Young Volcanoes escrita por Cassie


Capítulo 2
Pequena Justiceira


Notas iniciais do capítulo

*-*



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A escola era deslumbrante, tudo parecia sofisticado demais. O chão era de um branco brilhante, o teto alto, com um tom de dourado, como se quisessem imitar o ouro. Imagens de santos que eu particularmente não conhecia, mas todos tinham um grande respeito. Os corredores, espaçosos, com armários feito de algum tipo de alumínio, resistente. Tão brilhantes quanto o chão, parecia que todos eles pediam para ser pichados... E um dia já foram, eu mesma tive essa honra. Se eles estão brilhando hoje, é por que eu tive que limpa-los. Uma experiência, não tão prazerosa quanto pichar.

Tudo estava na mais perfeita ordem. Não sei se é pelo fato da escola ser apenas para garotas, e não se via e nem ouvia nenhum tipo de testosterona, que por sinal... Me matava.
As garotas? Todas normais, com suas sais compridas e crucifixos no pescoço, mas nada me enganava, aposto todas as minhas fichas que elas dariam o lugar no céu só pra ver um homem de cueca na frente delas.
Caminhei até meu armário, número 200, próximo as escadas, e o melhor.... Próximo a saída!
Peguei meus livros e coloquei minha mochila dentro do armário. Joguei meu maço de cigarro e isqueiro no bolso, peguei novamente meu café, e fui para sala. O dia começava bem, com a primeira aula de religião, após a segunda aula que no momento não me recordava, todas as garotas iriam para capela, e logo teríamos nosso intervalo.
Geralmente era sempre a primeira a chegar na sala, mas por algum milagre, Marie já estava lá:
–Se não é minha santa preferida! - Me sentei ao lado dela.
–Bom dia Eli. - Marie parecia cansada, mas ainda sim não conseguia perder aquele jeito doce e carinhoso de sempre.
–Você está linda hoje. - Não seria novidade, Marie era tão branca quando eu, loira dos olhos verdes, alta e magra. Relativamente, um sonho para qualquer rapaz, ou até mesmo para as garotas. Mas Marie era mais ingênua que meu irmão de dez anos.
–E você parece que foi atropelada. - Ela sorriu
–Ressaca... A minha noite foi péssima. - Prendi o cabelo, deixando as marcas em meu pescoço amostra.
–Olha... Parece que não foi tão ruim... - Marie aponta para o meu pescoço. - Sua promiscua, o que você fez? - Marie sorria mas ainda sim parecia bem indignada.
–Não me lembro... - Sorri de volta. - Mas relaxa, foi só um amasso... E promiscua é a sua mãe! - Brinquei. - O que faz na sala tão cedo?
–Cheguei mais cedo...
–Entendi... Quer café?
–Você sabe que eu não posso... - Mais uma lógica que não compreendia, todos os tipos de drogas eram proibidas, e o café era uma delas. Não sei como eles conseguiam se manter acordados... - Conseguiu com o Luiz de novo?
–Ele é demais! Marie... A vida é tão pequena, pra ficar se preocupando com esse tipo de coisa.
–Não sei você, mas eu me importo para onde vou depois daqui!
–Só se for pra casa né? Relaxa...
–Você vai acabar se dando mal, jogue o café fora...
–Ainda não sentiu o espírito da coisa! - Coloquei o copo de café em cima da mesa de Marie. - Relaxe, você deveria fazer o mesmo.
–Você está louca? Essa escola é tudo pra mim, e para a minha família. - Ela se levantou jogou o café no cesto de lixo e voltou para o seu lugar.
–Blá blá. Estou louca para tirar os pés daqui.
–Boa sorte... Você já foi pega fumando no banheiro, bebendo, pichando os armários e ainda teve que pagar feio, passou o dia limpando toda escola, e ainda pegou o último professor.
–Ah que nojo, aquele era nojento... Achei que pegando um professor como o James, eles acabariam me expulsando, mas o coitado pagou pelo meu erro.
–Eles te conhecem Eli, vai ter que tentar mais do que isso.
–Só falta eu colocar pornô no telão do pátio.
–Não faria isso. - Marie ficou corada só de imaginar. - Por favor, esqueça essa ideia maluca... Você ficará por mais dois anos.
–Dois anos?! Prefiro ter uma overdose. Eu vou dar um jeito nisso. Me dê uma semana e terei uma nova ideia.
–Não vai dar certo, estou avisando.
