Proud escrita por Nymeros Martell


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Relendo os livros, uma das coisas que mais me incomodaram foi a falta que Dimitri fez durante a cerimônia de formatura da Rose. Ele lapidou uma pedra bruta. Não deixá-lo presenciar esse acontecimento foi muito cruel pela parte da Richelle. Enfim, baseado nisso, eu escrevi essa one. Espero que gostem, eu gostei bastante de escrevê-la. Poderia escrever mais 5000 palavras sobre esse dia e não seria suficiente pra explicar o quão perfeito seria tê-lo ali naquele momento. ♥Sem mais enrolações, boa leitura.



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A luz alaranjada do Sol poente passando pelas cortinas e indo até a sua cama enquanto você dorme soa como um insulto à maioria dos ouvidos. Pra mim, eles eram como pequenos milagres.

Quando se é um Strigoi, o Sol torna-se um dos seus maiores inimigos. Não faz realmente falta, uma vez que não há nada além da cobiça por poder e a sede insaciável de sangue. Ele não lhe parece mais genuinamente reconfortante, mas, sim, algo que vai fazê-lo se transformar em pó.

Era algo que eu achei que nunca mais seria capaz de sentir, mas ali estava. O calor reconfortante em meu braço.

Minha vida tornara-se uma sucessão de pequenos milagres há pouco mais de dois meses, quando uma usuária de Espírito chamada Oksana restaurou a minha alma e, acredite em mim, é tão estranho para você quanto é pra mim. Depois de ter sido despertado, minha aluna – com quem eu tinha um envolvimento romântico secreto – deixou a academia com a missão de me matar.

Em sua caçada, ela conheceu Oksana, que acreditava piamente que havia uma forma de trazer um Strigoi a seu estado original. Isso, no entanto, é algo que tem nos sido dito impossível desde sempre. Rose deixou Oksana para trás e seguiu sua busca, embora a ideia esmagasse seu coração.

Ao me encontrar, no entanto, a situação mudou. Eu fiz a ela coisas horríveis e mantê-la cativa foi apenas o começo de uma sucessão de atrocidades. Quando ela fugiu, entrou em contato com a Moroi. Juntos, Rose, Oksana e seu parceiro de laço, Mark, dominaram-me e estacaram-me.

Desde então, minha vida mudou. Nas primeiras duas semanas, eu não suportava estar no mesmo ambiente que Rose, olhar nos olhos dela e lembrar o quanto eu desejei matá-la. Eu não conseguia lidar com a culpa, com o sangue em minhas mãos, não conseguia esquecer os gritos das vítimas que fiz. Com o tempo passando e as autoridades, pouco a pouco, se convencendo de que eu realmente deixara de ser um Strigoi, eu passei a aceitar que, se havia alguma forma de me perdoar, seria estando ao lado dela, da mulher que eu mais amei.

Nem tudo voltou aos eixos, no entanto. Minha posição na Academia não foi reavida, assim como meu título de guardião. Eu ainda era uma espécie rara e estava constantemente envolvido em testes, exames e tendo que lidar com todo tipo de burocracia.

Mas deitado ali, naquela cama de hotel, com o Sol aquecendo o meu corpo e um bilhete da minha Roza nas mãos, eu sentia que não precisaria de mais nada.

Eu havia sido liberado da constante vigilância da Corte, mas não havia então para onde voltar, uma vez que eu não mais fazia parte dos guardiões da Academia e nem sabia se receberia outra designação na vida. Não podia voltar para a casa da minha família por causa dos testes e porque a ideia de deixá-la era incogitável.

Depois de alguma pesquisa, eu encontrei um hotel que ficava há cerca de uma hora e meia da Academia, o que era quase tão milagroso quanto sentir os raios do sol, uma vez que a instituição foi construída o mais distante possível da sociedade humana. Não era a definição de luxo e, no entanto, soava como o melhor lugar para se estar.

