Contraposição escrita por Blue Butterfly


Capítulo 23
Capítulo XXIII




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/644989/chapter/23

'Mãe.' Jane murmurou, sentindo o corpo quase paralisado de vergonha. Graças a Deus ela tinha trancado a porta ou de outro modo as chances da mulher mais velha pegar ela e Maura no ato teriam sido alarmantes.

'Você parece pálida, Jane!' A mulher disse ao estudá-la, segurando seus braços de modo maternal.

Pálida. Com razão. Ela não estava irritada com a mais velha pelo simples fato de que ela tinha sido a pessoa a pedir para que a mãe voltasse para casa. Entretanto, ela não sabia que Angela agiria tão rapidamente. A detetive forçou um sorriso e piscou os olhos para se livrar dos pensamentos.

'Ei, mãe. Como você tá?'
Pergunta desnecessária. O rosto de Angela estampava a mais pura alegria - Jane só precisava saber o motivo à desencadeá-la.

'Oh! Eu não aguentava mais ficar na casa de Abelia! Ela não tem muitos bons costumes.'

Jane levantou uma sobrancelha, cética. Seria isso mesmo ou o nível de exigências de sua mãe tinha aumentado inconscientemente depois de anos morando ao lado de Maura?

'É mesmo?' Ela devolveu sem dar muita bola, contornando a mesa da cozinha e se servindo de um copo de água.

'Sim. É mesmo.' Angela retrucou irritada com o pouco caso da filha. 'Onde está Maura, por falar nisso?'

Boa pergunta, Jane pensou consigo mesma, lamentando o fato de não estar junto à ela.

'Banho.' Ela murmurou com amargura a resposta dissilaba.

Contente o suficiente com a resposta, Angela embarcou em outro tipo de interrogatório. Como tinha sido os dias afastadas de Boston? Relutante e tomando cuidado com cada palavra, Jane contou ligeiramente sobre cada dia passado lá. As noites assombradas por pesadelos de Maura. As corujas, Marley. E Amanda. Alguns minutos foram separados para cpntar sobre a amizade que tinham construído com a morena. A lembrança colocou um sorriso no rosto de Jane e até mesmo uma gargalhada se manifestou quando Jane narrou sobre Marley e Amanda sendo perseguidos pelos patos.

'A princípio nós ficamos preocupadas, porque ela trabalha para uma revista e tudo mais... Mas ela foi ganhando nossa confiança. Ela é uma boa pessoa.' Jane deu de ombros e sorriu timidamente. Ela já sentia falta da amiga.

'Oh, Jane! Eu fico feliz que vocês tiveram bons momentos lá. Fiquei preocupada, achando que vocês fossem se recolher em melancolia ou algo do tipo. Não me olha com essa cara. Você sabe muito bem que isso já aconteceu com vocês duas!' Angela apontou um dedo pra ela mas resolveu deixar para lá. Era um outro assunto delicado que nenhuma delas precisava trazer a tona agora.

Jane virou-se de costas, mais para ignorar o comentário da mãe, e praticamente jogou o copo dentro da pia, causando um estrondo ao batê-lo na beirada de mármore. Ops.
'Jane, eu estava falando sério quando disse que terminaria...'

'Maura, olha quem tá aqui!' Jane cortou-a imediatamente, apontando fervorosamente um dedo para Angela. Por misericórdia a loira pareceu notar a presença da mulher por si só. Ela vestia apenas uma calcinha e um moletom que lhe caia até os joelhos. Espera, aquela blusa era de Jane?

Surpresa com a presença da mais velha, Maura parou de andar e sentiu as bochechas corarem.

'Oh... Olá, Angela.' Ela esfregou as mãos na roupa, o gesto que entregava o nervosismo.

'Maura!' Angela exclamou, aparentemente não ciente do desconforto da loira. 'Você tá mais magra?' Ela disse ao abraçar a loira e segurá-la por um tempo.

'Eu creio que não.' Maura riu levemente e devolveu o abraço. E de repente sentiu uma imensa vontade de chorar. Angela sempre fora uma substituta para sua mãe, e o carinho e conforto maternal que emanava da mulher a deixava tão vulnerável a ponto de se sentir uma criança protegida em seus braços. 'Eu senti tua falta.' Ela murmurou e a voz carregada não passou despercebida

'Oh querida, eu senti sua falta também.' Angela a abraçou com mais firmeza, correndo as mãos em suas costas.

Um pouco mais e as lágrimas que ela se recusava a derrubar escapariam de seus olhos.

