So I hope you see

That I

Would love to love you

And that she

Will cry

When she learns we are two

If I fell in love with you

(The Beatles)

Pov. Stiles

Eu estava anotando freneticamente no quadro.

Dr. Valack.

The Dread Doctors.

Correntes telúricas.

Depois da agradável experiência que tivemos no Eichen e de uma explicação do que tinha ocorrido, Scott e Kira foram para a clinica veterinária checar as câmeras de segurança, e eu convenci Lydia a ler o livro na minha casa, com medo de que as "memórias reprimidas" provocassem alguma coisa.

Desde que ela saiu do hospital, eu não me sentia muito confortável em não estar perto dela.

–Sabe, você devia descansar um pouco - ouvi a Banshee dizer. Ela estava deitada na minha cama, lendo o livro - não parou de analisar esse quadro desde que chegamos.

A encarei mordendo minha caneta . Ela sempre dizia que eu ficava parecendo um cachorro mordendo um brinquedo quando fazia isso.

–Eu tenho que fazer alguma coisa enquanto você não tem um "ataque" ou coisa parecida - disse ainda com a caneta na boca, a fazendo rir.

–Que gentil, mas eu te disse que ficaria bem lendo sozinha- ela falou virando mais uma página do livro.

"E eu não ficaria" me impedi de dizer.

A encarei enquanto ela lia freneticamente. Sempre me perguntei como ela fazia para ler tão rápido e entender o que os textos diziam.

–Stiles, você está fazendo de novo- afirmou ela sem desviar os olhos do livro.

–Fazendo o quê?

–Me olhando com a cara de "você poderia ter morrido antes, agora não vou te deixar sozinha".

–É... Bem... Resume bem o que eu quero...

–Stiles -ela me interrompeu, fechando o livro e se sentando- você não precisa se preocupar comigo. Estou bem.

–Você foi atacada por uma quimera e passou por uma cirurgia. Não acho que essa é a definição de bem- falei me sentando na cama ao seu lado, e colocando minha mão sob a dela.

–E você?- ela perguntou receosa.

–E eu o quê?

– Você vai me contar o que aconteceu com você ?

A encarei estático. Era impossível ela saber sobre o Donavan. Certo?

Antes que eu pudesse responder, nossos celulares vibraram ao mesmo tempo. Nunca um bom sinal.

–É o Scott, "Venham para o Nemeton. Agora."- li já me levantando e pegando as chaves do Jeep que estavam na minha cômoda.

[...]

Assim que entramos no carro, a chuva começou a cair forte, o que dificultava eu me guiar pelas ruas. Os vidros do Jeep sempre embaçavam muito, conforme eu corria mais, o barulho do motor se tornava insuportável. Torci para que ele não pifasse no meio da estrada.

–Stiles, você está com dor ainda?- Lydia me perguntou preocupada.

–O que? Dor?- disse soando como uma criança que mente para os pais.

–No seu ombro- a ruiva falou levantando a mão e quase a colocando no ponto que doía mais.

– Lydia não, por favor -choraminguei.

Ela puxou minha camiseta, revelando um curativo mal feito que eu tinha colocado ali pela manhã.

–Sti... Stiles...- ela passou a mão pelo curativo, me fazendo recuar um pouco- Me desculpe- ela me olhou assustada.

Eu encostei o carro. Ficamos minutos em um silêncio desconfortável, só ouvindo a chuva e o barulho da respiração um do outro.

–Stiles, me conta o que aconteceu - ela disse docilmente, tirando minhas mãos do volante e as segurando.

–Por que? Você já sabe, não é? - perguntei ofendido. Tinha percebido que as "Vozes" provavelmente me denunciaram.

–Sim, eu sei - ela admitiu - de inicio eu achei que fosse só mais um pesadelo, mas... - ela me olha com algumas lágrimas nos olhos - bem, eu acho que a nossa conexão ainda está aqui não é?- ela diz tentando forçar um sorriso.

Eu respiro uma vez. Duas. Três. Lydia ainda me olha compreensivamente, sem me apressar.