Antes que eu pudesse me perder novamente em pensamentos, levantei e fui direto para o banho. A calça preta e a camisa branca que vesti eram partes do meu uniforme oficial de guardião – certos hábitos nunca morrem - mas não me importei com a jaqueta preta e vesti um sobretudo. O tempo de Montana estava começando a esquentar naquela época do ano, mas nossas noites ainda eram agitadas pelo vento gelado.

Sem demora, peguei as chaves da S.U.V. alugada e parti em direção a Academia. Aquele era o dia em que Rose faria o seu teste para guardiã e mesmo não sendo mais seu mentor, eu jamais perderia a chance de vê-la pondo o ginásio abaixo.

O Sol já havia se posto quando eu cheguei ao enorme complexo estudantil. Eu tinha uma folga de uma hora e meia antes que os testes começassem e o saudosismo me invadiu por completo assim que pus meus pés na escola. Decidi rever alguns conhecidos antes de ir para a arquibancada.

Chequei a sala de Alberta e a sala de reuniões dos guardiões, mas estavam ambas vazias. Eu esperava que houvesse ao menos alguém guardando aquela parte do complexo, mas, pelo visto, as defesas da escola foram gravemente abaladas no ataque. Aquele maldito ataque...

– Belikov? É você? – uma voz conhecida soou atrás de mim.

– Em carne e osso e alma. O bom filho a casa torna. – Eu respondi, tentando conter um sorriso, mas como era bom estar de volta, mesmo que como visitante.

– Ah, Belikov, eu estou tão contente em vê-lo – disse Alberta. Sua posição de guardiã nunca falhava, mas havia em seu olhar uma afeição intensa. – Eu soube das notícias, mas não pude comparecer a nenhuma das audiências. Venha – ela exclamou, gesticulando com a cabeça – venha comigo. Estou indo para o ginásio. Imagino que está aqui para acompanhar o teste de Rosemarie.

– Eu não poderia perder. Obrigada, a propósito. Por terminar sua mentoria.

– Você sabe, Belikov, pouco havia que eu pudesse acrescentar. Pouco há nesse teste, também, se ela sobreviveu ao que sobreviveu nesses últimos meses. O verdadeiro teste dela aconteceu fora desses portões. – Disse ela, enquanto caminhava com a eficiência de um guardião.

Eu entendi a profundidade de suas palavras assim que saíram de sua boca. Eu havia feito muito por ela, mas quase a destruí no processo. Foi por mim que ela deixou a Academia e foi sozinha à Rússia. Foi por mim que ela teve que enfrentar inúmeros Strigois e foi pelas minhas mãos que ela sofreu. Certamente Alberta não sabia sobre essa última parte, mas a culpa me atingiu como um punho fechado.

Não havia nada a acrescentar naquele momento, então acatei suas palavras silenciosamente e caminhei ao seu lado até chegarmos ao ginásio, que já estava cheio de convidados ansiosos pelos testes. Assim que me despedi de Alberta, senti uma mão tocar meu ombro, impedindo-me de subir as escadas e tomar o meu lugar na arquibancada.

– Diga-me, Belikov, que não está indo se sentar antes de falar com a minha filha.

Zmey. Eu reconheceria aquela voz ameaçadora em qualquer lugar que estivesse.

– Sr. Mazur. É sempre um prazer revê-lo. – Eu disse, tentando manter o tom cortês.

– Não minta para mim, Dimitri. Eu sou geralmente o pesadelo das pessoas. Não há prazer em encontrar com a serpente. – Ele disse, citando justamente a tradução para o seu apelido russo e dando um daqueles sorrisos que escondiam a sua verdadeira intenção.

Ibrahim Mazur era um dos Morois mais poderosos e traiçoeiros que eu já havia tido notícias. Ele não era da realeza, mas ganhava a vida fazendo negociações – muitas vezes ilegais – e tinha contato por toda a sociedade, seja com os Moroi ou com os Strigoi.

Só havia um problema nisso tudo: Abe era pai de Rosemarie e eu era o Mentor-sete-anos-mais-velho-e-ex-Strigoi com quem ela havia tido um romance proibido dentro dos muros da escola. Ela havia encontrado com ele na sua viagem à Rússia e só depois de voltar descobriu sua verdadeira identidade.

