Trigo ambulante e o ladrão de pipocas.

Leo Valdez

Demorou longos minutos até que Travis e Katie finalmente parassem de discutir. Poxa, eu tinha acabado de tirar um pacote de pipocas de micro-ondas prontinha para comer, de dentro do meu cinto de ferramentas, que eu tinha levado dentro da mochila, só por garantia. Parece que eles ligaram um radar; abri o pacote e eles pararam.

— Sério isso? Logo agora? Tão de sacanagem comigo — falei enchendo a mão com as pipocas e colocando na boca.

Fiz uma careta de quem não gostou nenhum pouco.

— Isso, come ai e fica quieto, que é melhor. — A cara de milho falou, me olhando com aquela cara de quem tinha vomitado.

Travis revirou os olhos, enquanto jogava a cabeça pra trás e levantava as mãos. Tanto ele, quanto eu e Katie estávamos sentados no chão do elevador. Eu de um lado e Katie e Travis do outro lado.

— Meus deuses do Olimpo, qualquer um dai que seja o da paciência, me dá um pouquinho dela ai porque eu to precisando.

Katie olhou para ele de um jeito que deu medo até em mim. Parecia que ela iria tirar uma faca sei lá de onde, e arrancaria os órgãos dele pra vender no mercado negro, depois faria picadinho do resto e daria para o Cérbero.

— Que tal você pedir pra Hades te levar daqui, é muito melhor. — falou.

Travis olhou pra ela com uma expressão cansada, como se já não aguentasse mais. Ah não, podem começando a discutir, por favor.

— Sabe, as vezes eu acho que erraram e ele que é seu pai, porque tu é mal humorada que nem ele. Aliás, feia também, cara de cevada.

Agora sim, que a treta comece outra vez. Me encolhi no canto onde estava e comecei a comer minha pipoquinha, parece que eu não peguei ela atoa.

Se antes o olhar da Katie já tinha sido assustador, esse conseguiu superar.

— Você me chamou do que? — perguntou serrando os dentes. Opa, isso vai dar ruim.

— Hum, de cada de cevada?! — falou Travis, com a maior cara de inocente.

Katie pareceu ficar mais irritada ainda, se é que isso era possível. Esse é o meu garoto.

— Não — falou — antes disso.

— Ah, claro, que burro. Filha de Hades? — perguntou.

Enchi a mão de pipocas e comi. Até a briga dessa vez não estava tão boa quanto as outras, mas estava ótima para distrair enquanto estamos ali. Falando nisso, quando é que iriam consertar essa droga de elevador. Aliás, meu pai curte consertar as coisas, será que não dava pra dar uma mãozinha aqui? Socorro, não mereço ficar aqui com esses dois que ficam nesse “estamos brigando, mas queremos nós pegar loucamente, pena que o Leo tá aqui”.

— Depois disso.

— Mal humorada?

Ela revirou os olhos e Travis olhou para ela como se estivesse acabado de descobrir a cura de alguma doença.

— Ah, já sei. Feia.

A cara dela foi impagável. Parecia que alguém tinha vomitado em cima dela.

— Ridículo. Quando saímos daqui, eu juro que vou transformar todas as suas roupas em saco de arroz — falou irritada.

Travis olhou pra mim, rindo.

— Só eu que cansei dessa TPM eterna dela?

Ela olhou pra ele, cínica.

— Sim, só você. O diferentão. 7 bilhões de pessoas do mundo, mas você.

Precisei rir da cara de bunda que ele fez. Foi engraçado, e, por isso, continuei.

— O único. A última gota de néctar do deserto. O último pedaço de ambrósia no meio da batalha.

E com isso, a estranha começou a rir. Qual é a dessa garota? Mudou de humor mais drasticamente que os deuses antes da guerra contra Gaia ou melhor, que Hera em dia de TPM.

Ela pareceu pensar um pouquinho e continuou a brincadeira, para desgosto do filhote de ladrão.

— A melhor invenção de Dédalo. A única conta de inverno. Mais raro que o ofiotauro.

— O tipo de parafuso que Hefesto não tem. O único filho de Poseidon. O herói da profecia de Cronos. Primogênito de Hermes. A escova de cabelo azul que acertou Cronos.

