Fated escrita por J N Taylor


Capítulo 2
I - The Blood Glow




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Londres, Inglaterra, 14 de Julho de 1843

Charles tomou o café em silêncio com sua esposa e o filho. Enquanto um dos empregados retirava a mesa, Elizabeth mostrou uma leve inquietação.

–O que houve? - perguntou o marido.

–Nada. - ela respondeu, distraída.

–Não minta pra mim.

–Não estou mentindo.

–Onde está a Anne? - ele parou por um segundo, olhando ao redor – Anne!

–Senhor. - ela entrou, secando a mão na roupa.

–Anne, por favor, leve o James para o quarto. Estamos esperando um convidado. Daqui a pouco peço para você descer com ele. Elizabeth, podemos conversar?

–Claro, senhor. - Anne pegou James pela mão e o conduziu até o quarto – Vamos, pequeno senhor?

–Fale, Charles.

–Elizabeth… Vamos ao jardim. - e se levantou, dando a volta na mesa e oferecendo a mão a esposa. Ela o olhou, sorriu e segurou, levantando-se. Ambos já estavam vestidos e prontos para a visita que chegaria em breve. Foram juntos até o jardim, nos fundos da casa. O silêncio era quebrado apenas por Charles, que assobiava uma aria de Mozart.

–Fale. - ela falou, quando chegaram ao meio do jardim. Ele parou de assobiar.

–Você está estranha hoje.

–Estranha como?

–Parece distraída. Reparei isso ontem, quando cheguei. Estava distraída, hoje parece inquieta.

–Ontem recebi uma carta. Minha mãe está doente.

–Por que não me disse?

–Não quero incomodar.

–Por Deus, Elizabeth! Você jamais me incomodaria. - falou, carinhosamente. Acariciou o rosto dela, passando os dedos entre seus cabelos castanhos – Você quer visitá-la?

–Eu adoraria.

–Irei com você.

–Não pode deixar as apresentações.

–Claro que posso. Eu vou contigo, Elizabeth.

–Charles, não.

–Não discuta. - ele segurou as mãos dela entre as suas – Iremos no próximo fim de semana.

–Como quiser.

–Senhor! - um dos empregados os alcançou, chamando-os – O senhor Delagney está aqui.

–Obrigado. - disse, com um sorriso e um aceno de cabeça – Peça para que Anne desça com o James.

–Como quiser. Com licença, senhor. - e saiu.

–Terminaremos nossa conversa mais tarde, Charles.

–Não terminamos? - perguntou, enquanto iam para a sala principal.

–Não. - ela confessou, de forma misteriosa. Ele olhou para a esposa e sorriu.

Quando alcançaram a sala, viram o homem que era o melhor amigo de Charles, Henry Delagney, brincando com James. O casaco e a cartola dele estavam pendurados em um suporte ao lado da porta. Levantou a cabeça e viu o casal.

–Henry, meu amigo! - e o cumprimentou com um aperto de mão e um abraço.

–Charles! Quanto tempo, não?

–De fato, meu amigo.

–Senhora. - e se virou para Elizabeth. Ela ofereceu a mão, Henry segurou e a tocou suavemente com os lábios – É uma honra revê-la.

–Digo o mesmo. - ela disse, cortesmente – Seja bem-vindo.

–Agradeço, senhora.

–Trouxe o que pedi, Henry?

–Acha que eu esqueceria desse favor ao meu amigo? - e foi até o casaco. Procurou em um dos bolsos e tirou uma pequena caixa de madeira que entregou ao amigo – Aqui.

–Para você, Elizabeth. - Charles pegou e olhou para a esposa. Ela lançou um olhar curioso.

–O que…? - ela parou quando ele abriu. Dentro estava um belíssimo colar, com uma corrente fina de ouro, com um pingente também dourado, com o formato de um par de asas recolhidas em torno de um rubi em formato de coração – É lindo.

–Eu disse que você preferia algo maior, mais chamativo. - murmurou Henry.

–Eu acredito que você goste de algo mais discreto.

–De fato, gosto, Charles. - ela sorriu, olhando para o colar – Você me conhecer melhor que ninguém.

–Sou seu marido, não é nada além do meu mínimo. - ele pegou o colar da mão dela de maneira delicada – Quer experimentar?