Havia uma lista de transgressões minhas, com as quais ele poderia facilmente acabar com as ínfimas chances de ter minha antiga vida de volta, sem contar a própria Rose. A relação com uma pessoa ainda de menor era apenas a ponta do iceberg.

– Ah, Dimitri, deixe-me te dar um conselho. – ele disse, enquanto alisava a barba negra em seu queixo. Eu conheço a sua reputação. Você é um homem perigoso, com toda a sua técnica russa de batalha. Mas lembre-se: nem mesmo toda a atenção de um guardião bem treinado como você seria capaz de prever todos os movimentos de alguém com mais pares de olhos do que você poderia contar em um dia inteiro. O segredo da serpente é não pisar em sua cauda, ou será uma vítima certeira.

Nossos olhos se encontraram por um instante e eu senti toda a lição vinda daquele olhar. “Minha filha. Eu estarei te observando. Eu sou perigoso. Eu não hesitaria em te fazer sofrer.

Aquela nossa comunicação foi quebrada com a chegada de Janine, a mãe de Rose. Janine sempre foi conhecida por sua conduta impecável e por ser uma guardiã excepcional, acima de qualquer média. Olhá-los um ao lado do outro – ela com o seu uniforme completo de guardiã e ele com o seu terno de cashmere e as extravagantes joias douradas – fazia minha cabeça rodar. Era impossível crer que daquela união improvável nascera a mulher mais incrível que já conheci.

– Não é esse o momento que o mentor dá ao seu aluno as palavras de apoio ao seu aluno e diz que ele terá sucesso? – ela questionou-me, ignorando qualquer outro assunto que pudesse estar correndo entre nós. Diferente de Abe, Janine não tinha conhecimento do meu envolvimento com sua filha e, provavelmente por isso, recebi um olhar muito mais agradável dela.

– Creio que não tenha permissão para entrar lá, já que fui deposto temporariamente do meu título de guardião.

– Deixe de bobagem. A Guardiã Petrov certamente deixará com que a veja. Diabos, ela está quase tendo um infarto pensando que você não vem. – Ela disse, ainda animada. Sua voz exalava orgulho e, se eu não tivesse ouvido da própria Rose como ela foi criada pela Academia, poderia jurar que ela teve a mesma criação que eu.

– Era justamente sobre isso que eu conversava com Belikov, sobre como Rose ansiava pela chegada de seu ex-mentor. – A ênfase veio junto de um profundo olhar profundo.

– Nesse caso, temo que deva me retirar e procurar por ela imediatamente para desejar-lhe boa sorte. – Ela não precisava, é claro. Não quando ela derrubou os Strigois que derrubou, não quando ela conseguiu me dominar, não quando ela lutou contra o próprio amor quando decidiu me matar. – Sr. Mazur, Guardiã Hathaway.

E com um aceno eu deixei-os, caminhando firmemente em direção ao salão onde os estudantes se concentravam. Eu respirava aliviado por não ter mais a companhia de Abe, mas saber que tão poucos metros afastavam de mim a minha Roza deixava meu coração aos pulos.

Entrar não foi problema, exatamente como Janine havia dito, mas havia tantos dhampirs reunidos naquela sala que meus olhos não encontraram Rose de imediato, como aconteceria em qualquer outra situação. O recinto estava cheia de alunos nervosos e seus mentores, dizendo-lhes palavras de estímulo. Era a oportunidade perfeita para rever muitos colegas de trabalho, mas eu não poderia me parar quando eu encontrei quem procurava.

Rose estava no canto mais afastado da sala. Seu cabelo estava preso em um rabo alto exatamente como eu dissera para ela fazer. Deus, parecia que havia sido há tanto tempo. Uma época em que minhas maiores frustrações eram discipliná-la e tentar me manter o mais longe possível dela. Obviamente, eu só havia falhado em uma delas.

Qualquer tipo de pensamento ruim se esvaiu de minha mente no momento em que eu pude olhar para o seu rosto mais de perto. Ela encostava-se à parede, os olhos fechados, murmurando baixinho para si mesma. Eu me aproximei silenciosamente e me permiti ficar algum momento para admirar a face dela. Tão linda...

