Pokémon Nuzlocke: Sky Above Us escrita por Umisachi Misaki


Capítulo 6
Chapter 5: Glass


Notas iniciais do capítulo

É SEGUNDA-FEIRA ATÉ EU IR DORMIR.

ALKSJLKAJSLA Mentira, postando aqui pra comemorar o dia do escritor. ♥ E também porque damn, vai fazer quase três meses que não posto coisas aqui quando tava planejando enrolar só uma semana or so.

Éééér, sorry por isso. Algumas coisas ocorreram, tipo um monte de professor começar a enfiar trabalhos e mais trabalhos minha guela abaixo, ugh. Aí depois quando chegou a semana de postar o 5 eu descubro que devia ter revisado e programado assim como faço, porque welp, tava cheio de erro.

Enfim, sem mais enrolações, que comece o capítulo O/



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Chiyo não olhou para a confusão que se instalara ali até o momento em que o grito de Alex cortara seus pensamentos. Surpresa percorreu seu corpo, e ela observou, estática, o garoto gritar ainda mais quando finalmente se soltou do Poochyena, agravando ainda mais o ferimento do que livrando-o da dor. Parecia um sinal claro para que fizesse alguma coisa.

Imediatamente, seus olhos encontraram os de Natsuhi e Akatsuki, já de pé e alerta quanto ao ocorrido. No entanto, antes mesmo que pudesse dizer uma palavra ou passar alguma mensagem por seu olhar, vacilou. Um resmungo deixou seus lábios ao lembrar-se das palavras de Alex sobre não querer deixar Akatsuki cuidar do lobo. Bem, agora que ele se mostrara, não havia qualquer desculpa para não...

O pensamento não se completou a tempo. Um segundo som se fez presente, tirando a atenção de Chiyo e forçando-a a olhar na direção de Alex novamente, apenas para observá-lo perder o equilíbrio e desabar no chão. Ofegou quando viu a poça de sangue próximo a ele, provavelmente sujando suas roupas, e quis acreditar que aquilo não estava vindo de qualquer outro ferimento senão sua mão.

Voltou-se para o lobo e a Pokémon de Alex e piscou, um tanto confusa. Pelo menos, o canídeo havia desmaiado e já não seria mais um problema. Agora, Alex... Ele já era outra história.

Deixando Natsuhi para trás, Chiyo foi em sua direção. Agachou-se, e com cuidado, empurrou o menino para o lado, de modo que ficasse de barriga para cima. Era assustador como seu rosto estava sereno e a respiração baixa, quase inexistente. Percorreu os olhos por seu corpo, em busca de qualquer ferimento, não encontrando nada que não fosse o ferimento na divisão das costas da mão e o pulso, sangrando profusamente.

Um machucado feio, e bastante profundo. E que provavelmente continuaria sangrando se não fizesse alguma coisa.

— Natsuhi, me dá uma ajudinha aqui? — pediu ela, ainda analisando o corpo de Alex. A Mawile assentiu em resposta, correndo para obedecê-la, mas ela não pareceu ter sido a única que teve a atenção chamada pelo pedido.

Logo, a Pokémon do menino se juntou as duas, miando diversas vezes para o treinador. Chiyo, como dissera a Alex, não sabia dizer o que Margareth falava, mas podia dizer que estava claro o tom de preocupação em sua voz. Pouco demorou para que a pequena identificasse o problema, arregalando os orbes verdes ao identificar seu ferimento. Empurrou sua mão com o focinho, surpreendendo-se com o fato de o menino não ter reagido com o toque, e pareceu prestes a entrar em desespero.

Chiyo suspirou, e com a ajuda de Natsuhi, ergueu o garoto pelos braços, cada uma puxando-o por um lado. Foi com dificuldade que o arrastaram pra perto da fogueira, sentando-o perto de uma árvore. Margareth as seguiu, colocando-se no colo do menino e inspecionando a ferida, usando sua língua para limpar o sangue de tempos em tempos. Seus esforços, porém, pareciam inúteis, e o sangue apenas continuava a escorrer, manchando a grama e as roupas. Isso estava ficando cada vez mais preocupante.

Mas ela recusou-se a se deixar preocupar com aquilo. Ao invés, concentrou-se na tarefa principal: buscou sua mochila, e com o kit de primeiros socorros, buscou o necessário para cuidar de sua ferida. Ela não poderia fazer muito sozinha, era uma ferida feia e provavelmente precisaria de pontos, mas também não era como se pudesse deixar o garoto sangrar até a morte.

Ignorou os miados insistentes de Margareth, e dirigiu se até o machucado, primeiro apertando um pano úmido, a fim de estancar o sangramento por alguns momentos. Depois, utilizou-se de um segundo para limpar a área ao redor, livrando todo o braço do líquido pegajoso.

"Eh, parece bastante complicado de cuidar." Murmurou Natsuhi, observando o trabalho da treinadora. Akatsuki, por sua vez, concordou, soltando um resmungo incompreensível.

— É, verdade — respondeu, os olhos ainda pregados em seu rosto. Pelo menos, ele não tinha acordado ainda.

O que a preocupava, porém, era o sangue em toda a camisa, praticamente encharcada do líquido avermelhado, quase como se gritasse gritar a possibilidade de haver um ferimento pior ali.

E isso a preocupava. Chiyo podia fazer algo pra pelo menos estancar o sangue até o dia seguinte, onde encontrariam um local mais adequado para fazer os pontos e cuidar do hematoma, mas e se houvesse algo a mais que não poderia tratar? E se, por conta da sua pouca falta de conhecimentos quanto a cuidar de pessoas, acabasse por fazer algo errado ou insuficiente para mantê-lo seguro até Alex ter um melhor cuidado? Talvez Alex acabasse pegando uma infecção.

Suspirou, preocupada, e olhou para Margareth. Ainda miava em protesto, quase como se quisesse ajudá-la. O fazia diversas vezes, chegando ao ponto de irritá-la, e apenas se calava quando Akatsuki soltava um rosnado em sua direção, muito embora não passasse muito tempo para continuar a protestar.

— Certo, certo, eu vejo se tem mais algum machucado — resmungou para a Shinx, e hesitou quanto a fazê-lo realmente.