–Quero. - e se virou. Charles arrumou o cabelo dela de forma que facilitasse sua visão, colocando-o sobre o ombro esquerdo dela. Colocou o colar carinhosamente – Pronto.

–Ficou bom? - ela perguntou, ficando de frente para eles.

–Perfeita. - sussurrou Henry, com o olhar fixo nela – O fulgor de sangue. - falou, fazendo referência ao brilho vermelho sangue do rubi.

–Concordo, meu amigo. Perfeito de uma forma que apenas você conseguiria estar.

–Agradeço. - ela disse, levemente ruborizada.

–Por Deus, o seu rosto… - falou Henry, sem pensar.

–O que tem? - ela perguntou.

–Você ficou mais linda do que já é. - confessou – Suas bochechas, com esse tom vermelho… Você está linda, Elizabeth.

–Verdade. - concordou Charles.

–Acho mais conveniente eu me retirar. - disse Henry, após alguns instantes olhando os olhos dela.

–O que houve? - perguntou o anfitrião.

–Preciso ir. - falou, pegando suas coisas apressadamente – Com licença, me perdoem a pressa na saída. - e saiu, quase correndo.

–Entendeu alguma coisa? - questionou Elizabeth.

–Não, não entendi. Ele deve ter se lembrado de algo. - e deu de ombros.

–Por que o colar?

–Não sei ao certo. Eu o vi, achei bonito e pensei que você gostaria. - e segurou as mãos dela afetuosamente – Pensei errado?

–Não, pelo contrário. Achei lindíssimo.

–Além disso, Henry nos convidou para um baile em sua casa hoje.

–Sim, você havia mencionado.

–E você confirmou que iria comigo. Me desculpe pedir isso, sei que está preocupada com sua mãe.

–Não, tudo bem. Uma distração momentânea será ótima. Além disso, não tem muito o que eu possa fazer daqui. O máximo seria me preocupar.

–Concordo. - e silenciaram por alguns instantes – Eu te amo, Elizabeth.

–Eu também te amo, Charles. - e ele a abraçou, beijando-a na testa.

***

Washington D.C., Estados Unidos, hoje

Jéssica entrou em casa, já passara das oito da noite. Seu marido, Bruce Kramer, estava de pé na cozinha, terminando de preparar o jantar. Ele se virou e a viu entrando. Tinha os cabelos castanhos naturalmente bagunçados, os olhos verdes, e a barba por fazer, dando um ar divertido e sério a ele. A entrada da casa era a sala, com as paredes com um papel de parede com um padrão de losangos dourados num fundo vermelho-escuro. O sofá ficava no meio da sala, de costas para a porta. Na parede oposta, uma enorme estante de madeira com a televisão, que estava desligada. Vários livros e DVDs se espalhavam pelos espaços vazios. A cozinha era separada da sala por uma meia parede, que permitia ver o outro cômodo.

–Como foi o dia, amor? - perguntou ele.

–Foi bem. Chegou mais cedo? - ela perguntou, jogando a bolsa no sofá.

–Sim, meu chefe me liberou mais cedo. Senti sua falta. - ela foi até a cozinha e deu um beijo carinhoso no marido.

–Que bom. Aproveitou e fez meu jantar?

–Claro. - ele falou, sorrindo.

–O que está preparando?

–Um bife ao molho de champignon, com batatas gratinadas. - ela parou e olhou para ele com cumplicidade – E de sobremesa, pavê de coco com nozes. Seu favorito.

–Eu juro que se não fosse casada contigo, eu casava agora.

–Eu sei. - e riu – Mas preciso te falar uma coisa séria.

–Vou trocar de roupa, não exploda a casa. Quando eu voltar, você fala, certo?

–Como quiser. - ela foi para o quarto, tomou um banho demorado, trocou de roupa, e desceu. Quando chegou, o marido tirava as batatas do forno.

–Cheguei na hora! - ela falou, esfregando as mãos.

–Vou tomar um banho porque aquela cozinha está muito quente.

–Vai sim. Vou ficar assistindo algo na televisão.

–Não vou demorar. - e subiu as escadas, ensaiando uma corrida. Ela se jogou no sofá e ligou a televisão. Puxou o telefone da bolsa. Uma mensagem.

Olá, nos encontramos mais cedo. Você esbarrou em mim e acho que acidentalmente peguei seu cartão. Bom, me ligue. Precisamos conversar sobre algo que você possa ter esquecido. Ass.:Lucian

Ela parou por alguns segundos. Respirou fundo.

