Survive escrita por Allye


Capítulo 2
Capítulo 2 - Pesadelos


Notas iniciais do capítulo

Não tenho palavras.



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Eu não sabia onde estava. A escuridão tomava conta de tudo ao meu redor, trazendo a sensação de que eu estava sendo sufocada. Ouvia passos em um local próximo, mas meu corpo parecia incapaz de se movimentar. Os sons de pessoas andando aumentaram gradualmente, começando a se misturar com vozes que logo se tornaram gritos. Gritavam meu nome, choravam de forma desesperada. Então logo reconheci o espaço apertado que eu estava. Um caixão. Memórias agora apareciam de uma forma descontrolada. Eu havia estado nos Jogos Vorazes. Eu não havia sobrevivido. Eu estava morta.

— Nina. — Ouvi a voz de meu pai. Uma pequena luz parecia entrar por alguma fresta, mas não o suficiente para iluminar qualquer coisa — Acorde.

Um carreirista cortara minha garganta, fazendo com que eu caísse ao chão branco e gelado. Um caixão com meus restos mortais chegara ao Distrito 5, com o anúncio do horário em que meu corpo seria velado. A notícia era muito pesada para que meu pai contasse para minha mãe - ela provavelmente nunca descobriria.

— Você vai se atrasar, acorde logo.

Meus olhos se abriram de imediato. Meu corpo ficou ereto sobre a cama, minha respiração arfante e meu coração batendo em um ritmo acelerado e desesperado. Eu não estava morta, eu não estivera presente nos Jogos Vorazes. Fora apenas um pesadelo que me consumira pelo nervosismo que era estar no dia da colheita.

Esfreguei os olhos, soltando um suspiro de alívio ao perceber que minha realidade era um tanto melhor do que estar morta. Joguei minhas pernas para fora da cama e me forcei a levantar, andando em passos rápidos até o banheiro. Arranquei os últimos pedaços de roupa que vestia e me afundei na água gelada, deixando apenas meu rosto e meus cabelos para fora da pequena banheira, esfregando cada parte de meu corpo com delicadeza e precisão. Se arrumar para um sorteio mortífero virara uma tradição nos distritos, principalmente causada pela pressão dos seres ricos da Capital, querendo mostrar nosso melhor lado para um reality show.

Quando me levantei, colocando uma toalha por cima de meu corpo, me senti observada. Olhei para a porta de meu quarto e vi minha mãe, apoiada da antiga maçaneta para se manter em pé sem muito cansaço. Ela mantinha um sorriso pleno em seu rosto, mesmo com toda a preocupação e dor que eu sei que a consumia. Andei em passos rápidos até ela e a ajudei a chegar até minha cama, onde ela sentou-se, aliviada por não precisar fazer esforço algum.

— Você não deveria sair de seu quarto, mamãe, sabe que qualquer esforço te deixa exausta.

— Eu estou com câncer, Nina, mas não sou uma criança incapacitada de andar em minha própria casa. — Ela suspirou, apontando para minha cômoda, onde minhas poucas roupas estavam guardadas — Use o amarelo. O que tem o laço branco.

Andei, segurando firme a toalha contra meu corpo. Abri a segunda gaveta, retirando o vestido que ela requisitara e me vesti. Ele estava um tanto apertado, mas não liguei - o sorriso que minha mãe agora me mostrava fazia com que valesse a pena.

— Descanse, tudo bem? — beijei seu rosto, logo penteando meus cabelos com os dedos, colocando meus sapatos ao mesmo tempo. — Daqui umas horas eu já estarei de volta.

Deixei com que ela ficasse deitada em meu quarto, destrancando a porta dos fundos quando passei pela cozinha. Esperava que Aiden fosse silencioso o suficiente para assistir a colheita sem que minha mãe percebesse. Não seria fácil dar uma explicação plausível caso eles se encontrassem.