–Vou fazer algo grande! Algo que vai me tirar aqui. Você vai ver! - Marie era incrivelmente pessimista, mas era a única pessoa que me aturava nessa escola. Não iria terminar nossa amizade, caso saísse daqui, precisaria de alguém como ela, mesmo com todos esses defeitos que ela possui... Mas não quero ser muito sentimental.
O sinal havia tocado, as alunas entraram no mesmo instante, desesperadas, como medo de chegarem atrasadas.
–Com tantas loucuras que você inventa, por quê não pega uma advertência por atraso? - Marie perguntou sussurrando do meu lado.
–Você não é nada criativa não é? Atraso? Uma maneira muito idiota de ser suspensa.
–Ana ficou cinco dias em casa, por chegar atrasada. Marie retrucou.
–Ana é uma bebê mimada. Recebe tudo de mão beijada. Nunca teve uma causa real.
–E você tem causas demais! - Marie sorriu. - Olha só, substituíram o professor James.
Olhei de imediato , para substituir o James só sendo alguém mais bonito, alguém que poderia usar como porta de saída desse inferno. Mas como de costume eu estava errada, o tal "professor novo" era velho, gordo e parecia ter ideologias mais velhas que o próprio Papa!
Usava suspensório, uma gravata de bolinhas manchada de café.
A aula era sobre religião, James tinha no máximo trinta e dois anos, conseguíamos discutir, mas esse velho?
Ótimo, uma discussão com esse velhote , me levaria para a diretoria fácil.
–Bom dia turma, meu nome é José Carlos e serei seu novo professor de religião. - A voz estava intacta, mas o andar era devagar, não dizia uma palavra sem passar a mão gordurosa na careca.
–Tive uma ideia genial. - Sussurrei para Marie.
–Eli não! - Marie estava nervosa. - Pegar esse velho é nojento até pra você!
–Fala baixo. - Sussurrei. Peguei as mãos de Marie puxando-as para baixo. - Não vou pegar ele, eca! Vamos debater um pouco...
Eli. Respeita nosso novo professor.
Não vou desrespeita-lo, vou usa-lo. É diferente. - Soltei uma risada maliciosa. - Professor? - Deixei as mãos de Marie e levantei um dos braços para chamar a atenção do professor.
–Sim? Qual seu nome? - Ele enrugou os olhos, como se estivesse tentando me enxergar.
–Elisabeth Blue. - Forcei um sorriso tal simpático que provavelmente toda sala já sabia que eu iria fazer algo.
–Sim, Elisabeth.
–Então... Religião, não é. - Fiz uma pequena pausa dramática. - O "senhor" irá falar da sua religião, a religião da escola, ou irá falar sobre todas as religiões existentes no mundo?
–Bom Elisabeth, acho que a opção mais viável, seria a segunda opção. Deveríamos falar sobre a religião da escola.
–Claro... - Disse sendo sarcástica. - Relaxa Marie. - Olhei pra ela novamente. - A aula está só começando...
José começou a aula, com um clássico: Adão e Eva, acho que todos já conhecem essa história. E a aula ficava cansativa, me esforçava para prestar atenção no assunto que no fundo não queria saber. E tudo ficava chato, arcaico. Até que não conseguia mais ouvir, José conseguiu por automático me irritar.
–Desde sempre, ouvíamos falar de Adão e Eva, o correto seria um Adão e uma Eva, certo? Algo que Deus criou, com um intuído de que os dois procriassem.A não ser que vocês já leram na bíblia, a história de duas Eva, ou dois Adão. - José zomba, dizia em um tom de piada.
–Ah não... - Marie resmungou em voz baixa. - Agora ela explode...
–Desculpa quem é o senhor mesmo? - Interrompi o discurso.
–Sou o professor de vocês. - Disse em um tom inocente, acho que por um segundo, José achou que eu tivesse algum sério problema de memória.
–Acho que você não entendeu... - Me levantei, ficando em frente a minha carteira. - Quem é você para tentar nos dizer o que está errado ou não! - Sentia a fúria em mim, meu sangue corria fervendo em minhas veias, minhas bochechas rosadas, ficaram quentes, minha pele branca ficava irritada, me causando algum tipo de alergia.
–Sente-se agora! - José gritou.
–Não! - Retruquei
–Eu sou seu professor, sou formado. Estou correto e exijo respeito. - Mas instantaneamente ele abaixa o tom, olhou em sua pasta velha e se calou.
–Você sabe quem eu sou não sabe? - Me aproximei. - Você viu na sua pasta... Você sabe quem são meus pais, não sabe?
–Então você é "aquela " Elisabeth, já esperava isso de você. Ouvi muito a respeito de você senhorita.
