O Máscara escrita por MileFer


Capítulo 12
Flores e... Desculpas


Notas iniciais do capítulo

Olá meus amores ♥

Então, esse capítulo é bem especialzinho para mim e (como sempre, rs) espero que seja igualmente para vocês. Tenho que confessar para vocês: Rafael está ficando cada vez mais amoreco para mim, e até agora está sendo muuuuito legal escrever sobre ele (tanto que é uma das minhas partes preferidas!).

Enfim, espero que gostem e, se forem bons com referências então... HAHAHA!



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Adélia estava quase pegando no sono dentro da banheira com água quente e perfumada quando Jeniffer rompera pela porta, acordando-a com um susto.

—Desculpe - lamentou-se, enquanto deixava o roupão cor-de-rosa próximo à banheira.  Parecia que sua ideia de um banho relaxante havia sido melhor do que esperava. Embora ainda estivesse com expressão de choro e cansaço, Adélia lhe parecia até melhor do que antes. - Como está se sentindo?

Adélia ajeitou-se na banheira, trazendo a espuma para perto de si, envergonhada com a própria nudez. Ainda não havia se acostumado a ficar despida na frente de Jeniffer, mas pelo menos estava dentro da banheira e encolhida.

—Não estou bem - respondeu, abraçando o próprio joelho. - Mas me sinto menos envergonhada agora.

Jeniffer riu, embora se sentisse mal pela garota. Aquela tarde a havia deixado esgotada; não estava decepcionada com Adélia e Rafael. Ainda tinha esperanças.  Mas havia algo maior que a preocupava.

—Diga-me, de zero a dez - Adélia a distraíra - o quão patética eu sou? - Ela fez uma pausa, encarando-a. - Seja sincera.

Jeniffer franziu a testa, depois arregalou os olhos e riu, quando Adélia também desatou a rir. Era bom para ela poder rir daquilo agora, depois de chorar durante quase meia hora. O riso lhe tirava o peso da dúvida (será que não havia sido grosseira demais?), a dor de cabeça (pois havia chorado demais) e a coragem para não se esconder para sempre. Talvez não houvesse sido uma “boa primeira impressão”; com certeza Adélia poderia fazer melhor. Mas aquilo não dependia apenas dela, não é?

—Já está entardecendo - Jeniffer anunciara, enquanto afastava-se até a porta. - Vou buscar algo para você comer.

E com isso, ela saiu. Adélia ficou mais um tempo na banheira, pensando em tudo o que acontecera nas últimas horas. Parecia que havia algo novo ali, diante de seus olhos, mas que ela não conseguia ver.

Tudo tinha a ver com o máscara, que a perseguia agora em pensamentos. Ele era diferente de tudo o que Adélia já vira na vida, e que provavelmente esperava nunca ver. Ela mal o conhecia e isto era um fato. Mas sua postura era tão semelhante à de seu pai que Adélia podia sentir que o conhecia o suficiente para achá-lo irritante de primeira. Por um momento, Adélia se pegou pensando em como Adam seria como pai. Talvez ele fosse diferente do Adam que Adélia conhecera. Talvez ele realmente amasse seu filho o suficiente a ponto de fazer as coisas que fez a ela e seus pais para salvá-lo.

Adélia sentiu uma pontada em seu coração; mas e seus pais? Será que não haviam feito o que podiam para salvá-la também?

É claro que sim, ela concluiu. Eles a amavam.  Mas por que Adam não entendia e a deixava em paz?

Quando sentiu as lágrimas brotarem em seus olhos, Adélia levantou-se da banheira e enrolou-se em seu roupão, arrepiando-se quando a brisa da janela aberta do quarto tocou sua pele.  Ela estava separando seu melhor pijama - que se resumia em uma antiga camisa do pai e uma calça de moletom estampada com ursinhos - quando Jeniffer adentrou no quarto sem a bandeja costumeira. Em seu lugar, havia um punhado de flores, que logo encheu o ambiente com um perfume doce e bem-vindo.

