Você aceita ser meu único amigo? escrita por snow Steps


Capítulo 7
Elemento-chave


Notas iniciais do capítulo

Sei que demorei muito para postar, mas por favor me perdoem T.T
Passei por maus bocados, termino de namoro e por aí vai....
Mas espero que ainda não tenham me abandonado :)



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Caio, o veterano mais bonito e também o mais arrogante, está com um apito fincado entre os dentes, e encara desdenhosamente a fileira de jovens cristãos que suam debaixo do sol escaldante. Ele para diante de nós com as pernas espaçadas, respira fundo apenas para que o seu peitoral malhado se sobressaia na fina blusa de malha e cospe:

— ESTÃO PRONTOS PARA SOFRER, SOLDADOS?

Ai Deus, por que você não resiste em dar asas à certas cobras?

— SIM! – Responde em uníssono o grupo brama, constituído pelos caras altos e fortões e pelas garotas robustas e flexíveis.

Em seguida é possível ouvir o “sim” desinteressado e desarmônico das minorias que, na verdade, são 90% da população do retiro. Nicholas solta um “não” bastante demorado e debochado, que me faz rir.

De repente, Caio lança um olhar furioso em direção a nós e posso ver o pingo de cuspe reluzir ao sol quando ele diz:

— Posso saber qual é a graça?

Agora todos estão me encarando de novo. E hoje ainda é apenas o segundo dia.

— Sou eu – Responde orgulhosamente Nick, com um sorriso indecente. Ao mesmo tempo em que fico aliviada pelos holofotes saírem da minha mira, o pânico me invade pela audácia que o Nicholas está cometendo.

Ninguém enfrenta o Caio, ninguém. É uma lei que todos seguem desde a sétima edição do retiro, quando um garoto – que nunca mais apareceu por aqui de tão traumatizado – resolveu “roubar de brincadeira” o Danoninho de sobremesa do Caio. O que esse pobre e infeliz garoto não sabia era que:

1 – Danoninho aqui dentro é mais valioso do que Nutella lá fora.

2 – Danoninho também é moeda de troca para conseguir uns favores maneiros.

3 – Caio estava guardando seu Danoninho para usar o celular do Nathan – o único que tinha sinal ali dentro anos atrás – para enviar uns torpedos para a sua gata.

Bem, o desfecho não foi agradável. O Caio até deu uma segunda chance, falando que caso ele conseguisse um outro Danoninho dentro de 24 horas, tudo seria perdoado. No entanto, o garoto quis bancar o rei do pedaço e respondeu que não devia nada a ninguém. E foi assim que o beliche dele “acidentalmente” desmontou no meio da madrugada – observando que sua cama era a de cima e ocasionalmente o parceiro da cama de baixo saiu para beber água na hora do ocorrido – e resultou numa fratura de perna que o deixou manco para o resto da vida.

Caio não assusta porque sabe brigar e mandar em todo mundo. Essas são as atitudes mais previsíveis no tipo de cara como ele. O que realmente assusta no Caio é que ele nunca paga na mesma moeda, tornando-o completamente imprevisível.

— Só me faltava essa... mais um querendo bancar o engraçadinho — Desdenha Caio, com sangue nos olhos.

— Espera um pouco capitão, não quero bancar nada. Eu sou engraçadinho. Não vê como todas as garotas me acham um fofo? Quer dizer, eu não posso ver – Ele suspira de um jeito inconsolável – Mas o essencial é invisível aos olhos. Algo do tipo.

O que diabos Nick está falando? Penso, sentindo a minha pele amarelar.

— Só porque você é diferente não significa que está imune a mim. – Retorque Caio de um jeito calmo, porém ameaçador.

— Você me chamou de diferente? Cruzes, eu pensei que estivéssemos num retiro de igreja! Vocês não deveriam seguir os dez mandamentos? Aposto que em algum lugar deve dizer para não chamar o coleguinha de diferente...

— Vocês dois, já chega! – Interrompe Rebeca, caminhando para perto de Caio. – Nicholas está certo. Não existe nada de diferente nele, somos todos filhos de Deus perante aos olhos Dele.

— Isso aí! – Concorda Nicholas, provocando uma expressão aborrecida em Rebeca de quem diz “não abusa”.

— Certo – Rosna Caio num tom baixo, encarando Nick de soslaio. Ele entrega o apito para Rebeca e dá meia-volta, retrucando um “se vira”.

Rebeca retesa os ombros e abre um sorriso acolhedor, ignorando a situação anterior que quebrou o clima de harmonia – quer dizer, o clima “dissimulado” de harmonia. Ela começa a explicar as etapas da primeira prova, mas a única coisa que eu consigo pensar é em como Nick está ferrado, e então resolvo avisá-lo:

— Nick, você está ferrado.

