100 dias escrita por Camila Lião


Capítulo 2
Capítulo 2 - O começo da batalha I


Notas iniciais do capítulo

Olá, bem vindo a mais um capítulo, espero que goste!
O dia e o mês se referem a: Quando comecei a escrever o livro
O ano: Em que eu nasci.
Capítulo reformulado: 21/05/2016



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Dia 1: 18/08/1997

O despertador toca, são nove horas. Após tanto tempo em coma, o cientista precisa restabelecer-se antes de fazer qualquer coisa, terá que enfrentar muitos exercícios e sessões de terapia fonoaudiológica.

Any chega para encaminhá-lo à sala onde ficará por duas horas realizando atividades específicas para o seu caso.

—Bom dia, Doutor. Vamos comer? Trouxe todas as frutas picadas para que fique mais fácil. -Diz ela sorrindo-

A enfermeira coloca a bandeja ao lado da cama e pacientemente o alimenta. Entretanto, não é uma tarefa fácil devido à falta de coordenação que ele possuía.

Terminando o café da manhã, ela retira as cobertas da cama e empurra uma cadeira de rodas para próximo dele.

—Eu e a Mia iremos acompanhar o senhor e auxiliá-lo em seus exercícios diários. Ela já está esperando por nós, vamos? -Ela olha para o lado de fora do quarto e faz um sinal-

Um rapaz com vestes brancas, alto e forte entra no quarto, o pega no colo, coloca na cadeira e depois sai. Any guia o cientista até a sala de exercícios onde encontram com Mia que já está com tudo preparado.

Após algumas horas, as atividades são encerradas e ele é levado para a fonóloga, onde tudo o que consegue realizar são barulhos das suas tentativas de fala. Em seguida, direcionam-no para comer e lhe dão duas horas de descanso antes de voltar para os treinos.

No final desse embaraçoso dia, ele é conduzido para um quarto novo, um tanto diferente do antigo, com uma imensa janela ao lado esquerdo da cama, onde é possível avistar a extremidade da montanha e as árvores da floresta.

Assim que entra, ele consegue observar algo passando rapidamente do lado de fora.

A enfermeira nota que ele olha com uma feição estranha para a janela.

—Tudo bem? O senhor gostaria de ficar mais próximo?

Como ela sabia que não iria obter resposta, empurrou a cadeira até ali. Ele procura entre as árvores o que poderia ser aquilo, mas tudo o que enxerga é a escuridão da noite.

Any com a ajuda de uma segunda enfermeira fazem a higienização do homem, se despedem e vão embora.

Segundo dia: 19/08/1997

São três horas da manhã, a luz da lua preenche o quarto. Ele acorda assustado, alguém estava fazendo um barulho alto bem próximo. Olha para a janela e atenta uma imagem horrível, uma criatura em formato quase humano, porém, verde e deformada. Precisava pedir ajudar antes que invadisse o quarto, mas no seu estado atual, gritar ou correr estava fora de cogitação. Por sorte, Carla que passava no corredor ouviu e entrou no quarto.

—Imagino o seu susto, mas não se preocupe, isso não consegue quebrar este vidro. -Disse Carla, a chefe de segurança do local enquanto fechava as cortinas- Irei me retirar, mas a todo momento seguranças rondam os corredores, fique tranquilo, caso escutem algo suspeito irão investigar.

Então quer dizer que eles não podem quebrar o vidro? Isso é perfeito. Ele poderia estudar noite após noite a criatura.

O despertador toca, são nove e quinze, a terceira vez que o alarme está soando. Onde está Any que não o acordou?

Que noite terrível, não conseguiu dormir direito pensando no acontecido. Ela finalmente chega e parece não ter dormido bem também, tenta ser agradável, dando-lhe um pequeno sorriso, mas era possível ver o cansaço em seus olhos.

—Desculpe o atraso. Hoje vamos tentar usar a muletas, tudo bem? Eu estarei segurando o senhor o tempo todo, então não precisa ter medo.

Ela retira as cobertas da cama, arrasta as pernas dele para o lado e coloca uma muleta de cada lado. Após cinco longas tentativas ele finalmente consegue ficar de pé.

—Hoje nós iremos comer no refeitório. Assim você poderá observar as outras pessoas, ouvi-las, o que lhe fará muito bem.