Acabou por dar de ombros, simplesmente puxando o tecido úmido e tendo a ajuda e Natsuhi para erguer-lhe os braços. Felizmente não havia nada em seu corpo, a não ser algumas poucas manchas causadas pela blusa encharcada, agora igualmente pegajosa ao toque. Por via das dúvidas, continuou a analisar seu corpo, passeando os olhos por ele até erguê-los novamente e surpreender-se com as pálpebras de Alex tremendo antes de se abrirem.

Seus olhos escuros observaram o local, um tanto confusos. Alex parecia meio atordoado e sonolento, como se tivesse dormido por muito pouco tempo, insuficiente para acordar disposto e cheio de energia. Piscou diversas vezes antes de assimilar o local e encontrar Chiyo, e assim que o fez, teve três reações diferentes. Primeiro, franziu o cenho, confuso. Depois, seu rosto ficou branco, quase como se tivesse visto um fantasma, e por fim o branco passou a ser vermelho, cobrindo praticamente todo o rosto com a vergonha perante a situação atual.

Alex abriu a boca para dizer algo, mas ao invés disso, Chiyo voltou a puxar-lhe o braço, mirando a ferida em sua mão. O simples toque próximo a fonte de sua dor o fez gemer, assim como se arrepender de ter virado o rosto para ver o que a menina estaria fazendo. Assim como Chiyo pensara, Alex virou o rosto para o lado imediatamente, evitando contato. Só virou novamente por Margareth, animada em ver o treinador acordado de novo. Aninhou-se em seu colo, tirando um sorriso de Alex, que usou a mão livre para acariciá-la.

— Fobia? — perguntou. Lentamente e ainda mais receoso do que ela, Alex assentiu. — Compreensível. Pelo menos não falta muito pra chegar em Violet, porque você vai precisar de um hospital.

Piscou novamente.

— Está tão ruim assim?

— Vai precisar de pontos — murmurou, e embora aquilo não fosse exatamente uma resposta, dava a mesma certeza que Alex temia. — Vamos ter que viajar mais rápido a partir de agora. Até lá, é melhor que tente não usar ou forçar essa mão.

— Ugh — reclamou, mais por desgosto do por qualquer outra coisa.

Em seguida, tratou de cuidar da ferida, fazendo com que Alex abafasse gritos ofegantes e que Margareth miasse, tentando ajudá-lo a se acalmar. Em determinado momento, o menino passou a retrair a mão e quase forçá-la de volta si, e realmente o teria feito se Chiyo não tivesse força o suficiente para mantê-lo ali. As reclamações foram constantes e o lábio foi mordido na vaga tentativa de contê-los, e no fim, o menino possuía lágrimas nos olhos e uma mão fortemente enfaixada, manchada de vermelho.

— Arceus, você reclama demais — resmungou ela, lançando um olhar reprovador. Alex bufou em resposta, contendo a vontade de reclamar ainda mais. Um momento de silêncio se passou, e após uma última olhada em seu trabalho, Chiyo continuou: — Acho que está bom por enquanto. Cuidado com ela na hora de dormir, também, não queremos que o sangramento volte. Amanhã de manhã eu troco o curativo pra tentar não fazer ele infeccionar, mas duvido muito. Com ele aberto, assim...

— Vou tentar tomar cuidado. — Foi sua resposta dada de forma vaga, o que fez com que Chiyo o encarasse por um momento, desconfiança pintada em sua expressão. — ...O que aconteceu com aquele Poochyena?

Com o queixo, ela apontou para o local onde o lobinho jazia, ainda desmaiado.

— Ainda está ali, perto dos salgadinhos. Vai fazer alguma coisa sobre ele?

— Quero tentar, pelo menos. Ele não parecia estar fazendo por mal.

— Ele te deu esse machucado aqui. — Apontou ela, ironia em suas palavras. — E você acha que não foi por mal?

— É — disse, simplesmente, como se a única explicação que ela precisasse fosse aquela única palavra. — Vou cuidar dele e esperar que ele acorde.

"Ele pode ir embora assim que acordar, você sabe" advertiu Natsuhi. "E roubar mais coisas. Não acha melhor capturar?"

— Pode ser, então. — Ainda lhe parecia um pouco estranho vê-lo responder sua Pokémon, mas Chiyo preferiu não comentar sobre o assunto. — Mas tenho que cuidar dele primeiro. Você fez um belo estrago, hein, Maggs?

E com essa última frase, deixou um carinho a mais no topo da cabeça de sua Shinx, como que para parabenizá-la pelo pequeno feito. Tentou se levantar, ganhando um rosnado de Akatsuki e uma advertência da própria Chiyo, empurrando-o de volta para o chão e obrigando-o a ficar ali.

— Nem pense em tentar cuidar dele com o braço desse jeito.

— Mas eu não...

Fez um gesto curto com a mão, interrompendo-o.

— Deixa que eu cuido dele. Você fica aí e vai dormir. Perdeu muito sangue e precisa de um descanso, ou não vai conseguir viajar direito amanhã. E eu não vou te esperar.

Alex abriu a boca para protestar, e mais uma vez foi interrompido. Chiyo o deixou com a vigília de Natsuhi e Akatsuki, ignorando o bufar de aborrecimento que o garoto soltara, e dirigiu-se até o Pokémon caído.

De fato, ainda estava desmaiado, possuindo alguns cortes superficiais pelo corpo, enquanto os mais sérios estavam escondidos por entre os pelos chamuscados. A única coisa que denunciava sua presença seria o sangue manchando os pelos cinzentos de seu corpo, pois, de resto, parecia normal. Felizmente, não eram machucados tão sérios quanto pensava, então foi fácil cuidar dele, limpando as feridas com uma Potion e deixando curativos onde julgava ser melhor. Depois, levou o Poochyena até Alex, e o menino não tardou a puxar sua mochila. Tirou dela uma Pokéball vermelha e branca e uma camisa limpa, já que a outra continuava suja, e assistiu enquanto ele se vestia, gemendo quando o pano roçava a mão enfaixada.

