Luck acordou a menina com lambidas gentis na mão. Ela abriu os olhos e encarou o par azul do animal. Cany se levantou e arrumou o cabelo com os dedos. Luck saiu correndo em direção do campo de trigo e se deitou por lá. A garota foi atrás do gato, rindo. Os dois brincaram de pega-pega, mas logo se cansaram. Os espíritos ficavam só observando tudo, curiosos. Luck foi até a meninha e se deitou ao seu lado. Os dois ficaram olhando para o céu azul sem nuvens da ilha.
Os dias se passaram e um navio parou em Hilas. Dele, desceram centenas de pessoas. Essa gente começou a construir casas e comércios, separando a ilha em duas partes, a da população e a das florestas. Os espíritos ficaram pertubardos, mas nada fizeram, afinal aquelas pessoas não tinham matado nenhum de sua espécie e fariam companhia para sua amiga. Uma família adotou Cany e separou-lhe do gato. Luck ficou sozinho por bastante tempo, até que a garota completou doze anos. Nesse aniversário, ela foi até o antigo santuário e encontrou o gato. Ele estava maior e com pelos mais compridos. A menina deu um sorriso de pura felicidade e abraçou a animal. Ele retribuiu o gesto e ronronou baixinho. Os dois estavam juntos novamente, depois de todos aqueles anos. Foram juntos para a costa. O céu da noite estava cheio de estrelas e um vento fresco batia em seus rostos. Luck olhou para lua e uma coroa de cor azulada se formou acima de sua cabeça. Cany encarava-o, sem acreditar no que via. O gato olhou para ela e disse:
–Sou um espírito animal, como pode perceber. Estou tentando fugir de minha família, já que com a morte de meu pai, serei o próximo rei. Não quero isso para mim, reinos, terras, guerras, conquistas, não fazem parte de minha natureza. Você não pareceu notar quem eu era quando me conheceu. Isso me deixou feliz, pois me fez ter certeza de que seria minha amiga mesmo assim.
–Luck... Eu sempre vou ser amiga, você sendo ou não rei. Sua alma é tão pura quanto seu pelo. Eu te amo-disse, abraçando e chorando nas costas de Luck-Para sempre.
Ele ronronou e soluçou junto da garota. “Eu também te amo” pensou antes que seus pensamentos fossem embaçados pela tristeza profunda que sentia. Aquele sentimento parecia não ter sentido, mas eram muito bem justificados.