia acariciando meus cabelos. – Acho que eu já teria enlouquecido.

— Eu estou a ponto de enlouquecer.

— Você não quer pensar no assunto, sei lá. Dizer sobre o Max.

Sei que ela está hesitando em falar sobre isso. Sei que ela não entende meus motivos.

— Sabe o que ele me disse antes de ir embora? – Pergunto sentindo a magoa me invadir outra vez. – Ele disse que eu iria ficar com a minha vida e que ele iria voltar para a dele. – Digo repetindo suas palavras. - Você entende? Ele está com a vida dele lá, e eu não faço mais parte dela.

— Você não acha egoísta? – Eu sei que é isso o que ela pensa. – Sei lá, ele vai ter um filho, e ele nem sequer sabe disso. Ele poderia decidir se iria assumir ou não, mas acho que isso tem que ser uma escolha dele Mel.

— Talvez. – Digo com sinceridade. – Mas ele quer esquecer isso Julia, esquecer esse lugar, ele me disse isso. E eu nunca vou esquecer a verdade que eu vi em seus olhos quando ele disse essas palavras. Era realmente o que ele queria. Ir embora e esquecer. Eu sei que eu o magoei muito por não ter ido com ele, e acho que ele merece ser feliz e eu vou dar isso para ele. – Mesmo que me doa muito. - A prova de que ele está seguindo adiante foi àquela mulher que atendeu seu telefone, e eu não quero atrapalhar isso. Ele já está com outra pessoa. Eu já sou passado para ele.  – Fecho os olhos ao sentir outra dor atravessando meu ventre. – Eu não quero prendê-lo a mim a força. Eu vou deixa-lo ter a vida dele lá, e eu vou ter a minha aqui. Como sempre foi.

Julia aperta minha mão na sua.

Acho que pela primeira vez ela me entende de verdade.

[...]

Meu avô e Ana voltaram a cerca de uma hora, mas há vinte minutos o doutor Rafael entrou na sala, e após me examinar ele disse que estava na hora.

Exalei em alivio e me encolhi em medo.

Ana e meu avô ficaram na sala de espera enquanto Julia me acompanha até a sala de parto. Meu corpo inteiro está tremendo. Acho que eu nunca estive tão apreensiva quanto agora. Eu olho para todos os lados em busca do quê eu não sei. Acho que no fundo eu procuro por um lugarzinho para onde eu possa correr e me esconder.

Eu já estou posicionada na cama, Julia está ao meu lado coberta com uma roupa azul, assim como o doutor Rafael. Julia segura minha mão e me dá um sorriso encorajador.

— Podemos começar agora Mel. – Anuncia Rafael calmamente. – Quando você sentir uma contração, eu preciso que você empurre com toda sua força.

Faço que sim com a cabeça.

Respiro fundo.

É só empurrar!

Assim que sinto uma dor muito forte me atravessar, eu empurro com tudo o que tenho. Juntando todas as minhas forças. E continuo a fazer isso pelo o que parece uma eternidade, mas parece não ser suficiente. Lágrimas de desespero molham meu rosto. Eu tento não fazer muito barulho, mas a dor está mais intensa, arrisco até a dizer que está pior que antes.

— Não aguento mais. – Choramingo me sentindo completamente esgotada.

— Claro que consegue Mel! – Diz Julia confiante.

— Estamos quase lá Mel! Falta pouco! Eu já consigo vê-lo!

Meu coração acelera no peito, e de algum jeito eu consigo encontrar o que restou de força dentro de mim para fazer força, e empurrar mais algumas vezes.

— Isso! Continua assim Mel! – Diz Rafael soando orgulhoso.

E eu sigo o som da sua voz. Eu tomo sua confiança.

Eu vou conhecer o meu bebê!

E isso já é mais do que motivo para eu ter mais força e coragem agora!

Reúno mais força, tentando não me concentrar na dor que me rasga, para empurrar com tudo o que tenho uma última vez. Por um momento eu estou completa, e em outro me sinto vazia. Um choro agudo e muito forte preenche a sala, e eu acho que meu coração vai parar no peito. Em meio a tanta dor e desespero um sorriso se abre em meu rosto quando eu percebo que esse choro é do meu filho.

— Olha Mel! – Diz Julia com lágrimas escorrendo pelo rosto. – É o Max!

Acho que esse é o momento mais lindo de toda a minha vida. E eu quero vê-lo. Eu quero segurá-lo.

— Onde ele está? – Pergunto tentando me erguer em meus braços.

— Aqui mamãe. – Diz Rafael com ele nos braços enrolado em uma manta azul. – Agora você vai conhecer a mamãe. – Cochicha para Max.

Rafael o coloca em meus braços e ele é tão pequeno. Tão frágil. Passo meus dedos por seu rostinho, ele ainda está chorando. Eu nunca senti tamanha emoção antes. Ele é meu. Nasceu de mim.

— Tudo bem. – Digo beijando seus dedinhos tentando consolá-lo para que ele pare de chorar. – Eu amo tanto você. – Digo colocando seu rosto bem perto do meu. Beijo a ponta do seu nariz e, ele se cala quando deito sua cabeça em meu peito. – Está tudo bem, meu amor.