–Na... Na noite passada... Eu tinha ficado até tarde na biblioteca, lendo o bestiário - comecei inseguro. Ela fez um gesto para que eu continuasse - e quando eu fui ir embora essa droga de Jeep não pegava, e eu estava consertando ele quando... Quando o Donavan apareceu - falei me sentindo meio tonto.

–Ele... Ele te fez isso? - ela me peguntou apontando pro curativo. Sua voz soava apavorada, mas a expressão continuava terna.

–Sim, foi ele. Ele era um tipo de Wendigo, eu não sei... Ele tinha... Bocas nas mãos, no pescoço e aqueles dentes enormes - engulo em seco, me obrigando a continuar - Ele me atacou, eu consegui desviar e correr para a biblioteca. Quando eu cheguei lá, me escondi, e ele me contou... - parei, tentando evitar chorar - uma história... De como o meu pai estava sentado inutilmente na viatura, pedindo reforços, enquanto o parceiro dele estava sozinho num tiroteio. O parceiro era o pai do Donavan. E ele... Ele foi atingido e... Acabou ficando paraplégico. O Donavan acabou me achando e nós brigamos... Eu subi num dos andaimes que estavam lá, ele veio atras... Segurando minhas pernas. Eu acabei puxando uma alavanca do andaime, e os materiais caíram em cima dele... E ele... Ele... -respiro fundo três vezes- ele foi atravessado por uma barra de metal - finalizo não conseguindo mais conter minhas lágrimas, que desciam teimosas pelo meu rosto.

Quando acabei de contar, não me senti aliviado como deveria. Só em completo pavor. Até aquele momento eu não tinha admitido para mim mesmo o que eu era. Um assassino. E desta vez, não tinha demônio nenhum para eu culpar. Imediatamente, minha visão começou a ficar turva, eu me senti tonto, e comecei a hiperventilar.

–Stiles, olha pra mim - Lydia disse firme, olhando nos meus olhos, e colocando as mãos no meu rosto - só... foca no som da minha voz. Feche os olhos e prenda a respiração.

A obedeci, contando até 10.

–Lydia... Não ... Não tá... - tentei dizer antes de abrir a porta do carro, saindo correndo na chuva.

–STILES - gritou ela indo atras de mim - espera - a ruiva segurou a manga da minha blusa, me obrigando a virar e encara-lá.

Nós dois estávamos completamente molhados, e a chuva parecia aumentar. Antes que eu pudesse pensar, ela me dá um tapa. Eu a olho surpreso e confuso por uns 3 segundos, só então percebo que agora consigo respirar normalmente.

Ainda atônito, ela me abraça, chorando, colocando os braços ao redor do meu pescoço e me apertando contra seu corpo. Eu retribuo, a abraçando forte.

–Me desculpa, eu... Não sabia outro jeito de te fazer prender a respiração - ela diz com a cabeça em meu peito.

–Tudo bem. Acho que é a primeira vez que eu fico feliz por receber um tapa. Aliás, você bate muito bem - digo, a fazendo rir.

–E, sempre que você tiver um... Ataque de pânico, eu vou para-lo - ela diz se afastando minimamente, para olhar nos meus olhos, sorrindo - ou... Se precisar conversar, eu vou ouvir. Eu sei o que você está pensando, e não. Você não tem que te culpa pela morte do Donavan. Foi auto-defesa Stiles, era ele ou você.

–Mas eu...

– Eu sei como você se sente - ela diz ficando na ponta dos pés, encostando a testa na minha - mas olha nos meus olhos Stiles, e ouve bem o que eu vou te dizer. Se você se sentir culpado de novo, eu quero que você se lembre que isso não foi sua escolha, era uma questão de vida ou morte. E eu iria ficar muito irritada se você morresse.

Eu a encaro perplexo. Ela me olha feliz, rindo. Mas eu a conheço. E sei que esse olhar é o jeito dela de me dizer que está feliz que eu ainda estou vivo. Eu sei que ela ficaria devastada com a minha morte, então ali na chuva, todo encharcado, faço uma promessa. Eu nunca irei morrer antes dela, nem que isso me obrigue a tomar vários remédios para o coração, a usar máquinas para respirar, o que for. Eu sempre vou estar aqui para ela, assim como ela sempre vai estar aqui por mim.