'Ok. Ok. Já é o suficiente. Maura não precisa ser esmagada logo agora, mãe.' A morena resmungou, mais pelo fato de de querer distrair Maura.

Angela repreendeu Jane com um estalar de língua. 'Você me diga agora se minha filha tomou conta de você como ela deveria, Maura! Se não tomou, nós vamos ter uma conversa muito séria.' E apesar de parecer irritada, o que Angela tinha feito era apenas ter entrado na pequena provocação de Jane. Motivo o qual agora a loira ria levemente.
'Nós cuidamos bem uma da outra, Angela.' Sorriso tímido.

Jane piscou os olhos para ela, e aquele segredo que tinham foi carregado apenas por um olhar. Um sorriso agora de cumplicidade.

'É o que eu espero de vocês. Agora... vocês não tem planos para o jantar, tem?' Os olhos da mais velha brilharam em expectativa.

'Nós, ahn...' Jane murmurou e lançou um olhar para Maura. Uma pequena ajuda?

'Não temos nada em mente.' Ela disse e acrescentou um sorriso, no mesmo instante que Jane jogava as mãos ao lado do corpo. Aquela era a vingança dela por ter sido abandonada mais cedo na banheira?

'Ótimo. Vou fazer uma lista do que preciso para hoje a noite e Jane pode passar no mercado e -'

' Não. A Jane não pode passar no mercado porque ela tem que voltar pra delegacia.' A morena concluiu no mesmo tom de voz, referindo-se a si mesma na terceira pessoa apenas por provocação.

'Ora! Eu preciso ver meu neto!' Angela argumentou.

' Se você quer cozinhar, compre o que precisa por si mesma.' Jane rebateu.

'Eu não sabia que você precisava voltar para a delegacia.' Maura murmurou para Jane, o cara de cão abandonado acompanhando a fala.

'São só por alguns minutos, querida.' E lá estava a voz calma e suave que Jane só usava com Maura.

Angela arqueou às sobrancelhas.

'Você não pode fazer isso depois?' A morena insistiu com a mãe.

'Há quanto tempo não vejo TJ! Tenho certeza de que Maura ficará bem por alguns minutos sozinha. Certo, Maura?'

Maura virou o rosto para Jane, e se antes ela tinha achado uma coincidência Angela ter aparecido tão cedo, agora ela entendia o por quê.

'Sim, eu vou.' E embora a resposta tenha sido dirigida à mais velha, era à Jane que ela lançava um olhar fatal.

'Ótimo. Vejo vocês mais tarde, então.' Ela disse contente e com um balançar de mão se despediu das duas.

' Eu não acredito que você pediu para sua mãe... Jane! Eu não tenho mais quatro anos de idade! E eu não - eu não me importo de ficar sozinha por um tempo!' Ela exclamou, indignada.

Jane se remexeu sobre os pés e suspirou. 'Eu... Na verdade eu pedi porque... foi por mim também. Porque... Porque fico mais tranquila sabendo que você está com ela e não sozinha. Eu sei que você é independente e tudo mais.' Boa saída, Rizzoli.

Os olhos de Maura já não estavam tão estreitos e ela não parecia mais assustadora. Um sorriso - um tanto sarcástico?
'Eu vou ficar bem sozinha.'

E foi o que ela continuou repetindo para si mesma depois que Jane deixou a casa. São só alguns minutos. Nada pode acontecer nesse tempo. Certo? Ela lambeu os lábios e, aflita, segurou no encosto da cadeira e fechou os olhos. Ela sempre achara aquela casa grande demais. Fria demais. E agora essas impressões só se intensificavam. O medo de estar sozinha nunca tinha se manifestado antes. Ela se acostumara tão bem com a solidão que o silêncio costumava ser seu melhor amigo. Mas não agora. Agora ele destacava detalhes que ela não queria notar. O som da madeira estalando vez ou outra. Havia alguém no andar de cima ou eram só os átomos se dispensando por causa do ar quente da casa? Ela escutou melhor. Não poderia ser passos. Eram irregulares demais. Ela tentou se mover, quase convencida de que tudo estava bem. Quase. Era essa incerteza que a consumia. A hesitação. O medo correndo discretamente pela camada mais rasa da pele. Os pulmões queimaram com a falta de oxigênio e ela respirou fundo. Seria assim de agora em diante? Eu vou ficar bem sozinha. Ela repetiu para si mesma, com um mantra. Milhões de vezes.

E desapontada, quando nada pareceu mudar dentro de si - nenhum sinal de que ela se livraria do medo - ela bufou irritada e lágrimas queimaram seus olhos mais uma vez. Por que sua vida tinha que ser tão difícil assim?


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!