–Aquele arrogante desgraçado… - praguejou, quase num sussurro – Não vou responder. - o telefone dela vibrou. Ela pegou. Outra mensagem.

Provavelmente você recebeu minha mensagem anterior. Estarei te passando o endereço do hotel que estou hospedado, e o número do quarto. Só encontrar um hotel… E um quarto.

–Ele… Não acredito. - e jogou o telefone no bolso. Continuou deitada no sofá, passando os canais aleatoriamente. Seu marido voltou, quase vinte minutos depois.

–Pronta? Com fome? Demorei? - perguntou, enquanto colocava os pratos na mesa.

–Sim, sim e sim. - ela respondeu, rindo.

–Ótimo! - ele correu na direção dela, fazendo cócegas. Ela riu.

–Para, chega! - ela falou, caindo no sofá outra vez, rindo.

–Não. - e se aproximou dela, a beijando.

–Para! - ela falou, entre risos – Parecemos dois adolescentes.

–É a intenção! - e a beijou outra vez.

–Chega, Bruce. - Jessica chorava de rir.

–Certo, Jess. Vamos jantar. - e parou, se levantando.

–Ótimo! - e levantou também. Ele a segurou pela mão e a puxou carinhosamente. Ela o seguiu.

–Sente-se. - e puxou a cadeira para ela. Ela agradeceu com um sorriso e um aceno de cabeça.

Bruce serviu o jantar e abriu uma garrafa de refrigerante, servindo ambos. Se sentou do lado oposto da mesa.

–Refrigerante?

–Não tinha vinho! - ele falou, com uma risadinha – Mas é quase igual. Tirando a uva, o preço, a marca e o gás… E o refrigerante.

–Concordo. - ela falou, levantando seu copo – Um brinde.

–Um brinde. Saúde! - e brindaram.

–Saúde. - e bebeu um gole. O telefone dela tocou – Eu atendo depois. É meu chefe, vou enviar uma mensagem dizendo que estou ocupada.

–Faça isso. - e deu uma piscada para ela.

***

Lucian saiu do hotel pouco depois da meia-noite, segurando um buquê de rosas azuis nas mãos. Andou tranquilamente até o cemitério, do outro lado da cidade. Sem pressa, atravessou as ruas, cortando caminho entre os becos. Quando chegou lá, entrou. Caminhou entre os túmulos até chegar em um grande mausoléu. Empurrou o par de portas de ferro e entrou. Se dirigiu diretamente ao canto do fundo. Procurou por dois, em especial. Um túmulo, com o nome de sua esposa, e outro logo ao lado, com o nome de seu filho. Respirou fundo e colocou as flores sobre o caixão de sua esposa. Ela fora levada para os Estados Unidos depois de sua morte, para ficar junta da família, que era americana. O filho teve o mesmo destino. Henry entrou, minutos depois. Lucian e ele se olharam, se cumprimentaram com um aceno de cabeça.

Mantiveram um silêncio de compreensão e respeito mútuo, apesar da falta de simpatia.

–Perdemos muitas coisas, Henry. - murmurou, sem tirar os olhos do túmulo da esposa.

–Não só você. - falou, colocando a mão sobre o ombro do outro.

–Me seguiu?

–Sim. - soltou, respeitosamente – Me desculpe por isso.

–Não importa. - e deu de ombros, saindo do alcance de Henry.

–Eu não tive culpa.

–Você tirou minha esposa de mim.

–Eu a amava.

–E eu também. Mas você foi egoísta demais, Henry.

–Eu achei que ela poderia…

–Achou errado. - e saiu para o ar frio do exterior, abotoando o sobretudo.

–Me desculpe. - Henry o seguiu e fechou as portas do mausoléu.

–Você não tem vergonha?

–Charles, por favor. - Lucian abriu a boca para responder, mas a fechou novamente. Soltando um leve gemido de tristeza – Me desculpa. É tudo o que eu tenho pra te oferecer.

–Você pode se perdoar?

–Não. Nunca poderei. Mesmo não tendo culpa.

–Não diretamente. - e abaixou a cabeça, cortando o cemitério. Henry o seguiu na mesma velocidade.

–Eu sinto por ela. Eu sinto a falta dela.