Foi com estranha hesitação que Alex apertou o botão central da esfera bicolor, a fim de deixar que o objeto liberasse um brilho vermelho. Este, por sua vez, envolveu o lobo cinza e sugou-o para dentro, para então chacoalhar entre suas mãos, o botão central piscando em vermelho. Como o Pokémon estava inconsciente, porém, o ritual de captura durou pouquíssimo tempo. O brilho manteve-se ali por mais segundos do que o comum, e então desapareceu por completo, indicando que a captura havia sido feita.

A partir daí, não houve muito o que se fazer. Chiyo encarregou-se de organizar as coisas, tanto dela quanto de Alex, alegando que a mão machucada não o deixaria fazer as coisas direito. Alimentou o fogo com mais alguns galhos secos, uma pequena prevenção para que a fogueira não se apagasse durante a noite, e anunciou que iria dormir. Minutos depois, Alex e Margareth fizeram o mesmo, e o único som que se podia ouvir no acampamento era o do fogo estalando.

Dormiu rápida e calmamente, num sono sem sonhos.

O dia seguinte foi um pouco corrido para o grupo. Chiyo foi a primeira a acordar, insistindo em organizar as coisas e preparar o café da manhã ao lado da irmã o mais rápido o possível. Café da manhã pronto, Natsuhi ficou encarregada de acordar Alex e Margareth, e assim que comeram, voltaram a viajar.

Dessa vez, a caminhada foi feita de forma rápida, em que ambas ignoravam os protestos de Alex para irem mais devagar e conversavam entre si. Como o esperado, o menino estava cansado e mais sonolento que o normal, e pra piorarem as coisas, a ferida voltara a sangrar quando tirara o curativo pela manhã obrigando-a refazer os mesmos cuidados da noite passada apenas para que Alex olhasse para o outro lado, ofegando. Se aquilo continuasse, infeccionaria mais rápido do que o esperado. E pior ainda, talvez houvesse a possibilidade de suas bandagens acabarem. E Chiyo não tinha tanto dinheiro assim para comprá-las.

Fora isso, as coisas se seguiram completamente normais. Manteve uma conversa breve com Alex por poucos minutos, juntando a irmã e a Shinx, e esta apenas foi breve para economizar fôlego. Pretendia deixar a floresta ainda naquela manhã, já que a saída podia ser vista de longe, próxima a um pequeno rio que cortava a floresta e desaguava ao longe, num caminho diferente e que não iriam seguir agora. Andou, então, até que o som do rio se fizesse ouvir, e andou um pouco mais antes de pararem para o almoço.

Aos poucos, a vegetação começava a rarear. A mata ficava mais aberta, deixando os raios solares iluminarem a área ao redor melhor, trazendo seu calor e afastando o típico clima frio das manhãs. Mais a frente, podia se ver um tapete de grama estendendo-se até onde seus olhos podiam alcançar, assim como parte do rio que procuravam. Um local certamente agradável para o almoço.

Finalmente, ouviu os pedidos de Alex para parar, e passaram a pegar lenha e procurar um local para almoçarem em paz, perto do rio, onde poderiam lavar a camisa suja do menino e as panelas. Demorou apenas alguns minutos para acharem um espaço bom o suficiente, e passaram a fazer a fogueira ali.

Mais uma vez, ignorou os protestos e as tentativas de Alex de ajudá-la para que o menino descansasse novamente. Ele, mais do que Chiyo e Natsuhi, estava mais cansado, e mal podia esperar pelo momento em que a noite chegaria para ter uma boa noite de sono. Se estivesse viajando sozinho, provavelmente já teria parado em algum lugar, mas essas coisas não eram de seu feitio quando estava acompanhado. Muito pelo contrário. Gostava de ajudar, não importando muito o caso, mas sua mão também não colaborava para o fato. Ser obrigado a ver Chiyo e Natsuhi tendo todo o trabalho de buscar lenha, acender a fogueira e fazer o almoço o fazia se sentir, no mínimo, desconfortável, para não dizer inútil. Fazia-o olhar para a mão machucada, se lembrar de como ela estava e mudar de ideia.

Tédio, principalmente, foi uma das coisas que o incomodou naquele meio tempo. Só tinha de ficar sentado num canto, dando carinhos a Margareth, que aproveitava o momento de descanso para deitar em seu colo e adormecer. Perdia-se em seus pensamentos assim, perguntando-se se seria melhor treinar agora ou seguir o plano de esperar chegar à cidade para fazê-lo. Então se lembrava do Poochyena que pegar hoje, e não sabia o que fazer.

Tecnicamente, o Poochyena podia se considerar sua primeira captura, e certamente que estava feliz com o feito. Mas, de alguma maneira, não estava lá tão feliz assim com aquilo. Estava, na verdade, um tanto preocupado com a reação do lobo quando o liberasse da esfera vermelha e branca novamente. Um de seus maiores medos era o de um Pokémon o rejeitar, porque, diferente das outras pessoas, Alex podia entender sua fala. Podia ouvir suas opiniões e podia dar-lhes a opção de ficar com ele após uma captura ou ir embora. Dizer que não sentia medo da resposta negativa era uma mentira bem grande.

Ah, sim, agora que a situação real chegara, e ainda de forma tão inusitada, ele sentia medo. Medo de que o Poochyena pudesse atacá-lo novamente, medo de que dessa vez não fosse para defesa, e medo de que ele fugisse de Alex mais uma vez, levando o pacote de salgadinhos consigo. A esperança de que o Pokémon o escutasse parecia improvável demais, algo com uma chance tão pequena de ocorrer que nem mesmo valia a pena acreditar.

Observou a Pokéball entre seus dedos da única mão que escapara da faixa. A outra latejava ao menor toque, sobrando apenas àquela opção em especial.

De repente, o formato esférico e o calor emanado dela pareciam a coisa mais interessante do mundo.

— Alex, não vai liberar ele, não? — A pergunta de Margareth foi, praticamente, a única coisa que tirou sua atenção. — Ele provavelmente deve estar se sentindo entediado de ficar na Pokéball por tanto tempo. Eu me sentia assim quando ficava, também.

Alex piscou, parecendo surpreso.

— Não está preocupada de ele nos atacar de novo?