– Não se preocupe, camarada. Eu posso fazer isso vendada. Diabos, talvez eu até faça. Você tem alguma coisa que eu possa usar? Se você for bonzinho comigo, eu até te deixo amarrar... – ela disse, ainda de olhos fechados.

– Você está sendo imprudente, Roza. Poderia ser qualquer outra pessoa aqui. – Eu olhei com repreensão para ela assim que ela abriu os olhos e começou a me encarar.

– Não, não poderia. Eu conheço o seu cheiro, camarada. Veio aqui para me dar mais da sua sábia filosofia zen? Eu tive disso o ano todo, você sabe. Estou tão boa nisso quanto você. – Ela disse com uma falsa indiferença.

Era difícil ficar irritado perto dela. Toda a tensão pela qual eu passei desde que cheguei à Academia simplesmente se dissipou naquele olhar intenso.

– Pensei que não tivesse recebido o meu bilhete.

– Eu recebi o bilhete. Não que eu precisasse de um convite para assistir ao seu teste, já que eu viria de qualquer maneira. – Eu sorri para ela.

– Foi apenas uma precaução. Nunca se sabe quando o admirável e nobre Dimitri Belikov vai trocar um evento social por um livro de ficção sobre o Velho Oeste.

E eu não pude resistir a uma gargalhada. Ela sempre implicou com o meu gosto literário. Assim que eu o fiz, ela abriu um amplo sorriso, como sempre fazia quando conseguia tirar de mim algo tão espontâneo.

– Você deveria estar se concentrando pro seu teste. – Eu tentei adverti-la.

– Eu estava falando sério sobre a venda. Eu sei que você quer amarrar. – O duplo sentido ficou claro como água e o ar entre nós se tornou pesado.

– Guarde suas insinuações para depois, Roza.

– Certo, general. Isso só não muda o fato de eu querer desesperadamente te beijar agora. – Ela disse, dando de ombros, e eu só podia agradecer por ela ter escolhido um lugar tão retirado para estar.

– Eu preciso ir. – Eu acariciei sua bochecha levemente, indiferente à ideia de ser visto naquele gesto carinhoso. Eu não poderia ser expulso uma segunda vez. Ela fechou os olhos ao meu toque e abriu um sorriso – Nos vemos depois.

– Eu espero deixá-lo orgulhoso. Lá na arena.

Com um último olhar afetuoso, eu olhei para trás e murmurei tão baixo que não tenho nem ao menos certeza que ela ouviu. – Eu amo você.

Saí sem olhar para ela uma segunda vez e fui em direção à arquibancada. Era estranho estar alheio a toda a organização do evento. Ver os guardiões interpretando Strigois no campo fazia com que eu me lembrasse do período de experiência de campo, no qual ajudei, e fazia o meu peito se encher de saudade.

Pouco tempo depois, vi Lissa e Christian vindo até mim. Eles pareciam um Yin-Yang juntos: ela com seus cabelos dourados, olhos verdes e seu sorriso fácil e ele com seus cabelos pretos e olhos assustadoramente azuis. Perguntei-me quantos casais contrastantes eu veria até o fim do dia. Talvez eu até fosse parte de um.

– Princesa Vasilisa. Sr. Ozera. – Eu cumprimentei a ambos com a mesma formalidade de sempre, recebendo um olhar exasperado de Lissa.

– Pedir pra me chamar de Lissa nunca vai funcionar, vai?

– Dificilmente. Velhos hábitos nunca morrem. – Eu dei um contido sorriso.

– Ela está feliz, sabia? Por você estar aqui. É como se tudo estivesse se encaminhando pra como estivesse suposto pra ser desde o começo.

Lissa descobriu sobre a minha relação e a de Rose apenas quando esta a deixou para ir procurar por mim na Rússia. Elas tinham um laço muito especial e só quando Rose deixou aquilo de lado ela pode percebeu a real dimensão do que Rose sentia. Falando naquele momento, no entanto, era como se o laço delas não fosse unidirecional mais.

