Bloody Queen escrita por Alyss Meryan


Capítulo 3
CAPÍTULO II ♚ Fallen Soldier




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/634856/chapter/3

Aedion estava a poucos segundos de estrangular alguém.

Primeiramente, não entendia o motivo daquela maldita reunião para qual lhe arrastaram tão cedo. Ele queria dormir, descansar a cabeça da noite anterior, qual passara o dia todo festejando. Seus homens haviam chegado da nova província conquistada com apenas uma perda, e passaram a noite toda bebendo em homenagem ao soldado caído. Estava cansado e praticamente morto, com suas incompletas três horas de sono. Teve de esfregar os olhos turquesa diversas vezes para conseguir se concentrar em ficar acordado.

― Beba isso ― a mãe lhe ergueu uma caneca fumegante, qual ele aceitou.

― O que é?

― Vai te tirar a ressaca ― lançou um olhar que mostrava estar ciente de sua noite em claro ― E mantê-lo acordado.

Tinha um cheiro doce, e ele agradeceu com a cabeça antes de tomar uma golada. O que quer que fosse aquilo, o aqueceu de dentro para fora, alertando-o.

― O que tem aqui?

Naquele momento, uma figura esvoaçante passou por ele, os cabelos prateados fazendo cócegas em sua face. A irmã se inclinou sobre o ombro e lançou um olhar meticuloso ao líquido que Aedion bebia. Depois franziu o nariz.

― Xixi de Lhama.

― Vai se ferrar, Aelin ― lançou uma careta a ela, que apenas sorriu.

― Já fui e voltei, muito bem, obrigada ― então virou-se para a mãe, bocejando ― Sobre o que é tudo isso?

Aedion também estava curioso quanto ao assunto da reunião para qual havia sido acordado tão cedo. Mesmo assim, não podia perder a oportunidade de provocar a irmã, vestida num roupão de seda fina.

― Estamos decidindo se, quando eu te matar, vamos enterrá-la junto aos nossos ancestrais ou simplesmente jogar seu corpo frio numa vala qualquer.

Ela se enfureceu, cruzando os braços sobre os seios.

― Oras, mas é-

Foi interompida pela mãe, que se colocou estrategicamente entre os dois, fitando-os.

― Cresçam, vocês dois ― ralhou. Então, ao se certificar que os filhos não atacariam um ao outro, respondeu à questão inicial ― Quanto à reunião... Apenas escuta.

Seu pai passou por eles, alto e forte, ladeado por um homem de cabelos negros. Aryan Ashryver fuzilou o filho com o olhar, alertando-o silenciosamente ― comporte-se para as visitas. Fosse ele quem fosse, deveria ser importante para que o pai demandasse uma reunião àquela hora. Tão cedo que mesmo ele, o rei invicto de Illéa, tinha a bainha da espada abotoada desleixadamente e os cabelos prateados bagunçados sob a discreta coroa dourada. Não queria nem pensar em como ele mesmo estaria, vestido apressadamente, mas tinha a impressão que os botões de sua túnica haviam entrado nos lugares errados e que uma das botas até os joelhos que vestia era ligeiramente mais escura que a outra. Despediram seu cavalete, o que poderia fazer?

Mas a mãe, no entanto, estava absolutamente composta, com os belos fios louros numa trança bem feita, que descia até mais da metade de suas costas. Parecia estar acordada há horas pela elegância com que se movimentava. Aelin já não desfrutava dessa virtude, e era bastante óbvio que fora arrancada de sua cama ― ou da cama de outra pessoa ― e vestida no primeiro roupão encontrado.

Era bom que fosse algo importante, importante o suficiente para justificar o fato de sequer terem dado um tempo adequado para a irmã se vestir. E mesmo que o maldito roupão arrastasse no chão, o recorte insinuante do traje deixava seus seios bastante definidos sob a seda carmesim, e ele não gostava em nada dos olhares que os guardas lançavam a ela.

Rapidamente, arrancou dos ombros a capa que usava e colocou-as nos da moça.

― Me interceptaram no corredor ― ela começou a explicar, emparelhando os ombros com o irmão ― Nem tive tempo de me vestir. Mas parece melhor que usar dois pés esquerdos de botas diferentes.

Aedion voltou-se para os próprios pés, constatando ser verdade.

Droga ― praguejou.

