Relatos sobre você
As madrugadas insones, de olhar o teto, o celular, a janela e repetir a sequência. Os sons dos carros, os gritos na rua e as bebidas. O frio, as desculpas, a espera, as risadas e o caráter duvidoso.
O escritor é um desgraçado: escreve do que sente, do que gostaria de sentir e até do que deveria ter sentido.
Bebi do teu copo, traguei do teu trago, afoguei-me na tua história e tudo com pura consciência.
Em meio aos relatos sobre você passei a questionar e analisar a simetria dos olhos e a curvatura dos quadris. Intriguei-me com o caminhar e me vi num impasse sobre o cheiro: amadeirado ou cítrico?
Eram os pensamentos de uma hiena que com paciência e astúcia aguarda... Simplesmente aguarda.
A nocividade de tais relatos é evidente como uma placa de neon que lhe alerta do perigo. Ela esfrega na sua cara, aponta e até ri sadicamente; "Vai lá velha louca! Nem toda a piscina de sujeira é suficiente hum?"
E essa merda toda nada tem a ver com melodramas sentimentais! Tem mais a ver com quantas doses se é capaz de beber sem cair. O quanto se consegue encarar, o quanto se consegue ouvir e ver.
Penso que mereço tudo isso! É algo como uma punição divina por tudo que ja alimentei levianamente.
No meio dos relatos sobre você ouvi músicas, "andei pelo vale das sombras", acordei com dores de cabeça e falei o que não deveria ser dito.
Da lisura de um leão com feições de cervo as confidências ao pé do ouvido. Daquilo que não precisa ser repido. Eu sei, você sabe.
Ao fim de mais uma madrugada me pergunto: são relatos sobre você ou sobre mim? E deixo que uma nova dose responda.

–in crônicas de uma velha louca