O outono havia chegado trazendo consigo um vento mais frio do que de antes, um preparo para o inverno. As folhas caiam lentamente até pousarem no chão, umas eram levadas pelos ventos sabe se lá pra onde ele as levaria. Os ventos também batiam no meu cabelo, balançando ele, e por vezes o fazendo voar no meu rosto – uma coisa um tanto quanto irritante – mas quando isso não acontecia, o vento trazia uma sensação gostosa de liberdade e que ao mesmo tempo ajudava a secar o meu cabelo que ainda estava um pouco molhado por conta do banho que eu havia tomado mais cedo. Junte o útil e o agradável, como diz o velho ditado.

—Está pensativa – Alex disse do meu lado enquanto caminhávamos para o auditório – E relaxada demais. Você sabe o que vai ser dito? – ele questionou me encarando fixamente.

Dei de ombros.

—Vai saber. Não me importo muito com o que eles fazem, no final eles são sempre previsíveis demais.

—E por eles você quer dizer os Anciões?

—Sim, porque sinceramente eu não duvido de nada quando está relacionado a eles, porque eles nunca vão pensar nos seus subordinados, eles vão pensar no que é melhor pra eles, nós só temos que acatar as ordens e tentar fazer de tudo pra sobreviver. – respondi, tendo consciência que Ally e Skye também estavam ouvindo – Nós somos apenas peões de um jogo que dura há anos.

—Então, você não quer pegar o responsável pelos ataques? Você não liga para o que os Anciões estão fazendo? – ele perguntou cautelosamente sabendo pra onde meus pensamentos iriam me levar, e ele não estava de todo errado, pois eles logo se voltaram para o meu amigo e pra aquele dia enfadonho de três anos atrás. Balancei a cabeça tentando me livrar da direção que os meus pensamentos estavam me levando.

—Eu nunca disse isso – respondi com um sorriso que provavelmente faria o gato de Cheshire morrer de inveja. Os gêmeos olharam confusos pra mim como se eu estivesse me contradizendo, mas pra esclarecer melhor eu continuei – Eu disse que devemos obedecer às ordens, mas não que deveríamos seguir elas a risca, afinal, regras existem para serem quebradas, não é mesmo? E no meio desse caminho se encontrarmos o culpado, melhor ainda, digamos que eu vou fazer o serviço completo em nome da Ordem, pra não ter erros e me garantir que ele não vai esquecer o que fez e nem o que eu vou fazer com ele.

Nada mais precisava ser dito, e a promessa de pegar o culpado ficou no ar e eu sabia que eles iriam me ajudar, ate mesmo Skye que nem chegou a conhecer o Dylan, mas isso não quer dizer que eu vou sair que nem louca atrás do culpado e atacar sem pensar. Não, eu preciso ter cuidado e tudo tem que ser executado perfeitamente para não ter erros e que ele ou ela nunca mais faça algo desse tipo de novo, vou me certificar de deixar isso gravado na medula de seus ossos.

Nós chegamos ao auditório junto com alguns outros Iniciados e a porta abriu automaticamente quando chegamos perto da mesma, deslizando silenciosamente para os lados. Ás vezes eu me esqueço que boa parte da Ordem é cheia de tecnologia assim, porque na maior parte, pelo menos a que usamos no dia a dia como os dormitórios, as portas são normais, digo de madeira e que você mesmo tem que abri-la, afinal esse prédio é mais antigo do que tudo nesse mundo e além de ser prédio da Sede da Ordem ele também é um patrimônio histórico por ter pertencido a alguma família importante no passado – que não me é relevante agora – mas mesmo assim a tecnologia não deixa de estar presente no prédio principal e em todos os outros ao redor do mesmo, uma forma de tornar tudo mais fácil e pratico ao longo dos nossos dias.

Nós entramos e logo fomos conduzidos para as primeiras fileiras, afinal nós éramos poucos não tinha o porquê de sentarmos espalhados pelo auditório que na minha opinião parecia mais um grande teatro. Nós quatro nos sentamos juntos na terceira fileira, as outras duas já estavam quase que completamente cheias e não me agrada muito sentar perto de gente que eu não conheço – embora eles pareçam me conhecer, porque estão me encarando desde que entrei nesse lugar - e que ta me olhando esquisito desde que eu voltei pra Ordem. Eu hein, pessoal estranho. Será que tem algum problema comigo?

Todas as cadeiras do auditório são de um tom de vermelho muito bonito, e depois que sentamos pude notar o quanto era confortável também. Eles podiam trazer a gente aqui mais vezes para dar os recados e avisos em vez de manter a gente no refeitório...Embora por um lado eu entenda o lado deles, quanto mais pratico e rápido melhor.

—Ei, Alex – chamei ele, que estava sentado do meu lado, mas com o olhar focado em alguma outra coisa, ele se voltou pra mim e sorriu me incentivando a continuar – Quantas pessoas entraram na Ordem nesses últimos anos, claro, depois a gente? E quantos têm ao todo?

Nesses últimos três anos, Alex havia virado aprendiz de Kayla na Sala dos Problemas, parece que mexer com computadores o dia todo realmente é a praia dele, e se tem alguém que pode me informar o que eu quero, esse alguém é ele.

Ele pensou por um momento e depois começou a cita-los nos dedos.

—Bom, no primeiro ano seguinte ao que nós entramos entraram somente cinco. Parece que todos estavam com medo de entrar na Ordem por causa dos incidentes e mortes que estavam acontecendo – ele explicou em voz baixa – No ano seguinte o número quadriplicou, e quase chegou ao numero de Iniciantes do nosso ano, e ano passado entraram somente doze. Os números estão variando muito e nem temos uma estimativa de quantos podem entrar nesse ano.