― Mas não se preocupe. Você anda estranho o tempo todo, não é como se alguém fosse reparar.

Ele deu uma cotovelada nas costelas dela, brincando. Erguendo as mãos até a cabeleira, fez o que pôde numa trança improvisada e tomou das mãos da mãe a coroa prateada e colocou-a sobre os cabelos, indicando sua posição como princesa. Seus irmãos mais novos não estavam acordados e não fazia sentido chamá-los, afinal, o que duas crianças fariam numa reunião de estipe não séria?

Antes de entrar na sala, suspirou profundamente e deu um sorriso encorajador em direção à irmã.

― Por Wyrd. Eu não vou me casar com Kahlan Sardothien ― protestou, balançando a cabeça, a boca se contorcendo ligeiramente à menção do nome. Aelin concordava veemente ― Dê ela a Rhysand Galathynius ou… Ilias Havilliard. Mas não me ofereça o próprio demônio e espere que eu aceite de braços abertos.

Do outro lado da mesa, o rei Aryan o observava cautelosamente. Tinha o olhar fumegante sobre o filho, e ele tinha a consicência de estar andando sobre ovos; o rei Andros Sardothien, magnífico pai de Kahlan, também o observava como quem desejava o homicídio. Rapidamente, o rapaz acrescentou:

― Não que seja nada pessoal, Vossa Majestade.

― Certamente que não ― Andros sorriu, mas este sorriso não atingiu os olhos.

O rei Sardothien sequer era de Illéa; comandava um reino vizinho, bastante amigo, mas que apelava por uma aliança mais forte que a amizade entre dois reis. Entrelaçar as famílias parecia uma ideia genial, exceto que Aedion Ashryver odiava Kahlan com todo seu coração. Ela era exibida, mimada, narcisista e extremamente orgulhosa, praticamente a imagem refletida de Aedion. E isso o irritava tanto, tanto, que quando eram crianças, sempre conspiravam um contra o outro. Casá-los… Assim que o fizessem, provavelmente o Castelo de Vidro viria ao chão. Ninguém em sã consciência os colocaria num mesmo cômodo sem esperar uma destruição em massa.

― Como íamos dizendo ― Lorde Adayre pigarreou, tirando a atenção dos olhos famintos de Andros de cima de Aedion ― Rhysand Galathynius e Ilias Havilliard desposarão moças da plebe-

― Eu preferiria casar com a a moça do pão ― disse baixinho no ouvido da mãe, que se sentava ao seu lado. Vanora não sorriu, mas um lampejo de diversão cruzou seus olhos.

― E você, Aedion, pedirá a mão de Kahlan e em alguns meses faremos a cerimônia.

Com uma carranca, ele cruzou olhares com o pai. Como ele podia permitir aquilo? Estava preparado, na verdade, para se casar com Aelin, sua própria irmã, durante a Grande Purgação, já que seu avô era tão obcecado com a pureza do sangue Ashryver. Pelos Deuses, ele estava preparado para desposar até Rhoe Galathynius mais que Kahlan Sardothien. Aryan mantinha a expressão de quem não aceitava discussões. Então bebericou o vinho, procurando uma solução.

― Mais alguma coisa? ― perguntou, carrancudo.

Lorde Adayre assentiu, voltando-se para os papéis.

Então o formigamento na boca familiar começou. Por que Lorde Adayre parecia tão errado?! Seus lábios se moviam, mas a voz vinha muitos segundos depois, fazendo com que Aedion franzisse o cenho cada vez mais. Estavam lhe pregando uma peça? Sua mão esquerda formigava igualmente, de modo que teve de soltar a caneta que segurava para massageá-la... Mas não a encontrava. Onde está minha mão?! Tudo que sentia era um formigar sem fim, não tinha a mínima consciência se estava na mesa ou em qualquer outro lugar. O terno que usava começava a sufocar, queimava seu pescoço enquanto o ar nos pulmões parecia insuficiente, e com a mão direita, desajeitadamente, começou a desabaotoar a camiseta. A voz retumbante de Lorde Adayre agora lhe parecia distante... Distante... Quase um sonho. O lustre acima de si piscava em câmera lenta, entorpecendo seus sentidos. Apertou o punho com força quando este começou a formigar, e como viu depois, tremer. Seus braços começavam a tremer, mas não tinha controle sobre eles. Estava sufocado, preso dentro do próprio corpo que não respondia aos seus comandos com muito sucesso. Olhou para o pai, que assentia, mas não conseguia entender para quê. Me ajude! Tentou suplicar, um lamento inaudível que mal saiu de sua garganta. Ou saiu muito bem, pois todos na mesa se voltaram para a outra ponta, onde se sentava. Agora estava nu, só, todos aqueles olhos lhe inspecionando e a mão tremendo em espasmos variados. Não podia deixar que o vissem daquele modo, não...