— Claro que estou. — Bufou, como se sugerir aquilo fosse um insulto. — Mas eu estou aqui agora. Não tem como ele fazer algo comigo tão perto.

— Está tão confiante assim?

De resposta, o corpo da Pokémon liberou diversas faíscas azuis, enquanto um rosnado do fundo de sua garganta se fazia presente, revelando a fileira de dentes afiados que possuía. Alex riu, deixando um carinho breve em sua cabeça, e decidiu que o faria logo de uma vez. Pelo menos, tinha Margareth consigo agora. As coisas não sairiam lá tão ruins assim.

Foi acreditando nesses pensamentos que, finalmente, Alex pressionou o botão central da Pokéball, fazendo com que esta se expandisse se ajustasse ao tamanho da mão. Hesitou por um momento, respirando fundo. Por fim, pressionou o botão novamente, permitindo que o brilho branco liberasse o Pokémon.

Alex não podia negar que estava com medo.

Quanto mais que, lá no fundo, estava esperando que o Pokémon estivesse desacordado e aparecesse deitado no chão, mesmo que já soubesse a resposta:

Não estava.

Muito pelo contrário. O brilho de seus orbes, ao invés, encarava ao redor com confusão, talvez um pouco de fúria até, mas principalmente confusão. Observou ao redor, na tentativa de identificar o local, observando a fogueira e na panela que Chiyo estava preocupada em cuidar. Pairou o olhar sobre as coisas de ambos os adolescentes por alguns segundos, apenas para interromper-se em Alex. Mais precisamente, na mão enfaixada, também suja de vermelho.

Quase que imediatamente, o Pokémon rosnou, revelando os dentes da mesma forma que Margareth o fizera momentos atrás e fazia agora, em resposta a ameaça. Sua cauda cinzenta foi ao ar, alerta, e os olhos vermelhos brilhavam de algo que, para Alex, não podia ser identificado somente como raiva ou confusão. Era algo a mais, talvez algo diferente que o fez erguer as sobrancelhas e tentar parar de hesitar por tanto tempo assim.

Isso pareceu algo incrivelmente difícil de fazer, então quem o fez primeiro foi o lobo cinza. Um latido deixou seus lábios de forma súbita, provavelmente a fim de intimidar aqueles que o haviam capturado. No entanto, tudo o que conseguiu foram duas coisas. A primeira, um sibilar de Margareth, o corpo voltando a liberar faíscas azuis. A segunda foi a atenção de Chiyo, seus olhos faiscando em sua direção, como um pequeno aviso de que estava monitorando a cena e de que, caso o Poochyena tentasse alguma coisa, estaria ali para intervir. De repente, o garoto se sentiu um tanto pressionado a dizer as primeiras palavras.

— Uh... — Começou, baixo demais para ser ouvido. Pigarreou, e assim que teve os olhos do Poochyena sobre si, continuou: — Hey, ahn... Você tá com fome, né?

Sua resposta foi um segundo rosnado, junto com um recuar de passos. Certamente que aquela não foi a melhor pergunta que o menino deveria ter feito, mas o que mais podia ter feito quando estava submetido a tamanho nervosismo?

— O que você quer comigo? — Veio a resposta trêmula, falhando em passar toda a raiva e ameaça que os dentes insinuavam. — Se for outra mordida, vou ter o prazer de dar.

— Sinta-se livre, então — O modo como Margareth o disse pareceu um convite amigável, apenas com uma carranca de aborrecimento e faíscas azuis aumentando mais e mais, quase a ponto de fazer o corpo brilhar em eletricidade. Provavelmente só não o fazia pela proximidade com Alex, ciente de que o menor toque dele em seus pelos azuis fazia o corpo do menino estremecer com a corrente elétrica.

— Ei ei, não briguem, vocês dois! — advertiu Alex, chamando a atenção do cão novamente. — E eu não quero nada, só quero ajudar.

Uma sobrancelha foi erguida em resposta.

— Huh, anda difícil de encontrar humanos que me entendem. Isso deixa as coisas mais fáceis — murmurou, mais para si mesmo do que por qualquer outro dos presentes ali. — Mas ainda assim, o que você quer? Porque me capturou?

— Ué, você queria ter ficado lá, todo machucado, enquanto a gente ia embora sem dizer nada? Se você não percebeu ainda, fomos nós quem cuidamos de você — respondeu a Pokémon, bufando. Alex piscou para ela, por um momento, confuso com a estranha rudeza da pequena.

— É mais ou menos isso. — Continuou o treinador pela Shinx. — Foi mais pra querer te ajudar, mesmo. Quer dizer, você parecia com fome pra estar roubando minhas coisas...

— Só por querer ajudar, é? Está ainda mais difícil achar treinador que captura só pra ajudar.

— Tô falando sério, caramba! — Agora, havia um tom mais irritado em suas palavras. — Se você quiser comer alguma coisa, então okay, a gente te dá algo. Se quiser ficar, tudo bem, se não quiser, então pode ir. Não vou te obrigar a ficar comigo ou aceitar a comida.

Era verdade. A intenção de Alex era muito mais do que apenas capturar o pequeno. Admitia que gostaria de ter feito uma captura real, mas, ainda assim, força um Pokémon a ficar com ele era algo que iria além de seus ideais, além de sua própria ética. E que, acima de tudo, o iria fazer se arrepender de ter tentado, a culpa o consumiria antes de sequer pensar naquela possibilidade.

O cão pensou por um momento, hesitante. Os olhos vermelhos passaram de Chiyo pra Alex e de Alex para Chiyo novamente, parando em Margareth. Examinou suas opções com cuidado, procurando todo e qualquer resquício que fosse apontar a mentira em suas palavras, além de algum sinal para finalmente confiar no grupo.

Caso Poochyena escolhesse ficar com eles, ou mesmo aceitar a comida, continuava sendo tremendamente arriscado. Confiar no grupo até era uma opção, mas Poochyena suspeitava que já não era mais capaz de fazê-lo. Já vira treinadores demais com a voz mansa e dizendo manter a palavra quando, no caso, o que fazia era bem diferente do combinado. A fome com que estava agora o comprovava.