—E quando vai ser o novo recrutamento? – Skye perguntou se inclinando sobre o meu banco e encarando Alex, ela também estava curiosa com o assunto.

—Creio que em um ou dois meses.

Assenti em silencio, os números rodando na minha cabeça, se somarmos todos os Iniciantes que temos, temos no total cerca de 60 pessoas, e pra Ordem que aparece estar perto de uma guerra esses números não são tão bons assim.

—E...Mais alguém...morreu ou chegou a desistir? – perguntei em um sussurro, um nó se instalando na minha garganta.

—Mais duas pessoas morreram depois que você foi embora, e três desistiram – ele respondeu também em um sussurro.

—Então, ao todo são cinquenta e cinco pessoas, cinquenta e seis se contarmos com Skye, visto que ela não entrou junto com nenhum outro grupo, mas mesmo assim faz parte da Ordem e está em treinamento com uma Sentinela – eu disse – Não são números muito favoráveis pra Ordem.

—Querida, eu valho por dez pessoas – Skye disse se gabando, me fazendo rir.

—Veremos isso quando chegar a hora – eu respondi encerrando a nossa conversa enquanto eu observava os Anciões entrarem pelas laterais do palco e se posicionarem em uma fila de frente para nós, nos encarando fixamente, cada um deles deixando seu olhar pousar sobre um ou outro Iniciante.

—Boa tarde, crianças – aquela senhora que usa um óculos de bibliotecária nos cumprimentou, e nós respondemos em uníssono um educado "boa tarde" o que deixou a senhorinha satisfeita – Sei que muito de vocês não me conhece, mas eu sou a Adelaide Morris e eu faço parte do Conselho dos Anciões, assim como todos que estão presentes aqui – ela fez um gesto indicando os seus companheiros e todos acenaram com a cabeça educadamente.

Meu olhar foi atraído por uma figura que estava em pé ao lado do auditório, nas cochia por assim dizer, e quando eu consegui focar a minha visão percebi que era tia Serenity que observava enquanto os anciões falavam e também parecia observar os Iniciantes e suas reações, vai saber pra que, até que eu percebi que Seth estava no seu ombro. Eu assobiei baixinho e o vi mover a cabeça me procurando, assobiei novamente e ele desceu do ombro da tia Serenity e desapareceu nas escadas, assobiei mais uma vez pra ter certeza que ele me acharia e me contive pra não rir da cara que minha tia fez quando percebeu que Seth havia descido de seu ombro e desaparecido.

Algumas pessoas na fileira à frente haviam escutado eu assobiando e se viraram pra me olhar, os gêmeos e Skye também perceberam e Skye logo perguntou:

—O que você está fazendo? – ela sussurrou perto do meu ouvido, mas não foi preciso responder, Seth de repente apareceu e pulou no colo de Skye antes de pular no meu, o que fez ela pular de susto em seu assento e quase soltar um grito. Ela me lançou um olhar furioso como se eu tivesse culpa dele ter assustado ela...talvez, seja minha culpa, porque eu o chamei, mas não vou admitir isso, principalmente quando foi tão engraçado ver a reação dela ao súbito aparecimento de Seth.

—Oi, menino – eu disse fazendo carinho em Seth, ele deitou no meu colo e fechou os olhos tranquilos. Suspirei contente, já estava quase morrendo de saudades dele.

Os Anciões continuaram com o discurso e pareciam não ter notado quando eu assobiei, se notaram, não deram sinais quanto a isso. Cada um deles estava com um microfone preso à cabeça – tipo aqueles que os cantores costumam usar em shows, presos na orelha e que vai até a boca – assim eles podiam andar livremente pelo palco enquanto falavam, sem nenhum empecilho.

—Nós viemos observando vocês durante esses últimos anos e recebemos vários relatórios de cada um de vocês – o Sr. Matthew continuou – Alguns mais favoráveis que outros, mas mesmo assim, todos foram excepcionais em seus treinamentos e nós concluímos que vocês estão prontos.

Tive a sensação que ele olhou na direção onde nós quatro estávamos sentados, mas foi por um pequeno momento e ele logo desviou o olhar, dando a palavra para sua esposa que continuou com o discurso parecendo ser ensaiado e totalmente mecânico.

—Foram o que disseram da ultima vez – bufei contrariada.

—O que será que eles querem dizer com: "vocês estão prontos"? – Ally perguntou ignorando o que eu falei.

—Observe e verá – Skye respondeu simplesmente, afundando-se no assento, observando os Anciões atentamente. Se antes ela não sabia o que iria acontecer, agora eu tenho certeza que ela sabe.

—Cada um de vocês passou por incontáveis treinamentos, alguns se aperfeiçoaram em determinadas áreas. Se esforçaram ao seu máximo e além disso – Mary Anne continuou – Por isso eu parabenizo cada um de vocês pelo esforço, pelo tempo dedicado, por cada machucado ganhado em seus treinos e por cada experiência vivida.

Mary Anne começou a bater palmas e os Anciões logo a seguiram, em seguida timidamente cada um dos Iniciados bateu palmas também, parabenizando a si mesmos e aos "colegas de trabalho", o auditório se encheu com o barulho das palmas, e eu só não bati porque minhas mãos estavam ocupadas demais acariciando Seth pra fazer tal coisa.

Quando as palmas cessaram uma menina que eu não conheço levantou o braço timidamente, chamando a atenção de Matthew que assentiu pra ela incentivando ela a continuar.

—O que o senhor quer dizer com estamos prontos? – ela perguntou, e eu tenho quase certeza que ela devia estar corando de vergonha por ter tanta gente focando o olhar nela.

—Que vocês vão se tornar oficialmente parte da Ordem. Vão se tornar Protetores!