A Dona do Castelo escrita por snow Steps


Capítulo 2
Capítulo 2




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Minha esperança?

Eu franzi o cenho, achando que aquele sujeito deveria ser mais algum maluco que esbanjava sua insanidade nas noites desertas. Porém, ele estava muito bem vestido para ser um insano qualquer com quem estava acostumado a lidar.

_ Não estou o entendendo, senhor. Por favor, seja mais específico. - Pedi com um tom mais receoso do que desejaria demonstrar.

_ O que o faz levantar da cama nesta madrugada fria, carregando uma maleta? - Ele indagou de volta, apontando para a minha mala com um olhar curioso e um sorriso escondido pela sombra.

Eu arfei, pensando se aquilo era algum tipo de assalto ou um presente do destino, que queria esfregar no meu ego que a decisão a qual eu havia tomado era horrível.

_ Na verdade, estou sem destino. – Contei-lhe a verdade. Ele era um completo estranho, e não havia motivo para ter vergonha de meus erros.

_ Um jovem tão bonito e sem destino? Não creio. – O ancião duvidou, com ar malicioso.

Eu hesitei antes de responder qualquer coisa. Comecei a ficar realmente preocupado com as intenções daquele sujeito e resolvi ir ao ponto.

_ O que você quer?

O homem cruzou as mãos na altura do peito, e admirou por alguns segundos o céu nebuloso e sem resquícios de dia. Voltou a mim, com as seguintes palavras:

_ Para lhe ser franco, não tenho nenhum assunto a tratar com você. E sim, a minha Dona.

_ Sua dona? – Questionei, cada vez mais amarrado nos fios daquela teia de aranha.

_ Sim. A Dona do Castelo. - Ele complementou, lançando um olhar sóbrio. – Ela está o esperando há bastante tempo.

_ Desculpe, nunca ouvi falar seu nome. Garanto que a madame não me conhece. - Eu confirmei com palavras trêmulas, porém no fundo senti o baque de um soco no estômago.

Nas últimas semanas fui acompanhado de uma sensação que algo estava me perseguindo. O constante comichão de que havia olhos assistindo me atordoava durante o trajeto de ida e volta da fábrica, e nas vezes em que me retirava da pensão altas horas da noite para fumar um cigarro de palha. Nada se revelava a minha volta, exceto o burburinho do esgoto se esvaindo pelos córregos abertos e dos ratos correndo de um lugar a outro. De vez em quando parava para escrutinar especificamente um ponto no escuro, imaginando que o sujeito estaria exatamente ali, aguardando para dar o bote assim que eu virasse as costas. Mas quem se interessaria em estudar um mísero capataz da indústria, tão comum quanto os milhares dali?

_ Sim, ela o conhece. Mais do que pensa. - O senhor falou com firmeza. - E ela está lhe fazendo uma oferta. Como disse, a sua esperança.

Cada vez mais eu engolia minha própria voz, abocanhado pelo medo do desconhecido. Como aquele tipo de conversa poderia estar acontecendo? Como ele me encontrara? Como sabia que eu indubitavelmente precisava de um milagre naquela noite?

_ Ela está lhe oferecendo abrigo, comida farta e vestimentas em seu suntuoso castelo. Um lugar de comodidade impecável, por sinal. E você não precisará pagar nenhum centavo por isso, assim como eu não pago. - Ele anunciou com um grande sorriso nos lábios, como se fosse a oferta mais espetacular que poderia ser feita na vida de alguém.

Pus a mão na boca e ri, descansando a maleta no chão. Voltei a encará-lo, este esperando que eu logo aceitasse.

_ Como sabe que estou procurando um lugar? - Eu perguntei sombriamente, quase num sussurro.

_ Eu de nada sei. Ela... - Ele olhou para os dois lados, como se a tal dona fosse onipresente. - Ela é quem sabe.

_ Escute, se está achando que vou acreditar nessa sua armadilha, desista. Fale logo o que quer ou eu vou embora. - Retruquei, já suando frio com aquela sinistra conversa. – Ninguém da nobreza é capaz de demonstrar tal gesto de caridade a não ser que queira ganhar um escravo.

_ Existem escravos levando uma vida mais confortável que a sua – Ele observou, esquadrinhando-me dos pés à cabeça com desdém. – Eu já comuniquei meu objetivo. Dona pediu para que eu avisasse que seu castelo está aberto para a sua estadia. E eu - Ele parou por um momento - Ou melhor, nós, sabemos que você precisa dela. - Ele continuou, num tom tão calmo e natural que me dava arrepios.

Aquela loucura só poderia ser irreal. Mas eu era um miserável rapaz que estava voltando de uma fuga fracassada, e não tinha pressa para voltar à pensão de pulgas. Eu poderia gastar mais um tempo para entrar na brincadeira daquele insano senhor, para me arrepender mais tarde de recusar a oferta mais adorável que minha débil vida ganharia.

_ E onde fica esse castelo?

_ Não muito longe de Londres. Um pouco de caminho, mas nada que se perca da civilização.

_ E por qual motivo a dona está me oferecendo abrigo? Eu não acredito que ela não queira nada em troca.

_ Ela está oferecendo porque sabe que você precisa. E também... ela deseja a sua companhia. - Ele respondeu, meio amargurado, deixando seu olhar cair ao chão.

Hesitei mais, formulando minha próxima pergunta.

_ Que tipo de companhia ela deseja?

_ Companhia. Somente. O castelo é muito grande e vazio, ela está cansada da solidão. - Ele continuou, sua amargura parecia crescente.

_ Você parece incomodado agora. Deve estar mentindo. - Lancei, esperando desmascarar o estranho.

Ele suspirou fundo, aproximando-se de mim, até que nossos rostos fossem separados por centímetros. Seus olhos cor cinza filtrou os meus, olhos de muitas experiências e amarguras, lutando contra os meus tão ingênuos e revoltados.

_ Meu filho, sei que sua vida parece não ter sentido, mas você precisa fazer algo para progredi-la. No momento, o único caminho que resta é voltar para a sua casa, continuar a viver miseravelmente até que se conforte com sua mediocridade e morra como o resto dos outros trabalhadores que venderam as suas almas para sobreviver, em qualquer ruela jogado às fezes e cães. Ou então... tentar um caminho que você desconhece. O desconhecimento dá esperanças.

Contemplei-o por uns instantes, imaginando o que poderia vir do desconhecido. Eu não tinha certeza sobre nada, mas o desconhecido realmente era o único que poderia me fornecer esperanças.

_ Então, o que me diz?


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Notas finais do capítulo

E aí, estão gostando? :)