– Espera... Você pode ouvi-la agora? – Eu encarei seus verdes olhos.

– Não, não, não. Quem me dera eu pudesse fazer isso. Eu estava com ela antes de vir pra cá. – Ela explicou.

– Eu estou feliz por estar aqui também. Em Portland... Eu vi a capacidade nela, na forma como ela tentou lhe proteger, ainda que não tivesse técnica alguma. Mas depois de tudo que aconteceu... Ela será a guardiã que nasceu para ser.

Eu repreendi a mim mesmo por estar falando tanto, mas era quase impossível não abrir o coração perto dela. O carisma que vinha com o poder do Espírito era tão forte, eu me sentia seguro e acolhido ao seu lado. Ela parecia a personificação de bondade.

Antes que Lissa pudesse responder, Alberta Petrov entrou na arena e chamou pelo nome de Rose. Enquanto eu a observava entrar, percebi Ibrahim e Adrian Ivashkov entrarem juntos e sentarem-se perto de onde eu, Lissa e Christian estávamos. Não olhei para trás, mas quase podia sentir o olhar do Ivashkov queimar em minhas costas.

Meus olhos estavam focados em Rose e meus lábios se repuxaram em um sorriso ao ver a confiança com que ela entrava. Eu sabia que, certamente, ela estava nervosa, mas não havia motivo. Ela era a melhor de sua turma, possivelmente uma das melhores que já passaram por St. Vladimir.

Ali, na arena, não havia passado, não havia nós, não havia problemas em sua mente. Seu foco era a batalha e ela lidou com cada obstáculo, algumas vezes usando as técnicas que eu a havia ensinado, outras vezes usando técnicas próprias.

Não estou dizendo que aquilo era fácil, de forma alguma. O relevo era cuidadosamente planejado para testar seu equilíbrio e ter alguém que fingia ser um Moroi para proteger gerava toda uma atmosfera de stress que irradiava do estudante. Era um bom teste para qualquer outro, mas inútil para ela. Eu sabia que ela poria tudo abaixo se significasse que era o único modo de fazer a coisa certa.

Muitos outros alunos haviam sido testados antes dela e havia certo padrão de ataques, mas o que aconteceu a seguir pegou a todos desprevenidos. Em um dos momentos altos do teste, onde ela deveria cruzar uma ponte bamba enquanto ainda era perseguida por Strigois, seu teste tomou outra proporção. Todos os anteriores cruzavam-na, amparando seu protegido e mantendo uma boa distância da ameaça, a fim de encontrar lugar mais propício para lutar. Com ela, no entanto, outro “Strigoi” se posicionou do outro lado da ponte, impossibilitando a travessia.

Eu e Lissa trocamos olhares intrigados antes que nossa atenção voltasse para o teste novamente. Não havia jeito de que ela conseguisse livrar-se dos três perseguidores a suas costas e daquele a frente de seu Moroi.

Bem, talvez não houvesse jeito para qualquer outra pessoa, mas ela era a exceção, não a regra. Quando ela fez seu protegido segurar nas cordas e cortou-as, desestabilizando os quatro oponentes e ganhando algum tempo para se livrar do último que realmente restou depois daquilo, a multidão explodiu em alegria. Eu sentia meu rosto ser preenchido por um sorriso maior que o normal e meu coração ser preenchido por orgulho. Ela estava errada, eu pensei. Não era aqui que ela me deixaria orgulhoso. Eu já o era desde que comecei a treiná-la e vê-la transformar-se na mulher incrível que era.

Depois daquilo, houveram outros testes, mas tudo passou como um turbilhão, assim como Rose. Ela lutava tão bravamente, seus olhos fixos no inimigo – tão fixos que mal pode perceber quando o teste acabou. Ela estava suada, o cansaço sendo estampado em sua face, mas seu corpo ainda em posição de ataque, pronta para qualquer outra ameaça que pudesse haver.

