Como se eu tivesse em baixo d'agua por horas, acordei puxando todo o ar que poderia. "Lucas? Lucas pelo amor de Deus. Mãe?" fui diminuindo meus gritos de desespero. Me levantei e me vi numa historia de terror. As minhas pernas estavam bambas, sentia meu corpo dormente e eu queria encontrar o fim do corredor. Coloquei a mão no meu peito pra recuperar o ar. Consegui achar o fim daquele pequeno corredor, que parecia enorme. Vi Lucas chorando. Suas mãos estavam em sua bochecha pra segurar seu rosto. Estava sentado na cadeira da cozinha, e estava com cara de sono. Corri até ele e tentei entender o que estava havendo. Ele percebendo que eu estava ali, se levantou e me abraçou com os seus braços por cima de meu ombro e eu senti seu conforto. "O que houve? Me diz, eu não lembro de nada..." falo baixo em seu ouvido e saio correndo pro quarto da minha mãe, mas seus braços me detém. "Por favor me escuta... é muito difícil dizer isso" ele falaria algo que eu não queria ouvir. Isso de novo. "NÃO NÃO" grito o máximo que posso e me tiro dos braços dele e me coloco como antes no hospital. Meus pés me sustentavam e meus braços seguram meu rosto. Choro e choro e choro. Lucas segura em meus ombros e chora comigo, me sento no chão e não posso acreditar que isso está acontecendo comigo de novo. Eu não poderia perder mais ninguém. Eu não queria perder ninguém. Mas o pior é que me perdi nisso tudo.
Havia se passado uns 30, 40 minutos. Eu ainda estava em choque. "Lia, por favor se levanta". Não tinha forças pra aquilo, fui carregada como antes. Ele me deitou no sofá e começou a falar "você estava deitada na sua cama e entrou em pânico, chorava tanto" ele falava enquanto andava de um lado pro outro na minha frente, como se não tivesse coragem de falar a verdade "eu... Meu Deus eu não sabia o que fazer... Você fechou seus olhos e colocou suas mãos neles como se quisesse parar e eu sabia que você depois iria ficar bem, mas e sua mãe? Corri pro quarto dela e a vi se contorcendo..." "PARA POR FAVOR... MEU DEUS ONDE ESTA ELA?" disse me contorcendo ainda, no sofá "ela já foi, me desculpa, me desculpa" diz ele desesperado, se culpando por tudo "onde ela está?" "a ambulância já levou ela" ele disse deitando no chão e começou chorar de novo. "Eu fui até o quarto dela e vi ela... ela estava tão deprimida... e eu chamei a ambulância... quand... quando eles chegaram aqui ela estava... estava pálida... e eles... eles viram que ela teve um ataque cardíaco... eu lamento tanto... eu queria poder fazer alguma coisa... me desculpa... por fav..." levantei com as poucas forças que tinha e fui até ele no chão, e me deitei em cima dele. E ficamos ali. Parados no silêncio. Minha cabeça estava vazia, meu coração incrivelmente dolorido. E minha vida já não tinha mais sentido algum.
"Eu deveria estar feliz já que era véspera do meu aniversário... Me lembro de como era ter uma festa de aniversário legal, me lembro dos bolos de seis até os onze. Me lembro..." começo a chorar baixinho e coloco minhas mãos nos meus olhos. "... Das risadas e do medo que tinha quando fosse apagar a velinha. Eu nem sabia que aquela era uma vida boa. E agora meu amor? Agora eu tenho que fazer que nem com o papai e não comparecer no funeral? Mas quem iria aparecer se eu não fosse?" digo como se ele estivesse acordado e me ouvindo. Era cerca de 4:45 da manhã e dormi a tarde e noite inteira. E ele permanecia dormindo. Era tão lindo. E eu não conseguia me imaginar sem ele. "Acho que deveríamos ir no funeral" diz ele meio drogado. Ele sorri forçado. E me faz chorar mais. Ele me abraça. E eu contínuo. "Não queria te fazer chorar, me desculpa" diz ele manso "você não me fez" digo limpando meus olhos. "Eu estou bem" eu digo, mas não prometo. Me obrigo a levantar e vou até meu quarto, entro no meu banheiro e me vejo no espelho. Como estava horrorosa. Estava com manchas roxas nos olhos, e meus olhos estavam muito inchados. Minha boca estava enorme. E meu cabelo estava em pé. Peguei minha escova tentando esquecer as coisas que estavam se formando na minha mente, escovo meu dentes, terminando fico me olhando, tentando me enganar dizendo que aquilo era um pesadelo e que logo eu iria acordar. E o senti pegando na minha cintura. Ele me acolheu em seu corpo. Me absorveu. Me levou pra cama. O beijo já deitada. Sinto seu cheiro e ele escovou os dentes também pelo seu cheiro bucal. Seus olhos me observavam quando páramos. Olhava pra ele e chorava de novo. O beijo pra esquecer. Seu beijo, repito, é maravilhoso. Seu toque me enlouquecia. Seu amor me fazia cheia de flores no meu coração. "Por favor por favor me ame me ame, não me deixe... nã.." dizia ao meio do choro e do seu carinho. Ele está em cima de mim e me beija no pescoço e vai descendo. E eu deixo. Estou suando. Ele tira minha blusa e beija a parte do meu peito exposta. Eu fico sem jeito. Mas aquilo era maravilhoso. A sensação que ele deixava em mim era espetacular, mas não podia. "Oh meu Deus oh meu Deus" o digo e ele brinca em abrir o meu sutiã e paro a ação dele "não por favor não, agora não". Eu estava em luto, estava deprimida. Não era o momento. Não era agora. A única coisa que queria era o conforto de alguém, mais precisamente dela. Meu coração estava acelerado. "Me desculpa me desculpa" ele diz sem jeito e eu coloco minha blusa de novo. E nos abraçamos. Eu tento dormir naquele silêncio que me agoniava.
Os meses foram se passando. O funeral foi a coisa mais triste que fiz na vida, acho que empate em ter falar pra minha irmã. Ela chorou muito e eu pude sentir sua dor, mas ela disse que voltaria só em fevereiro. Pelo menos se eu tivesse com vontade de ir na formatura ela estaria lá. Meu final de ano foi na casa de Lucas e é óbvio que estava triste e não comemorei nada. Fiquei na sacada vendo os fogos que vinha do centro, mas Lucas me acompanhava, ele ficou lá comigo o tempo todo e no fim sua mãe descobriu da história do meu aniversário. Me senti acolhida e amada por sua família. Mas aquela não era a minha. Eu queria minha casa de volta. Meu antigo conforto. Minha família.