Assim que passei pela porta um vento fraco bateu em meu rosto. Desci os dois degraus até que meus pés alcançassem a rua de terra. Os meus sapatos brancos provavelmente chegariam sujos e manchados pela terra avermelhada em que agora pisavam de forma frenética, em uma corrida para alcançar a praça central. Se eu chegasse atrasada não fazia ideia de o que os pacificadores poderiam fazer para castigar minha irresponsabilidade. Entrei na fila já afobada com a falta de ar que a longa corrida me proporcionara. Havia apenas mais duas pessoas em minha frente, então logo meu dedo fora espetado e meu sague marcado em uma folha do livro de presença, logo ao lado de meu nome, escrito em letras maiúsculas e com pouco espaço entre elas.

O grupo onde as garotas de minha idade se encontravam estava mais ao fundo, então logo me enturmei em meio a elas, fazendo com que minha presença não fosse notada. Todos se vestiam com cores fracas, todos fazendo ao máximo para não chamar a atenção. As câmeras e um número grande de pacificadores nos observavam enquanto os últimos preparos estavam sendo completados para dar início ao pequeno evento.

— Sejam todos bem vindos a trigésima edição dos Jogos Vorazes — Luuk Hooligans apareceu no palco em frente ao microfone prateado. O metal que compunha o aparelho brilhava menos que seu cabelo extremamente claro e platinado. — Antes de darmos início, assistam um vídeo que trouxemos especialmente da capital para vocês!

Todo o tempo que ouvia o repetitivo vídeo encarava o chão. Milhares de coisas passavam por minha cabeça ao mesmo tempo. Cantarolava uma música mentalmente, logo me desligando de tudo o que acontecia ao meu redor. Até então escutá-lo.

Nina Maghal Hale.

Meu olhar se ergueu, já cheio de lágrimas. Não poderia ser verdade. Fiquei paralisada em meu lugar por alguns segundos até que a garota que estava ao meu lado me empurrasse, deixando extremamente claro que ninguém iria se voluntariar por mim e que eu era a escolhida. Engoli em seco e comecei a caminhar em direção as escadas laterais, que me levariam até o palco. Antes que eu conseguisse chegar ao topo, um grito ecoou pela platéia antes silenciosa.

— Não — Olhei para a direita, vendo a silhueta de Aiden tentando passar por um grupo de pacificadores. O desespero em seus olhos era visível mesmo com toda a distância entre nós. — Nina, não, deixem ela em paz!

Tentei correr em sua direção, mas Luuk me puxara para o lado dele e segurava meu braço com força, mantendo um sorriso em seus lábios lotados de maquiagem.

— Já temos um voluntário? Qual é seu nome, jovem?

Aiden não poderia se atrever a fazer isso. Se ele não se contesse e fosse embora, nunca o identificariam e descobririam seu segredo. Mas ele insistia em continuar ali.

— Meu nome é Aiden Scarevith, e estou me voluntariando — ele disse em um tom mais calmo, porém tão firme e alto quanto antes — Não vão conseguir me identificar, pois meu nome nunca esteve na colheita. Eu nunca sequer fui registrado.

Ele havia acabado de revelar um dos maiores crimes que o Distrito já havia visto. Os pacificadores esperavam por alguma ordem enquanto o silêncio se estabelecia entre os jovens e adultos que encaravam a cena confusos. Pude ver um homem e uma mulher da capital conversando, logo dando ordens para o chefe dos pacificadores.

O homem vestido de branco, o qual nunca pude ver o rosto covarde, se aproximou do garoto que eu tanto amava, o deixando de joelhos no chão. Meu corpo ficou travado, sem conseguir nem ao menos piscar. Uma arma apontou para sua cabeça e, quando o barulho ensurdescedor do tiro ecoou, eu caí juntamente a ele. Gritos ecoavam de minha garganta em completo desespero, enquanto via uma poça de sangue se estender ao redor dos cabelos morenos e a face pálida.

Aiden estava morto. E eu seria enviada para os Jogos Vorazes.


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