E Alex tinha motivo o suficiente para mentir. A começar pela ferida em seu braço, agora escondida pelas bandagens. Podia sentir o cheiro de sangue vindo dela, ainda fresco. Estava mais do que ciente dos ferimentos de sua Pokémon, causados pelo breve momento em que trocara ataques com ela. Talvez houvesse ressentimento de sua parte. Talvez quisessem achar uma forma de se vingar.

É claro, também tinha o fato de que Poochyena não se sentia lá tão confortável assim quanto a aceitar a proposta de ficar e ser seu Pokémon. Afinal, ficaria a maior parte do tempo confinado numa Pokéball, saindo apenas para batalhar ou para comer, se é que o treinador fosse realmente querer ficar com ele.

Em outras palavras, pertenceria ao um treinador novamente, estando a mercê de seus comandos e de sua vontade.

E o Poochyena não pertencia a ninguém. Era sozinho, independente. Aqueles que tentaram capturá-lo sabiam muito bem desse fato. Porque, então, se deixaria aceitar as gentilezas de um humano tão incomum quanto Alex?

A resposta veio antes mesmo que pudesse terminar a pergunta. Os motivos para aceitar eram simples. Primeiro, ele não tinha e muito menos sabia para onde ir. Fora capturado por algum outro humano, e fugira deste por pura sorte e mais alguns estragos. Quando finalmente conseguira se afastar o suficiente, se encontrou num lugar completamente desconhecido e, pior ainda, não conseguia caçar ali. Estava há dias sem comer, incapaz de conseguir qualquer coisa que fosse. Vira-se faminto e desesperado a ponto de atacar vários treinadores, incluindo Alex, o único que conseguira chegar perto o suficiente de fugir.

Ficar com um treinador, além de tudo aquilo, significava ter comida para todos os momentos em que se sentisse faminto. Significava, também, uma vida de treinos constantes, batalhas, e até apresentações, coisa que até admitia que gostava. Em partes.

Seria aquela uma boa opção?

"Você pode muito bem se virar numa floresta nova e ser capaz de se cuidar", uma parte de si dizia, "Mas você sabe que não vai conseguir" a outra apontava, e essa era uma verdade não admitida que doía. "Sabe que é fraco demais pra sequer conseguir um território e protegê-lo. Sabe que também há riscos daquele cara te encontrar de novo, e não vai conseguir fugir de novo depois."

Ah, sim, ele sabia. Mas tinha medo, receio de aceitar pelo menos a comida. Hesitava em respondê-lo, e ainda por cima, medo da garota que até agora, não se fizera presente.

Mas também não podia ficar calado por tanto tempo.

— ...E ela? — O cão perguntou após vários momentos de silêncio, apontou Margareth com o focinho. — Você a capturou, também?

— Maggs? — Alex ergueu as sobrancelhas, surpreso e duvidoso da pergunta ao mesmo tempo. — Ahn, meio que sim e meio que não.

— Nós somos amigos. — Margareth se apressou em responder, exibindo um sorriso. Lembrava a Alex uma criança eufórica em contar uma novidade e isso fez com que sorrisse. — Ele me deixa ir embora a qualquer hora. E eu também quase nunca fico na Pokéball. Não é verdade, Alex?

— Ah... Sim. — Demorou em assentir, um tanto confuso. — É isso mesmo.

Silêncio foi a única resposta do cãozinho cinza. A mente estava bagunçada, repleta de pensamentos retrucando a ideia de outros. Apresentavam diversos argumentos diferentes, estando difícil de se concentrar e achar uma opção para escolher. E o fato de que podia sentir o cheiro da comida cada vez mais perto de estar pronta também não ajudava. Fazia-o perder a concentração e pensar com o estômago ao invés da cabeça. Podia até sentir e ouvir ele se revirando, clamando por comida e restaurar as forças perdidas. Se fosse apenas por aquele ele motivo, ah, sim, ele queria aceitar. E muito.

— Eu... Posso comer e pensar um pouco? — Desviou o olhar, e finalmente se sentou na grama. — Sobre ficar com você como seu Pokémon você, quero dizer.

— Claro, ué — respondeu franzindo o cenho, como se aquilo fosse algo completamente óbvio e não houvesse a necessidade da pergunta. — Só espera um pouco, uhm...?

— Linus — murmurou. O bom daquela situação, ao menos, era tem um nome do qual poderia ser chamado.

Alex meneou a cabeça, em sinal de concordância.

— Ah, sim. Bom, então só espera um pouquinho, Linus, que a Chiyo está, uh, fazendo o almoço ainda.

Ao término da frase, ele olhou para um canto, resmungando sobre querer ajudar ao invés de deixá-la fazer tudo por ele. Isso fez com que Linus erguesse as sobrancelhas, embora aquele não fosse o foco de sua atenção.

O que realmente estava preocupado em pensar era no agora. Porque os momentos seguintes pareceram um pouco surreais para o lobo cinza. No começo, ficara no lugar, o grupo todo ouvindo apenas o crepitar do fogo e alguns poucos sons emitidos por Chiyo e Natsuhi. Depois, Margareth pareceu entediada e começou uma conversa qualquer com Alex, e, em algum momento, arrastou Linus para ela. Apesar de suas claras respostas secas e curtas — indicio claro de que preferia ficar calado em seu canto —, continuaram a tentar puxá-lo para algum assunto. Perguntaram sobre o motivo de estar ali e com fome, e aquele foi um dos momentos que a tensão sobrepôs o aborrecimento.

Linus não iria contar o motivo de estar ali. Simplesmente não podia dizer os meios que usara para parar numa floresta e correr o risco de Alex o olhar estranho. Talvez ele nem oferecesse mais a proposta de o cão o acompanhar, e aí Linus faria o que? Morreria de fome? Muito provavelmente.

Por isso, o lobinho cinzento deu uma resposta vaga sobre a vida na floresta ser difícil. Alex e Margareth pareceram tremendamente surpresos com o fato, e quiseram saber mais sobre o assunto, a fim de comparar as diferenças dentre ambas as vidas.