Adélia pegou as flores e as cheirou, suspeita, quando Jeniffer as entregou de bom grado.

—O que isso significa? - Embora tivesse uma pequena noção do que significava, ela quis ouvir de outra pessoa, para ver se não estava começando a ter ideias mirabolantes.

—Acho melhor você dar uma olhada no cartão. - Jeniffer lhe entregou um pedaço de papel cor de creme dobrado e saiu em direção ao banheiro, deixando-a sozinha.

Adélia quis chamá-la de volta, para que ela a fizesse companhia. Mal havia tocado no cartão e já estava trêmula. Ela sentou-se em sua cama e deixou as flores de lado, segurando o cartão entre os dedos, pensando se deveria ler ou não. O que ele queria desta vez? Irritá-la por inscrito?

Com um suspiro de derrota, ela desdobrou o cartão e começou a ler a mensagem - que, por sinal, estava escrita com letras pequenas e elegantes.

Adélia,

Mal consigo pensar em como deve estar se sentindo neste momento. Parece que começamos com o pé errado, e eu penso que talvez possamos rever isto.

Encontre-me às 19h30min para um bom jantar e uma conversa muito sincera.

Ao final da leitura, Adélia ergueu uma sobrancelha. Ela procurou uma assinatura ou algo do tipo, mas não havia mais nada ali. Depois de reler de novo e de novo, Adélia bufou.

Um bom jantar e uma conversa muito sincera? Ele estava falando sério?

—Ele não pode estar falando sério! - Confessou para Jeniffer, que a encarou sem entender nada.- Ele me chamou para jantar! E ter uma conversa muito sincera!

—Não me parece ruim - Jeniffer disse, jogando um cesto de roupas de lado, enquanto se aproximava.

—Não me parece uma boa ideia - murmurou, pegando as flores e cheirando-as outra vez. Não era um buquê extravagante; eram flores aleatórias, como se tivessem sido colhidas as pressas. Mas não deixavam de serem perfeitas. - Sinto que se eu for… Não quero voltar para cá chorando outra vez. Nem sei se quero mais ouvir o que ele tem a dizer! E ainda me sinto tão envergonhada...

—Mas por outro lado... - Jeniffer completara - Pode ser que ele esteja sendo sincero. Talvez ele realmente queira conversar com você.

Ela deixou as flores e o cartão de lado, considerando a ideia de Jeniffer. Talvez ele realmente quisesse conversar com ela; mas quem garantiria que ele não a faria chorar outra vez?  Quem garantiria que ela estava pronta para encará-lo outra vez, depois de todo aquele teatro que acontecera a tarde?

Adélia estava cansada demais para aquilo de novo. Queria simplesmente dormir e poder esquecer, mesmo que por alguns momentos, que tudo aquilo havia acontecido ou que estava acontecendo.

—Ele é tão parecido com o pai que me dá calafrios- confessou, lançando olhares para o cartão. - Não sei explicar, mas há algo nele que é muito parecido com Adam. Tão assustadoramente parecido…

—Talvez você deva esclarecer melhor com ele - Jeniffer insistiu, dando mais motivos para deixá-la em dúvidas.

—Acha que ele vai querer conversar sobre esse tipo de coisa? - Adélia perguntou, franzindo a testa. - Me parece pouco provável que alguém que nem me disse seu nome vá querer me contar coisas da própria família.

Jeniffer pensou por um momento. Era muito difícil lidar com alguém que estava em dúvida quando você não sabe como ajudar. Se Adélia quisesse ir - e Jeniffer sabia que algo na garota queria - ela poderia ajudar. Mas se ela resolvesse ficar, Jeniffer não poderia ajudá-la. E, para piorar, não era a mulher quem devia decidir por ela - não podia fazê-la ir ou ficar. Estava ali apenas para ajudá-la a se arrumar e trazer seu café. Mas algo a impedia de seguir seu trabalho como deveria.