— Quem disse?

— Eu.

— Eu quem?

— Liora, droga.

— Ah, você ainda está aqui? Pensei que tivesse aproveitado a oportunidade para fugir de mim.

— E por que eu faria isso? – Pergunto, indignada.

— Sei lá, você gosta de deixar cegos falando sozinho.

— Ah, é verdade.

— Mas de que forma eu poderia ficar mais ferrado do que já sou?

— Sendo inimigo do Caio. E como ele mesmo disse, sua cegueira não irá livrá-lo das vinganças dele.

— Jesus Cristo. Eu pensei que aqui fosse um lugar de gente do bem. Estou aqui há dois dias e já fui ignorado, torturado com balde de água fria e ameaçado. Acho que é hora de voltar para casa.

— Você não pode voltar para casa.

— Claro que posso. Basta ligar para a minha mãe e ela vem aqui correndo com as próprias pernas se for necessário.

— Mas... você não pode ir.

— Me dê um bom motivo para ficar, então.

— Hmm... eu tenho tanta narração de imagem legal para descrever a você ainda.

Nicholas dá um meio sorriso convencido, e isso me mata por dentro. É sério que eu pedi para ele ficar? Deveria ter dito, “é, vai mesmo, diferentão. Vivi 15 anos sem você e cinco dias a mais sem a sua companhia não farão a menor importância”.

— Então eu fico por uma condição.

— Qual?

— Você precisará ganhar essa primeira etapa.

— Oi?

— Sim, ganhar essa competição de hoje. Vamos lá Liora, pelas sombras que eu vejo dá para notar que você tem pernas de Usain Bolt e silhueta de Daiane dos Santos.

Solto uma gargalhada incontida.

— Acho melhor você já ir ligando para sua mãe, então.

— Nãão. Não quero desistir assim tão fácil.

E ele atravessa seu braço nos meus ombros, o que me dá uma sensação terrivelmente boa de derretimento interno.

A primeira etapa é a clássica prova de atletismo com bastão. O coleguinha corre até uma demarcação e entrega o bastão para outro coleguinha, e assim sucessivamente até a linha de chegada, o que leva a conclusão de que não depende apenas de mim para que Nick permaneça – depende também dos outros indivíduos do grupo pária, como Nelson (o magrelo míope), Tatiana (pernas muito curtas), Hélio (pernas muito longas) e Lorena (gótica demais para correr com vontade).

Nos enfileiramos em direção ao campo de corrida que está delimitado por faixas amarelas, enquanto o sol queima forte nossa pele e faz nossas roupas grudarem nos corpos suados. Dou uma espiada no grupo brama, que se reúne numa roda fechada e discute em tom alto. O grupo xátria faz o mesmo, no entanto perde mais tempo lançando olhares maldosos para o grupo brama do que planejando algo concretamente. E nós, os párias... lamentamos.

— Não quero correr nessa merda de sol dos infernos – Resmunga Lorena, cujo delineador está borrado pelo suor.

— A gente não tem chance mesmo! – Entrega Tatiana.

— E por que não? Nós temos o Hélio: com apenas três passos ele alcança a linha de chegada... – Brinca Nelson, nervoso.

— Em compensação preciso de três mil passos – Contrapõe Tatiana, revirando os olhos.

Hélio é tímido. Se o vi falando uma frase completa alguma vez não recordo.

— Vocês não precisam de pernas grandes para ganhar. Vocês precisam é de visão. – Nicholas adentra ao assunto, rindo de si mesmo. – Aiai, eu mesmo me sacaneio ... enfim, precisamos abrir nossos horizontes. Se o caminho convencional não dará certo, precisamos correr atrás dos caminhos alternativos. Literalmente. Nossa, estou demais hoje.

— O que quer dizer? – Interrogo, franzindo o cenho.

— Obrigado pela pergunta introdutória, Liora. Mesmo não vendo, vejo que ninguém aqui é um atleta olímpico. Então é o seguinte: vamos trapacear. É a única forma de ganharmos.

— M-mas... isso é contra as regras – Balbucia Tatiana.

— Não me diga! – Ironiza Nick, formulando uma expressão surpresa. – Calma, lindinha. Não estou falando de implantar uma bomba nos bastões dos adversários ou desamarrar os cadarços deles. Estamos tratando de trapaça limpa.

— Há, essa eu quero ouvir. – Desdenha Lorena.

— O seguinte, vocês competirão normalmente. Apenas corram, seja como o papa-léguas, seja como o Forrest Gump. O elemento-chave será exclusivamente da minha conta.


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