Isso não deu muito certo para o canídeo, como era de se esperar. Ele era melhor ouvinte do que falante, principalmente quando a timidez misturada à desconfiança se fazia presentes. Afinal, era pessoa que acabara de machucar e que acabaram de machucá-lo. Como poderia ele agir normalmente quando os efeitos desses momentos ainda estavam vivos em sua mente?

Foi praticamente um alívio quando Chiyo finalmente anunciou o almoço, tanto pela comida em si quanto pela conversa ser interrompida. Em pouco tempo, a refeição foi praticamente limpada do pote dado, arrancando um olhar curioso de Chiyo. Trocou algumas poucas palavras com Alex sobre a situação, e no fim, trouxe um segundo pote de comida a ele e um de água, o que Linus teve dificuldades em agradecer. Depois disso, desapareceu em direção ao rio com a camisa ensanguentada, deixando-os a mercê do silêncio novamente.

Dessa vez, Linus fez questão de demorar em sua comida. Agora que a barriga não clamava pela comida e não trazia o desconforto irritante para tal tarefa, podia pensar com mais coerência e decidir melhor o que faria.

Mas essa era uma tarefa difícil de ser cumprida. A dúvida ainda parecia grande, a desconfiança e o receio, ainda maiores. Impediram-no de dar a resposta até que terminou a comida, novamente sem deixar nenhum resquício que fosse de que havia alguma coisa ali.

— Certo, eu vou com vocês. Por enquanto. — Adicionou rapidamente. — Mas com algumas condições.

Um sorriso de animação se abriu no rosto de Alex, assim como em Margareth, ambos assentindo desajeitadamente. Isso fez com que com que o Poochyena hesitasse por um momento, confuso. Estaria Alex tão feliz assim?

— Uh... — O murmúrio saiu baixo e hesitante, completamente o oposto do que queria. Por isso, pigarreou, adotando uma expressão séria. — Para começar, não quero ficar na Pokéball. Não quero também ter que viajar sempre ou não poder sair sem você deixar. E também não quero ser obrigado a entrar numa batalha. Se eu disser não, então é não.

O menino franziu o cenho.

— Mas eu já ia fazer isso sem você pedir...

— B-bom, se você aceita... — Continuou, ignorando-o completamente. — Então eu posso viajar com você como seu Pokémon.

— Certo, certo. — Sorriu. — Eu aceito então.

Linus assentiu, satisfeito.

— Você vai juntar insígnias ou vai para as apresentações chatas?

— Ginásios. — Foi Margareth quem respondeu por ele, parecendo orgulhosa. — Não começamos há muito tempo, também. Só estamos treinando para conseguir nossa primeira insígnia, mas não quero descartar esses tais Contests, também.

— Iniciantes, eh? — Ergueu uma sobrancelha, curioso. — Tudo bem, então. Quando começam a treinar?

A partir daí, o menino lhe contou seus planos, porém de forma meio receosa, quase como se esperasse pela aprovação do pequeno. Nesse meio tempo, Natsuhi passou para recolher as panelas, pratos e para apagar a fogueira. Segundo ela, sairiam em pouco tempo, então era melhor que se preparassem, e rápido. Isso surpreendeu o Poochyena, logo sendo avisado do motivo para o tal: a ferida de Alex. Chiyo queria pelo menos, vencer uma distância grande o suficiente para chegarem a Violet ainda naquela tarde, coisa que certamente seria possível se caminhassem rápido o suficiente.

Basicamente, foi aquilo que aconteceu nos momentos seguintes, e eles pareceram os mais surreais até então para Alex. Nunca pensara que a sua primeira captura seria feita daquela forma, e muito menos pensara que o Pokémon estaria andando ao seu lado tão logo como fazia agora. Parecia uma coisa improvável demais até pra ele, que não pensava que conseguiria fazer uma captura tão cedo, quanto mais daquele modo.

Acabou balançando a cabeça para aquele estranho fato, preferindo caminhar do que aborrecer-se com os pensamentos. O dia se seguiu silencioso, o sol incomodando seus olhos e fazendo o menino protegê-los com uma mão acima da testa. Resmungava vez ou outra sobre comprar algo para proteger-se em dias assim, mas, fora isso, apenas Chiyo trocava algumas poucas palavras com Natsuhi antes de serem deixados sob uma espessa nuvem de silêncio.

Não era exatamente como se pudessem falar alguma coisa, de qualquer forma. Tentavam não fazê-lo para caminhar, poupando o fôlego já gasto de se perder mais ainda com as conversas. Afinal, Chiyo os apressava a todo momento para caminharem mais rápido, seja andando a muitos metros a frente de Alex, Margareth ou Linus ou resmungando alguma coisa entrecortada pela respiração.

Essa tarefa, porém, mostrou ser algo nem um pouco fácil de se cumprir, principalmente para o garoto. Para começar, Alex continuava cansado, já dando sinais de uma possível febre no fim do dia. Ofegava mais e andava num ritmo lento, até mesmo parando ainda mais metros atrás de Chiyo, tendo de correr para alcançá-la. Os pés, repletos de bolhas, doíam a cada passo, e a costas também não ajudavam doendo com o peso que tinham de carregar, da mochila e de Margareth quando a pequena cansou-se de andar.

E Chiyo, é claro, sempre o apressava, ignorando completamente seus protestos e pedidos para parar. Somente quando o céu passou a anunciar a noite com os tons de laranja e o sol se recolheu por entre as montanhas, foi que Chiyo finalmente ouviu os pedidos de Alex e decidiu parar. Resmungou algo sobre não conseguirem chegar naquele dia, e mais uma vez, pôs-se a procurar um local próximo ao rio.

Passaram a procurar, então, a lenha para a fogueira, outra tarefa consideravelmente difícil para Alex. Assim como as outras, não podia realizá-la com aquele machucado, então a tarefa ficou mais para Chiyo do que para ele. Sobrava apenas a opção de a menina ignorar os protestos e resmungos irritados dele para pegar os gravetos logo, já que, afinal, também queria fazer a fogueira logo e descansar ao lado da irmã. Por isso, procurou fazê-lo rápido, dando uma breve examinada nos galhos e troncos que puxava para os braços antes de decidir de o levava consigo ou não.

Isso, é claro, até que uma voz interrompesse o grupo em sua caminhada.