— Estou cansada, Jeniffer - ela confessou suspirando, derrotada. - Não sei se estou pronta para encará-lo de novo. Não tão cedo.

Jeniffer compreendia a garota. Devia estar realmente exausta depois de tudo aquilo.

— Talvez você devesse pensar melhor a respeito - concluiu, arrancando de Adélia um olhar confuso. - Ainda são dezoito horas. Talvez você devesse descansar.

Adélia não podia negar que aquela era uma boa ideia. Ela pegou seu melhor pijama e o vestiu.

    

Rafael estava estranhamente interessado no céu naquela noite. Ele ainda não havia saído do quarto, nem estava com vontade. Fordy insistira naquela loucura - como sempre.

A ideia de “reconciliação” fora totalmente dele; Rafael jamais iria pensar em algo do tipo, até por que estava pouco interessado em pedir desculpas por um motivo que pouco se importava. Fordy, como sempre, fizera questão de resolver a situação.

Ainda sentia dor em sua perna, mas a cada passo que dava estava ficando mais fácil de lidar com ela. Mal havia conseguido dormir, e estava cada vez mais irritado e cansado.

—O que ela disse? - Ele ouviu um burburinho de vozes ao fundo, reconhecendo apenas a voz de Fordy. Parecia ser uma mulher conversando com ele. Rafael quase se surpreendeu com seu interesse na conversa de ambos. - Você a convenceu?

Ele não ouvira a resposta da mulher. Mas sabia que estavam falando de Adélia.

—Eu tentei!

Desta vez, foi a voz da mulher quem falara mais alto. Rafael podia deduzir que era uma criada, mas não conhecia nenhuma - exceto a de Adélia, que vira pela primeira naquela tarde.

—Não podemos obrigá-la - ela respondera a alguma pergunta insistente de Fordy. Parecia estar perdendo a calma, o que Rafael achou estranho. Eles dois deviam se conhecer, para chegarem ao ponto de gritarem um com o outro. - Talvez você devesse falar com ela. Mas duvido muito que ela te ouça.

Rafael mancou até o quarto, procurando por Fordy. Ele não estava ali; estava na porta, de costas para ele. A porta estava entreaberta, e Fordy estava entre ela.

—Ela não está facilitando em nada - o velho borbulhou, bufando. - O que faremos?

—Fordy - Rafael interrompeu, mancando até estar perto o suficiente para ver o rosto da criada. Ao encará-lo, ela arregalou os olhos e deu um passo para trás; ele a reconheceu daquela tarde. - O que está acontecendo?

A simples presença da mulher o irritou profundamente - mesmo que estivesse do lado de fora do quarto. Nenhum outro funcionário - exceto Fordy - tinha autorização de entrar em seu quarto. Ou muito menos de se aproximar dele. Para piorar, estava sem a máscara. A mulher o olhava com um misto de surpresa e temor, e nem tentava disfarçar.

—O que ela está fazendo aqui? - Ele indicou a mulher com um gesto de cabeça, incomodado. - O que ela quer?


Fordy balançou a cabeça, impaciente.

—Estamos resolvendo um problema — respondera, encarando-o intensamente. Era óbvio que ele não queria Rafael por perto; talvez ele nem soubesse que o garoto o havia ouvido.

—Qual é o problema? – Quis saber, aproximando-se mais de ambos, para ouvir melhor e participar do debate. Como nenhum dos dois pareceu interessados em responder, ele insistiu, desta vez mais firmemente. – Fordy? Criada?

A mulher desviou os olhos dele para seus pés, encolhendo-se. Já o velho hesitou, fazendo uma careta. Ele virou-se para a mulher do lado de fora e, com um aceno de cabeça, fechou a porta vagarosamente, virando-se para encará-lo em seguida.

—Acho que nossos planos – ele começara, escondendo as mãos atrás das costas – não deram certo.