Então ele colocou todas as forças nas pernas para se levantar, cambaleante, e seguir até a porta com um Preciso ir apressado, sem sequer escutar a própria voz. O pai falava algo, e percebia que era dirigido a si, mas sua voz e os movimento dos lábios não estavam em sincronia. Pequenos pontinhos negros dançavam em sua vista e se perguntou: terá sido o vinho? Não... Mas outros herdeiros já haviam sido envenenados antes, por que não ele? ...Não.

O coração em disparo, as pernas falhavam, já sentia o sabor do sangue no local onde havia mordido enquanto tremia. "Você está bem?", foi a única frase que conseguiu decifrar daquele amontoado de pessoas. Precisava sair dali, necessitava. Se jogou contra a porta com rapidez e correu pelo corredor --ou melhor, se arrastou, cambaleando para os lados. Precisava de um quarto, um abrigo, qualquer lugar fora do alcance de visão dos lordes dissimulados, desesperados por uma fraqueza que pudessem atacar. A escada. Oh, Deuses, ali estava a escada. E embaixo da escada havia um abrigo que levava ao subterrâneo.

Ainda se sentia sufocado, a visão falha, os ouvidos confusos... Mas ninguém havia lhe seguido. Tentou focar na maçaneta, fez de tudo para encontrar a alavanca que movia seus braços, e como que por milagre, conseguiu abrir a porta, que bateu atrás de si quando se jogou para dentro. Caiu de joelhos na pedra fria e áspera que compunha o chão dos túneis, e sem forças para fazer-se mais digno, caiu no chão. Estava muito alheio ao que acontecia consigo, mas tinha uma certeza: não tinha controle. As pernas começaram a espasmar, os braços tremiam, a cabeça doía terrivelmente; mas não sabia como parar, como controlar-se, como refrear o próprio corpo, aquele traidor inescrupuloso.

Soltou um arquejo de dor quando a cabeça bateu na parede de pedra e tentou se encolher, abraçar os membros e impedir que se machucasse ainda mais, mas foi impossível. Ar. Precisava de ar...

Então, como um anjo, alguém surgiu perto de si. Cabeleira loura, profundos olhos azuis, arregalados em assombro. Também foi incapaz de assimilar qualquer coisa que ela dizia, pois a única coisa que escutava era o pulsar acelerado de seu sangue na cabeça. Estava morrendo. Envenenado. Malditos... A moça começou a desabotoar sua camiseta com urgência, afrouxou o laço da gravata e retirou seu terno. Conseguiu respirar, enfim. Ia morrer, ele tinha certeza. Que merda, era tão novo... Nunca tinha banhado de mar e ficaria marcado na história por apenas um talho na parede da sala de jantar, onde havia escrito algo ilegível com quatro anos de idade.

Mas parou. Parou da mesma forma que começou, gradativamente. Tinha a cabeça no colo da moça, que ainda o fitava com extrema preocupação. Quando pôde ver mais claramente, forçou os olhos apenas para perceber que se tratava de sua mãe. Mamãe... Seu peito ardia, mas a mulher acariciava seu cabelo com tamanha afabilidade que ele sequer estremeceu. A mandíbula doía, a cabeça, os braços e pernas, e até a droga das costas. Dor de frio. Se encolheu, sem forças para mais nada, e fechou os olhos.

Quando acordou, teve a impressão de ainda estar nos túneis subterrâneos úmidos do subsolo do castelo; a bochecha estava em contato com algo gélido, molhado, mas quando abriu os olhos tudo que viu foi uma poça de baba num lençol branquíssimo e impecável, perfeitamente engomado e habilidosamente estendido sobre seu colchão confortável. Seu colchão. Sem corredores no subsolo. Seu quarto. Sua cama. Poderia estar feliz por estar ali e não na sujeira do subterrâneo, mas se viu retestado ao perceber que alguém tinha tido de levá-lo dali, alguém o viu naquele estado, estirado no chão, espasmático. Aliás, ele se perguntava, o que haveria acontecido? Veneno? Estava morto...!....?