–Nós a amamos, de maneiras diferentes. - falou, ao alcançar o portão do cemitério.

–Nós? - engoliu em seco – Charles, você nunca me tratou por nós.

–Uma trégua, enquanto estamos aqui.

–E nunca me deixou te chamar de Charles.

–Uma trégua, eu já disse. Por favor, me deixe.

–Por que?

–Por favor, Henry.

–Impressionante… Pela primeira vez, em dois séculos, vejo você demonstrar sentimentos.

–Me deixa em paz! - agarrou Henry pela gola do casaco e o empurrou de costas contra a parede do cemitério – Me deixa em paz! Eu cansei dessa nossa guerra! Eu cansei de te odiar!

–O que você quer que eu faça?

–Eu não tenho coragem para isso. - e se afastou, tirando uma Colt 357 de dentro do sobretudo. Segurou a arma pelo cano e entregou ao outro, que recuou um passo – Me mate, Henry.

–Como? - falou, sem jeito – Não posso.

–Quanto tempo passamos nessa nossa guerra? Eu cansei. Se você não fizer, eu farei. Por pena.

–Charles… - e pegou o revólver, engatilhou e apontou – Não posso. Perdemos coisas demais, não quero carregar essa culpa. Já basta o que aconteceu com a Elizabeth. - e abaixou a arma.

–Chega! Eu perdi meu filho, minha esposa e minha vida! Eu sequer vivo, eu só existo! Eu cansei!

–Eu também perdi. Perdi minha esposa, por sua causa.

–Minha causa? Não foi minha culpa, eu nem estava lá quando você a matou! Culpa dessa sua doença, dessa loucura, dessa sua obsessão pela minha esposa! A Elizabeth nunca te amou, e você nunca se conformou que ela preferiu a mim.

–Porque você tinha dinheiro! Você era rico, Charles.

–Não ouse chamar a minha Elizabeth de interesseira! - e deu um soco em Henry – Não desonre a memória dela. Você sabe que ela nunca sentiu nada por você.

–E eu a amava mesmo assim.

–E isso terminou com tantas mortes que só Deus sabe! Estamos lutando por séculos, um tirando o que o outro ama. Henry, acabe com isso! - e abriu o sobretudo, caindo de joelhos – Carregado com Beladona. Eu sei que isso vai me matar. Pode nos matar. Acabe com isso!

–Desculpa. - e apontou para o coração de Lucian – Charles…

–Apenas faça. - disse, olhando nos olhos de Henry.

–Eu não consigo.

–Seja um fraco novamente. - murmurou – Faça! Faça logo! Ou você ou eu!

–Como quiser. - apertou o gatilho.

Um estalo.

A arma falhou.

Lucian caiu deitado, ofegando.

–Isso está errado! Deveria funcionar. Tente de novo.

Henry apertou o gatilho. Uma, duas, três vezes. A arma falhou em todas. Lucian se levantou, arrancando a arma da mão dele. Apontou a arma para a própria cabeça e tentou disparar. O mesmo maldito barulho.

–Maldição! - e lançou a arma no muro do cemitério. Quando atingiu a parede, disparou – O que?

Ele correu atrás da arma e apontou para sua cabeça. Apertou o gatilho diversas vezes.

–Tente! - e entregou para Henry, que apontou para ele. A arma falhou. Apontou para cima e disparou. Em todas as vezes, atirando para cima, em qualquer direção, a arma funcionava. Menos quando disparada contra Lucian.

–Mefisto avisou que você não poderia morrer. - e jogou a arma no chão, saindo em seguida – Eu lamento por você.

–Não… - e ficou ali, de pé, olhando para a arma no chão. Uma chuva fina começou a cair. Ele olhou para cima, a luz prateada da luz delineava os prédios que, em sua maioria, estavam apagados. Sentia frio. Demonstrara sentimentos guardados por muitos anos. Estava fraco, sem vontade de continuar, querendo saber como poderia acabar com aquilo. E só uma coisa, uma pessoa, lhe vinha a mente todas as vezes que se deitava com alguém para satisfazer sua condição. Apesar de terem se passado mais de dois séculos, ele ainda amava Elizabeth. Havia jurado que usaria sua condição para poder tê-la de volta, mas foi levado para fora de seu caminho.

E agora, a partir dessa noite, reforçou sua promessa. Ele iria tê-la de volta.


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