—Os seus planos – Rafael corrigiu rapidamente, um tanto atônito com a noticia. Ele realmente esperava que ela o encontrasse? Depois de um tempo de silêncio, ele continuou: - Eu deveria estar surpreso?

Fordy não o respondera; apenas franziu a testa enrugada e o encarou, incrédulo. Talvez o garoto estivesse realmente despreocupado, ao contrário dele, que estava quase arrancando os poucos fios de cabelo que tinha.

Mas como ele conseguia ser tão indiferente em relação à garota? Fordy conhecia bem o garoto, e sabia de suas indiferenças. Talvez ele estivesse amargurado demais para continuar, mas não podia descontar aquele tipo de sentimento em alguém que não tinha culpa.

— O que te faz pensar que essa garota tem culpa de alguma coisa? – O velho conseguiu arrancar um olhar condescendente do garoto.

—Não estou culpando-a – ele respondeu, calmamente. – Estou apenas evitando que isso aconteça.    

—Então não se importaria em pedir desculpas – o velho retrucou – e convidá-la pessoalmente para um jantar romântico.

Rafael o encarou como se ele estivesse dando piruetas no ar. Ele não podia estar falando sério.

—Se está tão encantando com ela – rebateu, impaciente – chame-a você para jantar. E, se quiser, pode lamentar-se por mim. Não estou nem aí. - Ele lhe deu as costas e foi em direção a sua poltrona.

Fordy estava tentando manter a calma e fazer o que a razão lhe mandava. Mas, às vezes, Rafael conseguia ser tão insuportável quanto o pai, e eram nesses momentos em que Fordy tinha uma enorme vontade de lhe dar as costas. Mas não podia; mesmo que quisesse, mesmo que estivesse morrendo de vontade, sabia que não conseguiria. Rafael era sua pequena família agora. E, muito além de uma questão profissional, era sua obrigação cuidar do garoto.

Rafael tinha total consciência do olhar que Fordy lhe lançava, e lutava internamente para evitar render-se as ideais do velho. Estava tentando lhe provar o quanto não se importava, mas ele parecia rejeitar aquela visão. Rafael queria entender o motivo pelo qual o velho continuava lutando por ele. Queria entender seu otimismo e paciência. Mas eram coisas que estavam longe demais do alcance de Rafael – coisas que foram tiradas dele.

—Eu lamento – desculpou-se, não somente pela grosseria, mas disfarçadamente por tudo. – Lamento que seu plano não tenha dado certo e por todo o resto.

—Você não acha que está dificultando um pouco as coisas? – Fordy tentou não soar ríspido. Rafael sequer considerara sua pergunta; mas, mesmo assim, ele insistira: - Por que você tem tanto medo que as coisas dêem certo para você?

—Não é medo – Rafael respondeu automaticamente, com um suspiro. – Só estou cansado.

E estava mesmo. Parecia que não dormia há décadas, e seu espírito começava a reclamar por um pouco de sossego – o qual mal se lembrara de como era. Mesmo que mandasse Fordy deixá-lo em paz ou deitasse em sua cama para dormir, Rafael sabia que jamais conseguiria prosseguir. Não enquanto ela estivesse ali.

—Pois eu penso o contrário – Fordy rebatera, ainda em sua calma extrema. – Se está desistindo de si mesmo, não espere que as pessoas ao seu redor não façam o mesmo.

—Que pessoas, Fordy!? – Rafael explodira, virando-se para encará-lo. – Você!? Adam!? – Ele respirou fundo, tentando recobrar a calma. – Não há mais nada aqui — ele indicou a si mesmo – para vocês. Não há mais nada aqui para ninguém.

—Ah, garoto - Fordy lamentou-se, desviando-se do olhar dele, tentando esconder as próprias mágoas. Era insensatez sua tirá-lo do sério, mas haviam coisas que Fordy jamais conseguiria esconder de Rafael. Não lhe parecia justo. Se ele soubesse de metade das verdades que escondia...