Na verdade, não era exatamente uma voz. Estava mais para um piado irritado, semelhante a muitos dos que já ouvira naquela manhã, motivo pelo qual nem ela e nem a irmã deram tanta atenção assim ao ocorrido. Apenas Alex o fez, atraído pelas palavras provavelmente pertencentes a um Pokémon.

— Chiyo, espera.

O aviso, porém, veio um pouco tarde demais, além de, é claro, acompanhado de um suspiro cansado.

— Alex, já te disse que eu não vou parar em qualquer lugar — reclamou, interpretando aquilo como outro dos pedidos para o tal. Muitos deles, inclusive, haviam começado daquela mesma maneira.

— Não é isso, eu...

A frase foi cortada ao meio. Novamente, o piado se fez presente, dessa vez mais alto e repleto de fúria. Depois, um pássaro na cor negra bateu suas asas na direção da menina, tão rápido que pareceu um borrão, de modo que Chiyo apenas concluiu ser uma ave pelo piado estar vindo dele.

A partir daí, as coisas ocorreram um pouco rápido demais. A ave deixou de ser apenas um borrão parar virar um mar de penas negras desprendendo-se de seu corpo e flutuando por poucos segundos antes de repousarem sobre o chão.

Pelo menos dessa forma, Chiyo pôde identificá-lo facilmente como sendo um Murkrow. Um corvo grande até para o normal, as penas quase brilhando de tão negras. O bico longo num tom amarelo, presente tanto ali quanto em suas patas. Já a cauda, por sua vez, dava a impressão de ser mais peluda do que lhe seria possível, como um tufo de penas bagunçadas, enquanto as asas eram grandes e majestosas, motivo pelo qual podia erguer-se no ar.

Esta, porém, de longe a maior peculiaridade do pássaro. Seus olhos sim eram um aspecto curioso. Um colorido pelo vermelho-sangue e brilhante por tamanha irritação, enquanto o outro estava firmemente fechado, uma cicatriz cortando-o ao meio ao meio.

— Chiyo! — Veio o protesto de Alex, acompanhando o do Murkrow. — Aí, viu o que você fez?

A menina piscou, confusa.

— O quê?

— Você pisou no vidro dele.

— Pisei? — Piscou novamente, recebendo uma afirmação irritada do pássaro.

Olhou para irmã, confusa. De resposta, Natsuhi apenas fez um gesto para que erguesse o pé, e ela assim fez. Como haviam dito, diversos e pequenos pedaços de vidro estavam espalhados, cacos brilhantes e pequenos demais o que seriam originalmente.

— Ah — murmurou. — E o que tem?

— Aparentemente, era o vidro dele. — Foi a resposta de Natsuhi, indicando o corvo em seguida. — Ele está bravo porque você quebrou.

Seus olhos encontraram os do pássaro, preferindo isso do que dar atenção aos olhares reprovadores que recebia. Os do corvo pareciam chorosos e irritados ao mesmo tempo, pendendo mais para o lado choroso do que para o segundo. Olhavam para os pedacinhos esmagados, piando baixinho ocasionalmente enquanto tentava puxá-los para si com os pés. Porém, acabou pensando duas vezes, e decidiu que não era uma boa ideia, então apenas continuou a choramingar.

— Que coisa feia, Chiyo. — Reprovou Alex, balançando a cabeça de forma nem um pouco feliz. — Tsk, tsk.

— Ah, mas você queria que eu tivesse feito o que? Estava distraída. — A garota ergueu uma sobrancelha. — Não foi minha culpa.

— Foi sim. — Natsuhi apressou-se em dizer. — Ele disse que avisou, mas você não ligou e pisou mesmo assim.

— Eu não entendo todo Pokémon que me aparece. Além disso, quem manda ele deixar as coisas largadas por aí?

Franziu o cenho para um dos pensamentos, daqueles em que não queria exatamente compartilhar. Para começo de conversa, porque um Murkrow tinha um vidro?

— Mas ele falou que você é má e cruel. — Alex continuou, sem deixar o tom reprovador. — E que ele quer outro vidro.

Para acompanhá-lo, Chiyo manteve sua resposta.

— Não vou pagar vidro nenhum. A culpa disso não foi minha.

E com isso, continuou caminhando, fazendo questão de esmagar o restante dos cacos mais uma vez. O restante do grupo fez o mesmo, curiosos em descobrir o desfecho da situação.

Piados se fizeram ouvir, completamente incompreensíveis aos ouvidos da menina. A tentativa de ignorá-los parecia cada vez mais difícil, considerando a irritação com que o Pokémon continuava a piar. Foi vendo Chiyo caminhar para longe que ergueu suas asas e avançou rapidamente para ele, praticamente ignorando qualquer outra coisa. Aos poucos, os piados lhe chamavam a atenção, já que, afinal, não possuíam mais o aspecto de meros piados.

Palavras. Sim. agora haviam se transformada em palavras, ditas tão rápida e afobadamente quando o tom irritado de sua voz.

"...Meu vidro!" Essa foi uma das poucas e únicas coisas que pôde realmente identificar do pokémon, antes de a frase terminar.

Porque agora Chiyo tinha coisas mais importantes para se preocupar. Como por exemplo o fato de que o Pokémon avançava em sua direção de uma maneira violenta, e certamente sem a intenção de desviar no final. Foi quase por puro impulso que a menina emitiu um resmungou antes de afastá-lo com um tapa, vendo se este era o suficiente para fazê-lo parar de acusá-la pelo o que não havia feito intencionalmente.

Isso, porém, pareceu estar bastante longe o momento. O pássaro voltou até ela, encarando-a com fúria com seu único olho aberto.

Mais uma vez, suas palavras se fizeram presentes, fazendo-a piscar ao encará-lo.

"Eu quero outro vidro."

— Chiyo, ele quer outro vidro. — Veio a voz de Alex, correndo para alcançá-la. Aparentemente, ele não percebera que a menina podia ouvir a voz do pássaro, também.

— Ele que arranje sozinho, então.

Outro piado, dessa vez incompreensível.

— Mas Chiyo, ele tá dizendo que foi culpa sua.