Katie soltou uma gargalhada alta na última frase, coisa que não achava que ela fosse capaz de fazer. E continuou.

— A caçadora de Ártemis que tem namorado. O ciclope com dois olhos. O décimo terceiro olimpiano.

— Aquele que entende as profecias de primeira. O dia em que Hera não foi falsiane.

Estiquei o pacote com pipoca pra ele, que pegou algumas, enquanto riamos. Travis nos olhou com uma cara que dizia “Agora e assim?” ou “Desde quando vocês viraram amiguinhos?”. Tava difícil descobrir qual das duas opções era a certa.

— O último semideus do mundo. Um dos sete da profecia. O sal… — ela falava, mas interrompi.

— Ei, eu sou um dos sete — eu disse. Katie me olhou como se esperasse que eu continuasse a falar, mas não fiz isso. Ela revirou os olhos.

— Tá, e dai? Vai começar a se achar por isso agora? Porque se for, avisa, que eu te transformo logo numa macieira.

O Stoll começou a rir da minha cara de idiota.

— Toma, foguinho.

Peguei um monte de pipocas e joguei em cima dele.

— Olha como fala, panaca.

— Ok, fósforo. Agora, cala a boca e me dá esse pacote de pipocas.

Neguei com a cabeça e ele deu um sorriso de lado de uma forma sinistra. Ignorei ele e foi pegar mais pipoca, só que parecia que o pacote tinha sumido, sério, minha mão passava no ar onde deveria estar o pacote. Olhei pra baixo e não tinha nada na mão. Mas o que…? Ouvi a risada de Travis e voltei a olhar pra ele, que segurava um pacote de pipoc… Quer dizer, as MINHAS pipocas.

— Como você fez isso?

Sério, parecia coisa daqueles truques de magia esquisitos que passava na televisão.

— Coisinhas de filho de Hermes.

Katie revirou os olhos, entediada.

— Para de se achar.

— Não to com vontade — ele respondeu.

— Ah, mas vai ter que ter ou eu vou te bater — começou a ameaçar ele, voltando a ter aquela cara de psicopata de sempre.

Eles começaram a discutir igual a duas crianças irritantes. Nesse momento, eu entendi o motivo dos dois ficarem discutindo o toda hora. Aquilo era amor reprimido. Mas que bosta, será que não dava logo pra eles abrirem a boca e falarem logo o que sentem um pelo outro.

Continuei no meu canto, fingindo que eles eram pessoas civilizadas e estavam quietos. Eles gritavam igual a dois doidos e, o que antes eram pipocas bem comestíveis, estavam espalhadas pelo chão e cabelos de Travis.

— MAS QUE BOSTA! SERÁ QUE DÁ PRA VOCÊS PARARAM COM ISSO E SE PEGAREM LOGO? — gritei, bem mais do que irritado. Com isso, os dois pararam e me encararam.

— Olha só — começou Katie —, ninguém aqui v-

Nós ouvimos um barulho e sentimos um tranco no elevador, o que fez Katie parar de falar.

O elevador voltou a funcionar. Graças aos deuses. Enquanto ele finalmente subia, nós três ficávamos calado, apenas esperando. Quando chegou ao andar que deveria, parou e abriu as portas. Do lado de fora, Hefesto estava sentado no chão, com dezenas de ferramentas espalhada e um pedaço de aço jogado num canto; ao lado dele, estava Apolo. Ele me encarou sorrindo quando eu sai do elevador.

— E ai, cara? Muito traumatizado pelas duas horas com eles? — Deu uma risada, antes de Afrodite empurrar ele para o lado e depois fazer o mesmo comigo.

— VOCÊS! — ela gritou, de uma forma enfurecida, para Travis e Katie — por causa de vocês, eu borrei minha unha e quase arranquei um pedaço do meu cabelo! Ficaram ai gritando e discutindo durante três longas horas, perturbando todos do Olimpo com isso. Já chega. Agora vocês vão ver só.

Só nesse momento eu percebi que ela carregava um arco e uma flecha. As cores dos dois variavam entre o rosa, vermelho e branco. Também tinha uma penca de penas, corações e glitter.

Ela colocou a flecha no arco e apontou para os dois, e atirou.

Ai meus deuses, era o arco de Eros. Agora sim eles estão ferrados, e isso vai ser legal.