Eu estava terminando de me arrumar para a festa de Natal daquela noite, me olhando no espelho, tentando não encontrar a ponta que descobriria todo aquele sonho e me faria acordar em minha cama...

Fazia mais de um mês que a minha vida tinha dado uma louca guinada na monotonia a que eu tinha me acostumado... Eu não me cansava de me lembrar de um sonho... Um sonho que não tinha sido meu, mas que me enchera os olhos de lágrimas da primeira vez que o escutara... Um sonho da Ana... Em que ela falava com um anjo... E o anjo dizia que a vida dela ia mudar como uma onda numa calmaria... Era o sonho dela, mas eu sentia exatamente aquela sensação... A do fim da calmaria... Do começo da vida nova...

Eu não tinha noção do que poderia me acontecer quando eu subi no avião que me levaria para Nova York, pro primeiro show do the GazettE que eu assistiria na minha vida... Não tinha noção do que me aconteceria nem quando subi no jatinho particular da banda pra voar pro Japão...

- Onde é que você está, posso saber? – escutei uma voz deliciosa ao pé do meu ouvido, minha cintura sendo envolta por braços fortes que faziam meu coração bater acelerado e toda a minha pele se arrepiar.

- Bem aqui – respondi, ignorando o real significado de sua pergunta e olhando o reflexo de Kouyou pelo espelho, abraçado a mim. – Encarando o melhor que eu posso fazer com as sua namorada pra torná-la apresentável... – pude vê-lo revirar os olhos e me apertar mais em seus braços.

- Você é uma boba... Já lhe disse isso hoje?

- Acho que hoje ainda não me disse, não... – eu gargalhei.

- Você está linda, Ny! – senti um beijo delicioso em meu pescoço. – Adoro essa cor na sua pele, sabia disso? – ele suspirou, tornando a me encarar pelo espelho.

Eu estava usando um vestido longo até os joelhos, de mangas compridas, numa tonalidade vinho sangue.

- Desde aquela noite em que saímos pra dançar... – ele sussurrou em meu ouvido e eu fechei os olhos.

- Preciso estar apresentável e decente, não é? – tentei mudar o rumo da conversa antes que eu perdesse o controle.

- Está com medo? – ele deu risada.

- Medo? Não... Não... Pavor! – brinquei.

- Desse jeito, parece que minha família é uma família de vampiros, Sereny! – ele ralhou, mas não estava bravo de verdade.

- Não teria mais medo deles por serem vampiros, se estiver me dizendo que são... O medo continuaria o mesmo: são sua família!

- E alguém tão monstruoso como eu só pode ter saído de uma família medonha! Pavorosa! – ele gargalhou alto.

- Sabe que eu já perco pontos por ser ocidental! Sua mãe provavelmente sonhava em vê-lo com uma linda moça japonesa de boa família!

- Acho que minha mãe parou de fazer planos pra mim quando me viu de cintas-ligas, Ny... Talvez, até antes... – revirei os olhos. – Eles vão adorá-la! Eu tenho certeza!

Eu sorri e me virei em seus braços, abraçando-lhe com carinho.

- Está com saudades de casa? – ele me perguntou, preocupado. – Queria estar passando o Natal no Brasil?

- Natal em casa... – repeti. – Não sei do que sinto mais falta... O calor sufocante ou meus pais discutindo pra tornar a noite mais agradável... – brinquei, amargurada.

- E o Ano Novo? Sem entusiasmo pra voltar também?

- Minha mãe faz aniversário no Ano Novo... Já seremos cruelmente punidos por não voltar pro Natal... Não sei o que ela faria se passássemos o Ano Novo aqui também... – brinquei.

- Entendo... Entendo... – ele gargalhou. – Está pronta? – Kouyou me girou e eu ri.

- Pronta! Já vamos?

- Eu tenho uma coisa pra você antes... – seu sorriso lindo iluminou o quarto.

- Vou ganhar meu presente antes?

- Um deles...

- Um?

- É! O outro já está embaixo da árvore do otou e da okaa, prontinho pra ser aberto à meia noite, durante a festa! E fontes confiáveis me disseram que você vai adorá-lo!

- Fontes confiáveis, é? – eu ri, imaginando a cena de Kouyou pergunta à Carolina e Marcelo sobre o presente que me comprara. – E esse de agora? – perguntei curiosa.

- Bom... É que é o primeiro presente de Natal que eu vou te dar e queria que fosse especial, sabe? Fossemos só nós dois!

- Ah, Kouyou!

Ele soltou minha cintura e foi até seu armário, de onde tirou um embrulho grande em um saco vermelho, com um laço dourado.

- Feliz Natal, Ny!

Peguei o embrulho e era macio o que havia dentro. Olhei intrigada para o guitarrista, que deu risada e me incentivou a abri-lo. Dentro, eu encontrei um dragãozinho de pelúcia do Banguela de “Como treinar o seu Dragão”.

- Que lindo, Kou! Que lindo! – apertei Banguela com os braços, como uma criança.

- Gostou? – ele sorriu lindamente.

- Eu amei! – respondi empolgada.

- Não queria que fosse um presente comum, sabe? Um daqueles presentes de namorados... Uma joia, flores ou chocolates... Queria alguma coisa com personalidade... Com a nossa personalidade... Alguma coisa que fosse... Única!

- E você acertou em cheio, Kouyou! Não poderia ter acertado mais! Você sempre me lembrou um pouco o Banguela – eu ri. – Meio esquivo, solitário, mal humorado e extremamente fofo e apaixonante! – passei meus braços por seu pescoço, ainda segurando o dragãozinho de pelúcia e ele fez o mesmo em minha cintura, rindo. – Arigato gozaimashita!

- Doitashimashite, tenshi! – seus lábios encontraram os meus num beijo que fez com que meu ar sumisse rápido demais de meus pulmões, mais rápido do que eu gostaria...

Olhei fundo em seus olhos de mel e aquela cor de bronze dourado derretido aqueceu meu coração como da primeira vez que ele me olhara... E o que eu encontrei dentro daqueles orbes me fez entender que eu ainda não descobrira quão grande era a mudança que Kouyou seria em minha vida e em mim mesma... Que ele me ajudaria a criar uma nova tradição de Natal!