Rafael estava se sentindo culpado agora. Fordy estava criando expectativas que Rafael jamais conseguiria cumprir. Estava apostando tudo nele, e Rafael não podia deixá-lo acreditar que havia uma segunda chance. Adélia não era uma segunda chance. Ela só representava uma, pelo menos para Fordy.

—Fordy - Rafael o chamara, quando o velho estava saindo. Fordy o encarou, esperando. - Vou pedir desculpas a ela. E vou tentar conversar. Mas isso não significa nada.

Fordy não demonstrara emoção alguma ao ouvir aquilo. Estava pensando no que aquilo significava.

—Que bom - respondera finalmente. - Não fará mais que sua obrigação.

Rafael o encarou de esguelha, semicerrando os olhos.

Mal podia acreditar que estava realmente fazendo aquilo. Que estava ali, parado em frente à porta dela, prestes a bater.

Seja gentil, repetira para si mesmo, e, acima de tudo, seja rápido.

Não esperava que ela fosse aceitar seu convite para jantar – mas não sabia como agir se ganhasse um “não” muito sincero. Estava fazendo aquilo por Fordy, como uma forma de se redimir com o velho. Rafael já estava se arrependendo de ir tão longe. Sua perna começava a lhe proporcionar desconforto e sentia-se cansado demais para qualquer outra coisa, a não ser voltar para o seu quarto. Isso sem falar em seu humor, que decaía com o passar das horas.

Ele contou até três e bateu firmemente na porta alta de madeira escura. Aquela parte de sua casa era uma das poucas a qual explorara há tempos atrás, pois julgava vazia e desinteressante. Agora que havia realmente um hospede ali, as coisas pareciam mais limpas e até mesmo com um pouco mais de cor, fazendo com que Rafael descartasse a ideia de “mansão mal-assombrada”.

Ele ouviu o burburinho de vozes femininas dentro do quarto e respirou fundo, tenso.

Quem está aí? – Ele demorou um pouco para responder, analisando a ideia de mancar de volta para o seu quarto. Ele também esperou a porta se abrir, mas nada aconteceu.

Adélia estava sozinha em seu quarto, já que dispensara Jeniffer mais cedo quando decidira não sair. Estava jantando sozinha quando três batidas na porta quase a fizera derramar sua janta sobre si. Ela tentou não entrar em desespero, respirando fundo e contando até dez em voz alta, enquanto caminhava até a porta. Quando tocou a maçaneta, uma onda de medo a invadiu; quem poderia ser uma hora daquelas? Será que era Jeniffer? Isso a fez querer abrir a porta. Mas por outro lado, poderia ser outra pessoa e, como estava com roupas de dormir velhas e estranhas, preferiu manter-se em segurança dentro do quarto.

 Rafael batera outra vez, como resposta. Estava começando a ficar impaciente.

Adélia saltara para trás quando o visitante insistira, batendo na porta mais três vezes seguida. Ela recuou um pouco, antes de insistir na pergunta:

—Quem está aí? – Ela logo descartara a ideia de ser Jeniffer, já que ela normalmente entraria discretamente e sem bater. Ou se apresentaria.  – Não irei abrir até que se identifique! – Quase gritou, trêmula. Para seu pesadelo, a porta estava destrancada. – Ou me diga o que quer!

Rafael respirou fundo; por que ela simplesmente não abria a porta?

—Adélia – ele respondera receoso. Ele nem precisou dizer mais uma palavra para que um silêncio gritante tomasse conta da situação. Quando ela não falou mais nada, Rafael presumiu que estivesse surpresa ou coisa do tipo. – Precisamos conversar. – Falou rapidamente, sentindo-se embaraçadamente tímido.

—O que você quer? – Adélia soou ríspida, quando na verdade estava trêmula.

