O Negrume escrita por Aryalie


Capítulo 16
Pobre Harry


Notas iniciais do capítulo

Bem, acho que o título diz tudo. Boa leitura!



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Catarina se levanta muito cedo naquele dia. O sol mal havia terminado de subir no horizonte, e ela já saía de casa. Andava muito estranha ultimamente. Depois de tantos dias sem querer sequer pisar fora de casa, com medo de ficar sozinha, agora sai de casa sem nenhum motivo aparente.

       Eu desperto com o som da cama ao meu lado rangendo. Abro os olhos lentamente, ainda sonolenta, e vejo Annika no mesmo estado que eu, erguendo seu corpo para ver com mais clareza o que Catarina estava fazendo.

       –Onde está indo? – Annika pergunta à Catarina com um bocejo, ao ver que a garota já havia se trocado e agora calçava seus tênis.

       –Vou visitar Edgar, ouvi dizer que ele está doente. – explica ela, sem desviar os olhos de seus cadarços enquanto os amarra.

       –Eu te disse isso. – eu respondo –Vocês nem se falam direito. – minha voz sai um pouco mais ríspida do que eu planejava.

       –Nos falamos mais do que você pensa, Wendy. Ele é meu amigo também, ok? – Catarina responde, vestindo seu casaco e saindo do quarto sem esperar o que eu iria dizer.

       Depois disso Annika dá de ombros e nós duas simplesmente voltamos a dormir. Nunca deve-se desperdiçar mais uma boa hora de sono. Deito a cabeça no travesseiro e envolvo meu corpo nos cobertores.

       Catarina não volta para o almoço. Eu não estranharia se Daniela a houvesse convidado para almoçar no moinho, mas me sinto incomodada por Catarina estar passando tanto tempo com o meu amigo. Edgar e Catarina não têm nada em comum, e nunca conversaram muito. Eu saberia se eles tivessem desenvolvido uma amizade. Ou não?

       Naquela tarde resolvo continuar explorando o porão. O dia está um pouco mais quente, e sem meus casacos me sinto mais disposta para me movimentar. Com as mãos aquecidas eu posso folhear melhor os livros, destravar as caixas. O sol lançava um brilho alaranjado pela pequena janela redonda do cômodo, fazendo tudo parecer menos sombrio e mais convidativo.

       Fiquei particularmente entretida com um baú de madeira antigo, com algumas coisas velhas. Entre elas algumas bonecas, livros de histórias e diários. Diários estranhos, que não hesitei em bisbilhotar.

       O primeiro datava outubro de 1982. Fiquei impressionada por serem tão antigos. Eu sempre tive certo respeito por esse tipo de coisa. O tempo realmente tem esse poder de dar valor às coisas. Pertenciam à uma garota chamada Lílian. Havia algo parecido com um pequeno conto em uma das primeiras páginas:

          Era uma vez um belo casal que teve três filhas. Três filhas louras, ricas e alegres, como toda a família. Porém, um dia, a mãe das meninas adoeceu e morreu. Seu espírito ficou preso a casa, então a família se mudou de sua linda mansão com um anjo na frente.

 

     Senti um vento forte, apesar de todas as janelas estarem fechadas. O vento fez com que as páginas virassem. Sinto um arrepio percorrer meu corpo, mas prossigo com minha leitura.

      Era uma vez um belo casal que teve três filhas. Duas delas eram louras, ricas, altas, alegres, bonitas e inteligentes. Mas a terceira era diferente. A terceira era quieta, de cabelos escuros e antissocial. Ela sempre fazia de tudo para não ir à igreja. Lia livros estranhos e fazia experimentos em animais. A mãe das meninas ficou doente, e a terceira filha disse que podia curá-la. Mas nem mesmo a magia pode vencer a morte, e a mãe enlouqueceu e morreu. Seu espírito ficou preso à casa, então a família se mudou de sua linda mansão com um anjo na frente.

     Mamãe sempre desejou que seu terceiro filho fosse um homem. Eu só queria provar que poderia ser tão boa quanto Stella e Joana. Quando mais eu tentava...

 

     Os três pontinhos me deixam intrigada, mas ouço Annika me chamando e me apresso pela escada de mão, até o nosso quarto, onde ela estava.

     –Wendy, eu já te disse para me avisar quando pegar o Harry... Onde ele está? – ela pergunta irritada, cruzando os braços na frente do corpo. Esse gesto me lembra de nossa mãe.

     –Mas eu não o peguei! – exclamo, me sentindo injustiçada.

     –Como? Então onde ele está? – agora, por trás de seus gritos posso perceber o desespero surgindo ao não encontrar seu filho.

     Ouço passos rápidos nas escadas, e em segundos nosso pai surge na porta, pronto para dar uma bronca em nós duas por estarmos brigando. Até que ele nota o berço vazio.

     –Onde está Harry? – ele pergunta, antes de perceber o que acontecia –Ah, não! Annika, onde está o menino? – ele também beira o desespero.

     –Eu não sei, pai. Quando eu acordei ele não estava mais aqui. Ela o levou! – a voz de Annika sai esganiçada, e eu sinto vontade de abraça-la, apesar de ter gritado comigo.

     –Quem é ela? – papai pergunta furioso.

     –Vocês sabem quem é. A mulher que assombra essa casa. Nós sabemos que ela sempre quis meu filho! Você não pode negar que ela existe! – Annika continua gritando.

     –Você já deveria saber que fantasmas não existem, Annika. – papai diz com a voz baixa –Vou chamar a polícia.

     Polícia. Será que a situação seria realmente tão grae assim? O bebê não poderia estar engatinhando pela casa? Quem o roubaria, e como o teria feito sem que ninguém percebesse?

     Papai sai do quarto e desce as escadas. Ficamos em silêncio ouvindo os passos se afastarem até sair de casa. Nós duas ainda estamos nos encarando quando ouvimos o barulho do motor do carro dando partida e se afastando. Todo o som cessa, e o silêncio é tanto que posso ouvir um zumbido em meus ouvidos. Estranhamente, a falta de sons não oferece calma, mas sim um tipo incerto de agonia.

    Então Annika começa a chorar.


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Notas finais do capítulo

O que vocês acham que aconteceu com o pequeno Harry? E Catarina, o que estaria fazendo? A polícia será capaz de resolver esse mistério? E mais importante: estão gostando do rumo que a história está tomando? Lembre-se, seu comentário é importante para me manter motivada e para que eu possa corrigir meus erros e aperfeiçoar minha escrita, por isso sou muito grata a eles. :)



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