Fazia uma manhã ensolarada em Nova Jersey e faltava menos de 1 minuto para o fim da aula de Inglês mais chata do ano.A professora, Srta.Rudolph, olhava atentamente para turma, sentada atrás de sua mesa esperando o sinal tocar, enquanto eu tentava pensar em qualquer coisa que não fosse a possibilidade de algo dar muito errado.

- Bom, a aula acabou pessoal.Tenham um bom verão!! - disse a Srta.Rudolph para turma no momento em que o sinal tocou, enquanto todo mundo dava o fora o mais rápido possível.

Aquilo era patético!!Estávamos num orfanato, é claro que ninguém ali teria um bom verão.Mas ninguém ligou para isso, principalmente os garotos, que pararam para observar a professora uma última vez, extasiados.Todas as criaturas do sexo masculino que viviam no Orfanato Russel babavam por aquela mulher, enquanto as meninas morriam de raiva, sem entender o que ela tinha de tão interessante.Nem mesmo o Diretor Johnson, um cara sério e justo, parecia ver o que ela realmente era.Já estava com a mochila nas costas, quase saindo da sala de aula deserta quando a Srta.Rudolph me chamou: 

- Posso dar um palavrinha com você, Srta.White? - ela disse em um tom doce, mas seus olhos faiscavam. 

Congelei.Eu não queria ficar sozinha com aquela mulher.Tinha a horrível sensação de que ela ia fazer algo bem ruim.Sem falar que ela emanava uma aura horrível e muito antiga.E também porque ela era um monstro.Literalmente.Para começar, ela parecia uma vampira: pele super branca, olhos vermelhos e presas afiadas.Mas suas pernas eram esquisitas.A da esquerda parecia com a perna de um burro e da direita era humana, só que feita de bronze.Uma empousa, saída diretamente dos livros de Mitologia Grega.

Não, eu não uso drogas.

No exato instante em que ela ia fechando a porta, sem esperar pela minha resposta, ouviu-se um estrondo e um gás incolor tomou conta do corredor.

- Mas que diab...? - disse a Srta.Rudolph ao colocar a cabeça pelo lado de fora da sala enquanto eu pulava a janela correndo o mais rápido que podia, o que não era pouca coisa.Era a melhor corredora daquele lugar, ninguém conseguia me alcançar nas provas de Atletismo.

A armadilha que eu tinha montado um pouco antes da primeira aula da manhã tinha dado certo.Quem quer que tenha parado para beber uma água no bebedouro devia estar se acabando de rir junto com todos que estivessem no corredor na hora.Nada como um pouco de gás hilariante para fazer as pessoas felizes.

Eu tinha conseguido sobreviver ao último dia de aula, ocasião em que eu imaginava que ela iria tentar me atacar depois de um ano de olhares homicidas e tentativas de me humilhar publicamente. Agora o próximo desafio era sobreviver ao verão, já que o diretor já tinha nos avisado que os passeios voltariam com força total, depois de quase 5 verões de atividades dentro da propriedade.E como sempre acontecia quando eu saía do orfanato, eu encontrava monstros e pensava seriamente em consultar um psiquiatra.Mas provavelmente eu seria internada em um hospício, e entre ficar presa em uma camisa de força e ficar por aqui mesmo tentando dar um jeito nos valentões eu prefiria o último.

Afinal, quando é que alguma coisa boa iria acontecer na minha vida?Eu vejo monstros horríveis desde pequena, sofro de dislexia e TDAH, sou orfã de mãe desde os 12 anos, nunca conheci o meu pai e pra completar, eu sou uma ladra.É, é isso aí mesmo, adoro surrupiar coisas dos bolsos de pessoas desavisadas.Infelizmente, todos sabiam dessa minha habilidade, então eu não tinhas amigos.Ninguém queria ficar perto o suficiente para me dar a chance de roubar algo.Não que eu me importasse realmente.Seria muito difícil disfarçar o meu pânico ao ver ou sentir algum monstro com alguém do meu lado.

Continuei a correr em direção ao jardim que ficava ali perto, mas quando eu cheguei, Matt e o seu bando estavam atormentando um garotinho de 8 anos.Controlei o impulso de ir lá e acabar com aquilo e resolvi voltar ao prédio de onde eu tinha acabado de sair, totalmente esquecida do que tinha acontecido.

Quando eu entrei no corredor principal, pensei que estivesse num hospício. Alunos, inspetores e até alguns professores riam sem parar, por motivos bestas.

- HAHAHAHA, olha só, sua blusa é verde!!Verde é uma cor tão engraçada, HAHAHAHAA - disse uma garota do 5º ano para mim, enquanto se dobrava ao meio e caia no chão, mal se aguentando em pé de tanto rir.Já ia me abaixar para ajudar a garota a se levantar, me controlando para não rir também, quando uma mão agarrou o meu braço direito com força. Me virei e tomei um susto ao ver o inspetor Miles com uma expressão satisfeita no rosto

- Venha comigo White. A Professora Ruldoph quer falar com você 

- Ei, me SOLTA!!Sabia que eu posso denunciar você por truculência?

- Sem provas, sem crime garota. Agora vamos. 

Ele segurava o meu braço com tanta força que eu tinha certeza de que iria ficar marcas, o que poderia ser usado como prova, mas fiquei quieta.O inspetor Miles era um cara alto, musculoso e muito forte, então era praticamente impossível me livrar do seu aperto.Me deixei arrastar pelo corredor até chegar à sala de aula de onde eu tinha fugido 10 minutos antes.Ele abriu a porta com violência, me jogou lá dentro e se dirigiu à criatura parada de costas para a porta:

- Aqui está ela professora!Deseja mais alguma coisa?

- Não inspetor, muito obrigada.Pode se retirar

Ouvi a porta batendo atrás de mim e eu começei a entrar em pânico

- Então, Katie White. Imagino que você já saiba porque eu te chamei aqui? - ela disse em um tom perigoso enquanto se voltava para mim

- Não professora.Não faço a mínima idéia. - na verdade eu tinha uma vaga idéia, mas me resusava a pensar naquilo - Qual é o problema?

- O problema aqui é que você não deveria estar viva, semideusa.

Eu pisquei com força

- Do que é que você me chamou?? - o.k., eu definitivamente deveria ir correndo ao psiquiatra. 

- Semideusa, meio-sangue.Mas normalmente jovens como você são conhecidos como heróis. - e ao dizer essa última palavra seus olhos brilharam de ódio.

PARA TUDO!!

Ela estava dizendo que eu era uma semideusa.Aquilo era surreal.Todos os mitos gregos que minha mãe me contava antes de dormir estavam invadindo a minha realidade de uma maneira assustadora.Não podia ser real, mas algo me dizia que sim.

- Então, acho que está mais do que na hora de acabar logo com isso.

Dei um passo para trás e tateei às minhas costas, procurando pela maçaneta da porta mas era tarde demais.

Suas presas cresceram e ela se preparou para atacar.