—Quero jantar com você – ele respondera, recompondo-se. Por mais estranho que aquilo lhe parecesse, ele desejava profundamente que ela abrisse a porta, para que pudessem conversar pessoalmente, sem nada os atrapalhando. – E conversar com você.

Um bom jantar e uma conversa muito sincera?— Ela ironizou, imitando-o. Aquelas palavras haviam sido escolha dele e, agora que ela as enfatizara, a expressão de surpresa de Fordy ao lê-las em voz alta fazia todo sentindo; talvez até ela havia achado-as horríveis. – Não posso. Estou ocupada.

Adélia estava mentindo descaradamente, mas era para proteger a si mesma. Não estava pronta para aquilo e queria ser deixada em paz, mas parecia extremamente difícil para ele entender. Jeniffer lhe garantira que havia dado o recado de que não iria jantar ou conversar com ele, mas a simples presença dele ali em sua porta, incomodando-a, devia significar algo. Talvez ela realmente devesse conversar...  

—Então talvez devêssemos apenas jantar – ele insistiu outra vez.

O coração de Adélia disparou. Então ele era mais determinado do que ela pensava. Talvez apenas jantar fosse um bom começo.

—Não estou com fome – rebateu, rispidamente.

Rafael nunca recebera tantos “nãos” seguidos e de uma só vez. Estava se sentindo ofendido e irritado. O que aquela garota queria, afinal?

—Imagino que deteste esta situação tanto quanto eu...

—Então me deixe em paz – ela o interrompeu, sua voz saindo em um murmúrio alto e seguida do que pareceu um som oco e fraco, como se ela tivesse batido em algo.

Rafael respirou fundo, deixando que todo o seu estresse saísse junto com o ar de seu corpo.

—Sabe, Adélia, nós poderíamos sermos amigos – ele disse, controlando-se o máximo que podia para manter a voz calma. – Mas parece que você não gosta de facilitar as coisas.

Adélia ficou em silêncio, enquanto encarava a porta em sua frente. Por mais estranho que aquilo lhe parecesse, ela se sentia mal por estar sendo tão grosseira com ele, por não estar sequer lhe dando uma chance. Talvez ela realmente estivesse sendo paranóica, exagerada. Além disso, havia prometido a si mesma que seria corajosa. Que enfrentaria tudo de cabeça erguida.

— Seja como for – ele continuou, interrompendo seus pensamentos. –– Não medirei esforços para que suas vontades sejam feitas. - Rafael mal se importou se estava sendo grosseiro ou não; aquela altura, não se importava com mais nada. – Se quiser ser tratada como uma prisioneira, não impedirei.

Adélia franziu a testa, incrédula. Ela sentiu uma vontade arrebatadora de retrucar. Queria dizer que ele não podia lhe obrigar a nada, muito menos a conversar ou jantar com ele. Mesmo que fosse uma prisioneira, ela não iria render-se aquela mal-educada e grosseira pessoa.

Irritada, ela abriu a porta com força, sem se importar se estava vestida para dormir ou se seu cabelo estava despenteado. Ela respirou fundo e abriu os olhos, dando de cara com ele. Ele estava parado feito uma estátua em sua frente, todo de preto e com uma bengala vermelha e escura na frente do corpo, cabisbaixo. Ele levantou o rosto vagarosamente em sua direção, de um jeito que causou calafrios na espinha de Adélia.

Adélia pensou no que queria dizer, mas estava atônita demais. Ele parecia ainda mais assustador parado ali, naquele corredor pouco iluminado encenando o momento, junto com a brisa fria que refrescava o ambiente.  Ele até parecia mais alto que ela, mesmo estando um pouco encurvado. Ela o analisou da cabeça aos pés, sem saber onde pousar o olhar, quando por fim decidiu se concentrar no chão aos seus pés.

Rafael a analisou também, estranhando as roupas largas que vestia. Parecia que estava prestes a deitar-se. Mas, mesmo não estando tão caprichadamente vestida, ela ainda conseguia dar um nó na garganta dele.

