Humphrey escrita por Amy W


Capítulo 2
Some Days


Notas iniciais do capítulo

https://www.youtube.com/watch?v=ZbUNv_jr_FI



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/632452/chapter/2

Aeryn Humphrey contava os dias como uma forma de distração de seus pensamentos mais preocupantes. Não que fosse efetivo.

Quinze dias atrás, ela vomitara pela primeira vez em anos.

Há nove, seu período atrasou.

Há três, quatro testes de farmácia indicaram um resultado positivo.

E, ainda há quinze, ela vinha enlouquecendo.

Em sua mente, ainda tentava se convencer de que algo estava errado. Tinha que estar. Ela tomava pílulas rigidamente todos os meses, sem atrasar minutos sequer em cada dia. Prevenia-se em toda e qualquer relação. Sempre fora muito centrada nisso.

Exceto...

Aeryn esgotou seu vocabulário palavrões pela milésima vez desde que fizera os testes, fitando o teto ao xingar em todos os idiomas dos quais sabia alguma coisa. Era irônico, até. Sempre tentara se manter tão segura para um dia falhar e deixar-se invadir por outro projeto de ser. Burra, tola, estúpida. Por que tivera que permitir? Aqueles minutos de êxtase não compensariam a consequência. E ainda havia Tristan.

Ela vinha pensando nele desde o momento em que comprara os testes. E, embora soubesse que um bebê não se fazia sozinha, e que ele merecia saber que havia um filho seu dentro dela, Aeryn não conseguia mesmo imaginar a sua reação – inferno, ela nem conseguia ver-se contando a ele.

Ela sabia que aquilo seria sua ruína, mas não precisava fazer com que fosse a de Tristan também. Ele, um artista nos olhos da mídia como ela, certamente não precisava de um bebê naquele momento. E Aeryn já planejara tudo, caso a gravidez se confirmasse. Tinha guardado boa parte do cachê de seus filmes, o que não era pouco. Ela sairia do país ao fim daquelas malditas gravações, utilizando suas identidades falsas. Mudaria toda a sua aparência (embora somente o cabelo, sua marca, talvez fosse suficiente). Estabilizaria-se em alguma cidade do interior onde ninguém jamais ouvira falar dela. Deletaria todas as suas redes virtuais. Trocaria o celular. Não daria explicações. Não deixaria avisos.

E, o mais importante: Aeryn jamais abortaria sua bebê.

Sim. Sua. Nunca acreditara em previsões ou pressentimentos, mas quase podia ver uma garotinha em seu futuro. Apesar disso, o sexo da criança lhe era indiferente. Ela jamais quisera ter filhos, mas, embora apavorada, foi incapaz de evitar uma relevante alegria conforme conferia os testes. Já amava seu bebê antes mesmo de ter cem por cento de certeza que ele existia, e aquilo era muito, uma vez que Aeryn nunca se vira sentindo aquilo por alguém de fato.

Agora ela sabia o que era isso. E, ao mesmo tempo, tinha certeza de que não tinha nada a ver com o tipo de amor que Sherman queria ver.

Ah, droga, ela fechou os olhos com força. Sherman.

Se ela fugisse e eventualmente, por alguma razão, retornasse, a jovem tinha certeza de que seria brutalmente assassinada – ainda que esse assassinato se fizesse com ele a forçando a engolir glitter ou algo assim. Mas talvez fosse a chance para ele se livrar do cinema, também.

Aeryn fechou os olhos novamente, agora com mais suavidade. Por que, de repente, parecia-lhe que sua partida mais ajudaria a muitos do que causaria transtornos?

Engoliu em seco. Não poderia colocar mais uma preocupação em sua cabeça. Não agora que ela não estava sozinha.

Ela sorriu. Da próxima vez que Sherman perguntasse se ela estava com alguém, teria que se segurar muito para não sorrir tolamente e acariciar a barriga com zelo, tal como viera fazendo. Suspirou. Aquilo seria um problema.

***

No estúdio, Aeryn se via rodeada por uma tempestade de pó, perfumes e tecidos. Eles pareciam quase cair sobre ela conforme Janeth emperiquitava sua face com um milhão de produtos para que, no final, Aeryn ainda parecesse a mesma. Mas não questionaria os dotes da maquiadora – sabia bem que seria o mesmo que pedir para ser estraçalhada.

Enquanto permanecia sentada por um tempo interminável e ouvindo Janeth tagarelar, Aeryn se observava no espelho à sua frente. Seu cabelo não era natural há alguns meses, mas continuava bonito e chamava a atenção: anteriormente de um tom castanho escuro, agora ele estava mais claro e brilhante, ondulado no meio das costas. Seus olhos eram os mesmos de sempre, quase negros de tão escuros, contrastando com a pele branca.

Já se passavam duas semanas da realização dos testes e ela estava conformada e feliz. Lentamente, ela começou a perceber ações involuntárias em seu comportamento: às vezes, punha a mão sobre uma elevação ainda inexistente em seu abdômen; começava a listar nomes que gostava em sua cabeça; e, como agora, se olhava no espelho e pensava em quais características suas a bebê herdaria. E também se pegava encarando Tristan eventualmente, tentando imaginar o resultado da soma de ambos.

Ele não percebera, e Aeryn não poderia estar mais satisfeita. Continuavam se encontrando em algumas noites, e nada passava daquilo. Bom, ela esperava que não. Talvez fosse sua mente sensível pregando-lhe peças, mas Aeryn vinha notando uma certa intimidade com ele e por parte dele que nunca tivera com qualquer outra pessoa. E isso não era saudável; não seria para nenhum dos dois. Aeryn logo partiria, e não tinha a intenção de feri-lo.

Poucas noites antes, ela conversava com Tristan por poucos minutos antes de adormecer, sua língua meio solta graças aos espasmos de êxtase que ainda passavam por seu corpo junto do relaxamento que aos poucos a encobria. Como fizera nos últimos dias, ele a puxou contra si e apertou-a de forma protetora até que ela suspirou.

– Você já teve algo sério com alguém? Ele perguntou-lhe, e Aeryn sentiu o corpo enrijecer.

– Não – ela respondeu, e, visto seu silêncio, acrescentou pouco depois: – Mas eu prezo pelo que estou fazendo em cada momento da minha vida. Qualquer falha que seja cometida, seja em uma relação séria ou não – ela levantou os olhos para Tristan –, eu estou fora.

Tristan ficou pensativo por alguns instantes, e Aeryn não disse o que ela queria, de fato, falar: eu quero que você falhe comigo. Será menos doloroso para nós dois.

Porque ela sabia que sempre iria vê-lo em sua bebê, independente de quanto tempo se passasse, onde ela estivesse ou com quem estivesse. E não queria apegar-se a isso. Cortar o que eles tinham imediatamente seria mais fácil do que ter que rasgá-lo pouco a pouco.

Sua única ressalva seria a falta de uma presença masculina para a filha. Ela mesma crescera sem o pai – tão negligente que um dia Aeryn parou de se importar –, e somente ela sabia como era isso. E Aeryn definitivamente não queria encontrar um substituto e arriscar a sua própria felicidade. Não, não mesmo. Sua mãe a criara assim. Aeryn conseguiria também.

Ela estremeceu e uma represália de Janeth a fez voltar à realidade. Ainda não era hora de pensar nisso. Por enquanto, só precisava pensar em terminar as gravações e sumir dali. Mais algumas semanas, Aeryn lutou para convencer a si mesma. Mais algumas semanas.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Comentem. :)



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Humphrey" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.