Resmungou em resposta. Os punhos passaram a se cerrar cada vez mais, as unhas afundando na própria pele. Sucesso parecia não ser uma palavra na lista de coisas que Chiyo conseguiria no momento, a considerar a dificuldade encontrar em ouvir apenas os pensamentos.

Irritação. Aborrecimento. Uma grande vontade de dar outro tapa no pássaro negro novamente para ver se ele parava. Não só dele, como também em Alex, ou não tinha certeza se seria capaz de aguentar aquilo por muito tempo. Talvez até conseguisse. Se, é claro, a voz de Alex não se fizesse presente de novo.

— Chiyo, o vidro — insistiu ele, um sorriso maldoso brincando em seus lábios. Acompanhado do pássaro, este piou diversas vezes, cada vez mais irritado. — Chiiiiyo, é o vidro que ele coloca no olho, Chiyo. Você vai ser tão má assim? Chiyo, Chiiiiiiiyo ~

— Espera, é um olho falso? — Parou por um momento, olhando para Alex. O menino hesitou por um momento, surpreso com a súbita mudança, mas assentiu, assim como o corvo.

"É sim. E você, sua pessoa má e cruel, quebrou ele todo!" Mais uma vez, ele choramingou. Bem, ao menos, aquilo explicava o porquê de ele estar limitando a própria visão. "Meu vidro..."

Um suspiro. Se aquele era o caso, então... Bem, era um problema. Um certamente desagradável, que a fazia morder o lábio em dúvida e sentir uma sensação estranha de culpa a incomodando, impelindo-a a abrir a boca para falar.

— Ugh, tá, tá, eu compro outro vidro pra você. — Desistiu com um segundo suspiro, finalmente ganhando espaço do Pokémon negro para caminhar.

O corvo bateu as asas ao seu lado mais uma vez, estufando o peito e emitindo um piado de triunfo. Isso fez com que Chiyo o encarasse, em curiosidade muda. Primeiro porque o olho com a cicatriz lhe chamava a atenção, e segundo porque aquilo a aborrecera um pouco, tinha de admitir.

"É bom mesmo que compre" disse, erguendo o queixo em sinal de protesto e para tentar parecer um pouco mais agressivo do que realmente seria. Depois, encarou-a novamente. "Tu vai pra Violet, né?"

— Sim, vou. — Meneou a cabeça. A resposta pareceu surpreender Alex, a considerar o som que ele fez ao ouvir, chamando a atenção mas sem realmente interromper.

"Certo, então eu vou também!" exclamou, surpreendendo a garota. "Vou com você até me comprar outro vidro, pra te vigiar se vai mesmo."

Como resposta, Chiyo apenas deu de ombros.

As coisas que aconteceram nos momentos seguintes pareceram um pouco... Surreais. Como se nada houvesse acontecido, o grupo voltou a procurar algum lugar para fazer o acampamento, agora com um corvo os seguindo.

Nesse meio tempo, Chiyo descobriu com a ave que ele se chamava Yatagarasu e que o vidro que tanto falava nada mais era do que uma pequena esfera meio desproporcional que, como dissera a Alex, colocava em seu olho. Não contou o motivo, mas disse que por isso deixava aquele único olho fechado, alegando que certamente assustaria os outros caso optasse pelo contrário.

Porém, o fato de ela ser desproporcional não ajudava muito, pelo contrário. Estava até se tornando comuns os momentos em que a esfera caia no chão, obrigando-o a procurar até por horas a fio até encontrar novamente. Afinal, não podia simplesmente arranjar outra em uma floresta, e manter um dos olhos fechados era uma tarefa desconfortável. Então, era mais do que lógico que obrigasse Chiyo a lhe dar outra, nem que tivesse de acompanhá-la até Violet e então voltar.

Com um tanto de culpa a incomodando, continuaram a buscar galhos e folhas secas para fazer a fogueira, e assim que tiveram o bastante, encontraram um lugar para passarem a noite, novamente próximo ao rio. A fogueira foi organizada e o jantar passou a ser feito, tudo isso feito sobre o olhar vigilante da ave, quase como se Yatagarasu estivesse se certificando que Chiyo não fugiria sem lhe pagar.

Não passaram muito tempo acordados, apesar da vontade. O dia fora cheio para todos eles, principalmente para Alex. Os pés doíam, e as pernas clamavam por um descanso, além de a barriga certamente não estar ajudando em anunciar a fome a cada segundo. O único que pareceu não se importar em dormir sem um jantar foi Alex, quase adormecendo antes mesmo de Chiyo começar a prepará-lo. Só não o fez realmente porque a garota ainda precisava trocar suas bandagens e não o permitiu até que tivesse comido.

Com Alex indo dormir logo após comer, não sobrou muita coisa para o restante do grupo fazer. Apenas contou a Natsuhi e Yatagarasu o que planejava no dia seguinte e alimentou o fogo um pouco mais. Porque, depois disso, a ave se retirou para uma árvore próxima, e as duas decidiram que seria melhor dormir um pouco. Chiyo, então, dirigiu-se ao seu saco de dormir, e assim, a noite se arrastou.


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Notas finais do capítulo

As falas da Natsuhi e do Yataragasu estavam entre aspas porque estava na narração da Chiyo (magias de terceira pessoa), e como já foi dito antes, ela não entende exatamente os Pokémons como o Alex faz, e às vezes pode sempre ocorrer de Chiyo não entender completamente ou saber só do contexto da frase.

Oh welp, eu vou TENTAR não atrasar mais. Sim, confesso que vou me sentir desconfortável postando sem ter pelo menos três capítulos adiantados, mas welp, é a vida, né? Vou ver aqui o que faço pra sair desse wild block que resolveu me atacar e revejo algumas coisas da fic. @_@

Ah, é, cês lembra lá daquela fic que aparecia a Alyss de H&H também? Uma que estava em hiatus e tal... Então, parece que a tia que escreve voltou com a fic e está postando regularmente agora. Aqui o linko pra quem quiser: https://fanfiction.com.br/historia/644496/AttheEdgeofOurSin/

Anyhoos... Agora queridos, me retirarei para os confins do word pra terminar mais um capítulo e programar a postagem do outro já. u_u

Até a próxima semana~