Ela estava aparentemente constrangida, o que provocou em Rafael certo desconforto. Ele deu um passo à frente e tocou, com mãos enluvadas, seu queixo delicadamente, erguendo-o para que ela o encarasse. Ele queria que ela o encarasse diretamente nos olhos, como fizera quando se viram pela primeira vez. Estava disposto aquilo.  

—Olá, Adélia – ele quebrou o silêncio. Estava sorrindo por dentro da máscara, esquecendo-se de toda a irritação que sentira há alguns segundos atrás.  – É bom revê-la.

—Me deixe em paz – ela retrucou, sua voz saindo mais trêmula do que esperava.

—Deixá-la em paz? – Questionou, cínico. Estava sussurrando propositalmente, dando-se conta do quão assustador era ao encarar os olhos dela. – Mas é você quem me persegue.

Opa... Não era para aquilo ter soado tão alto. Adélia ergueu uma sobrancelha, sentindo a ironia da situação. Ela teve vontade de falar, abriu a boca e fechou de novo, mas decidiu que seria uma péssima ideia se ele soubesse que pensava a mesma coisa. Adélia coçou a cabeça e desviou os olhos dele, tímida.

—Não sei o que quer dizer com isso – comentou, sentindo-se boba. É claro que sabia.  – Eu jamais perseguiria alguém como você.

Seu comentário não deveria ter sido intencionalmente maldoso, mas foi isso o que pareceu quando Adélia o fez em voz alta. Ela estava sendo sincera; aquele rapaz parecia ser o tipo de pessoa a qual Adélia correria até estar longe o suficiente para se sentir segura. Ela tinha certeza de que não seria a única. Mesmo ele sendo tão assustador e mau com ela, Adélia ainda conseguia sentir pena dele e vergonha de si mesma por ser igualmente má.

Rafael não pôde evitar se sentir ofendido. Mas o que esperava? Que ela lhe elogiasse e admirasse sua monstruosidade? Chegava até a ser engraçado o modo como ela conseguia ferir os restos de seu ego com poucas palavras.

—Cuidado, Adélia – sussurrou, ameaçadoramente.

Ela engoliu em seco, mas não recuou quando uma pontada de medo causou-lhe calafrios. Naquele momento, parecia ser Adam disfarçado à sua frente, aparentemente encarando-a com desdém e um ego a manter. Ela quis chutá-lo de sua frente e gritar, mas estava mais pacífica do que esperava naquele momento.

— O que você quer, afinal? – Murmurou,entre dentes. Queria voltar para dentro do quarto e ficar em paz.

—Conversar. – Rafael retrucou, calmamente.

—Não – ela respondeu, piscando para afastar as lágrimas de irritação. – Você teve oportunidade hoje, mas preferiu me provocar. Ah, e ontem também – ela respirou, tensa. – Não quero conversar com você agora. Não queria nem encará-lo. Por que acha que recusei o seu convite idiota? – Ela pausou, pensando no que acabara de dizer; antes que começasse a chorar ou se sentir uma própria idiota por isso, ela continuou: - Me. Deixe. Em paz.

Ela se calou, sem conseguir encará-lo. Adélia lhe deu alguns segundos para refletir antes de bater a porta em sua cara e desabar no chão e abraçar a si mesma. Apenas algumas lágrimas escaparam, mas ela tinha certeza de que não eram de tristeza. Estava até aliviada por ter sido direta e sincera, por não ter corrido ou nada do tipo. Ele poderia não ter gostado da resposta dela ou, se fosse realmente como o pai, com toda certeza iria achar um jeito de rebater mais tarde. Mas, fosse como fosse, Adélia não se arrependeria. 







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Notas finais do capítulo

Não está sendo fácil para ninguém, né?!

Adélia não facilita, Rafael não facilita, o clima não facilita... E agora?! Como proceder? HAHA Até o próximo ♥



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