Com a ajuda de Any, eles deslocam-se para o refeitório e saboreiam o café da manhã antes do início das enormes sessões de exercícios e fonoaudiologia.

No final do dia a enfermeira o leva para o quarto. Após o banho ele não queria deitar, tinha planos para essa noite, olhou para a enfermeira e em seguida para a janela, ela entendeu o recado e o levou até lá.

—O senhor vai ficar olhando para o nada?

Ele lança um olhar para a enfermeira que fez com que ela o colocasse na cadeira de roda e saísse do quarto sem dizer mais nada. Ele ficou ali, paralisado por quase duas horas. Ele estava com um sentimento estranho, o que seria? Ele não conseguia decifrar.

Então as criaturas surgiram, ele as observou cuidadosamente, de onde vinham, como surgiam e como se comportavam... Enquanto todos dormiam, às onze horas e dezenove minutos, ele estava frente a frente com a criatura de ontem.

Mas, havia algo com aquele ser...

Tão familiar...

A criatura o encarava, não emitia som nem batia em nada.

A enfermeira que faz a checagem na madrugada entra no quarto.

—Acordado até essa hora? Sinto muito, mas não poderei permitir, colocarei o senhor imediatamente na cama. Ignore isso, irei fechar a cortina. –Ela empurrou a cadeira de rodas até a beirada da cama e com muita dificuldade o coloca nela-

Ela volta para a janela, fecha a cortina e sai.

Terceiro dia: 20/08/1997. Aquele olhar... Era tão familiar. Mais uma noite que ele não dormiu bem. Queria descobrir porque aquele ser lhe trazia aquele sentimento que parecia com...

Saudade

O despertador toca, são nove horas em ponto, não precisou esperar a enfermeira chamar ou a soneca tocar. Mas, para que despertador? Mal conseguiu pregar os olhos. Ele ouve o barulho da porta e vira seu olhar para ela. Era Any, que entrou e já foi em sua direção entregando as muletas. No dia anterior ele havia tido uma pouca melhora, porém, conseguiu recuperar alguns movimentos do rosto e minimamente dos pés e mãos, é como se o seu corpo estivesse recordando como tudo era antes.

—O senhor está bem? Dormiu bem?

Ele faz “sim” com a cabeça.

—Tudo bem, mas devagar hoje, faremos exercícios mais leves. Ela o pega pela cintura, dá um impulso para ajudá-lo a se levantar e depois o segura o tempo todo para que ele não caía.

São cinco horas e dezoito minutos, ele já está de volta ao quarto, pararam quase quatro horas mais cedo do que de costume. Apesar de ainda estar em um quarto de clínica, esse era bem melhor do que o antigo onde ficou internado.

Seu novo quarto era muito agradável, tinha uma bela cortina azul com branco, um sofá branco na parede de frente a cama, criados mudos com detalhes que davam a impressão de terem sido feitos a mão, um com um telefone, um pequeno vaso de flor e no outro o seu abajur que era um tom mais escuro e vivo que o da cortina. Sua cama era feita de uma madeira clara trabalhada, que combinava com os criados e um belo carpete. No canto dessa parede havia uma entrada para o banheiro, que, apesar de pequeno era bonito. O que mais o incomodava eram as barras de apoio, espalhadas por todas as paredes, ele não via a hora delas se tornarem inúteis.

Dirigiu-se para o banheiro com o auxílio da enfermeira que perguntou:

—O senhor vai precisar de mais algum serviço meu? Se não, irei ver um outro paciente, a enfermeira que cuida dele está mal, e eu estou no lugar.

—Nã...não -tentou ele dizer-

—Certo, irei me retirar. Estou feliz com a sua melhora, mínima, porém esperançosa -disse Any sorrindo e indo em direção a porta-

Quarto dia: 21/08/1997

 São quatro e doze. Ele desperta, ouvindo um barulho longe. Acende o abajur, olha para janela e vê a criatura que tinha o visitado na noite anterior. O que estava acontecendo? Parecia estar brigando com alguma coisa. Ele então percebeu que o monstro estava impedindo que algo se aproximasse do hospital. Porém, o outro ser que estava envolvido, acabou nocauteando o monstro que caiu e ali ficou. O cientista decidiu que aquela era a hora perfeita para descobrir que criatura era aquela que toda noite o olhava. Segurando no apoio, foi em direção as muletas e com passos lentos, direcionou-se para a porta, quando abriu, deu de cara com Carla.