Sua teoria se tornou terrivelmente errada quando sentiu um hematoma na cabeça, latejante. O fato de alguém tê-lo carregado até o quarto feria seu orgulho, mas saber que não tinham tomado cuidado de seu corpo inconsciente deixava-o aliviado. Não havia sido uma maca, então. Ou médicos. Talvez um empregado desleixado pelas escadas escondidas? Tentou colocar-se de pé, mas uma horrível vertigem tomou conta de seu ser. Fechou os olhos e esperou que parasse.

A porta do quarto se abriu e ele voltou a visão embaçada para ela. A mulher que adentrou o quarto com graciosidade era justamente quem esperava. Ela carregava um pano úmido nas mãos e se sentou próxima a sua cabeça.

― Aedion… ― bagunçou seus fios prateados, retirando-os da testa com ternura. Umedeceu o rosto do rapaz, que sentia todo o corpo queimar.

― Mãe, ― ele chamou, já sentindo o corpo fraquejar ― Eu fui envenenado.

Vanora assentiu, acariciando sua face.

― Eu sei, querido.

A mulher continuou a refrescá-lo, enquanto sentia o enjoo inicial passar. Não precisou perguntar como havia anulado o veneno, pois sabia muito bem que sua adorável mãe sabia mais sobre venenos que o próprio boticário. Ela provavelmente havia descoberto da droga maliciosa antes mesmo dele desabar naquele chão.

― Quem? ― perguntou, sentando-se abruptamente.

― Andros Sardothien, talvez ― ela palpitou ― Mas não… Não seria tão estúpido às vias de nos atacar em nossa própria casa, sabendo que ele é o estranho.

― Lorde Adayre.

― Me poupe, Aedion. Se ele desejasse lhe matar, já o teria feito há séculos. Duvido que seja inteligente suficiente para tal proeza. Não… Tem que ser alguém que não estava naquela sala.

― Já verificou os criados? ― ele perguntou, recebendo uma confirmação sombria. Pobres fossem os coitados que foram submetidos a um julgamento com Vanora Ashryver ― Alguém ficou sabendo? ― indagou.

Ela voltou-se para ele, movendo-se pelo quarto.

― Claro que não ― deslizou os dedos pelo dossel ― Fraqueza, filho, não deve ser exposta.

Ele concordava, como concordava com quase tudo que sua mãe afirmava. Então se colocou de pé lentamente, procurando evitar a vertigem.

― Onde vai?

― Eu tenho uma festa para atender.

Viu a face da mãe tornar-se vermelha.

― Por Wyrd, Aedion. Acaba de ser envenenado! O que acha que acontecerá da próxima vez?

Ele deu de ombros, caminhando pela extensão do próprio quarto até um baú. A mãe continuava a listar razões pelas quais ele não deveria ir, ralhando, veemente, que o efeito do veneno não havia passado. Apesar de uma excelente mentirosa, Vanora não enganava ao filho. Abriu a arca e retirou de lá sua espada de punho prateado, bastante desgastada para o herdeiro de um dos tronos de Illéa, e a capa carmesim.

Antes que cruzasse o portal, ou sequer desse alguns passos, sua mãe o interceptou.

― Temos que falar sobre Kahlan Sardothien.

Ele revirou os olhos num ato impulsivo, que lhe rendeu um olhar fumegante da mãe.

― Kahlan ― testou ― Aquela garotinha insuportável, que pintou o meu cabelo de rosa, mamãe, de rosa! ― ele fez um gesto exagerado em direção à cabeleira branca e sedosa, na altura dos ombros, como se fosse o seu bem mais precioso. Mas para Aedion, bem, era. ― Eu me recuso a casar com aquela víbora Sardothien. Por que não Celaena? ― citou a irmã mais velha de Kahlan, buscando por uma aprovação ― Ela é tão mais adorável.