–Sem formalidades por favor. - O que mais pensava era como deixar esse velho no chão. Minha cabeça trincava. - O "senhor" não pode esperar algo de mim, o "senhor" não me conhece.
–Sei que você é uma anticristo, espero tudo de gente que não tem Deus no coração.
–Eu tenho tudo no meu coração... O que eu não tenho é babacas como você, que tentam dizer o que é o amor!
–Eu não fiz as regras... Deus ditou o que é certo!
–Aposto que ele não ditou você! Tenho quase certeza que você foi aquele resto da maça envenenada.
–Você quer ir para diretoria? Se não quiser, vá se sentar agora!
–Eu engasgo só de falar teu nome! - Estava ferrada, já havia perdido o controle, não mandava mais em minha própria boca, tudo saía no modo automático. - Seus pais devem estar tão orgulhosos de você. Pelo grande merda que você se tornou!
–Já chega! - Ele gritou tão alto dessa vez, que seu rosto estava vermelho, conseguia ver o ódio em suas palavras. - Já para diretoria!
–Já pro inferno!
–É isso, estou sem paciência hoje. - José foi até mim, com toda fúria que um homem idoso, jamais poderia ter. Apertou meu braço me jogando até a diretoria.
–Eu li uma vez na internet, que sexo anal é ótimo para tirar o estresse. - Fingi que não estava sentindo a dor em meu braço. Ele poderia ser velho, mas era estranhamente forte, meu braço queimava. - No seu caso seria fio terra. - Zombei. - O senhor já fez exame de próstata? Gostou?
Chegamos a sala do diretor, ele me jogou bruscamente na cadeira:
–Oito da manhã, são oito da manhã e essa menina está me tirando do sério! - José estava tão nervoso que cuspia ao falar. Era nojento.
–Bom dia Elisabeth. - Disse o diretor
–Bom dia Tony, como estão as crianças? - Me sentei mais a vontade na cadeira. Acho que de todos os lugares da escola, a sala do diretor era o meu lugar preferido. Sem santos, sem crenças, apenas uma sala normal, com uma estante de livros, uma grande mesa com seu computador, uma caneca com chá, e porta retratos por toda sala.
Já Antônio era encantador, um homem baixo, aparentava seus quarenta anos. Uma bela barba, sobrancelhas grossas, cabelos escuros, e no nariz com sardas.
–Primeira aula e já está na minha sala? Deve ser um novo recorde. - Ele sorriu. - Professor, o que aconteceu?
–Essa menina não tem nenhum respeito pelos mais velhos, não respeita a bíblia! - Ele ainda gritava, sinceramente não aguentava mais a voz dele na minha orelha.
Antônio olhou sério para mim e disse:
–E o que você fez?
–Simples... Toda aquela história de que apenas o amor de Adão e Eva era considerado "aceitável". - Toda minha raiva tinha ido embora, agora só sentia a dor, da injustiça perante aos ignorantes. - Liga pro meu pai, eu quero ele aqui.... - Tentei ao máximo engolir o choro.
–Agora você quer chamar o papai? - José zombou, como se eu fosse uma mera mimada que não conseguia ganhar o brinquedo da loja.
–Professor. - Antônio tentou chama-lo a atenção. - Você vai entender, quando o pai dela chegar. Até lá, fique quieto! - Disse, pegando o telefone, discando os números que ele já tinha memorizado.
Não entendia, por quê era tão aberto a tudo, mas ainda sim, ordenava coisas que estavam ditas a anos, me dava punições como limpar a escola, mas ainda sim parecia estar do meu lado.
Demorou em cerca de quarenta minutos até Jimmy chegar, parecia uma eternidade com o José me encarando.
–Bom dia senhor Blue, por favor sente-se. - Antônio pediu.
–O que foi que ela fez? - Jimmy não parecia nada surpreso, na maioria das vezes era Carlos que aparecia na diretoria. Mas ainda sim, era algo mais natural que a luz do dia.
–Discutiu com o novo professor... De novo. - Antônio dizia, sem olhar para Jimmy, ficava o tempo todo escrevendo em seu caderno.
–Discutiu?! - José voltou a gritar. - Ela me difamou!!
–Como você é dramático. - Zombei
–Elisabeth... - Antônio me repreendeu. - Senhor Blue, essa não é nem a primeira e nem a ultima vez que sua filha arranja problemas. Mas eu tenho uma perspectiva que dessa vez, não foi por rebeldia..
–Como assim? - Jimmy estava confuso, olhou para mim e no instante viu uma lágrima cair do meu olho, mas não expressava nenhuma emoção.
–Professor.. Pode me falar qual foi o tema da aula de hoje por favor? - Antônio se virou para José, e ele que parecia bem mais distraído e mais calmo, como se soubesse que a coisa iria ficar feia pra mim.