As pessoas ao meu redor, na arquibancada, finalmente explodiram em aplausos, levantando-se e comemorando o que acabaram de ver, mas Rose parecia não se dar conta de nada disso. Somente quando Alberta tocou seu braço e a chamou para voltar à tenda seus olhos se desfocaram do campo e ela olhou em volta, seus olhos seguindo diretamente para Abe e, então, sobre mim. Eu sorria profundamente, ainda aplaudindo seu desempenho e só então ela sorriu, embora seu olhar ainda fosse confuso.

Alberta levou-a para dentro e todos voltaram a se sentar, esperando para o próximo teste – que aconteceria assim que a ponte fosse concertada. Lissa, eu e Abe, no entanto, tentávamos abrir caminho para ir até Rose e parabeniza-la pelo feito.

Entrar na tenda, no entanto, era algo impossível no momento e nós fomos orientados a seguir para o lugar onde ocorreria a cerimônia de marcas. Ainda em estado de euforia, caminhamos para lá, com Abe indo de encontro a um lugar mais afastado e Lissa, acompanhada de Christian, procuravam os melhores assentos. Normalmente Morois não acompanhavam a cerimônia, mas eles eram convidados de Rose e, Deus, eu não via modo de eles não estarem presentes ali.

Como a cerimônia ainda demoraria para acontecer, fui até o fundo do salão e gastei algum tempo conversando com velhos guardiões conhecidos. Todos queriam saber mais sobre o período que passei fora, sobre a minha experiência como Strigoi, assuntos que eu, é claro, tentava me esquivar ao máximo. E, sem dúvidas, todos me parabenizavam por Rose.

Não levou muito tempo, então, para que ela chegasse. Ela havia se limpado e vestido apenas uma calça simples e suéter mas, uau, sua presença enchia o salão inteiro. Ela ainda estava cansada do exame, mas caminhou por todos com firmeza e imponência e esperou por sua vez na hora de tatuar, com a impecável postura imparcial de um guardiã.

Deus, eu estava orgulhoso dela. E eu sabia que ela também estava orgulhosa dela, e isso me enchia de sentimentos que achei que jamais sentiria novamente: alegria, carinho e, por mais difícil de admitir que fosse, amor. Pensar em como eu havia visto a mulher tomar o lugar da menina – em batalha e, bem, na minha cama – despertava pensamentos que fariam com que eu tivesse problemas bem sério com Abe Mazur se levados a público.

Quando seu nome foi chamado e suas notas no teste lidas em voz alta, muita carga emocional saiu de suas costas. Poderia não ser o suficiente para fazer com que a comunidade Moroi-dhampir esqueça de seus atos, mas elas eram, em disparada, as melhores da turma. Aquele era um processo doloroso, mas ela manteve seu rosto o mais imparcial que pode.

Ainda de cabeça baixa, ela levantou os olhos, que encontraram com os meus. Sempre havia sido assim conosco: não precisávamos de palavras, sabíamos exatamente o que o outro estava pensando. Dessa vez não poderia ter sido diferente. Seu rosto em branco suportava a dor e me dizia que ela tinha razão: ela conseguiu me deixar orgulhoso. O meu rosto dizia que o que eu sentia era muito mais que apenas orgulho. Ela sorriu.

Tatuar a marca da promessa não era um processo rápido e todos os novos guardiões esperaram pelo menos mais duas horas em pé até que sua vez chegasse.

Rose, por vezes, se remexia, parecendo incomodada, me fazendo pensar o que passava por sua cabeça naquele momento. Agora que ela estava saindo da Academia, sua vida mudaria completamente. Poderíamos resolver nossa situação, é claro, mas eu me perguntava se o que a afligia naquele momento era o seu passado e a sua influência na sua designação. Não havia forma de ela aceitar outro Moroi além de Lissa. Nesse momento eu a vi encarar a parceira, que estava do outro lado do salão. Sorrisos foram abertos em ambas as faces e a postura de Rose relaxou um pouco.

Olhar para elas era como a definição de oposto. Lissa com seus cabelos louros e a face branda, Rose com sua postura defensiva, a expressão de um verdadeiro anjo vingador. Eu não sabia quem tinha mais sorte de ter a outra.