― Escute a si mesmo, rapaz! ― Vanora esbravejou, impaciente, o tom de voz tão alterado que Aedion acreditou que a mãe fosse explodir bel ali ― Deixe de ser imaturo e tenha um pouco de perspectiva! Está sendo tolo, idiota ― gesticulou apressadamente. Estava tão alterada que os fios loiros haviam se desprendido da trança, fazendo com que parecesse que estava travando uma batalha. E talvez estivesse. ― Escute, por uma vez, a voz da razão, não dos… Punhos.

Ele continuava ali, apoiando-se de um pé para o outro, sem dizer muita coisa. Discutir com a mãe era que nem discutir consigo mesmo ― inútil e inafetivo, e sairia vitoriosa de qualquer lado. De todo modo, a rainha Vanora sempre, sempre, conseguia aquilo que queria se desejasse com muito afinco. E ela queria que ele casasse com Kahlan.

Estava virada para a janela quando voltou-se para ele com os olhos brilhantes.

Oh, não. Me deu uma ideia ― se aproximou lentamente, próxima o suficiente para sentir a respiração entrecortada do filho ― Você gosta de falar com os punhos, não é? Então vamos fazer uma dinâmica ― antes que pudesse se desviar do punho da mãe, que ia de encontro à mandíbula do rapaz com uma rapidez impressionante, ela o acertou em cheio. Ela havia acabado de lhe dar um murro?

― Mãe! ― massageou o queixo, curvando-se.

― Sabe o que foi isso? ― perguntou. Antes que ele desse uma resposta engraçadinha, Vanora continuou ― Veja meu punho direito como o povo de Illéa. E o povo de Illéa está irritado. E veja você como o rei daqui a alguns anos. O que aconteceu?

― O povo de Illéa me bateu.

― Exato ― ela ergueu a outra mão ― Por quê?

― Porque eu fui um idiota…?

― Também. Mas principalmente porque o seu avô foi um idiota. As pessoas acham que você vai ser igual a ele, e não querem, não te desejam, como rei ― o cruzar olhares com o dele, ela apressou-se ― Por mais que lhe desejem em outros aspectos. Veja meu punho esquerdo como Kahlan Sardothien e seu povo. Se o meu punho direito quiser lhe acertar, o meu punho esquerdo pode pará-lo. E tudo isso depende de uma maldita aliança. Sabe o que ocorre com reis sem rainhas?

― Eles falham?

― Eles falham ― concordou ― E eles caem. E são presos nas masmorras pelo resto de suas vidas miseráveis. Com uma rainha poderosa, Aedion, com amigos e alianças, você mantém seu trono e a cabeça sobre os ombros. Caso contrário… ― novamente, sem aviso algum, Vanora avançou sobre o filho, dando um soco novamente. E com a outra mão, outro. ― Vê? Da próxima vez em que disser que estou lhe casando com Kahlan para te torturar, lembre-se que eu só quero a sua sobrevivência no mundo onde vive.

Calou-se por alguns segundos, inclinando-se sobre o encosto da cadeira. Então virou-se para Vanora, reconhecendo ali o verdadeiro poder de toda dinastia Ashryver.

― E que mundo é esse?

Ela aproximou-se, erguendo seu queixo com um dedo. Seus olhos turquesa brilhavam, dando ênfase ao anel dourado das beiradas.

― Se me escutar, filho, o mundo que quiser.

Eles se encararam por longos segundos, os olhos turquesa brilhando em faíscas que pareciam dançar entre os dois, em busca de um acordo silencioso, de uma promessa controlada apenas no olhar que apenas os dois conseguiam se transmitir ―eram mãe e filho, afinal. Feitos do mesmo material.

Então Aedion deu outro passo em direção à porta para continuar em direção ao seu destino devasso.

― Onde pensa que está indo? ― ela suspirou, cruzando os braços, a musselina branca de seu vestido se movendo com um leve farfalhar.

― É descortês o anfitrião não dar as caras na própria festa, mamãe. Não acredito que o mundo dos meus sonhos se transformará esta noite, enquanto fico em repouso ― saiu, e após alguns segundos, voltou-se para a porta, fitando a mãe ― Não me espere acordada.

Estava escuro, e o luar era refletido com magnificência nas torres do Palácio de Vidro. Dos telhados cor de esmeralda, ele esperava, apoiado na ponta dos pés para que nenhuma telha escorregasse e denunciasse sua posição. Esperava, esperava, e esperava por mais algumas horas pela notícia drástica do falecimento do príncipe Ashryver. Até então, os sinos da torre ainda não haviam tocado nas badaladas mórbidas que anunciavam a morte de algum membro da monarquia, e nenhum servo do castelo saíra correndo, gritando aos quatro ventos que Aedion Ashryver estava morto.