—Onde o senhor vai a essa hora? –Ela pergunta com uma feição séria-

Ele olha para a janela intrigado e por mais que tentasse não podia evitar que ela o levasse para a cama. Deitado, encarou a janela, mas, onde estava? Para onde havia ido? Não estava mais lá. A solução seria descansar e esperar o próximo monótono dia.

Quinto dia: 22/08/1997

—Bom dia, doutor. Como se sente? Hoje o senhor não terá que fazer exercícios ou ir a fonóloga. Deve repousar, seu corpo exausto não fará progressão.

Ele parecia não ouvir.

—Está tudo bem? O senhor ficou pálido de repente. Irei chamar o médico. -Disse a enfermeira correndo para a porta-

Instantes depois entrou no quarto, um homem alto, moreno, de olhos castanhos, barba e cabelo grisalhos.

—Pegue o termômetro, o estetoscópio e um copo d'água. -disse o médico puxando uma cadeira para sentar ao lado do paciente-

"Sidney! Quanto tempo, meu Deus, como você está diferente" –pensou o cientista ao ver o rapaz-

—O que você está sentindo? Se estiver com dor aperte minha mão uma vez, senão, duas vezes.

O cientista apertou duas vezes.

—Tudo bem. Irei checar seus batimentos.

—Aqui está o copo d'água, doutor.

—Coloque no criado mudo.

—Precisa de mais alguma coisa?

—Não, por enquanto é só.

—Irei me retirar. -Disse a enfermeira saindo da beirada da cama e indo em direção a porta-

—Seus batimentos estão acelerados. Você parece ter passado um grande susto ou nervoso. Beba o copo d’água e acalme-se.

—Você se lembra de mim? Faz muito tempo, hein? -Disse o médico com um enorme sorriso no rosto- Fico muito feliz em saber que já acordou. É uma pena que depois do seu acidente você tenha ficado assim, mas pelo visto está se recuperando rápido.

—Sim, e-eu me l-l-em-b-ro. –Leon tenta responder-

—Fico muito feliz em saber.

E de repente vieram lembranças na cabeça do cientista, um topo de uma montanha, uma planta, um passo em falso, um grito, pancadas, duas, três, inúmeras colisões que ele recebeu enquanto caía, cheiro de sangue, dor, agonia, escuridão.

—Fiz questão de cuidar de você durante esses dois anos. Espero que quando se recuperar, não volte a ser teimoso como antes, Leon Lerner.

"Leon Lerner? Desde que acordei ninguém disse meu nome ou mostrou algum documento. Mas, agora eu me lembro. Me lembro de tudo. O acidente. E... aquele olhar. Emma! Emma Scarlet, minha esposa. Não pode ser. Aquele ser?"

Em...Emma -Disse Leon ofegante-

—Emma? -Perguntou Sidney assustado- Você está se lembrando?

—Emma! -Disse o cientista nervoso e tentando se debater para levantar-

—Acalme-se, não se esforce, eu te contarei o que aconteceu com ela. Estou surpreso que você se lembre...

Leon o olhava com desespero nos olhos.

—Certo... Pouco tempo depois de você ter chegado ao hospital à beira da morte, eu liguei para Emma e avisei sobre o ocorrido, já estava de noite, ela estava nervosa, o hospital era afastado do centro da cidade. Ela infelizmente acabou envolvendo-se em um acidente de carro... Um camponês que morava ali perto ouviu o barulho e foi ver, mas tudo que encontrou foi Emma inconsciente no chão sendo arrastada por alguma coisa que ele não conseguiu identificar.

"Não pode ser, é tudo culpa minha, Emma, espero que um dia me perdoe."

Leon chora desesperadamente.

—Eu tenho uma teoria muito estranha. Sabe aquilo que te olha pela janela todas as noites? Desde que você foi trazido para cá aquilo começou a aparecer. E casos de pessoas transformadas foram confirmados, talvez o que estava arrastando a Emma fosse um deles e ela esteja infectada.

"Será que um dia ela poderá me perdoar? Prometo que irei fazer tudo o que puder para te trazer de volta, minha querida Emma." –Pensou ele aos prantos-

Décimo dia: 01/09/1997.

São nove horas.