Não bastando todo o agito do dia, Abe se certificou de que sua filha comemoraria sua formatura e planejou o que ele chamava de “uma pequena reunião”, mas que, pra mim, era quase um baile formal. Não que fosse realmente difícil esperar algo assim dele...

Depois da cerimônia, decidi procurar por Rose antes que ela fosse até a festa. Tivemos poucos momentos sozinhos desde que tudo aconteceu e eu ansiava por abraça-la e beijar seus lábios mais uma vez. Sem conseguir me conter, caminhei até seu quarto, torcendo para que ela ainda estivesse se arrumando para a sua pequena reunião.

Parado em frente à sua porta, um mar de lembranças me atingiu e eu tive lutar contra cada ínfimo de culpa pra bater em sua porta e esperar que ela quisesse me ver. Em meu interior, eu sabia que ainda tinha medo da rejeição, tinha medo de que, de uma hora para outra, ela decidisse que eu já havia feito o bastante em sua vida e que me queria fora dela.

Mas quando ela abriu a porta, usando um vestido verde esmeralda e terminando de passar em seus lábios o gloss que eu dera pra ela há tanto tempo, eu queria que ela me quisesse, com todas as forças que habitavam o meu corpo.

– O quê você está fazendo aqui? – Ela disse, sem conseguir conter um sorriso de canto.

– Testando a segurança do dormitório. É uma droga.

Seu sorriso se alargou e, segurando minha mão, me puxou para dentro do seu quarto, trancando a porta atrás de si. Oh, não, Rose, não estimule minha imaginação dessa forma...

Antes que eu pudesse pensar em algo sensato a ser dito, seus braços se enrolaram ao redor do meu pescoço e seus lábios tocaram os meus em fúria e ardor, demonstrando uma saudade que eu sabia que não era exclusivamente minha agora. Uma de minhas mãos foi para seu cabelo, deixando com que os fios sedosos passassem entre meus dedos, tentando fixar aquela sensação maravilhosa em minha mente.

Durante muito tempo, houve coisas demais entre nós: houve as regras da academia, houve nosso próprio preconceito, houve incertezas e então houve os horrores do meu período Strigoi. Naquele momento, não queríamos nada entre nós.

Antes, eu fui atormentado pelas lembranças da noite em que fomos enfeitiçados por Vitor. Fui atormentado pela ideia de tê-la tão perto, de ter estado tão perto e, Deus, eu sei o quanto eu tive que lutar para parar aquilo. Fiz porque não era certo e então, por meses, me perguntei se sabia mesmo a diferença entre certo e errado. Toda e qualquer dúvida que eu cultivei desse dia cessou na cabana, quando eu a tive pela única vez. Tê-la em meus braços, sussurrando meu nome entre suspiros era o certo. Ver a sua pele brilhando pelo suor e seu corpo sempre magnífico junto ao meu era certo. Não havia jeito de aquilo ser errado.

Havia se passado tanto, tanto tempo desde aquele dia, mas ver o vestido deixando seu corpo e sentir seu corpo sob o meu soava como casa para mim.

Aquilo não era só sobre sexo. Era sobre como as coisas pareciam estar indo, finalmente, para o caminho certo depois de tantos erros. Era sobre quão maravilhoso era ter os seus maiores desejos saciados pela única pessoa que por quem você os alimenta. Era sobre a sincronia que havia entre nós e sobre como tudo era natural e ordenado. Era sobre sentir a vida e a energia fluindo entre nós de uma forma surreal.

– Um dia poderemos ter uma rotina assim? Dormir e acordar um nos braços do outro todos os dias? – Ela disse enquanto deitava sobre meu ombro. Seus olhos fixados em mim, como um mar negro de infinitas surpresas.

– Eu não sei. – Eu respondi honestamente, enquanto enrolava uma das mechas de seu cabelo eu meus dedos e depositava um beijo sobre sua testa – mas eu te garanto que vou até os sete infernos se isso puder manter-nos lado a lado.


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