E aquilo o deixava preocupado.

Ergueu-se, a capa verde camuflando-se com a cor dos telhados, mesclando-se com facilidade na escuridão, e saltou cuidadosamente para outro teto. Ele deveria dar uma festa naquela noite, e provavelmente alguém ali ouvira falar da morte iminente do príncipe herdeiro. Ou sua ausência era comentada. Correu sobre os telhados por mais alguns quarteirões, tão acostumado com a vida de gatuno que mal se importava.

Podia escutar a Devastação de longe. Seus sentidos aguçados afirmavam que a festa continuava, e que o exército pessoal do príncipe Aedion se divertia como nunca, gritando e bebendo, comemorando sua chegada das montanhas. Aedion era bastante popular ― ou fora ―, e seu desaparecimento certamente seria notado pelos próprios companheiros. Ele dirigia toda uma tropa com mais de duzentos homens, armados e treinados, e era um comandante amado por seus soldados, a Devastação.

Quando alcançou a viela onde a festa acontecia, teve de semicerrar os olhos para vê-los mais de perto; quase todos os homens do príncipe estavam já dentro da enrome taverna, no subterrâneo, mas haviam cerca de dez soldados de prontidão na entrada.

― Alto, quem vem lá? ― um deles gritou quando uma figura apontou na ruela. Apesar da questão, estavam rindo.

A figura que se aproximava retirou a capa, revelando seus cabelos prateados que iam pouco acima dos ombros. Aedion. Como é possível? Era para tê-lo matado e ainda assim ali estava, como se nada houvesse acontecido. Prestou atenção à conversa.

― Seth! ― o radiante Aedion gritou ― Como vai a esposa?

― Maravilhosa, como sempre ― o soldado, Seth sorriu ― Mas Amara está doente desde a semana passada.

Ele assentiu, compreensivo.

― Espero que se recupere logo.

Adentrou o estabelecimento, logo ficando claro o porquê de ser tão popular entre seus homens, o porquê de lutarem com tanto empenho, tornando-os a melhor tropa de Illéa. Era porque Aedion era familiar ― tomava cerveja com seu pessoal, pelos Deuses! Quantos líderes faziam isso?

Ainda assim… Onde havia errado? A quantidade de veneno escolhida era mortal para qualquer pessoa, e o fato dele estar andando apenas algumas horas depois… Testara a erva em outras pessoas apenas para ter certeza, e a confirmação era sempre a mesma. Mortos em alguns poucos segundos. E Aedion Ashryver estava ali. Sorrindo deliberadamente.

Mas aquele farfalhar em sua cabeça continuava. Sua tentativa em assassinar o homem falhara miseravelmente, e sabia que agora haveria um preço a se pagar por tal fracasso. A Guilda não tolerava perdedores, e caso não aparecesse até a meia noite com a cabeça de Ashryver nas mãos, morreria ou pelas mãos de seus outros colegas Assassinos, enviados para eliminar a falha, ou seria morto por quem lhe contratara, em vingança cega pelos serviços mal-prestados.

Não sabia qual era pior.

Com o coração acelerado, fechou os olhos e deixou a brisa quente da noite atravessar seu capuz. Então veio o badalar da torre, anunciando um novo dia. Escutou a corda do arco ser puxada antes mesmo disso, e quando a flecha zuniu pela escuridão, não seu moveu por um milímetro. Esperou que a ponta afiada atravessasse sua garganta, numa morte limpa e merecida.

Afinal, ele falhara.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

AHA! Terminei esse capítulo bem rapidinho, hein? Na verdade, terminei dia 18 e programei para hoje, sexta feira, de tão empolgada que estava! O que acharam do Aedy? Eu, pessoalmente, vejo esse moço como o sex symbol da fanfic. E a Vanora? Tenho uma tara muito grande por essa mulher.
Quem vocês acham que envenenou (ou tentou envenenar, heheh) o nosso príncipe maravilhoso? E por que acham que não surtiu o efeito esperado nele? Deixem suas teorias!
Enfim, espero que tenham gostado.
Até o próximo, ^^