Desde o dia que recuperou a memória, Leon não conseguira dormir. Cinco dias acordado. Era possível notar seu cansaço de longe. Pálido e fraco. Ele só tinha um objetivo após conversar com Sidney, salvar Emma.

Depois de dias sem uma boa alimentação e com uma sequência de exercícios diários, ele teve uma crise de nervos. Pegou seu despertador e o atirou longe. Any que estava no quarto com ele assustou-se.

—O que o senhor pensa que está fazendo? -Perguntou a enfermeira tentando contê-lo-

—Me deixe em paz! –Exclamou Leon-

—O senhor está descontrolado, não dorme faz cinco dias, isso deve estar te afetando. Se não parar irei chamar o Doutor para lhe aplicar um sedativo. -Respondeu a enfermeira aos gritos-

—Já se passaram dez dias desde que eu acordei e eu não consigo andar sem cair, comer sem derrubar. Preciso salvar minha esposa, eu a matei. Ela está morta! -Exclamou ele-

Leon soluçava de tanto chorar, seu desespero era perceptível todos os dias. Se esforçando cada vez mais para voltar a ser independente.

Os olhos da enfermeira se arregalaram.

—Morta? -Perguntou-

—Será que você não percebe? Eu falhei com ela de novo! -Leon olhou para enfermeira e logo em seguida encarou a janela- Se ela estiver viva, se ela me perdoar, eu...

Silêncio. Leon se calou. A enfermeira olhou Leon Lerner cair bem na sua frente e então ela lançou um olhar de desespero para a pessoa que apareceu ao seu lado.

Décimo segundo dia: 03/09/1997.

Leon não acordou com o som do despertador. Acordou com a enfermeira o chamando. Quanto tempo havia dormido desde que o médico lhe aplicara a sedativo?

—Sr. Lerner?

Ele não conseguia enxergar direito, sua visão estava embaçada e algo incomodava sua vista. Só conseguia ver alguma coisa vermelha. Levou alguns segundos até que o borrão se transformasse nos cabelos ruivos da moça.

—Any? Porque estou aqui?

Olhou em volta e viu que realmente não estava em seu dormitório. Estava em um quarto todo branco, e com uma luz forte que quase o cegava. Estava em uma maca, estava amarrado, mas porquê?

—O senhor teve dois ataques depois daquele dia. Não deve se lembrar porque não estava em si. Está aqui desde terça-feira, dia 01. Ficou em observação até agora. Os médicos que estão observando o senhor me mandaram acordá-lo. Disseram que de acordo com o que está ligado ao seu sistema nervoso, apontou uma melhora. Vê esses fios? -Disse a enfermeira levantando alguns e mostrando para ele-

Leon sentia coisas coladas na perna, abdômen, peito e cabeça.

—Eles estão no senhor mandando informações para um painel, onde os médicos podem se manter informados sobre o seu estado...

Um barulho de porta silenciou a enfermeira que se virou imediatamente para ver quem era.

Sidney se aproximou de Leon com um sorriso que alegraria qualquer um.

—Como se sente, amigo?

—Bem, eu acho.

—Isso é ótimo. Porque precisamos conversar.

Leon não respondeu, então Sidney continuou.

—Encontramos Emma, mas ela está ferida, porém nós...

Leon não estava mais escutando, "Encontramos Emma, mas ela está ferida, encontramos Emma, mas ela está ferida, encontramos Emma... Ferida? Desde aquele dia que foi atacada?" Essas palavras soaram como agulhas na cabeça dele, começou a sentir uma extrema dor de cabeça, fechou os olhos e começou a se debater.

—Leon? Enfermeira, fique com a seringa pronta. -Disse Sidney sério e preocupado- Leon, responda, se tiver mais um ataque você vai morrer. Leon, me escute, você tem que ficar calmo, você não quer o perdão de Emma? Você não quer vê-la? Pois se você quer, tem que ficar calmo! -Exclamou o médico num tom médio e numa fala firme-

—Quero, é o que eu mais quero. -Respondeu Leon tentando respirar fundo-

—Então descanse, assim que acordar irei te levar para Emma.-Sidney fez um sinal com a cabeça e saiu da sala-

Any aplicou um calmante.

Novamente a escuridão tomou conta.


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Notas finais do capítulo

Obrigada por ter lido até aqui. ♥



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