–O mais simples é claro, expliquei a origem da história de Adão e Eva. - Ele dizia deixando um sorriso malicioso, como se quisesse me ver ali, sendo repreendida.
–Claro... - Jimmy juntou todos os pontos. - Eli, não faça isso de novo, ele é seu professor, precisa respeita-lo. - Jimmy se aproximou de mim, pegou em minhas mãos e olhou fundo em meus olhos como sempre fazia.
–Ele não respeita você. Ele não respeitou a mim. Ninguém aqui nunca respeita... - Segurei o choro, olhava de volta no fundo dos olhos castanhos de Jimmy e lá no fundo, sentia que agora ele também queria chorar. Mas manteve seu papel.
–Do que essa menina está falando? - José já havia perdido tudo, estava confuso.
–Acho que meu marido seria mais capacitado para resolver esse problema. - Jimmy olhou para José e voltou sua atenção para Antônio. - Não acho que eu, teria mais paciência ou cautela para resolver esse assunto. - Antônio assentiu com a cabeça. - Mas, assino uma autorização para levar minha filha hoje, para casa, ela não parece estar em um bom estado para estudar. - Jimmy olhou para mim, bravo mas ainda sim compreensível. - Conversaremos sobre isso em casa. - Mudou o tom, tentando parecer mais durão. - Por favor, diretor, peço que ligue para meu marido.
–Seu marido? - Só agora José havia se tocado, ele era um pouco lerdo, devo dizer.
–Você ainda não percebeu? - Gritei
–Elisabeth, já para capela, fique lá por alguns minutos, pensando no que disse para o professor José, enquanto ligo para seu pai... - Ele olhou para Jimmy. - O outro...
Me levantei, olhei para José, com talvez todo meu desprezo. Sai da sala, sem pressa, caminhei até o jardim, que levava até a capela. Que até fora da escola conseguia vê-la, de tão alta e esplêndida. As portas estavam sempre abertas, poderia entrar quando bem quisesse. Tudo lá dentro era simples: Cadeiras de madeira, quase tudo parecia ser feito da mesma madeira, Todos os santos colocados em prateleiras por todas as paredes. E um grande altar.
Me sentei na ultima cadeira, e não havia no que pensar, só que quando chegasse em casa levaria a maior bronca. Primeiro: Xinguei um professor que para Jimmy seria um dos maiores pecados do ser humano. Segundo: Não são nem nove da manhã e já estou voltando pra casa. E terceiro? Ainda estou com meu cigarro no bolso... Se ele pegar, eu sou declarada como morta!
Mas mesmo assim, no dia seguinte, vou ter que pedir desculpa para o José na frente da sala toda, seria o de menos... Já sei que discutir com o professor não me levará para fora. Mas com o Tony no comando, nunca iria sair daqui. Ele é um cara maneiro, é diferente, mas em um momento de aperto, ela deixa todas suas ideologias de lado, para seguir todos os mandamentos! Por um segundo, achava que com ele na diretoria, as coisas mudariam, ficaria mais leve... Mas ele é igual a todos aqui...
Soltei meu cabelo, fechei as mãos e para todos que passem por lá, eu estava rezando e pedindo perdão a todos esses santos que me observavam.
–Nós sabemos que você não sabe rezar. - Jimmy apareceu e se sentou ao meu lado. - Por quê você faz isso Eli?
–Pai... Você ainda pergunta...
–São oito e trinta da manhã. - Ele olhou em seu relógio de pulso. - Não posso te levar pra casa agora... Quer ir pro trabalho comigo ou quer que eu te deixe em algum ponto? - Ele perguntou
–Carlos vai vir?
–Vai, ele está chateado, e eu também! - Ele se levantou. - Mas eu não posso agora, prometi que iria esperar por ele, para termos aquela conversa.
–Droga... Nesse castigo, vou perder o que? Meu celular, minha liberdade...
–Eu já tirei tudo isso de você. - Ele se abaixou e olhou novamente em meus olhos. - E mesmo assim, você nunca parou... Vamos pensar em algo mais sério... Por que eu juro que todas as minhas opções já acabaram. - Ele sorriu.
–Terão que me trancar em uma masmorra. - Brinquei
–Acho que é o único jeito.. - Ele pegou em minha mão e se levantou. - vem, vamos minha justiceira...


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Notas finais do capítulo

Próximo cap saíra o mais rápido possível



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