Nesse momento eu esqueci toda a dor. E tudo vale a pena agora.

Tiro a manta de sua cabeça e ele tem muito cabelo. Bastante mesmo. Uma cabeleira loira. Inspeciono cada pedacinho seu e ele é perfeito, e eu quero segurá-lo junto a mim e nunca mais largar.

Ele está dormindo agora com o rostinho sereno, sua mãozinha aperta com força meu dedo.

— Ele é lindo. – Murmura Julia ao meu lado olhando para Max de boca aberta.

— Ele é mesmo. – Digo toda boba sem conseguir tirar meus olhos dele. – Meu deus! Eu sou mãe!

— Você é mãe, e eu sou madrinha! – Diz Julia quase dando um gritinho, o que me faz rir.

E é neste momento que minha vida muda por completo...

[...]

Julia não quer largar Max. Todos estão muito bobos com ele. Meu avô então não queria sair de perto. Eu tive que implorar para que ele fosse para casa. Não é nada bom para ele dormir em uma cadeira de hospital.

— Qualquer coisa me ligue! – Ele me alerta.

— Eu ligo sim vovô. Nós vamos ficar bem. – Digo para acalmá-lo.

No momento eu não percebia por que tudo o que eu enxergava e sentia era dor, apenas a terrível dor, mas meu avô estava muito nervoso o tempo todo.

— Eu sei que vão. – Diz sorrindo. – Estou muito orgulhoso de você.

E isso era tudo o que eu precisava ouvir.

— Obrigada. – Murmuro.

— Ele é lindo Mel. – Diz Ana me abraçando. – Mal posso esperar que ele vá para casa logo, para eu poder me grudar nele.

— Ah, mas ai você vai ter que disputar comigo, e eu tenho a certeza de que ele vai preferir a mamãe. – Digo orgulhosa.

— Vamos ver. – Diz piscando.

Meu avô está segurando a mãozinha do Max, que está embalado nos braços de uma Julia babona.

— Tchau meu pequeno anjo. – Ele murmura beijando sua mão.

Meus olhos se enchem de lágrimas com essa cena.

[...]

Julia está cochilando na poltrona perto da minha cama. Max dormiu por um longo tempo e eu consegui descansar um pouco. Despertei com uns ruídos e com um choro baixinho, ele está muito agitado em meio aos lençóis. Ele está tão fofo que eu tenho vontade de apertá-lo.

— O quê foi? – Pergunto me inclinando sobre o berço para pegá-lo em meus braços.  O deito em meu colo e acendo a abajur ao lado da minha cama. – Você está com fome? – Pergunto beijando seu narizinho outra vez. O jeito como ele praticamente ataca meu nariz me diz que eu estou certa. – Acho que você está mesmo com fome. Você acabou de babar meu nariz. – Digo rindo.

Eu tive algumas aulas de como amamentar. E já é bem tarde ou bem cedo, e eu quero poder fazer isso sozinha.

Desabotoo alguns botões do meu vestido e tento acomodá-lo do melhor jeito possível em meus braços. Demoro um pouco até pegar o jeito, mas finalmente eu consigo fazê-lo agarrar o meu peito.

Ele está mesmo com fome!

— Viu – murmuro para ele – nós conseguimos. Nós dois. Juntos nós dois vamos conseguir muitas coisas.  Por que você é tudo o que eu preciso, e eu espero ser tudo o que você precisar também.  – Digo orgulhosa por ele ser tão esperto. Por ele ser tão perfeito. Por ele ser meu.

Fico admirando o pequeno anjinho em meus braços. Ele balança as mãozinhas e eu me lembro de vê-lo fazer isso durante a ultrassom. É tudo tão surreal. Tão mágico. A menos de quatro horas ele ainda estava dentro de mim. E agora ele está aqui, em meus braços. E há nove meses ele nem ao menos existia. E antes de conhecer John, antes dele chegar, eu nem ao menos pensaria que em tão pouco tempo eu seria mãe desse pequeno anjinho.

John mudou tudo...

Esse foi a melhor coisa que ele trouxe para a minha vida.

Max parece estar satisfeito. Eu o levanto para que ele não se engasgue, e pela primeira vez ele parece fazer um esforço para abrir os olhinhos. Eu ainda não os vi. Ele pisca algumas vezes por causa da luz. Mesmo sendo fraca a luz que vem do abajur parece incomodá-lo. Passa os dedinhos pelo rosto e eu fico apenas observando sentindo um amor tão grande por esse pequeno ser. Ele abre os olhos e é como um soco em meu peito. Seus olhos são verdes, e é como se eu estivesse olhando nos olhos de John outra vez. Ele pisca algumas vezes e volta a fecha-los. E nesses poucos segundos meu mundo parece ter parado de girar.

Eu choro baixinho com Max aconchegado em meu peito. Eu sei que essas foram minhas escolhas, e eu tenho que aprender a conviver com elas. Eu tenho que aprender a sempre enxergá-lo em meu filho.

Em nosso filho!

Acho que eu não sabia. Não antes de ver seu rosto. Não antes de saber o quanto ele seria parecido com ele, que seria mais difícil do que eu havia planejado, muito mais difícil do que eu achei.

E ele se parecer com ele só me faz amá-lo mais.


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